Historiadores
explicam disputa de narrativas sobre ditadura militar
Passados
59 anos do golpe e da ditadura militar, ainda está presente na sociedade a
chamada disputa de narrativas em torno do período.
Uma
das questões é qual a real data do golpe: se o dia 31 de março ou 1º de abril.
Para o professor de história da Universidade Federal Fluminense (UFF), Daniel
Aarão Reis, essa é uma polêmica menor. Segundo ele, o início do golpe foi de
fato no dia 31 de março.
"Na
madrugada do dia 31, o general Mourão Filho dá início ao golpe armado pela
deposição do João Goulart, e as esquerdas, ironicamente derrotadas, passaram a
caracterizar o golpe como tendo sido vitorioso no dia 1º de abril. Como a gente
sabe, o 1º de abril é o dia da mentira", argumenta.
Outra
disputa presente até hoje é em relação ao termo golpe ou revolução. Daniel Reis
reitera que foi um golpe a deposição de João Goulart em 1964, apesar de ter
havido apoio de parcelas da sociedade civil a essa deposição, e que partidários
do golpe renomearam o movimento como revolução por ela estar associada a coisas
positivas na época.
"Golpe
é todo aquele movimento que pela violência depõe um presidente da República.
Ora, isso é objetivo. No Brasil, João Goulart (Jango) foi deposto por um
movimento violento, que não provocou derramamento de sangue notável porque o
presidente e as demais lideranças de esquerda resolveram se render sem luta”,
explica.
Indo
mais profundamente sobre a denominação do período, o professor também explicou
porque o período da ditadura civil militar não pode ser considerado um período
revolucionário.
“Essas
modificações pela raiz, essas transformações designam o processo como
revolucionário ou não. Houve revolução na Rússia, em Cuba, houve revolução
francesa, americana... Porque ali houve transformações das políticas econômicas
e culturais. Isso não houve no Brasil, embora o Brasil tivesse passado por um processo
intenso de modernização. Foi uma modernização conservadora e autoritária”,
opina.
• Sociedade dividida
As
pesquisas de opinião feitas à época pelo Ibope nas grandes cidades mostravam
uma sociedade dividida. Se antes do golpe 42% consideravam bom e ótimo o
governo de João Goulart e 30% regular, após a ação dos militares, pesquisa do
Ibope em maio de 1964 revelou que 54% dos entrevistados aprovaram a deposição
de Jango.
O
motivo da população ter mudado de apoio a Jango para apoio ao golpe pode ter sido
o forte sentimento de anticomunismo associado a João Goulart e que foi
incentivado pela grande mídia e por adversários políticos. Nas pesquisas do
Ibope, o comunismo era visto como ameaça por mais de 65% dos entrevistados. Mas
o professor de história da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Rodrigo
Patto Sá Motta, reitera o equívoco que era associar João Goulart ao comunismo
ou socialismo.
“Muitas
pessoas acreditaram que o Brasil estava em vias de se tornar um país comunista,
o que estava muito longe de ser verdade. O presidente João Goulart não era um
socialista, nem muito menos um comunista. Ele era um político trabalhista a
favor de algumas reformas sociais, de salários melhores para os trabalhadores.
Mas não era socialista, até porque ele era uma pessoa muito rica, um dos
maiores fazendeiros do Brasil. Mas ainda assim, então, houve toda essa agitação
em torno da ideia de que o Brasil corria um risco sério de se tornar uma nova
Cuba na América Latina”, diz Daniel Reis.
E
para quem quiser entender mais as discussões em torno do período, o historiador
Rodrigo Patto publicou, em 2021, um livro que estuda mais a fundo todas as
questões, chamado de Passados Presentes, o golpe de 1964 e a ditadura militar.
1º de abril de 1964. Por Alberto
Cantalice
O
Golpe de 1964, desencadeado pelas forças armadas e por políticos conservadores,
por obra do acaso, ocorreu no Dia da Mentira. Parecia de início para alguns que
seria uma farsa passageira. Ledo engano, durou 21 anos. Erguendo o “espantalho”
da ameaça comunista as vivandeiras de quartéis naquele período sombrio, também
encasteladas nas principais redações de jornais, rádios e TVs, bradavam aos
quatro ventos que era preciso pôr abaixo o governo legítimo de João Goulart.
