Nanismo: desafios e conquistas de uma comunidade que inspira
Imagine viver em um mundo em que você é
constantemente julgado, discriminado e desconsiderado devido à sua altura. Para
milhares de pessoas no Brasil e em todo o mundo, essa é a
realidade diária devido ao nanismo, uma condição física rara e complexa,
muitas vezes mal compreendida.
A condição é decorrente de uma mutação genética que
se caracteriza por uma deficiência no crescimento dos ossos, resultando em
indivíduos com estatura abaixo da média nacional, chegando à fase adulta entre
70cm e 145cm de altura. No Brasil, existem 32 centros de referência em doenças
raras — no Distrito Federal, o Hospital de Apoio de Brasília e o Hospital
Materno Infantil.
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Em 20 e 21 de outubro foi realizado o Simpósio
Brasileiro de Nanismo, no Rio de Janeiro, e de acordo com informações da
Annabra (Associação Nanismo Brasil) — organizadora do evento —, existem mais de
400 tipos diferentes de nanismo, alguns ligados a questões hormonais e outros à
displasias ósseas (falha na organização normal das células). As duas principais
formas de nanismo são a acondroplasia e a hipocondroplasia (deficiência do
hormônio de crescimento).
"Tivemos
avanços significativos na luta contra o preconceito desde
a implementação da Lei nº 13.472/17, em 2017, que instituiu o Dia Nacional do
Combate ao Preconceito às Pessoas com Nanismo. Mas ainda há a necessidade de
enfrentar o preconceito estrutural, que persiste. Ressalto a importância da
união, disseminação de informações e participação ativa em eventos para
promover o entendimento e apoio às minorias, visando que todos se sintam
acolhidos e amados", destaca Kenia Maria Rio, presidente da Annabra.
Não existem pesquisas ou estatísticas que apontem a
proporção da população brasileira com nanismo. Estima-se que a cada 15 mil
nascimentos, uma criança tem algum tipo de nanismo. Essa falta de dados torna
ainda mais importante a conscientização e o combate ao preconceito.
A expressão "anão" é considerada
pejorativa e inapropriada, carregando uma bagagem de estereótipos prejudiciais.
O termo correto é pessoa com nanismo. O capacitismo é considerado crime,
conforme o artigo 88 da Lei Brasileira de Inclusão (nº 13.146), com pena de
reclusão de um a três anos.
O Dia Nacional do Combate ao Preconceito às Pessoas
com Nanismo, celebrado em 25 de outubro, é uma homenagem ao ator e ativista
americano Billy Barty, criador de uma associação que, na década de 1950, lutava
pelo direito das pessoas com nanismo e por tratamento médico adequado. No mês
de outubro, tornou-se tradição iluminar em verde, que representa o nanismo,
diversos pontos turísticos em todo o Brasil. Essa ação é realizada em conjunto
com a Annabra e os delegados de cada estado, reforçando a busca pelo reconhecimento
e respeito à condição.
·
Diagnóstico
Segundo o médico geneticista Juan Clinton LLerena
Junior, do Centro de Genética Médica e Serviço de Referência para Doenças Raras
da Fiocruz, o nanismo pode ser detectado ainda na gestação, por meio de exames
específicos, mas o diagnóstico definitivo é, geralmente, estabelecido após o
nascimento, por meio de testes genéticos.
"É importante realizar estudos controlados,
nos quais coletamos dados sobre a vida cotidiana dos pacientes ao longo de um
período específico para avaliar medicamentos para acondroplasia e monitorar o
crescimento ósseo. Isso enfatiza a necessidade de ajustar os tratamentos
conforme as necessidades evoluem", explica. Além disso, faz-se necessária
a atenção constante a possíveis complicações e o envolvimento de diversas
especialidades médicas para garantir cuidados ao longo da vida, incluindo riscos
como morte súbita infantil, dores crônicas e atrasos no desenvolvimento.
·
Tratamento
De acordo com Ana Paula Bordalllo, endocrinologista
pediátrica da Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (UERJ), o
tratamento do nanismo visa proporcionar uma melhor qualidade de vida,
especialmente devido às cormobidades associadas às displasias ósseas. “Para
isso, recomenda-se um acompanhamento genético e multidisciplinar ao longo da
vida da pessoa com nanismo.”
