Ben Norton: Acordo
de paz entre Irã e Arábia Saudita é um grande golpe contra o petrodólar e a
hegemonia dos EUA
A
China surpreendeu o mundo em 10 de março, ao anunciar que havia patrocinado com
sucesso as conversações de paz entre os rivais Arábia Saudita e Irã.
Quatro
dias de negociações secretas em Pequim levaram a um acordo histórico no qual as
duas nações da Ásia Ocidental normalizaram as suas relações, após sete anos
tensos sem quaisquer laços diplomáticos.
Anteriormente,
o Iraque havia promovido conversações de paz entre a Arábia Saudita e o Irã,
porém estas foram sabotadas em janeiro de 2020, quando o presidente
estadunidense Donald Trump ordenou um ataque de drone para assassinar o alto
oficial iraniano Qasem Soleimani, que estava envolvido nas negociações.
O
avanço diplomático da China faz parte de um processo maior de integração
asiática e constitui um passo na direção de trazer o Irã e a Arábia Saudita
para o sistema BRICS e instituições como a Organização para Cooperação de
Xangai (OCX).
Além
de encorajar a estabilidade e a paz numa região devastada por décadas de
guerras e intervenções dos EUA, este acordo terá enormes repercussões
econômicas em todo o planeta.
Mais
tangivelmente, o acordo é um golpe significativo ao sistema do petrodólar que
os EUA usaram para manter o dólar como reserva monetária global, ameaçando
assim o próprio alicerce da sua hegemonia econômica.
A
Arábia Saudita tem sido por um longo tempo uma das principais produtoras de
petróleo do mundo, dentre as três maiores (juntamente com os EUA e a Rússia). O
Irã tem estado consistentemente entre os 10 maiores produtores de petróleo crú.
Enquanto
a líder de facto da OPEC, a Arábia Saudita exerce uma influência significativa
sobre o preço do petróleo no mercado global. Desde aos anos de 1970, Riad
concordou em vender o seu petróleo cru em dólares, investindo-os depois estes
petrodólares em títulos do Tesouro dos EUA, ajudando assim a fortalecer o valor
do papel verde e aumentando a demanda global pela moeda estadunidense.
Mas
o sistema do petrodólar está enfrentando novos desafios. Em janeiro, o governo
saudita confirmou publicamente que está considerando vender petróleo em outras
moedas.Esta declaração veio apenas algumas semanas após o presidente chinês Xi
Jinping fez uma viagem histórica a Riad. Lá, Pequim assinou acordos com o
Conselho de Cooperação do Golfo (CCG) e a Liga Árabe.
Xi
anunciou que a China estaria comprando petróleo e gás da região do Golfo
Pérsico com a sua própria moeda, o renmimbi, não em dólares.
“A
China continuará a importar grandes quantidades de petróleo cru dos países do
CCG, expandindo as importações de gás liquefeito de petróleo... e fazendo pleno
uso da Bolsa de Petróleo e Gas Natural de Xanghai para realizar a liquidação do
comércio de petróleo e gás em yuan”.A viagem de Xi a Riad foi um retumbante
sucesso, quando comparada com a tentativa de Joe Biden de fazer um “recomeço”
em julho de 2022. A foto do presidente dos EUA recusando-se apertar mãos e, ao
invés disso, de tocar os punhos com o governante saudita de facto, o príncipe
herdeiro Mohammad bin Salman (MBS), foi um símbolo de uma viagem que foi amplamente
criticada como um insucesso diplomático.
Naquele
momento, Biden estava lutando com uma significativa inflação no índice de
preços ao consumidor nos EUA e com as eleições de meio de mandato no horizonte.
O presidente estadunidense pressionou MBS para aumentar a produção de petróleo,
numa tentativa de reduzir preços, mas a Arábia Saudita e a OPEC+ se recusaram a
fazer isso.
O
afastamento gradual de Riad do seu papel histórico, firmemente abrigado no
centro do campo liderado pelos EUA, reflete uma tendência global maior na
direção de um mundo multipolar.
A
Arábia Saudita e outros estados do Golfo Pérsico estão adotando uma política
mais não-alinhada que contrabalança os EUA e a Europa contra a China e a
Rússia.