A
tragédia que se seguiu com cassações, aposentadorias compulsórias, prisões,
exílios e mortes já está por demais escrita e documentada. Como rescaldo
tenebroso do processo, restam a aparição dos corpos de dezenas de ativistas que
sequestrados e mortos pelo porão, não tiveram suas famílias a devida
elucidação.
O
golpe, que começou com a participação do conservadorismo brasileiro e da
quinta-coluna subordinada aos interesses estrangeiros, transmudou-se em
ditadura eminentemente militar com a edição do famigerado Ato Institucional Nº
5. Nada mais do que o golpe dentro do golpe, em 13 de dezembro de1968.
Vindo
de um círculo virtuoso no governo JK e da consagração de um plebiscito cujo
resultado largamente majoritário dava ao governo João Goulart o apoio popular
para as chamadas Reformas de Base, a interrupção do governo em 1964 legou ao
país o atraso institucional, econômico e financeiro que até o presente não se
conseguiu superar.
O
retorno dos golpistas à frente dos quartéis, quase 60 anos depois, é o reflexo
mais cristalino do caráter autoritário e anti-povo produzido pelo golpe militar
de triste memória.
A reconstrução do tecido social brasileiro pós
golpe midiático-parlamentar de 2016 e da experiência trágica que foi o governo
de ocupação do capitão Jair Bolsonaro exigirá das forças democráticas e
progressistas um radical compromisso com a democracia.
Só a plena democratização da sociedade
permitirá que os setores populares se organizem e exijam os direitos básicos de
cidadania. A dolorosa experiência do autoritarismo deve sempre servir de
espelho para que não se esqueça.
Ditadura
Nunca Mais!
Eventos no 31 de março. Comandantes
militares se calam enquanto clubes e associações organizam eventos
comemorativos
As
redes sociais dos militares das forças armadas e de civis militaristas andam
bastante agitadas depois que anunciou-se que o ex-presidente Jair Bolsonaro
voltaria para o Brasil nos próximos dias. Após algumas postagens em sites
ligados aos militares, especula-se que o líder da direita pode comparecer ao
Clube Militar do Rio de Janeiro para o evento que celebra o 31 de março.
Dentro
das Forças Armadas já foi batido o martelo e não haverá nenhum tipo de ordem do
dia ou comemorações relacionadas à revolução de 1964. O comandante do Exército,
assim como o da Marinha e da Aeronáutica, não devem emitir qualquer comentário
exaltando a data.
O
Clube Militar do Rio de Janeiro é uma associação recreativa formada por
militares da reserva, militares da ativa e civis que se associam a convite dos
mesmos. Muitos militares de baixas graduações e até alguns oficiais que foram
praças consideram o clube uma associação elitista, na medida em que não permite
que suboficiais, subtenentes e sargentos, ainda que sejam militares de
carreira, sejam admitidos como sócios.
O
Clube Naval do Rio de Janeiro também está divulgando entre seus associados o
convite para o evento que vai acontecer no Clube Militar.
Outras
instituições, como a ACAPE -Associação de Componentes Ex-Componentes e Amigos
da Polícia do Exército, também vão realizar eventos na data, não
necessariamente especificados como em alusão ao 31 de março. A associação
informa que No dia 31 de março de 2023, a Cia de comando da 1ª Divisão do
Exército vai realizar uma formatura em homenagem aos veteranos da 1ª Cia PE,
integrantes da ACAPE.
Segundo
veiculado pelo site montedo.com, a associação de oficiais da reserva também vai
realizar um evento no 31 de março.
Há 55 anos, o assassinato de Edson Luis
mobilizava o país contra a Ditadura Militar Fascista
No
dia 28 de março de 1968, o estudante secundarista Edson Luís foi brutalmente
assassinado pela polícia da Ditadura Militar Fascista. O jovem de 18 anos
morreu durante uma manifestação enquanto reivindicava melhores condições para o
restantaurante Calabouço, que funcionava enquanto um bandejão para os
estudantes se alimentarem.
Edson
Luís nasceu em Belém, no Pará, no dia 24 de fevereiro de 1950. Filho de uma
família paraense, estudou na escola estadual Augusto Meira. Devido à falta de
opções de ensino na sua região, mudou-se para o Rio de Janeiro para cursar o
ensino médio no Instituto Cooperativo de Ensino.
O
Calabouço foi fundado em 1951 na sede histórica da UNE, no bairro do Flamengo.
