sexta-feira, 31 de março de 2023

O mistério sobre o assassino de Gandhi, mais de 7 décadas depois

Na noite de 30 de janeiro de 1948, Nathuram Vinayak Godse atirou em Mohandas Karamchand Gandhi à queima-roupa, quando o líder mais venerado da Índia saía de uma reunião de oração na capital, Déli.

O fanático de 38 anos era membro do Hindu Mahasabha, um partido de direita, que havia acusado Gandhi de ter traído os hindus por ser a favor demais dos muçulmanos e brando com o Paquistão.

Eles o culparam até pelo derramamento de sangue que marcou a Partição, processo pelo qual a Índia e o Paquistão foram criados após a independência do Reino Unido em 1947.

Um tribunal de primeira instância condenou Godse à morte um ano após o assassinato. Ele foi executado em novembro de 1949, depois que o tribunal superior confirmou a sentença. (Um cúmplice, Narayan Apte, também foi condenado à morte, e outros seis à prisão perpétua).

Antes de entrar para o Hindu Mahasabha, Godse era membro da Rashtriya Swayamsevak Sangh (Organização Nacional de Voluntários) ou RSS, a fonte ideológica do Partido Bharatiya Janata (BJP), à frente do governo da Índia.

O próprio primeiro-ministro, Narendra Modi, é um membro de longa data da "nave-mãe" de 95 anos do nacionalismo hindu. O RSS desempenha um papel profundamente influente em seu governo e fora dele.

Por décadas, o RSS rejeitou Godse, que assassinou o "Pai da Nação", como os indianos adoram chamar seu principal ícone.

No entanto, um grupo de direitistas hindus tem louvado Godse nos últimos anos e celebrado abertamente o assassinato de Gandhi. No ano passado, um parlamentar incendiário do BJP descreveu Godse como um "patriota".

Tudo isso indignou a maioria dos indianos, mas o RSS manteve sua posição: Godse deixou a organização muito antes de matar Gandhi.

Um novo livro agora afirma, no entanto, que isso não é bem verdade.

Godse, um homem tímido que abandonou o ensino médio, trabalhava como alfaiate e vendia frutas antes de entrar para o Mahasabha, onde editava seu jornal. Durante o julgamento, ele levou mais de cinco horas para ler um depoimento de 150 parágrafos perante o tribunal.

Ele disse que "não houve conspiração" para matar Gandhi, tentando assim absolver seus cúmplices de qualquer crime. E negou a acusação de que agiu sob a orientação de seu líder, Vinayak Damodar Savarkar, que deu origem à ideia de Hindutva ou Hinduísmo. (Embora Savarkar tenha sido exonerado de todas as acusações, os críticos acreditam que o direitista radical que detestava Gandhi estava ligado ao assassinato.)

Godse também afirmou ao tribunal que havia rompido com o RSS muito antes de matar Gandhi.

Dhirendra Jha, autor de Gandhi's Assassin ("O Assassino de Gandhi", em tradução literal), escreve que Godse — filho de pai carteiro e mãe dona de casa — era um "trabalhador proeminente" do RSS. E não havia "evidências" de que fora expulso da organização. Um depoimento de Godse registrado antes do julgamento "não menciona sua saída do RSS depois que ele se tornou membro do Hindu Mahasabha".

No entanto, em depoimento perante o tribunal, ele disse que "se juntou ao Hindu Mahasabha depois de deixar o RSS, mas permanece em silêncio sobre quando exatamente fez isso".

"Esta alegação permaneceu sendo um dos aspectos mais debatidos da vida de Godse", diz Jha.

Ele acredita que "escritores pró-RSS" usaram isso para "alavancar silenciosamente a ideia de que Godse já havia rompido com o RSS e se juntado ao Hindu Mahasabha quase uma década antes de matar Gandhi".

O pesquisador americano JA Curran Jr afirmou que Godse entrou para o RSS em 1930 e saiu quatro anos depois, mas não forneceu evidências para sua afirmação.

Jha escreve que, em depoimento dado à polícia antes do início de seu julgamento, Godse admitiu que estava trabalhando para ambas as organizações simultaneamente.

Familiares dele também entraram no debate no passado. Gopal Godse, irmão de Nathuram, que morreu em 2005, disse que seu irmão "não deixou o RSS".

E, em 2015, um sobrinho-neto de Godse contou a um jornalista que o tio avô entrou para o RSS em 1932 e "não foi expulso nem deixou a organização".