Isto
também é um resultado da crescente importância econômica da China como a maior
economia do mundo (segundo a medida de paridade do poder de compra, que é mais
precisa que o PIB nominal).
A
China é o maior parceiro comercial tanto da Arábia Saudita quanto do Irã.
Pequim desfruta de relações próximas com as nações da Ásia Ocidental.
No
seu comunicado escrito anunciando o acordo de paz, o Ministro das Relações
Exteriores descreveu a China como um “amigo confiável dos dois países”.O Irã e
a Arábia Saudita se registraram formalmente para entrarem no bloco extensivo do
BRICS+, juntamente com os membros fundadores Brasil, Rússia, Índia, China e
África do Sul.Atualmente, os BRICS estão planejando “desenvolver um sistema
mais justo de câmbio monetário” para enfraquecer a “dominação do dólar”,
revelou em janeiro o Ministro de Relações Exteriores da África do Sul, Naledi
Pandor.Como parte deste processo, os BRISC estão considerando criar uma nova
moeda internacional de reserva, baseada numa cesta de moedas dos seus membros.
Enquanto
os BRICS buscam integrar economicamente o Sul Global, a massiva Iniciativa da
Nova Rota da Seda (Iniciativa do Cinturão e Rota — ICR) da China proverá a
infraestrutura física para fazê-lo. E tanto o Irã quanto a Arábia Saudita
também são partes importantes do ICR.
Complementando
o sistema dos BRICS está a OCX, que congrega a China, a Índia, o Paquistão, a
Rússia e numerosas repúblicas da Ásia Central numa associação massiva que
representa dois-quintos da população global e mais de um-terço do PIB mundial.
O
Irã está no processo de tornar-se um membro titular da OCX. O Secretário-Geral
da organização, Zhang Ming, visitou Teerã em março. Ele se encontrou com o
presidente iraniano Ebrahim Raisi, que “descreveu a OCX como a maior
organização regional internacional do mundo, que desempenha um papel importante
para a manutenção da segurança e estabilidade regional e global”.Em 2021, a
Arábia Saudita se tornou um parceiro oficial de diálogo com a OCX, um passo na
direção de tornar-se um membro titular. Catar e Egito fizeram o mesmo em 2022.
• BRICS+: uma potência global de
commodities
Se
todos estes países podem estar econômica e politicamente integrados, o bloco do
BRICS+ expandido seria a potência de commodities do mundo.
Os
membros-fundadores dos BRICS Rússia, China e Brasil estão entre os 10 maiores
produtores de petróleo do mundo, juntamente com a Arábia Saudita e o Irã.
Se
as nações da Ásia Ocidental entrarem se tornarem membros titulares, os BRICS+
incluirão pelo menos a metade dos 10 maiores produtores de petróleo do mundo,
representando mais de um-terço da produção global de petróleo.
Também
a OPEC se tornará uma parceira natural dos BRICS, dado o papel-chave da Arábia
Saudita na organização, juntamente com a voz influente da Rússia na OPEC+
expandida.
Não
é apenas o petróleo que é central nesta mudança geopolítica. Também o gás e
outras commodities são cruciais.
A
Rússia é o segundo maior produtor de gás natural do mundo. O Irã é o terceiro,
a China, o quarto, e Catar é o quinto.
A
Argélia, que também expressou interesse em tornar-se membro do BRICS+, é um
importante produtor.
O
Catar está amarrado aos EUA como o maior produtor de gás natural liquefeito
(GNL) na Terra. A Argélia está nos 10 maiores.
Esta
aliança é profundamente complementar. A China é o maior consumidor de petróleo
e um dos maiores importadores de gás.
Já
há mais de uma década, a China comprou mais petróleo da Ásia Ocidental do que
os EUA. Pequim importa um-terço dos seus recursos energéticos, especificamente
da região do Golfo Pérsico.
E,
à medida que o planeta transita para libertar-se dos combustíveis fósseis para
tecnologias de energias renováveis, os minerais se tornarão cada vez mais
importantes. Os países curiosos sobre o BRICS também estão muito bem colocados
aqui.
