As razões por que executivos pressionam
pela volta do trabalho presencial nos 5 dias da semana
Em janeiro, a CEO
(diretora-executiva) da empresa de remessas e encomendas UPS, Carol Tomé,
anunciou que a companhia estava eliminando 12 mil dos seus 85 mil cargos de
gerência. E os profissionais que não fossem dispensados deveriam comparecer ao
escritório cinco dias por semana a partir de março.
Para os funcionários
da empresa que conseguem desempenhar algumas ou todas as suas tarefas em casa,
a decisão foi uma ducha de água fria.
Especialistas insistem
que, para os profissionais que passam a maior parte do dia em frente a uma tela
de computador, o trabalho híbrido e remoto não pode ser simplesmente eliminado.
"Ele passou a ser
essencial", afirma a professora Colleen Flaherty Manchester, do
Departamento de Trabalho e Organizações da Escola de Administração Carlson da
Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos. "Não podemos andar para
trás."
Anos de dados
pós-pandemia demonstraram que o trabalho híbrido e remoto funciona.
Pesquisadores concluíram que os profissionais mantêm sua produtividade e podem
ajudar as empresas a ter lucro. E existem também fatores intangíveis que
desenvolvem a lealdade dos funcionários, como o melhor equilíbrio entre a vida
pessoal e o trabalho.
Ao longo dos últimos
anos, muitos CEOs recuaram depois de flertar com a ideia do retorno total ao
escritório, devido a esses dados e à forte resistência dos seus funcionários.
Mas esses fatores não
impediram que algumas empresas, incluindo algumas de grande porte, publicassem
decisões – ou pelo menos fortes sugestões públicas – para que seus funcionários
retornassem às suas mesas de trabalho cinco dias por semana.
Especialmente no setor
financeiro, instituições importantes, como JP Morgan Chase, Goldman Sachs e o
Citigroup, instituíram políticas de comparecimento cinco dias por semana para
boa parte dos seus funcionários. E a Boeing também decidiu exigir que muitos
dos seus empregados retornassem às suas mesas de trabalho.
Existem dados que
demonstram que outros executivos importantes estão considerando adotar essa
mesma medida, especialmente entre as grandes organizações.
Alguns especialistas
permanecem totalmente perplexos ao verem empresas como a UPS discutindo o
retorno ao escritório. Um deles é Stephen Meier, chefe da divisão de
administração da Escola de Negócios Columbia, em Nova York, nos Estados Unidos.
Mas Meier acredita que
existe um ponto comum entre muitas dessas empresas: as táticas de gestão de
linha dura.
"Você não pode
manter o mesmo estilo de liderança que você tinha antes [da pandemia]",
afirma ele. "Você precisa realmente empoderar [os funcionários]... E acho
que alguns líderes simplesmente se acostumaram com um certo modelo de comando e
controle."
Esta afirmação se
aplica a muitos críticos declarados do trabalho remoto, como o CEO da Tesla,
Elon Musk. Ele foi um dos primeiros a emitir um ultimato em 2022, do tipo
"apareça ou se demita".
Em entrevista para a
rede de TV CNBC em maio de 2023, Musk lançou um ataque carregado de ódio aos
profissionais que queriam horários de trabalho flexíveis. Para ele, a
"classe do laptop" estava "vivendo em La La Land".
O professor de
economia Nicholas Bloom, da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, afirma
que a postura de Elon Musk frente ao trabalho remoto vai além das necessidades
da empresa. Para ele, "sua vida é sua empresa".
"Se você for Elon
Musk, você basicamente quer passar cada minuto acordado e trabalhando. É o
lugar onde a sua mente se concentra. Você adora aquilo. É a sua carreira. É a
sua aspiração, onde todo o seu dinheiro está investido." Alguns CEOs com esta
mentalidade esperam o mesmo dos seus funcionários: "se eu voltei, você
também vai".
O CEO da JPMorgan
Chase, Jamie Dimon, também adota essa abordagem guiada pelo poder e pela força.
Ele reforçou sua aposta no trabalho presencial em julho de 2023.
Dimon deixou claro
que, se os profissionais quiserem incluir sua empresa de prestígio nos seus
currículos, eles devem atender sua exigência.
"Entendo
totalmente por que alguém não quer enfrentar uma hora e meia de transporte todo
dia", declarou ele. "Entendo totalmente... mas isso também não quer
dizer que eles precisam trabalhar aqui."
Além do culto da
personalidade, algumas dessas exigências intimidadoras podem ser causadas por
um desejo diferente de controle, especialmente nas atuais incertezas da
economia, quando os lucros e o desempenho das empresas são instáveis.
Bloom indica um estudo
realizado em 2023 por dois professores da Escola de Graduação em Negócios Katz
da Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos. Eles examinaram 137 anúncios
diferentes de retorno ao escritório no ano passado.
A pesquisa concluiu
que os gerentes usam as exigências de retorno ao escritório "para
reafirmar o controle sobre os funcionários e culpá-los como bodes expiatórios
pelo mau desempenho das empresas".
Bloom afirma que
muitos CEOs de empresas em dificuldades financeiras são pressionados para fazer
mudanças amplas e radicais – até "desesperadas" – para provar aos
acionistas que estão mantendo a lucratividade.
Ele se refere a Tomé,
da UPS. A empresa anunciou uma queda de receita acima do esperado nos seus
resultados do quarto trimestre de 2023.
"A CEO precisa se
apresentar e dizer alguma coisa, precisa tomar ações radicais para não perder o
emprego", explica Bloom. "É o que está acontecendo."
Este tipo de
manifestação dos executivos pode convencer alguns acionistas de que fazer os
funcionários voltarem ao escritório será a panaceia, mas especialistas afirmam
que a estratégia pode, na verdade, acabar prejudicando os líderes corporativos.
"Acho que alguns
desses CEOs [que se acham] Reis Sóis, como Elon Musk, têm este problema",
afirma Bloom. Ele faz referência ao monarca absolutista francês Luís 14.
"Eles são
simplesmente inacessíveis para seus funcionários e não estão acostumados a
ouvi-los... E acabam forçando essa situação, o que é uma decisão ruim."
Bloom prossegue:
"No longo prazo, o desempenho melhora mantendo os funcionários felizes e
reduzindo os custos de retenção e contratação. As pesquisas mostram com muita
clareza que, para os profissionais e para os gerentes, o trabalho híbrido é
lucrativo para as empresas."
E a maioria das
companhias irá perceber isso, segundo o professor de administração de empresas
Prithwiraj Choudhury, da Escola de Negócios da Universidade Harvard, nos
Estados Unidos.
Ele acredita que as
empresas que assumiram uma posição linha-dura quanto ao retorno ao escritório
são exceções e que muitas das que se opuseram ao trabalho remoto irão mudar de
posição em breve.
"Acho que nenhuma
empresa no mundo de hoje pode impor uma política contra os talentos",
afirma Choudhury. "Simplesmente não vai funcionar. Você irá sentir a dor.
Você irá ver algumas das suas melhores pessoas saírem. E, então, haverá uma correção
de curso."
Mesmo firmas de
prestígio, como a JPMorgan Chase, podem acabar não conseguindo exercer sua
influência para impedir a perda de funcionários talentosos. Mas isso não
significa que todas as empresas irão se mexer, especialmente porque os
profissionais perderam parte do seu poder com a recessão do mercado de
trabalho.
A arrogância é algo
poderoso e, em alguns casos, ela pode prevalecer – mesmo contrariando os
desejos dos funcionários e a lógica ditada pelos dados das pesquisas.
Fonte: Por Brennan
Doherty, da BBC Worklife
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