Jha, que vasculhou os arquivos, também se debruça sobre as ligações entre as duas organizações hindus.

Ele escreve que o Hindu Mahasabha e o RSS tinham uma "relação fluida e sobreposta" e uma ideologia idêntica.

Os dois grupos, segundo ele, "sempre tiveram conexões próximas e, às vezes, inclusive membros coincidentes" até que Gandhi foi assassinado. (O RSS foi banido por mais de um ano após o assassinato de Gandhi.)

O RSS sempre ecoou o que Godse disse no tribunal — que ele deixou a organização em meados da década de 1930, e que o julgamento provou que não tinha nada a ver com o assassinato.

"Dizer que ele era um membro do RSS é apenas projetar uma mentira com intenções políticas", disse Ram Madhav, um alto líder do RSS.

Golwalkar, um dos líderes mais influentes do RSS, descreveu o assassinato de Gandhi como uma "tragédia de magnitude sem precedentes — ainda mais porque o gênio do mal é um compatriota e hindu".

Mais recentemente, líderes do RSS como MG Vaidya chamaram Godse de "assassino" que "insultou" Hindutva ao matar uma figura tão respeitada da Índia.

Autores como Vikram Sampath acreditam que o RSS e o Hindu Mahasabha tiveram uma relação tempestuosa.

Sampath, autor de uma biografia de dois volumes sobre Savarkar, escreve que a decisão do Hindu Mahasabha de criar um grupo de voluntários semelhante a uma "sociedade secreta revolucionária" para "proteger os interesses dos hindus" havia "azedado" seu relacionamento com o RSS.

Além disso, de acordo com Sampath, o RSS "desistiu de idolatrar indivíduos, diferentemente do líder do Mahasabha, Savarkar, que acreditava no "culto a heróis e adulação exagerada".

Em outro livro, RSS: A View to the Inside(RSS: Uma visão de dentro, em tradução livre), Walter K Andersen e Shridhar D Damle falam sobre como o RSS foi "manchado com o envolvimento de um ex-membro (Nathuram Godse)" no assassinato de Gandhi, e "difamado com o respaldo oficial como fascista, autoritário e obscurantista".

No entanto, as dúvidas de que Godse fazia parte intrinsecamente e jamais deixou o RSS nunca desapareceram.

Antes de Godse ir para a forca, em 15 de novembro de 1949, ele recitou as primeiras quatro frases da oração do RSS.

"Mais uma vez, isso revela o fato de que ele era um membro ativo da organização", diz Jha. "Desassociar o RSS do assassino de Gandhi é uma invenção da história."

 

       Vikings: por que muito do que conhecemos sobre este povo nórdico está errado

 

Altos, loiros, fortes e guerreiros implacáveis da Escandinávia. Graças a algumas sagas e lendas - e aos filmes e à Netflix - foi assim que os vikings se firmaram no imaginário popular.

Mas agora, um novo estudo, a maior análise genética sobre essa cultura até hoje, derruba muitos dos juízos que tínhamos desse poderoso grupo de navegadores que conquistou partes da Ásia, Groenlândia e Europa por volta do primeiro milênio dC.

"Os resultados mudam a percepção de quem realmente eram os vikings. Os livros de história terão que ser atualizados", diz o geneticista evolucionista Eske Willerslev, líder do estudo, em comunicado divulgado pela Universidade de Cambridge, no Reino Unido, uma das instituições de ensino envolvidas na descoberta.

A pesquisa envolveu a análise genética de mais de 400 esqueletos Viking em diferentes locais na Irlanda, Islândia, Groenlândia, Polônia, Ucrânia, Reino Unido e Rússia.

"O estudo levou mais de seis anos para ser concluído desde a sua concepção e envolveu a coleta de amostras ósseas de toda a Europa em colaboração com uma grande equipe de arqueólogos", explica Fernando Racimo, especialista do Centro de Geogenética da Universidade de Copenhague, na Dinamarca, e um dos autores.

Segundo Racimo, os cientistas começaram extraindo e sequenciando o material genético das amostras para depois analisá-lo e compará-lo com outros genomas antigos e atuais, interpretando os resultados "em seu contexto cultural e histórico."

"Todo o esforço envolveu uma grande equipe de geneticistas, estatísticos, arqueólogos, linguistas e historiadores", diz ele.

O estudo foi realizado por cientistas da Universidade de Copenhague (Dinamarca) e de Cambridge (Reino Unido), e os resultados foram publicados na quarta-feira (16/09) na revista científica Nature.

•        O que o estudo diz?