O
Brasil é o segundo maior produtor de minério de ferro, seguido pelos outros
membros do BRICS China, Índia, Rússia e África do Sul em terceiro, quarto,
quinto e sétimo lugares, respectivamente. Potencial membro dos BRICS, o Irã é o
oitavo maior.A China e o Brasil são os maiores produtores de lítio, o “ouro
branco” necessário para baterias. Então, também o é a Argentina, que se
inscreveu para participar dos BRICS+ e participou das reuniões de cúpula do
bloco em 2022.O Irã anunciou em março que também encontrou reservas
significativas de lítio, poderia se torar o segundo maior produtor do mundo.
O
que tudo isso mostra é que, ao estender e incluir países como a Arábia Saudita
e o Irã como novos membros, o BRICS+ poderia se tornar uma potência das
commodities, com significativa influência nos mercados globais.
Nada
disso teria sido possível se a Arábia Saudita e o Irã estivessem em guerra
entre si. Agora eles normalizaram as suas relações, a integração asiática
provavelmente irá adiante a todo vapor.
• O petrodólar encontrou o seu igual?
A
Conferência de Bretton Woods em 1944 estabeleceu o dólar estadunidense como a
moeda global de reserva. Naquela época, o dólar estava vinculado ao ouro, com
um preço de US$ 35 por onça troy, tornando-o tão bom quanto o ouro.
Os
gastos militares dos EUA nas suas guerras na Coreia, no Vietname e outros
lugares fizeram as reservas de ouro de Washington diminuírem. Então, em 1971, o
presidente Richard Nixon acabou unilateralmente com a conversibilidade do dólar
em ouro, transformando o papel verde em uma moeda fiduciária flutuante.
Isto
levou a um período de instabilidade, agravado mais ainda pelo embargo do
petróleo da OPEC em 1973.Em 1974, Nixon enviou o seu Secretário do Tesouro,
William Simon, à Arábia Saudita. A “meta” da viagem, como explicou a agência
Bloomberg, foi de “neutralizar o petróleo cru como uma arma econômica e
encontrar uma maneira de persuadir” a Arábia Saudita a “financiar o crescente
déficit dos EUA com a sua recém-descoberta riqueza em petrodólares”.
Washington
assinou um acordo histórico com Riad, prometendo proteger a monarquia do Golfo
em troca da venda exclusiva do petróleo da Arabia Saudita em dólares,
depositando estes petrodólares em bancos comerciais estadunidenses e investindo
em títulos do Tesouro dos EUA.
Bloomberg
explicou: “O esquema básico era surpreendentemente simples. Os EUA comprariam
petróleo da Arábia Saudita e proveriam o reino com ajuda militar e equipamento.
Em troca disso, os sauditas colocariam bilhões das suas rendas de petrodólares
em títulos do Tesouro e financiariam os gastos dos EUA”.
Este
sistema de petrodólares ajudou a garantir a demanda global pelo dólar
estadunidense, porque os países que importavam petróleo e outras commodities
precisavam de dólares para pagar por estes.
Como
o economista Michael Hudson mostrou no seu livro “Super Imperialism’’, o
inchaço do déficit da conta-corrente dos EUA era quase inteiramente devido aos
gastos militares, porque Washington travava uma guerra após a outra e construiu
uma constelação de bases no estrangeiro no globo inteiro.
Para
a maioria dos países, tal déficit consistente e de longo-prazo levaria a uma
desvalorização da sua moeda nacional e a problemas econômicos relacionados. Mas
não para os EUA, em parte graças ao sistema do petrodólar.
O
status do dólar como moeda global de reserva e a constante demanda de dólares
para a importação de petróleo e outras commodities concedeu aos EUA um
“privilégio exorbitante” que lhes permitiu manter o seu massivo déficit em
conta-corrente (importando significativamente mais do que exportando).
No
entanto, a crise financeira de 2008 inspirou alguns países a pensarem sobre
alternativas. Especificamente, a China flutuou a ideia de destituir o dólar
estadunidense como moeda global de reserva.
O
governador do banco central da China, Zhou Xiaochuan, publicou um livro branco
em 2009, argumentando que “novamente, a crise pede uma reforma criativa do
sistema monetário internacional existente, indo na direção de uma moeda
internacional de reserva com um valor estável, com emissão baseada em regras e
abastecimento gerenciável, de modo a cumprir o objetivo de salvaguardar a
estabilidade econômica e financeira global”.
