O próximo passo do Hezbollah
Desde o ataque do Hamas no dia 7 de outubro, a
retaliação israelense desencadeou um nível de destruição impressionante - com o
número de mortos palestinos já ultrapassando os 10 mil [atualmente mais de 20
mil]. Os EUA enviaram para a região dois porta-aviões e vários destróieres, bem
como equipes militares especiais, para oferecer reforço ao seu aliado e evitar
qualquer possível intervenção do Irã ou do Hezbollah. O Hezbollah está
envolvido em escaramuças com Israel na sua fronteira norte, que se estende por
uma centena de quilômetros desde Naqoura, a oeste, até às fazendas de Shebaa,
no leste. Esta situação obrigou o exército israelense a manter um elevado
número de unidades profissionais estacionadas na área, bem como a manter a
força aérea e as defesas antimísseis em prontidão. A escalada deste conflito
local é atualmente uma das principais questões que se colocam à região e ao
resto do mundo.
Longe de ser um fantoche de Teerã, o Hezbollah deve
ser entendido como um poderoso partido político com uma forte milícia armada e
uma influência significativa em vários países para além do seu Líbano de origem
– Síria, Iraque, Palestina e Iêmen. Sua liderança e a maioria de suas tropas
consideram-se parte da constelação transnacional que deve obediência religiosa
ao Líder Supremo iraniano. Mas o Hezbollah não opera de acordo com ordens e
determinações, sendo ele próprio um tomador de decisões na estratégia iraniana
no Oriente Médio. A última palavra sobre as suas políticas vem do
secretário-geral Hasan Nasrallah e do seu gabinete. Sua relação com o Irã é de
parceiros, e não de auxiliares.
O Hamas também tem um elevado grau de autonomia e
lançou seu ataque com base nos seus próprios cálculos políticos e não nos do
Irã ou do Hezbollah. Decidiu que as políticas seguidas pelo governo israelense
e pela sua população de colonos – ocupação indefinida e anexação gradual –
tinham atingido um ponto crítico em que a inação se revelaria fatal. Esta
decisão estava enraizada numa avaliação mais ampla das transformações
geopolíticas em curso no Oriente Médio. A normalização entre a Arábia Saudita e
Israel estava prevista para o final do ano. Estava em pauta também um acordo
entre o Irã e os norte-americanos. O proposto Corredor Econômico Índia-Oriente
Médio-Europa, que promete reforçar a centralidade dos Estados do Golfo na
economia global, estava rapidamente se tornando uma realidade. À luz de tudo
isto, a "comunidade internacional" estava pronta para marginalizar
ainda mais a causa palestina e reviver a AP (Autoridade Palestina) como uma
alternativa mais confortável em relação ao Hamas. As dinâmicas interna e
externa convenceram a organização de que era preciso agir ou aceitar uma morte
lenta.
É quase certo que o Hezbollah não tinha
conhecimento prévio do ataque. O partido libanês concorda com o Hamas em muitas
questões e passou anos apoiando-o com dinheiro, armas e aconselhamento tático,
mas as suas posições geopolíticas nem sempre estão alinhadas (estiveram em
lados opostos na guerra civil síria, por exemplo). Parece que o ato de
desespero do Hamas – engendrar um conflito com o objetivo de reativar a luta
anticolonial palestina e manter a sua relevância política – não terá um efeito
dominó direto no Hezbollah. Pelo menos não por enquanto. Ao lançar ataques
limitados do outro lado da fronteira, o Hezbollah está mostrando a sua
disposição de abrir uma segunda frente, caso a pulverização de Gaza chegue a um
ponto que o partido não possa mais tolerar. No entanto, esta forma contida de
envolvimento também lhe dá espaço para reavaliar continuamente a situação,
considerar suas opções e determinar os seus próximos passos.
