Plínio Teodoro: PC Siqueira e Jéssica Vitória não se mataram. Eles foram
assassinados
As recentes mortes trágicas de Jéssica Vitória Canedo e de Paulo Cezar Goulart Siqueira, o PC Siqueira, revelam a face perversa de um momento histórico
em que as interações sociais se intensificaram por meio das redes, ao mesmo
tempo em que as pessoas se distanciaram e vivenciam uma cruel solidão no
mundo físico.
Em meio ao universo dos likes e emojis, a cultura e
do ódio nas redes sociais promove um verdadeiro tribunal de exceção onde impera
a Lei de Talião, que apura, julga e condena à pena do "cancelamento",
sem dar direito ao contraditório, indivíduos que, muitas vezes, vivem em
sofrimento psíquico.
Em um distante 1897, o sociólogo, antropólogo,
cientista político, psicólogo social e filósofo francês Émile Durkheim foi o
primeiro pesquisador a definir "O Suicídio" - que dá nome a
seu livro - como uma questão social.
Em seu longo e profundo estudo, focado na análise
das causas das taxas de suicídios de católicos e protestantes à época, Durkheim
afirma que "é a opinião pública que fala por nossa boca" e que
"agimos sob a pressão da coletividade, não como indivíduos".
"Existe, portanto, para cada povo, uma força
coletiva, de energia determinada, que leva os homens a se matar. Os movimentos
que o paciente realiza e que, à primeira vista, parecem exprimir apenas seu
temperamento pessoal são na verdade a consequência e o prolongamento de um
estado social que eles manifestam exteriormente", afirmou.
Durkheim ainda diz que as "paixões
coletivas" atuam como forças sui generis que dominam as
consciências dos indivíduos.
Ele, então, em uma espécie de
premonição, chega a citar como exemplo "um grande perigo público
que determine um aumento do sentimento patriótico" teria como resultado um
ímpeto coletivo em que os "os interesses particulares, mesmo os comumente
considerados os mais respeitáveis, devem se anular completamente diante do
interesse comum".
·
Ecos na modernidade
O triste cenário traçado por Durkheim há exatos 126
anos, infelizmente, encontra eco na barbárie moderna das redes sociais e,
mais precisamente, nos suicídios levados a cabo por Jéssica Vitória e PC
Siqueira, vítimas implacáveis da pena de morte imposta pelo cancelamento e o
discurso de ódio nas redes sociais.
Esse tribunal virtual coloca em julgamento milhares
de pessoas que frequentam o universo das redes todos os dias, mas afeta
principalmente aqueles mais fragilizados psíquica e emocionalmente, como foram
os casos de Jéssica e PC.
A influência das redes sociais em casos de
suicídios são refletidos nos números que registram aumento exponencial no
número de pessoas que tiram a própria vida a cada ano.
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública,
compilado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o número de suicídios no
Brasil cresceu 11,8% em 2022 em relação ao ano anterior.
Em 2022, foram 16.262 registros, uma média de 44
por dia. Em 2021, foram 14.475 suicídios. Em termos proporcionais, o Brasil
teve 8 suicídios por 100 mil habitantes em 2022, contra 7,2 em 2021. Em 2010, a
média nacional era de 5,24, revelando o aumento alarmante no número de pessoas
que tiram a própria vida.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS),
o suicídio é a segunda causa de morte entre jovens entre 15 e 29 anos no mundo,
só perdendo para acidentes de trânsito. No Brasil, é a terceira causa, atrás
apenas de acidentes de trânsito e homicídios. Estudo do Ministério da Saúde
aponta que os adolescentes foram os que mais morreram por suicídio no país,
passando de 606 mortes em 2010 para 1.022 em 2019, uma elevação de 81% no
período.
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) ainda
alerta para casos que acontecem mais cedo: cerca de mil crianças e
adolescentes, na faixa etária entre 10 e 19 anos de idade, cometem suicídio no
Brasil a cada ano.
Outro dado que reflete o tamanho do problema social
vem do Centro de Valorização da Vida, o CVV, que somente no primeiro semestre
de 2023 atendeu a uma média de 7,5 mil ligações por dia de brasileiros que
buscam apoio emocional e prevenção do suicídio, quase sempre em estados
depressivos não diagnosticados.
·
A tríade da "tristeza"
Confundida muitas vezes com a tristeza - um
sentimento momentâneo - o quadro depressivo resulta muitas vezes em um
sentimento de aversão à vida, que leva a pessoa a pensar em suicídio.