As
crescentes sanções ocidentais sobre a China e seus aliados, como a Rússia, o
Irã e a Venezuela, apenas incentivaram Pequim mais ainda a buscar novas alternativas
financeiras.
As
instituições dominadas pelos EUA, como o Fundo Monetário Internacional (FMI),
tomaram nota disso. Em 2022, um relatório do FMI advertiu sobre “a erosão da
dominação do dólar”, reconhecendo que as quotas de reservas de câmbio dos bancos
centrais em todo o mundo, mantidas em dólares, haviam encolhido de 70% para 60%
nas duas décadas anteriores.
Esta
não foi uma diminuição massiva, mas faz parte de uma tendência contínua de
acelerar-se, enquanto os EUA travam uma nova guerra fria com a China e a Rússia
Segundo
o Federal Reserve, o dólar estadunidense está envolvido em cerca de 80% do
comércio internacional, mas isto varia muito dependendo da região.
O
uso de outras moedas para o comércio na Ásia está aumentando, à medida que os
países visados pelas sanções ocidentais unilaterais desenvolvem novos
mecanismos para comercializar com as suas moedas nacionais.
Por
mais de uma década a China já está usando o yuan para comprar petróleo do
Irã.Depois que o governo de Donald Trump sabotou unilateralmente o acordo
nuclear com o Irã — o Plano de Ação Conjunto Global (PACG) – em 2018, a agência
Reuters assinalou que as recém-impostas “sanções poderiam fazer avançar os
‘petro-yuan’ da China’”.
A
guerra por procuração da OTAN contra a Rússia na Ucrânia foi uma injeção de
adrenalina no braço da desdolarização. As sanções sem precedentes dos EUA e da
União Europeia (UE) levaram Moscou a desenvolver novos arranjos financeiros com
os seus maiores parceiros comerciais na Ásia.
A
Rússia fez os importadores do seu gás pagarem em rublos, enquanto usa moedas
locais no comércio bilateral com países como a Índia e o Irã.A China também
está conduzindo cada vez mais o comércio bilateral com a Rússia em yuan.
Levou
algum tempo, mas a chamada que o Banco Popular da China fez em 2009 por um novo
sistema monetário internacional agora está entrando em fruição.
E
se Pequim for séria em desafiar a hegemonia do dólar estadunidense, a Arábia
Saudita é um ator-chave que ela precisa ao seu lado.
Antes
do marco do acordo de paz de março, a China estava preocupada de que teria que
escolher entre o Irã ou a Arábia Saudita. Agora, ela pode manter boas relações
com ambos.
• A integração asiática se acelera
A
normalização dos laços entre Teerã e Riad é um desenvolvimento significativo de
uma processo mais amplo de integração asiática. (Isto é frequentemente referido
com ‘Integração Eurasiana”, mas, essencialmente, a Europa expulsou
politicamente a Rússia do continente por causa da guerra por procuração na
Ucrânia, levando Moscou a buscar laços mais próximos com os seus vizinhos
asiáticos).
Na
sua obra de 1997 “The Grand Chessboard: American Primacy and Its Geostrategic
Imperatives”, o estrategista imperial estadunidense Zbigniew Brzezinski
advertiu que “o cenário mais perigoso” para a hegemonia unipolar de Washington
“seria uma grande coalizão da China, da Rússia e talvez do Irã, uma coalizão
‘anti-hegemônica’”.
As
sanções e políticas agressivas dos EUA contra estas três potências as
empurraram a unirem-se exatamente da maneira que Brzezinski temia.
Em
2021, a China e o Irã assinaram um histórico acordo de parceria econômica e
estratégica por 25 anos, estimado em US$ 400 bilhões. Reportando sobre o
acordo, a revista Forbes resumiu: “uma poderosa mudança ameaça a energia
ocidental”.
O
presidente iraniano Ebrahim Raisi fez uma importante viagem à China em
fevereiro de 2023. Esta foi a primeira visita de um presidente iraniano em 20
anos.
Em
um comunicado sobre a reunião, o Ministério de Relações exteriores de Pequim
afirmou: “A China sempre vê e desenvolve relações com o Irã desde uma
perspectiva estratégica, não importando como a situação internacional e
regional mude; a China permanecerá firme no desenvolvimento da cooperação
amistosa com o Irã e avançando a parceria estratégica compreensiva Chine-Irã.