Os pesquisadores partiram do pressuposto de que a expansão marítima das populações escandinavas durante a Era Viking (por volta de 750-1050 DC) foi uma transformação profunda na história mundial.

Para isso, a equipe sequenciou os genomas de 442 humanos (incluindo homens, mulheres, crianças) de sítios arqueológicos na Europa e na Groenlândia para entender a influência global dessa expansão.

"A maior conquista (da pesquisa) é que agora temos uma imagem muito detalhada da estrutura genômica dentro e fora da Escandinávia durante a era Viking e o impacto genético das expedições Viking em todo o continente", diz Racimo.

Para surpresa de muitos, e ao contrário da frequente teoria da "pureza racial" do grupo, eles descobriram que os vikings, geneticamente, não só vieram da Escandinávia, mas também tinham DNA da Ásia, sul da Europa e das Ilhas Britânicas.

"Concluímos que a diáspora Viking foi caracterizada por um envolvimento transregional substancial: diferentes populações influenciaram a composição genômica de diferentes regiões da Europa e a Escandinávia experimentou um maior contato com o resto do continente", aponta o estudo.

De acordo com Racimo, a pesquisa também revelou como as rotas Viking também levaram a genética do grupo a se diversificar.

"Também vimos que a ancestralidade do sul da Europa aumentou no sul da Escandinávia durante a era Viking, provavelmente devido ao aumento das rotas comerciais e à frequência das expedições ao sul do continente e vice-versa", observa.

Como resultado, os cientistas descobriram que nem todos os vikings eram louros ou tinham pele clara e olhos azuis.

"Nossa pesquisa desacredita a imagem moderna dos vikings de cabelos louros, já que muitos tinham cabelos castanhos e foram influenciados pela genética de fora da Escandinávia", diz Willerslev em comunicado divulgado pela Universidade de Cambridge.

•        Outras descobertas

A pesquisa sugere que ser um Viking era mais um conceito e cultura do que uma questão de herança genética, como se acreditava até agora.

Na verdade, a equipe descobriu que dois esqueletos Viking enterrados nas ilhas do norte da Escócia tinham herança escandinava e irlandesa, mas nenhuma escandinava, pelo menos geneticamente.

"Fiquei particularmente surpreso com a quantidade de mistura que ocorreu entre os vikings e a população local dentro de cada uma das regiões que estudamos. Muitas vezes, descobrimos que vários indivíduos que eram 'culturalmente' vikings ou enterrados no estilo viking também tinham afinidades com ancestralidade com povos locais, por exemplo, pessoas do tipo celta no oeste e nas ilhas do Atlântico Norte ", diz Racimo à BBC News Mundoy, o serviço de notícias em espanhol da BBC.

O estudo também aponta que os navios vikings em suas expedições às vezes eram compostos por membros da mesma família ou que estavam associados em suas viagens pelas populações ou regiões que habitavam.

•        Quem foram os vikings?

Tradicionalmente, os vikings eram considerados guerreiros e navegadores do norte da Europa que conquistaram partes daquele continente, a Ásia, e chegaram à América por volta do ano 1.000.

"As diásporas escandinavas estabeleceram comércio e assentamentos que se estendiam do continente americano às estepes asiáticas. Eles exportaram ideias, tecnologias, linguagem, crenças e práticas e desenvolveram novas estruturas sócio-políticas", diz Søren Sindbæk, arqueólogo do Museu Moesgaard na Dinamarca, um dos colaboradores do estudo.

Os vikings mudaram o curso político e genético da Europa, mas também exploraram outros continentes.

Muitas expedições envolveram ataques a mosteiros e cidades ao longo dos assentamentos costeiros da Europa, mas de acordo com historiadores, o comércio de produtos como peles de foca, presas e gordura era frequentemente seu objetivo principal.

As Sagas nórdicas, a antiga coleção escandinava de mitos e lendas, reconta o auge da conquista e exploração Viking um milênio atrás.

De acordo com seus relatos, Canuto, o Grande, tornou-se rei da Inglaterra, Olaf Tryggvason trouxe o cristianismo para a Noruega e um viking chamado Leif Ericson teria sido o primeiro europeu a chegar ao continente americano antes da expedição de Cristóvão Colombo.

Ericson, segundo a lenda, liderou uma expedição do novo assentamento nórdico na Groenlândia para o oeste, navegando rumo ao desconhecido, em busca de terras e recursos para fazer frente às deficiências da colônia da Groenlândia.

 

Fonte: BBC News India/BBC Worklife

 

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