Mais de um século depois dos estudos de Durkheim
mostrando os fatores sociais que levam ao suicídio, muitos ainda tendem a
classificar a depressão como algo inerente ao indivíduo, ignorando ou
minimizando a amplitude da questão que é reflexo da própria sociedade
doentia em que vivemos.
Nos últimos anos, três fatores contribuíram para o
aumento drástico dos casos de suicídio, vindos da cultura de ódio das redes
sociais.
A opressão imposta pelo regime de trabalho
incessante do capitalismo moderno leva pais a ficarem cada vez mais distantes
dos filhos, especialmente no início da vida.
A necessidade de o casal trabalhar para suprir as
necessidades básicas da família e a retirada crescente de direitos trabalhistas
levam mães deixarem filhos recém-nascidos aos cuidados de terceiros ainda
durante a exterogestação, período em que o bebê ainda se encontra em simbiose
física e emocional com àquela que lhe deu a vida.
Em um segundo momento, a responsabilidade pelo
desenvolvimento emocional dessas crianças é delegado às telas, sejam de
televisores ou telefones celulares.
É aí que um segundo fator altera a relação direta
da criança com sua autoestima - fator essencial para o amor próprio e pela
vida. As redes sociais transformam o afeto materno e paterno em likes e as
diretrizes de convivência, de responsabilidade dos pais, são substituídas pelo
ódio e o cancelamento nas redes.
O bulying, não menos grave mas antes restritos aos
ambientes físicos, se transforma em cyberbulying, em uma perseguição
implacável, 24 horas por dia, nas redes sociais.
A esses dois elementos, soma-se ainda, nos últimos
anos, a reascensão da ultradireita conservadora neofacista que destila todos os
tipos de preconceitos contra quaisquer indivíduos que se contraponham à
tentativa de imposição das crenças e valores "judaico-cristãos" defendidos
ferrenhamente por eles.
Vinculadas à uma visão deturpada do cristianismo,
amparada por pastores midiáticos e padres ultraconservadores, agem como
esteio dos interesses do sistema financeiro e dos grandes conglomerados
transnacionais que buscam impor o que ainda resta das premissas criminosas do
neoliberalismo - pinçando projetos de ditadores aos quatro cantos da terra
plana onde vivem.
De forma higienista, o neofascismo conservador
julga e pune quaisquer indivíduos que se oponham à sua visão dualista de mundo
e que condena pobres, pretos, gays, pessoas de crenças religiosas diversas,
ateus e tantos outros que, somados, representam a maioria da sociedade.
Estes três pilares comprovam que, como Durkheim
definiu, o suicídio é, sim, uma questão social. E é preciso rever a própria
estrutura de sociedade em que vivemos para que os seres humanos, cada dia mais
cedo, deixem de tirar a própria vida.
Jéssica Vitória e PC Siqueira não se mataram. Eles
foram assassinados por uma estrutura social doentia. E que precisa ser curada
antes que leve a cabo ao suicídio da própria humanidade.
Ø SANTA
CATARINA: Diretor de jornal que vendeu matérias elogiosas a Júlia Zanatta foi
condenado por tráfico
Criticada pela omissão em meio à tragédia das
enchentes de Santa Catarina, que deixou ao menos 3 mortos e 5 mil desabrigados no mês de novembro,
a deputada Júlia Zanatta (PL-SC), armamentista e apoiadora radical
de Jair Bolsonaro (PL), comprou no último mês de outubro por R$ 5 mil uma matéria elogiosa – e
mentirosa - no jornal Razão, de Tijucas(SC), no Vale do Rio Tijucas, uma das
regiões mais atingidas pelas cheias. Mas um detalhe escapou dos olhos dos
meios de comunicação: um dos dos donos do jornal já foi condenado duas
vezes, por tráfico de drogas e porte de armas, e chegou a ficar foragido da
Justiça.
Lorran François Silva Barentin, diretor do Jornal
Razão, cumpre as penas em regime semiaberto, com uso de tornozeleira
eletrônica. São dois processos que o envolvem, com as seguintes
numerações: 5004984-13.2019.8.24.0072 e 0000644-48.2018.8.24.0072.
O primeiro refere-se a caso ocorrido em 21 de
novembro de 2019, com uma condenação definitiva a pena de 1 ano, 8 meses e 15
dias de reclusão, em regime semiaberto. No segundo processo o crime foi
cometido em 28 de fevereiro de 2018, com condenação definitiva de 7 anos e 10
meses de reclusão, também em regime semiaberto.