Condenando
os ataques dos EUA contra o Irã, “Xi Jinping enfatizou que a China apoia o Irã
em salvaguardas a sua soberania, independência, integridade territorial e
dignidade nacional, apoia o Irã em resistir ao unilateralismo e o bullying, se
opõe às forças externas que interferem nos assuntos internos do Irã e minam a
sua segurança e estabilidade”.
A
China e a Rússia já são aliados próximos, com uma parceria estratégica
compreensiva que eles dizem “não ter limites”. Mesmo com as sanções ocidentais
sem precedentes impostas à Moscou em 2022 sobre a guerra por procuração na
Ucrânia, a China declarou que a Rússia é o “seu parceiro estratégico mais
importante” e chamou a sua amizade como sendo “sólida como uma rocha”.Ao mesmo
tempo, o Irã e a Rússia estão aprofundando a sua integração, em especial
economicamente. Os dois países estão construindo rotas comerciais para
contornar as sanções ocidentais”.
O
Corredor Internacional de Transporte Norte-Sul (CITN) multibilionário ligará o
porto de Mumbai na Índia ocidental ao porto de Bandar Abbas no sul do Irã,
quando os bens viajarão para o norte em redes férreas, passando através do Mar
Cáspio e chegando até a Rússia.
O
CITN não só eliminará a necessidade de que os produtos transitem através do Mar
Mediterrâneo; ele também reduzirá à metade o tempo médio de trânsito de 40 – 60
dias para apenas 25 – 30 dias, enquanto reduz os custos por aproximadamente
30%.
A
China, a Rússia e o Irã também estão desenvolvendo alternativas ao sistema
interbancário SWIFT, o qual é dominado pelos EUA.
Como
parte da guerra por procuração na Ucrânia em 2022, os EUA e a UE desconectaram
diversos bancos russos do SWIFT — uma decisão escandalosa que foi chamada de
“opção financeira nuclear”Em resposta à isto, em janeiro de 2023, os bancos
centrais do Irã e da Rússia fizeram um acordo para integrar os seus sistemas
interbancos de comunicação e transferências, conectando 52 ramos dos bancos
iranianos que usam o sistema SEPAM do Irã a 106 bancos que usam o Sistema de
Transferência de Mensagens Financeiras da Rússia.
Até
Riad está se aproximadamente a Moscou.
Em
2021, a Arábia Saudita e a Rússia assinaram um acordo de cooperação militar.
Riad também tem comprado equipamentos militares significativos de Moscou.O
embaixador da Rússia na Arábia Saudita disse à mídia estatal Sputnik em 2023
que Riad “mantém um diálogo regular e de confiança no mais alto nível”,
adicionando que as relações dos dois países têm “uma perspectiva real de
alcançar o nível de uma parceria estratégica”.
• A diplomacia da China poderia ajudar a
alcançar a paz e a estabilidade na Ásia Ocidental, após décadas de guerras dos
EUA
Claramente,
apesar do avanço diplomático da China, ninguém espera que a monarquia saudita
se torne uma amiga do Irã e que se una ao Eixo de Resistência
anti-imperialista.
Dito
isto, o equilíbrio de Riad nas relações com Washington e Bruxelas, por um lado,
e Pequim e Moscou do outro, reflete a transição na direção de um mundo
multipolar.
As
monarquias do Golfo Pérsico, que foram por muito tempo cientes leais dos EUA,
têm se movido gradualmente na direção de uma política externa mais
não-alinhada.
Certamente,
existem certas diferenças ideológicas profundas entre a corrente Wahhabi e os
ultraconservadores do Islã Sunita patrocinados pelos estados do Golfo e a
teologia revolucionária de libertação Shia promovida pelo Irã.
Mas
a normalização das relações de Riad com Teerã é um sinal de que a animosidade
do reino com relação à República Islâmica foi muito mais motivada pela pressão
geopolítica dos EUA do que pelas suas discordâncias religiosas.
Washington
tem buscado uma mudança de regime em Teerã desde que a revolução do povo
iraniano em 1979 derrubou o ditador do país apoiado pelo Ocidente. E os EUA há
muito tempo veem a Arábia Saudita como uma aliado-chave, até mesmo um
procurador, necessário para impor a sua “campanha de pressão máxima” contra o
Irã.
