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WhatsApp não bastam para conter solidão de idosos, diz especialista em ciência
da felicidade
A
pandemia da covid-19 levou governos em todo o mundo a adotarem medidas rígidas
de restrição e isolamento social para evitar a disseminação da doença. Os
idosos faziam parte do grupo de risco e passaram a ser evitados pela própria
família e amigos para reduzir a chance de transmissão.
Denize
Savi, especialista em ciência da felicidade e coordenadora da organização Doe
Sentimentos Positivos, disse que os idosos sofreram ainda mais na pandemia
porque eles não adquiriram o hábito de lidar com as novas tecnologias de
comunicação como os mais jovens.
"Eles
acabaram ficando isolados. Isso agravou a tristeza, aumentou muito o número de
depressão e ansiedade. É preciso que a gente olhe para esse cenário com
empatia, com cuidado, porque eles estão precisando de atenção, principalmente
agora nesse pós-pandemia", afirmou a especialista.
Denize
diz que estudos recentes apontam que esse isolamento da população em geral pode
refletir numa futura epidemia de saúde mental neste período pós-pandemia.
E
para evitar que doenças psicológicas atinjam a sociedade de maneira
massificada, ela diz ser necessário criar uma rede de apoio em torno das
pessoas, principalmente as mais vulneráveis, como os mais velhos.
"A
família precisa se reaproximar dessas pessoas. Porque o contato físico é
extremamente importante, fundamental", diz.
Outra
orientação da psicóloga é evitar enviar notícias ruins para os mais velhos.
"Às
vezes, por exemplo, você soube que uma pessoa do seu convívio, mais de idade,
faleceu (...) [É necessário] minimizar essas questões. Realmente levar notícias
boas e trazer para a roda de conversa algo que seja frutífero, que vai deixar
essa pessoa feliz", diz.
Mas
ela também dá um puxão de orelha nos idosos que não procuram a família.
"Da
mesma forma que os filhos e os netos precisam procurar os idosos para que haja
esse convívio, os idosos também têm que fazer isso. Eles também têm que mandar
um recadinho: 'Poxa, vamos fazer um almoço neste fim de semana?'", afirma
a especialista.
Quando
nenhuma dessas técnicas resolver, os idosos, segundo ela, devem procurar alguma
ocupação por conta própria. Algo, de preferência, que tenha um impacto social
por meio da solidariedade.
"Às
vezes, a idosa tem um talento para tricô. Ela pode fazer blusinhas e
casaquinhos para crianças de creches. O maior segredo de tudo não é saber o que
tem que ser feito. É ter disciplina. Ter disciplina é o mais difícil. Isso vale
para todas as idades, mas em especial para os idosos", diz Denize.
• A importância da presença
A
psicóloga reforça que, segundo estudos, o contato exclusivamente telefônico ou
via WhatsApp e redes sociais não é suficiente para aumentar a sensação de
felicidade e bem-estar.
"É
o contato físico, o afeto, principalmente o abraço e o olho no olho e o
carinho, que fazem com que o ser humano floresça para uma vida com mais
bem-estar. Então não adianta o familiar ligar para saber como o pai ou a mãe
está se ele não fizer uma visita presencial. É extremamente importante estar
junto de verdade. Muitas vezes é muito difícil porque mora em cidades
distantes, mas é necessário se organizar para, pelo menos em algum momento,
estar junto. Porque isso é fundamental", afirma ela.
Esse
contato físico, segundo Denize, é essencial para evitar que os idosos fiquem
doentes.
"[Essa
distância] pode levar a doenças como Alzheimer, Parkinson, depressão,
ansiedade, esquizofrenia e tantas outras doenças mentais", diz a
psicóloga.
A
especialista em ciência da felicidade diz que uma pesquisa desenvolvida pela
Universidade de Harvard, que já dura mais de 80 anos, revelou que as pessoas
que chegam na terceira idade com uma rede social pequena, com poucos amigos,
têm uma tendência muito maior à depressão.
"A
solidão, cientificamente falando, nos deixa infelizes. Então, a gente precisa
olhar para as nossas amizades como algo extremamente importante para o nosso
bem estar. Desde cedo, a gente já precisa cultivar essas relações porque essa
pesquisa mostra que uma vida feliz é uma vida compartilhada", diz.
"Essa
pesquisa inclusive mostra que as pessoas que têm mais ligações sociais, além de
serem mais felizes, são mais saudáveis. Elas vivem mais. A gente percebe que
entre as pessoas na terceira idade, sem amigos, a tendência é elas adoecerem e
virem a óbito antes", afirmou a especialista.
A
psicóloga afirmou ainda que é importante que as pessoas ao redor desses idosos
levem carinho e afeto para eles. Ela ressalta que também são necessárias
políticas públicas para que os idosos que vivem sozinhos tenham espaços para
interagir entre si.
"O
acolhimento é fundamental porque as pessoas deixam de sentir esse isolamento,
essa solidão, e passam a sentir-se importantes. Então perceba que o contato
físico, o encontro, promove isso."
• Notícias negativas
Além
de ser insuficiente para evitar quadros de doenças mentais, mandar mensagens a
idosos por meio de aplicativos pode causar ainda mais ansiedade neles.
"O
que a gente vê hoje é muita notícia negativa. Isso vai nos deixando cada vez
mais preocupados, ansiosos e introspectivos. Precisamos promover o contrário.
Falar de coisas que vão impulsionar esse reencontro entre as pessoas. Essa
esperança de que as coisas estão mudando. O que acontece é que o ser humano tem
uma tendência natural ao negativo."