Atualmente, as questões que se colocam às forças de
Nasrallah são as seguintes. Se entrassem numa guerra total com Israel (e
possivelmente com os EUA), seriam capazes de impedir a invasão israelense de
Gaza e o massacre de dezenas de milhares de palestinos? Correriam o risco de
ver o Líbano dizimado e danos tremendos à base de apoio do Hezbollah? Perderiam
milhares de combatentes e a maior parte das suas armas? Colocariam em risco as
realizações do eixo da resistência na Síria, no Iraque e no Iêmen? O que ganhariam
com esse perigoso curso de ação? As respostas são suscetíveis à mudança a
qualquer momento. A melhor estratégia de hoje pode estar fora de moda amanhã.
Mas, até o momento, parece que esta é uma guerra do Hamas, não do Hezbollah.
As opções do Hezbollah – manter as hostilidades com
Israel no seu nível atual, intensificá-las ou reduzi-las – são regidas por três
variáveis importantes. A primeira é a situação em Gaza. Israel quer destruir
totalmente o Hamas e recebeu permissão para cometer um genocídio na tentativa
de atingir esse objetivo, embora as hipóteses de sua realização sejam muito
incertas. Se o Hamas conseguir prolongar a luta, infligir danos significativos
ao inimigo e impedir uma vitória total israelense, então o Hezbollah marcará
pontos políticos importantes com sacrifícios mínimos, simplesmente mantendo
Israel distraído na sua frente norte. O partido poderia assim evitar os perigos
de uma escalada e viver para lutar outra guerra num momento mais propício.
A segunda variável é a base de poder do Hezbollah
no Líbano, que, junto da maioria da sociedade libanesa, apoia os palestinos,
mas hesita em travar uma guerra com Israel. Eles sabem muito bem que, para além
de terem perdido as suas economias na crise bancária libanesa de 2019-20, um
ataque israelense ameaçaria as suas casas e o que resta das sua infraestrutura
nacional vital. O Hezbollah está, compreensivelmente, relutante em pôr em risco
e alienar este eleitorado. A última variável é o Irã e os seus interesses,
incluindo a aproximação diplomática com a Arábia Saudita e as delicadas
negociações com o governo Biden sobre sua tecnologia nuclear e a extensão das
sanções dos EUA. A liderança iraniana sabe que ambas seriam abaladas por um
conflito regional de grandes proporções – daí a posição cautelosa do presidente
Raisi e as suas contínuas linhas de contato com o príncipe herdeiro saudita.
No entanto, à medida que a máquina assassina de
Israel abate palestinos aos milhares, cada um destes fatores pode mudar. Se o
Hamas parecer estar em perigo existencial, o cálculo para o Hezbollah pode ser
diferente – já que a perda deste aliado poderia encorajar Israel a atacar o seu
adversário libanês em seguida. Quanto ao povo libanês, não é claro se
continuará a dar prioridade às suas casas e bens no meio da proliferação de
imagens de sacos de cadáveres palestinos. Será que, em vez disso, estarão dispostos
a sofrer junto dos palestinos? Também os iranianos poderão ter de voltar a
analisar o equilíbrio entre os seus interesses materiais imediatos e os seus
compromissos nominais com a libertação da Palestina. Poderão sentar-se frente a
frente com as autoridades norte-americanas enquanto estes aplaudem a imolação
de Gaza? Isso não enviaria o sinal errado aos seus outros aliados na região, de
que o apoio iraniano é inconstante e pouco confiável?
Se a situação em Gaza se deteriorar ao ponto de o
Irã engavetar as suas negociações com os EUA, os países do Golfo azedarem sua
relação com Israel e a base do Hezbollah ficar convencida de que o partido não
está fazendo o suficiente, isso pode ser um gatilho para o Hezbollah aumentar a
escalada. Do mesmo modo, se Israel decidir atacar civis no Líbano e causar
grandes baixas, não se pode esperar que Nasrallah fique de braços cruzados.
Para o Hezbollah, a intervenção militar é sempre uma estratégia política baseada
na aritmética dos ganhos e das perdas e no complexo campo de aliados e dos
interesses. O seu próximo passo não será decidido pela influência iraniana ou
pela ideologia islâmica, mas pelas exigências do pragmatismo.