Durante
décadas de sanções unilaterais ilegais, constantes operações de
desestabilização e uma implacável guerra de informações e propaganda, os EUA
têm tentado desesperadamente fazer do Irã um estado-pária.
A
China neutralizou eficazmente esta estratégia dos EUA ao intermediar a paz
entre arquirrivais da Ásia Ocidental.
O
ultraje em Israel reflete a crescente tomada de consciência de que o Irã não
foi isolado. O regime de Benjamin Netanyahu está furioso. Tel Aviv vê o acordo
de paz como uma ameaça, porque ele frustra os seus planos de dividir os árabes
e os iranianos, os Sunitas e os Xiitas.
Os
EUA passaram anos tentando formar uma aliança entre Israel e os estados árabes
do Golfo Pérsico contra o Irã. O governo de Donald Trump teve uma vitória em
2020 com a assinatura dos chamados Acordos Abraham, que foram principalmente
simbólicos, mas formalizaram as relações diplomáticas entre os Emirados Árabes
Unidos, Bahrein e Israel.
O
fato de que os EUA e Israel veem as conversações de paz da China entre o Irã e
a Arabia Saudita como uma ameaça demonstra a diferença fundamental entre as
políticas de Pequim e Washington.
A
China quer estabilidade na região, aprofundar a integração econômica e o
comércio. No comunicado de Pequim sobre as negociações, o alto diplomata Wang
Yi salientou o fato que “a melhoria das relações entre a Arábia Saudita e o Irã
pavimentou o caminho para a realização da paz e estabilidade no Oriente Médio”.
Wang
adicionou que “a China apoia os países do Oriente Médio na defensa da autonomia
estratégica, o fortalecimento da solidariedade e da cooperação, livrando-se das
interferências externas e efetivamente manter o futuro do Oriente Médio nas
suas próprias mãos”.
Esta
abordagem não poderia ser mais diferente da política exterior dos EUA com
relação à região, a qual deriva de um impulso obsessivo para desestabilizar e
controlar, para fazer avançar os objetivos geopolíticos da Doutrina Wolfowitz,
para manter “a dominação de espectro total”, de promover mudanças de regime em
“sete países em cinco anos”.Apenas nas duas décadas desde o dia 11 de setembro
de 2001 (ataques às torres-gêmeas de NY), as guerras dos EUA contra o Iraque, o
Afeganistão, a Líbia, a Síria e o Iêmen mataram milhões de pessoas, criaram
dezenas de milhões d refugiados e devastaram países inteiros.
Washington
e os seus aliados atiçaram intencionalmente o sectarismo, fazendo surgir os
grupos extremistas Salafi-jihadistas como o al-Qaeda e o ISIS.
Países
como o Iraque, a Síria e o Líbano, em particular, sofreram pesadamente deste
conflito sectário.
Agora
que a Arábia Saudita e o Irã normalizaram relações, estas
nações-campo-de-batalha são as mais beneficiadas.
Esta
é uma razão-chave pela qual o próprio Irã passou anos tentando intermediar um
acordo. Mas, de novo, o governo dos EUA sabotou intencionalmente a iniciativa
de paz de Bagdá ao assassinar Qasem Soleimani em janeiro de 2020, quando o alto
general iraniano estava negociando com a Arábia Saudita.
Graças
à diplomacia da China, a guerra no Iêmen pode finalmente chegar ao fim, após
nove anos.
A
macabra campanha de bombardeio da Arábia Saudita, patrocinada pelos Estados
Unidos e a Grã-Bretanha, matou centenas de milhares de iemenitas e desencadeou
a maior catástrofe humanitária da Terra.
A
Ásia Ocidental indiscutivelmente será a primeira região a se beneficiar com o
avanço diplomático entre a Arábia Saudita e o Irã. Mas as implicações
geopolíticas e econômicas são verdadeiramente globais.
Dentro
de décadas, os historiadores provavelmente olharão para trás e verão este
acordo como um divisor de águas, refletindo o novo papel da China no palco
global como uma negociadora da paz, simbolizando o fim da hegemonia unipolar
dos EUA e o surgimento de um mundo multipolar.
Fonte:
Geopolitical Economy Report - Traduzido por Rubens Turkienicz para Brasil 247
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