Após um ano de aberto, foi transferido para as proximidades do aeroporto Santos
Dumont, no centro do Rio.
Durante
o ascenso de manifestações da década de 60, o Calabouço tornou-se palco de
inúmeros embates estudantis relacionados à defesa da educação. Nele, estudantes
travaram lutas contra o aumento do preço dos alimentos dos restaurantes
estudantis. Após o golpe de 1964 lutaram contra o regime militar e as torturas,
censuras e perseguições praticadas pelos covardes fascistas.
• “Atira, já mandei atirar!”
Quando
Edson Luis foi assassinato, o jovem tinha somente 18 anos. Ele era um dos 300
estudantes que jantavam no local. Carlos Alberto da Silva, testemunha que
estava em uma banca de jornal próxima, afirmou que viu os policiais se
dirigindo para o Calabouço e que ouviu a seguinte frase dos agentes: “Atira, já
mandei atirar!”.
Os
estudantes conseguiram resgatar o corpo de Edson Luís e o carregaram em
passeata pelo centro do Rio até as escadarias da Assembleia Legislativa, na
Cinelândia, onde seu corpo foi velado. O corpo de Edson Luís foi estendido no
saguão do Assembleia, realizando uma denúncia contra os crimes violentos
praticados pelos militares da Ditadura.
No
mesmo dia, houve manifestações de protesto contra a ditadura e greve geral de
estudantes em todo o país. Edson foi enterrado aos brados de “Mataram um
estudante. Podia ser seu filho!”. “Bala mata fome?”, “Os velhos no poder, os
jovens no caixão”.
• Centenas de jovens foram assassinados
durante a Ditadura
Após
55 anos, o dia 28 de março é lembrado e celebrado como o Dia Nacional de Luta
dos Estudantes. O regime dos militares perseguiu, assassinou e torturou grande
parte dos jovens que se rebelaram contra o sistema. Dessa forma, o dia 28 de
março leva bandeiras como Memória, Verdade e Justiça.
É
preciso honrar o legado de Edson Luís nas lutas contra a Reforma do Ensino
Médio, contra os cortes orçamentários na
educação, pela criação e manutenção de bandejões estudantis, pelo passe livre e
contra o genocídio da juventude e do povo negro.
Em
homenagem a Edson Luís, Milton Nascimento e Ronaldo Bastos compuseram a canção
Menino. A letra diz: “Quem cala sobre teu corpo / Consente na tua morte /
Talhada a ferro e fogo / Nas profundezas do corte / Que a bala riscou no
peito“. Portanto, está mais que na ordem do dia não se calar sobre os crimes
ocorridos nessa época do país. Punição para todos os responsáveis e cúmplices
por este assassinato e pelo regime de terror que foi a Ditadura Militar
Fascista.
Ditadura militar: carcereiro da Casa da
Morte deve responder por tortura e estupro, decide Justiça
Após
recurso do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal reformou decisão
que tinha absolvido o sargento reformado do Exército Antônio Waneir Pinheiro de
Lima, que atuou na chamada Casa da Morte. Conhecido pelo apelido de Camarão, o
sargento já havia se tornado réu por sequestro, cárcere privado e estupro da
militante política Inês Etienne Romeu – única sobrevivente da Casa da Morte,
localizada em Petrópolis (RJ). No entanto, após a defesa do réu, a denúncia foi
rejeitada e ele, absolvido, sob o fundamento de que os fatos apontados como
crime estavam protegidos pela anistia e pela prescrição.
Na
nova decisão, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) reconheceu que a
conduta de Antônio Waneir não estaria abarcada pela Lei da Anistia (Lei
6.683/1979) e determinou que a ação penal contra ele retome seu curso. O
acórdão reforça o entendimento de que o Brasil, por ser signatário da Convenção
Americana de Direitos Humanos, deve seguir a jurisprudência da Corte
Interamericana de Direitos Humanos, que determinou que o país investigue e puna
crimes contra a humanidade praticados pelos agentes estatais, não podendo
considerar-se um obstáculo à investigação ou processo leis internas de anistia
e prescrição, como é o caso dos autos.
Segundo
o MPF, os crimes imputados ao militar foram comprovadamente cometidos contra
Inês Etienne Romeu num contexto de ataque sistemático e generalizado contra a
população civil brasileira: “As torturas, execuções sumárias e
desaparecimentos forçados cometidos por
agentes de Estado no âmbito da repressão política
constituem graves violações a direitos
humanos, para fins de incidência dos pontos
resolutivos 3 e 9 da decisão, os quais excluem
a validade de interpretações jurídicas que assegurem a impunidade de tais
violações”,
afirmou o órgão, mencionando
sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso
Gomes Lund contra Brasil.
