quinta-feira, 30 de março de 2023

Tunísia: perfil do país que deu o pontapé inicial da Primavera Árabe

Localizada no norte da África, no caminho de rotas vitais para a navegação no Mediterrâneo, a Tunísia é historicamente um ator importante no comércio mundial. A antiga cidade de Cartago, às beiras do lago Tunis, foi um dos centros de comércio mais importantes da Antiguidade.

Essa localização estratégica, por outro lado, despertou a cobiça de romanos, árabes, turcos otomanos e franceses, que tentaram estabelecer o seu controle sobre a região.

O domínio colonial francês terminou em 1956. Por três décadas, o país foi governado por Habib Bourguiba, inicialmente como primeiro-ministro e depois presidente tunisiano. Ele promoveu ideias seculares, das quais a mais importante foi a emancipação das mulheres.

Para padrões árabes, a Tunísia é um país liberal em relação à participação feminina na sociedade. A economia é mais próspera que a dos vizinhos. A maior parte da mão-de-obra é empregada na e no turismo. Mesmo assim, o país não conseguiu superar desafios históricos como a pobreza e subdesenvolvimento. Tampouco conseguiu resolver as tensões políticas opondo o secularismo e islamismo.

No fim de 2010, manifestantes saíram às ruas em massa pedindo a renúncia do presidente Zine al-Abidine Ben Ali, em protesto contra a situação econômica, a repressão política e a corrupção. Ben Ali deixou o cargo em 2011 e se tornou o primeiro líder a cair sob a onda de protestos conhecida como a Primavera Árabe, que abalou países no Oriente Médio e Norte da África.

A onda de protestos teve início exatamente na Tunísia após a autoimolação do verdureiro Mohamed Bouazizi resolveu atear fogo em seu próprio corpo depois de tentar reaver seus produtos que tinham sido confiscados por autoridades. Ele se sentiu humilhado pela ação de policiais que não só mantiveram o confisco como também agrediram Bouazizi.

A atitude extrema do verdureiro comoveu a população que reagiu em sua defesa amplificando os protestos e forçando a renúncia do governo. A onda de manifestações se alastrou pela região deflagrando o que ficou conhecido como Primavera Árabe causando a derrubada de diversos governos autoritários.

Apesar de uma transição pacífica, as tensões entre grupos islâmicos e seculares não desapareceram. Em março de 2015, militantes de um grupo afiliado ao autoproclamado Estado Islâmico invadiram o Museu Nacional Bardo, em Tunis, matando 21 pessoas - a maioria, turistas estrangeiros. Em junho, um militante islâmico realizou um tiroteio em massa no resort turístico de Port El Kantaoui, próximo à cidade de Sousse, matando 39 pessoas.

FATOS

<< República da Tunísia

Capital: Tunis

•        População11,5 milhões

•        Área164 mil quilômetros quadrados

•        Principal línguaÁrabe (oficial), francês

•        Principal religiãoIslamismo

•        Expectativa de vida(2020): 77 anos (79 para mulheres e 75 para homens)

•        MoedaDinar tunisiano

Fonte: ONU, Banco Mundial

LÍDERES

<< Presidente: Kais Saied

O professor de direito aposentado Kais Saied foi eleito em outubro de 2019 com uma grande vantagem sobre o magnata da mídia Nabil Karoui.

Eleito aos 61 anos, ele fez uma campanha voltada para os jovens, apelando para o tema da corrupção.

Seu predecessor, Beji Caid Essebsi, foi o primeiro presidente da Tunísia a ser escolhido em eleições consideradas livres, em 2014, e morreu no cargo aos 92 anos cinco anos depois.

Saied é conhecido por posições conservadoras em temas como homossexualidade, direitos da mulher e pena de morte - punição suspensa no país desde 1994.

Em julho de 2021, Saied demitiu o primeiro-ministro, suspendeu o Parlamento e assumiu poderes de emergência em resposta a protestos contra o governo.

Uma nova proposta de constituição que aumenta os poderes do presidente e reduz os do parlamento, proposta por Saied, foi aprovada em referendo em junho de 2022.

Pelas circunstâncias, os críticos qualificaram a medida como um golpe.

