“Existe só uma maneira para a cultura
sólida do vinho: pela educação", diz
presidente da ABS-Bahia
Com mais de 40 anos de
atuação, a Associação Brasileira de Sommeliers (ABS) inaugurou, no último dia
21 de fevereiro, sua sede na Bahia. Para seus dirigentes, a chegada da entidade
– a única no país filiada à Association de la Sommellerie Internationale – é um
marco na promoção da cultura do vinho e da excelência em serviço de sommeliers
no Estado.
Em entrevista ao
Caderno Municípios, o presidente da ABS-Bahia (www.absbahia.com.br), Thiago
Aquino, aborda, entre outros temas, a disseminação do conhecimento e da
apreciação do vinho no Estado; a contribuição da associação para fomentar o
consumo da bebida; e o papel que eventos como Páscoa e festas de fim de ano
desempenham no incentivo ao hábito do consumo da bebida.
·
Como a sede da ABS na
Bahia poderá contribuir para fomentar o consumo de bebidas produzidas no
próprio estado?
Existe apenas uma
maneira, na minha opinião, para desenvolver uma cultura sólida de vinho em um
país ou em uma região como a nossa Bahia: pela educação. Para beber bem e
desfrutar adequadamente dessa bebida de cerca de oito mil anos, é preciso muito
mais do que poder aquisitivo para comprar seus rótulos mais caros ou conseguir
beber litros dela sem sentir seus efeitos indesejados. É super comum encontrar
pessoas de alto poder aquisitivo, envoltas de adegas quase que milionárias,
terem bebido vinho durante toda sua vida como obras de arte. Porém, se for
pedido que façam uma simples descrição sobre um único vinho que verteram em
suas taças, certamente não conseguirão. É um direito de quem compra o seu vinho
beber da forma que lhe apetecer? Óbvio que sim, mas um educador de vinhos não
pode dizer que ele fez um bom uso das oportunidades que o dinheiro lhe deu, em
termos educacionais do vinho. Um simples curso proporcionaria um outro patamar
de aproveitamento, certamente muito mais prazeroso, pois sairia da exclusividade
dos efeitos da substância química vinho propriamente dita, de relaxamento e
sociabilidade, para um prazer também intelectual. E aqui é fundamental dizer
que intelecto está relacionado ao uso da cognição e não à superioridade ou à
arrogância que costumam ser atribuídas ao consumidor de vinhos. Portanto, este
é, efetivamente, o papel da ABS-Bahia: atuar, conjuntamente aos empresários e
colaboradores, no desenvolvimento e no conhecimento dos estudos do vinho, do
seu mercado, da sua produção, importação... Não somos um grupo criado para
beber vinho, comprar mais barato ou uma confraria de amigos. Queremos melhorar
a cultura do vinho em nosso estado, baseados em serviço de excelência.
·
Em que nível se dá a
presença de vinhos baianos nos cardápios de bares, restaurantes e hotéis,
inclusive para divulgação aos turistas?
Infelizmente ainda é
baixo. A nossa produção não é feita de números estratosféricos, mas esta não é
a razão. É multifatorial, mas certos pontos têm maior relevância. A falta de
conhecimento continua refletindo nesta questão. É mais fácil vender produtos de
regiões mais famosas. O preço é outro. O Brasil trata muito mal os seus
produtos genuínos. Apenas em tempos mais recentes tivemos uma denominação de
origem relacionada a produtos alimentícios nacionais. O pão de queijo mineiro e
o queijo canastra estão mais à frente disto. Já pensou como poderíamos ter uma
denominação de origem para o delicioso Queijo do Reino, o nosso Pãozinho
Delícia, para um dos bolinhos mais famosos do mundo – nosso acarajé – ou para a
moqueca baiana? Mas não conseguimos nem nos resolver com o Espírito Santo. Se
não sabemos vender bem nossos produtos, com padronização, como vamos oferecer
aos turistas? Estas novas vinícolas têm investido em Enoturismo, tenho visto,
mas não pode parar nisso. É preciso realizar degustações formais, não apenas
com os consumidores finais, mas também com garçons, sommeliers, cumins,
bartenders. Eles também influenciam muito nas vendas. É uma engrenagem que não
caminha solta. Se retroalimenta.
·
Eventos como Páscoa e
festas de fim de ano desempenham que peso no incentivo ao hábito do consumo de
vinhos no estado?
Muito, muitíssimo
mesmo. É notório que o consumo de vinho no Brasil ainda se baseia na produção
daqueles elaborados por uvas não viníferas, aqueles chamados vinhos de
garrafão. Mas não há problema algum nisso. São uma boa forma de iniciar o
processo. Diz-se que um país está desenvolvido em termos de vinhos quando ele
tem um consumo habitual de vinhos doces, aqueles ditos de sobremesa. Já na
outra ponta. Portanto, é como se fechasse um círculo. Começa naquele primeiro,
docinho, mais fácil de beber, de baixa complexidade, e o processo se encerra
naquele em que consumimos com os pratos doces: tendem a ser mais complexos,
caros e cheio de especificidades. Datas como a Páscoa, quando são comuns estes
tipos de vinhos, foram fundamentais neste processo, e ainda são. Nossa produção
ainda se baseia em vinhos de uvas de mesa. Embora não mais no mesmo nível. O
Réveillon, inegavelmente, favorece a questão dos vinhos espumantes. Estas datas
são importantes, mas precisamos nos aproveitar, no bom sentido, melhor delas.
Fonte: A Tarde
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