• Tortura
Inês
Etienne Romeu foi sequestrada por militares na cidade de São Paulo e levada, em
8 de maio de 1971, para a chamada Casa da Morte, na região serrana do Rio de
Janeiro. O local funcionava como um aparelho clandestino do Centro de
Informações do Exército (CIE), onde militares torturavam presos políticos.
As
investigações comprovaram que Antônio Waneir manteve Inês Etienne contra sua
vontade dentro do centro ilegal de detenção, ameaçando-a de morte e utilizando
recursos que tornaram impossível a defesa da vítima. O réu estuprou a vítima
também durante o encarceramento. Sua condição levou-a a tentar tirar a própria
vida por quatro vezes.
Após
o período na Casa da Morte, Inês Etienne Romeu ainda foi presa em outros
locais. Seu encarceramento somente terminou em agosto de 1979. O MPF ouviu a
vítima em 2013, ocasião em que Inês Etienne Romeu reconheceu, pela primeira
vez, a foto de Antonio Waneir como sendo o “Camarão” da Casa da Morte.
Em
2020, o sargento reformado e outros militares também foram denunciados pelo
sequestro e tortura do advogado e militante político Paulo de Tarso Celestino
da Silva, crimes igualmente cometidos na Casa da Morte.
Ação
Penal – denúncia Inês Etienne Romeu – 0170716-17.2016.4.02.5106
Ação
Penal – denúncia Paulo de Tarso – 5001249-13.2020.4.02.5106
Ação
Civil Pública Paulo de Tarso – 5001770-21.2021.4.02.5106
TCU deve aprovar devassa em sistema de
controle de armas do Exército
O
Tribunal de Contas da União (TCU) fará uma devassa no sistema de controle de
armas e munições do Exército brasileiro. A auditoria deve ser determinada já
nesta quarta (29) pelo plenário da Corte. Ela abrangerá o período entre 2019 e
2022, quando Jair Bolsonaro (PL) governou o país.
Apurações
realizadas pela corte de contas no ano passado apontam indícios graves de
fragilidade na atuação do Exército como fiscalizador de clubes de tiro, lojas
de armas e CACs (caçadores, atiradores e colecionadores).
Segundo
o TCU, há casos encontrados durante a fiscalização que se enquadram em crimes
previstos no Estatuto do Desarmamento. Os documentos, no entanto, não permitem
concluir se as possíveis irregularidades foram encaminhadas à polícia pelos
militares.
O
relatório elaborado por técnicos da corte de contas trouxe, ainda, duras
críticas à falta de colaboração do Exército para atender às demandas da
auditoria.
"As
informações parciais prestadas corroboram o comportamento pouco colaborativo do
órgão em relação às atuações deste tribunal, ao adotar postura reativa e não
diligente no atendimento às demandas das equipes de auditoria, em ações
legitimamente aprovadas pela corte de contas", dizia o relatório.
A
demanda pela auditoria chegou à corte de contas por meio de um requerimento
apresentado pelo deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) e aprovado pela
Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados.
O
parlamentar afirmou haver indícios de descontrole do Exército Brasileiro. Ele
listou, por exemplo, a revogação de portarias que tratavam sobre o rastreamento
e a identificação de armas e munições sob o governo de Jair Bolsonaro —a todas
elas foram dadas diferentes justificativas, o que levantou suspeitas de que as
medidas tinham como objetivo atender a interesses de grupos armamentistas.
Valente
ainda citou a redução de recursos financeiros e humanos destinados à
fiscalização de lojas de produtos controlados, clubes de tiros e de empresas de
segurança privada, a ocorrência de fraudes e a falta de detalhamento das armas
registradas no sistema de controle, entre outros pontos.
"Diante
da relevância do objeto proposto e tendo em vista que as fiscalizações já
realizadas e as em execução não atendem integralmente os pontos trazidos pelo
parlamentar, deve-se realizar a auditoria solicitada", diz um relatório
técnico, em poder dos ministros do TCU.
Fonte:
Agencia Brasil/Revista Sociedade Militar/PGR/A Verdade/FolhaPress
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