Ø Palestinos
choram a morte de uma criança a cada dez minutos. Por Luiz Carlos Azedo
A comemoração mais importante do Ocidente é o
Natal, que celebra o nascimento de Jesus Cristo e, com isso, a renovação da
esperança que explode na passagem de ano-novo. Para os cristãos ortodoxos e
coptas, que ainda seguem o calendário decretado pelo imperador romano Júlio
Cezar, em 46 a.C., a festa natalina ocorre em 7 de janeiro. Entretanto, quase
não houve nem haverá celebração em Belém, a cidade mais católica da Palestina,
onde Cristo nasceu. Resume-se a um presépio montado sobre pedras e um menino Jesus
envolto num lenço palestino.
Simbolizam a destruição de Gaza e a morte de uma
criança a cada dez minutos pelos bombardeios israelenses, segundo os números
divulgados pelo porta-voz do Fundo da ONU para Infância (Unicef), James Élder.
A música, a árvore de Natal, a procissão e a grande
missa deram lugar a um protesto quase silencioso da Igreja Católica,
verbalizado pelo papa Francisco, em Roma, na Missa do Galo. Na Praça da
Manjedoura não há turistas nem fiéis.
Os líderes das diversas representações cristãs em
Jerusalém emitiram uma carta pedindo a seus congregados que renunciassem a
quaisquer “atividades festivas desnecessárias”. Em protesto, no domingo, o
cardeal Pierbattista Pizzaballa, o Patriarca Latino, a maior autoridade
católica da região, caminhou em silêncio de Jerusalém a Belém, onde celebrou a
missa, à meia-noite, na Igreja da Natividade, sem peregrinos.
Apesar da resolução das Nações Unidas (ONU) que
pede uma trégua para a entrada de ajuda humanitária, Israel prossegue seus
bombardeios no sul de Gaza, inclusive contra os campos de refugiados.
Diante das críticas do secretário-geral da ONU,
Antônio Guterres, o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, suspendeu a emissão
e a renovação de vistos diplomáticos para funcionários da ONU, entre os quais,
o secretário-geral adjunto para Assuntos Humanitários, Martin Griffiths. Um
gesto sem precedentes, mas coerente para quem é responsável pela morte de mais
de 140 funcionários da ONU nos ataques israelenses.
O secretário-geral da ONU irritou Netanyahu ao
criticar o Hamas pelos “ataques horrendos”, mas também Israel, pelo “castigo coletivo
do povo palestino”. Guterres acusa Netanyahu de “graves e claras” violações do
direito humanitário internacional em Gaza.
Disse que “os ataques do Hamas não se produziram em
um vazio. O povo palestino está submetido há 56 anos a uma ocupação sufocante,
e tem visto sua terra devorada pouco a pouco por assentamentos”, o que foi
interpretado como uma justificativa para o ataque terrorista do Hamas de 7 de
outubro, o que Guterres nega com veemência.
A retaliação implacável de Israel, de certa forma,
faz o jogo de seus adversários, sobretudo o Irã, pois aumenta seu isolamento
internacional. Aprofunda a crise política do país, mesmo que sob o manto de
unidade nacional, tecido por uma ação terrorista que é tratada como uma ameaça
existencial na dimensão do Holocausto.
A esquerda israelense perdeu a ideia-força da
coexistência com os palestinos; a direita, a confiança da população
conservadora e sionista.
A estratégia de ocupação militar da Cisjordânia e
bloqueio de Gaza fracassou. A escolha de Netanyahu, agora, é a ocupação
definitiva do enclave e uma limpeza étnica, insustentável internacionalmente,
até mesmo para Estados Unidos. A mudança de rumo em direção à solução de dois
Estados, mesmo com a queda do governo após a guerra, parece cada vez mais
difícil, embora tenha amplo apoio internacional.