<< Primeira-Ministra: Najla Bouden

Najla Bouden Romdhane tomou posse em outubro de 2021 como a primeira mulher a ocupar o cargo de primeira-ministra não apenas na Túnisia, mas em todo o mundo árabe.

Ela é geóloga com doutorado na escola Mines Tech - PSL, em Paris, e professora universitária. Seu pai também foi professor universitário e seus irmãos e irmãs são todos cientistas.

Ao longo de sua breve carreira política, Bouden ocupou cargos no Ministério do Ensino Superior e Investigação Científica do país.

Em 2016, ela foi responsável por gerenciar um programa do Banco Mundial para reformar e modernizar o ensino universitário no país.

MÍDIA

Desde os protestos que culminaram na sua versão da Primavera Árabe - conhecida localmente como a Revolução de Jasmim - a mídia tunisiana goza de maior liberdade.

As redes sociais desempenharam um papel fundamental na revolta. Além de prover um meio para a articulação de grupos de oposição, também permitiram uma maior comunicação com o mundo externo, através do compartilhamento imediato de informações sobre os eventos em tempo real.

RELAÇÕES COM O BRASIL

O Brasil foi um dos primeiros países a reconhecer a independência da Tunísia, em 1956. A Embaixada permanente foi aberta em 1961. Uma série de visitas de alto nível ocorreram a partir do início dos anos 2000, quando a diplomacia brasileira diversificava suas relações e incrementava os contatos com países da África, incluindo a região ao norte do Saara (Magreb).

Por iniciativa de Luiz Inácio Lula da Silva, os países da América do Sul e do mundo árabe passaram a ter um mecanismo de cooperação e articulação política. Dilma Rousseff e o então presidente tunisiano, Moncef Marzouki, se reuniram às margens da Cúpula América do Sul-Países Árabes realizada em Lima em janeiro de 2012.

Brasil e Tunísia mantêm uma agenda de cooperação bilateral diversificada, que abrange áreas como o desenvolvimento social, segurança alimentar, educação, meio ambiente e recursos florestais. Está em curso um programa de cooperação técnica com o objetivo de desenvolver e melhorar o valor das plantações de eucalipto na Tunísia.

LINHA DO TEMPO

Datas importantes na história da Tunísia:

Cerca de 1100 a.C. - Fenícios colonizam a costa norte-africana. A cidade de Cartago, às margens do lago Tunis, torna-se uma potência naval.

146 AC - Romanos destroem Cartago.

600s - Árabes conquistam o território que compreende a Tunísia atual.

909 - Tribos berberes conquistam a região.

1600s - A Tunísia se torna parte do império otomano turco, porém consegue manter um alto grau de autonomia.

1881 - Tropas francesas ocupam Tunis. Em 1883, a Tunísia vira um protetorado francês, com o governo em Paris controlando seus assuntos econômicos e estrangeiros.

1956 - Independência. Habib Bourguiba vira primeiro-ministro, a monarquia é abolida e a Tunísia se torna uma república no ano seguinte.

1987 - Primeiro-ministro Zine El Abidine Ben Ali orquestra a queda de Bourguiba, que é declarado mentalmente incapaz de governar. Ben Ali toma o poder.

2011 - "Revolução de Jasmin". Ben Ali deixa o país após uma onda de protestos contra a pobreza, corrupção e repressão política. É a primeira mudança de governo da chamada "Primavera Árabe".

2014 - Parlamento aprova uma nova constituição após a queda de Ben Ali, três anos antes.

2015 - Ataque ao Museu Nacional Bardo em por um militante islâmico deixa 21 mortos em março.

2015 - Tiroteiro em massa no resort turístico de Port El Kantaoui, próximo à cidade de Sousse, deixa 39 mortos. Governo anuncia o fechamento de algumas mesquitas por radicalismo.

2019 - Professor de direito aposentado Kais Saied vence as eleições presidenciais com uma plataforma anti-corrupção.

2021 - Saied demite o primeiro-ministro Hichem Mechichi, suspende parlamento e assume poderes de emergência em resposta a protestos contra o governo.

2022 - Uma nova proposta de constituição que aumenta os poderes do presidente e reduz os do parlamento, proposta por Saied, é aprovada em referendo em junho. Críticos qualificam a medida como tentativa de golpe.

 

Fonte: BBC News Mundo

 

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