Segundo consta na Receita Federal, o jornal Razão é
de propriedade de Araci Barentin, mãe de Lorran. A reportagem entrou em contato
com o jornal Razão e pediu o posicionamento do veículo em relação aos fatos
noticiados. Atualizaremos a matéria assim que recebermos uma resposta.
·
A fake news
A divulgação ocorreu em "reportagem" no
dia 11 de novembro com o título "Deputada Júlia Zanatta traz alívio
para empresários do Alto Vale". A foto é uma montagem da deputada
sobrevoando as áreas atingidas.
No entanto, a própria notícia diz que "a
Receita Federal anunciou a prorrogação do prazo de pagamento do Simples
Nacional para empreendedores de quatro cidades do Alto Vale do Itajaí, em Santa
Catarina". Ou seja, foi uma ação do governo Lula, a quem a Receita Federal
se submete.
À época, Julia Zanatta estava envolta à uma viagem
para os Estados Unidos. A parlamentar viajou para Nova York com uma comitiva
bolsonarista aproveitando para emendar o "recesso" no Congresso com o
feriado de 15 de novembro, que caiu numa quarta-feira.
A informação foi revelada pela jornalista Amanda
Miranda em publicação na rede X, antigo Twitter.
·
Método Ricardo Nunes
A estratégia da deputada é semelhante a que o
prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, realiza com grandes jornais, como Folha, Estadão e O Globo. Nunes tem apoio de Bolsonaro para se candidatar à reeleição no ano que
vem.
Entre outubro do ano passado e o mesmo mês de 2023,
Nunes gastou R$ 81.687.915,96 em contratos publicitários intermediados pelas
agências Mworks e Propeg, as mesmas empresas que fazem a intermediação de
sua gestão om a Folha, o Estadão, o jornal O Globo, rádios comerciais e jornais
de bairro para a divulgação de conteúdos propagandísticos.
Conforme já foi revelado por reportagens
da Revista Fórum e do The Intercept Brasil, o material
publicado nessa imensidão e diversidade de meios de comunicação se trata de
conteúdos positivos e elogiosos à atual gestão municipal paulistana, maquiados
como jornalismo e informações supostamente de utilidade pública - Leia
reportagem exclusiva da Fórum sobre o tema.
Ø Renato
Cariani: amigo de influenciador é indiciado por associação ao tráfico de drogas
A Polícia Federal indiciou Fábio Spínola por
associação por tráfico de drogas, tráfico equiparado e lavagem de dinheiro.
Amigo do influenciador Renato Cariani, ele seria o elo entre o bolsonarista e o
Primeiro Comanda da Capital (PCC).
Segundo as investigações, Spínola seria cúmplice de
Cariani e operaria um esquema para tentar ludibriar os órgãos de fiscalização
sobre o desvio de toneladas de solventes como o acetato de etila, acetona, éter
etílico, cloridrato de lidocaína, manitol e fenacetina, todos usados para
produzir cocaína e crack.
Além da ligação com a facção criminosa, Spínola
criou o pseudônimo de Augusto Guerra para lavar dinheiro com notas fiscais
sobre fictícias vendas ao laboratório transnacional AstraZeneca.
Em depoimento no ano passado, no primeiro inquérito
aberto em 2016, Cariani mostrou uma troca de e-mail com Augusto Guerra, que
segundo ele seria representante da AstraZeneca, e disse que chegou a se
encontrar com ele. A Polícia Civil e o Ministério Pública de São Paulo
acreditam na versão do influenciador e arquivaram a investigação.
No entanto, a PF descobriu na atual investigação
que Guerra, na verdade, é Fábio Spinola, amigo de Cariani, que faria a ligação
com o PCC. Spinola chegou a ser preso em maio deste ano na Operação DownFall,
sobre organização criminosa que usava mergulhadores para colocar droga no casco
de navios.
Ele foi solto uma semana antes da operação da PF,
que o encontrou ainda de tornozeleira eletrônica e com R$ 100 mil em dinheiro
em sua casa.
Segundo a PF, o montante de produtos químicos
desviados seriam usados para produzir toneladas de cocaína e crack.
Cerca de 2 mil litros de três tipos de solventes
poderiam ser usados para produzir 1.640 quilos de cocaína. Substâncias em pó
usadas para adulterar a droga poderiam resultar em 15,8 toneladas.
A PF ainda relaciona o desvio de 4.875 quilos de
fenacetina, que resultaria na produção de 12,2 toneladas de crack.
Fonte: Fórum
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