A Annabra destaca que em 2022, a Amvisa aprovou o
uso da medicação Voxzogo (vosoritida) para tratar a acondroplasia em pacientes
a partir de 2 anos de idade e que existem programas de pesquisa que continuam
explorando novas terapias para diversos distúrbios médicos.
“A aprovação do tratamento no Japão revela que a
eficácia em crianças diminui ao longo do tempo; por isso, estudos de vida real
e nos mais jovens são essenciais. Além disso, há esperança de que o tratamento
medicamentoso possa evitar cirurgias de alongamento de membros em casos de
acondroplasia, que são procedimentos complexos. A mutação na acondroplasia
afeta as curvas de crescimento, a placas de crescimento e a via do receptor da
FGFM3”, explica a especialista.
·
Acondroplasia
A acondroplasia é uma condição rara que afeta cerca
de um a cada 25 mil nascimentos, caracterizada por baixa estatura
desproporcional, curvatura da coluna, macrocefalia e problemas de saúde, como
apneia, obesidade, perda auditiva e mobilidade reduzida.
Conforme o especialista em Neurologia Pediátrica
Antonio Bellas, do Instituto Fernandes Figueira — Fiocruz, a acondroplasia
frequentemente envolve questões neurocirúrgicas. “O tratamento cirúrgico pode
aliviar sintomas, como a descompressão do estreitamento do canal ósseo na base
do crânio, por onde passa a medula espinhal, e problemas respiratórios devido a
características físicas específicas, como a caixa torácica pequena e a
obstrução das vias aéreas.”
<<<< Palavra do
especialista - Glaucia Vieira Ferreira Guimarães é endocrinologista do Hospital
DF Star, da Rede D’Or
·
Quais são as principais causas do nanismo e como a
endocrinologia desempenha um papel no diagnóstico e tratamento dessas
condições?
O nanismo tem diversas causas, algumas relacionadas
a problemas na gestação, doenças cromossômicas, desnutrição, doenças crônicas e
privação psicossocial. O endocrinologista é o especialista para avaliar e
tratar casos de baixa estatura, considerando curvas de crescimento padronizadas
e a altura dos pais. O diagnóstico é feito com base em critérios como estatura
menor que -2 DP (desvios-padrão) ou menor que o percentil 3 para idade e sexo,
ou estatura menor que -2 DP para o canal de crescimento da estatura-alvo, que
varia de acordo com a altura dos pais. Não há uma altura única para
diagnosticar nanismo.
·
Como a deficiência de hormônio do crescimento afeta
o desenvolvimento de uma criança e quais são as opções de tratamento
disponíveis para crianças com nanismo relacionado a essa deficiência?
A deficiência de hormônio de crescimento (Growth
Hormone) causa o nanismo e pode ser congênita ou adquirida. Causas adquiridas
incluem tumores, lesões hipofisárias, trauma, infecções, infarto hipofisário e
radioterapia craniana. A deficiência de GH pode ocorrer isoladamente ou com
outras deficiências hipofisárias. O tratamento com GH pode ser benéfico em
diversas condições, como deficiência de GH, síndrome de Turner, insuficiência
renal crônica, síndrome de Prader-Willi, para os pequenos para idade gestacional
(PIGs) e alguns casos de baixa estatura idiopática. A dosagem e a duração do
tratamento devem ser determinadas por um endocrinologista.
·
Além do hormônio do crescimento, que outros
hormônios podem desempenhar um papel no crescimento e no desenvolvimento das
crianças com nanismo, e como eles são avaliados e tratados?
O crescimento é único para cada indivíduo e é
influenciado por fatores genéticos, sistema nervoso central, sistema endócrino,
cartilagem de crescimento, ambiente e nutrição. Além do hormônio do crescimento
(GH), outros hormônios como IGFs, hormônios tireoidianos, hormônios sexuais,
glicocorticoides e insulina desempenham papéis cruciais. O diagnóstico envolve
histórico clínico, exame físico e exames complementares, com tratamento
recomendado por um endocrinologista. O crescimento é um processo complexo e único,
e em caso de suspeita de baixa estatura, os pais devem procurar um
endocrinologista para avaliação e definição de tratamento.
Fonte: Correio Braziliense
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