A guerra unificou um país dividido entre a
preservação da sua democracia e a adoção de um regime “iliberal”, com a
tentativa de Netanyahu de reduzir o poder dos tribunais. Também reduziu as
diferenças entre os judeus ultraortodoxos, que se recusam a prestar serviço
militar, e sionistas, sempre dispostos a pegar em armas para defender seu
território.
De certa forma, reforça o caráter étnico-religioso
do Estado de Israel e legitima o regime de apartheid imposto aos palestinos.
Enquanto houver a guerra, Netanyahu estará firme no poder, com apoio dos
militares linha-dura que comandam a carnificina em Gaza.
Uma pesquisa recente mostrou que 70% da população
árabe se sente parte do Estado de Israel. É uma realidade multiétnica que
somente tem sentido numa ordem democrática.
Para a minoria árabe, que representa um quinto dos
mais de 9 milhões de residentes de Israel, a situação é complexa: dezenas de
árabes morreram em 7 de outubro, o que fortalece esse pertencimento, porém, não
são indiferentes à morte dos palestinos civis de Gaza, sobretudo crianças em
mulheres, vítimas dos bombardeios israelenses.
Mais da metade dos israelenses judeus se opõe à
retomada das negociações para criar um Estado palestino e apoiam os
assentamentos na Cisjordânia. Além disso, há o senso comum de que os ataques do
Hamas não teriam ocorrido se a ocupação de Gaza por Israel tivesse permanecido
após a Intifada.
Entretanto, com a ocupação de territórios
palestinos, no espaço de duas ou três gerações, os árabes serão a maioria da
população do que seria a “Grande Israel”.
Ø Fim de
Netanyahu está próximo, diz conselheiro de Erdogan
O conselheiro-chefe do presidente turco, Recep
Tayyip Erdogan, Akif Cagatay Kilic, declarou nesta quarta-feira (27) que vários
países ocidentais afirmam que o "fim" do primeiro-ministro
israelense, Benjamin Netanyahu, está próximo, citando a suposta
"brutalidade" do Estado judeu, especialmente em suas ações na Faixa
de Gaza.
Em uma entrevista à emissora turca TRT Haber, Kilic
afirmou que "muitos países ocidentais dizem que este é o fim do caminho
para Netanyahu", referindo-se às críticas internacionais em relação às
ações israelenses na região.
As tensões entre Erdogan e Netanyahu aumentaram
ainda mais quando, na manhã de quarta-feira, o presidente turco comparou mais
uma vez o primeiro-ministro israelense ao líder alemão nazista Adolf Hitler.
Em resposta, Netanyahu acusou Erdogan de genocídio
contra os curdos e detenção de jornalistas que se opõem ao seu regime,
afirmando que Erdogan é a última pessoa capaz de pregar a moralidade.
O chefe do departamento de comunicações da
administração presidencial turca, Fahrettin Altun, endossou as críticas,
afirmando que ele é "a última pessoa a falar sobre genocídio" e que a
história irá julgá-lo como criminoso de guerra.
Altun também alegou que Netanyahu busca expulsar os
palestinos de suas terras há décadas, intensificando a retórica contra o líder
israelense.
A disputa verbal entre Erdogan e Netanyahu não é
novidade, com o presidente turco acusando repetidamente o líder israelense de
conduzir um genocídio na Faixa de Gaza para prolongar sua carreira política e
evitar processos judiciais em Israel.
A situação na região continua delicada, com o
presidente turco pedindo à comunidade internacional que se una em torno dos
esforços para alcançar um cessar-fogo imediato e negociações para uma paz
duradoura
Erdogan também reiterou o apoio ao movimento
palestino Hamas, recusando-se a reconhecê-lo como uma organização terrorista,
em contraste com a posição de Israel.
O início do conflito entre o Estado judaico e a
Palestina se intensificou em outubro, com morte de 1,2 mil israelenses por
ataque do Hamas. Desde então, o cerco aos insumos se intensificou e mais de 20
mil palestinos foram mortos pelas Forças de Defesa de Israel (FDI).
Fonte: Por Suleiman A. Mourad, em Opera
Mundi/Correio Braziliense/Sputnik Brasil
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