"O
pesquisador americano Rick Hanson diz que o cérebro humano é teflon para o
positivo e velcro para o negativo. E o que acontece quando a gente vê uma
notícia ruim? Aquela notícia não fica na nossa mente apenas nos segundos que
nós vemos na televisão ou no jornal. Ela reverbera durante todo o dia. E se a
gente passa uma hora tendo só notícia ruim ou ao longo do dia, tendo contato
com muitas notícias, a nossa visão de mundo vai ser totalmente negativa, o que
vai nos deixando cada vez menos confiantes pela vida."
Denize
Savi afirma que devemos sim nos manter informados, mas que também é necessário
se policiar para não se expor tanto a essa "tendência natural ao
negativo".
• Políticas públicas
Entre
as iniciativas, a psicóloga diz ser crucial a construção de espaços de
convivência para os idosos. Ela defende que esses locais sirvam não só de
pontos de encontro, mas que também ofereçam cursos profissionalizantes, aulas
de dança e esportes.
"Isso
precisa ser retomado, porque teve uma pausa na pandemia e agora sim é um
momento de chamado dessas pessoas. Muitos têm medo de sair porque a pandemia
nos deixou muito inseguros. Isso é fundamental para que elas voltem a ter esse
brilho pela vida", afirma.
Depois
da pandemia, a psicóloga diz que o combate à solidão tem sido um dos maiores
desafios da psicologia.
• A importância da amizade
A
psicóloga ressalta que cultivar amizades desde a infância é essencial para ter
uma vida adulta mais feliz.
"É
a partir dessa convivência com outras crianças que ela vai aprender empatia,
desenvolver a criatividade, o senso de responsabilidade e que ela vai saber o
que é compartilhar, dividir, aprender e negociar", diz a psicóloga.
Ela
afirma ainda que a amizade colabora na adolescência com a construção da identidade
e que nesse momento você começa a encontrar os maiores amigos. Essas
companhias, segundo ela, são o alicerce da vida adulta na resolução de
problemas.
"Quando
a gente compartilha os nossos problemas, eles ficam menores. Quando a gente é
acolhido por um amigo, a gente ganha forças para encarar o dia a dia e os
desafios. Muitas vezes você não se dá bem com as pessoas da sua família, mas
você se dá bem com os seus amigos. Essa é a família que a gente escolhe, como
diz o ditado popular."
Os benefícios de se achar mais jovem do
que realmente é
Que
idade você acha que corresponde à meia-idade? De 40 a 60 anos? Dos 50 aos 70?
Em algum ponto intermediário?
Provavelmente
não vai te surpreender saber que a resposta que as pessoas dão a isso depende
de quantos anos elas têm no momento em que ouviram a pergunta.
Quando
meio milhão de pessoas preencheram um questionário online em 2018, os
participantes que tinham entre 20 e 30 anos responderam que, em média, a
meia-idade começava aos 40 anos, enquanto a velhice tinha início aos 62.
Em
contrapartida, os maiores de 65 anos não pensavam que se chegava à velhice
antes dos 71 anos.
É
bastante óbvio o que acontece. Ninguém gosta de pensar que está envelhecendo —
então, se você tem 40 anos, adora artigos que proclamam que os 40 são os novos
30.
Da
mesma forma, as pessoas na faixa dos 70 anos ficam animadas com sugestões de
que, com os avanços na nutrição e nos cuidados de saúde, praticamente acabaram
de sair da meia-idade.
Além
disso, tendemos a querer nos dissociar de qualquer grupo que seja
estigmatizado.
Isso
significa que resistimos a ser designados como velhos, quando vemos o idoso
retratado como frágil, sedentário, doente e até mesmo um fardo para a
sociedade.
Claro
que a velhice é uma realidade, e os idosos devem ser tratados com respeito e
dignidade.
Será
então que as pessoas estão simplesmente se iludindo quando se recusam a se
considerar velhas?
Na
verdade, esta pode ser uma estratégia sensata, que pode ser realizada e
melhorar a qualidade de vida.
Em
2003, os pesquisadores Hannah Kuper e Michael Marmot (famosos por demonstrar o
impacto que o status socioeconômico pode ter em nossa saúde e expectativa de
vida) realizaram um amplo estudo no qual os participantes foram novamente
questionados: quando a velhice começa?
As
respostas variaram, claro, mas o que Kuper e Marmot descobriram foi que as
pessoas que pensavam que a velhice começava mais cedo eram mais propensas a ter
um ataque cardíaco, sofrer de doenças cardíacas ou ter uma saúde física em
geral precária quando monitoradas de seis a nove anos depois.
Os
participantes desta pesquisa estavam participando do chamado estudo Whitehall
II, um estudo longitudinal com mais de 10 mil funcionários públicos que
trabalhavam em Londres.
A
pesquisa é robusta e os participantes responderam a uma grande variedade de
perguntas.
Isso
significava que Kuper e Marmot podiam estabelecer que outros fatores, como o
nível de emprego, não poderiam explicar as diferenças nos resultados de saúde.
Como
poderia então a idade que você designa como o início da velhice ter um impacto
tão grande na sua saúde?
Uma
teoria é que a resposta para a simples pergunta de "quando a velhice
começa" fornece, na verdade, muito mais informação sobre uma pessoa do que
você imagina.
Pode
ser, por exemplo, que a pergunta leve as pessoas a pensar sobre sua própria
saúde física e, se tiverem problemas de saúde pré-existentes ou um estilo de
vida ruim, podem não se sentir tão bem e pensar que a velhice está chegando
mais cedo.
As
pessoas que dizem que a velhice chega mais rápido também podem ser mais
fatalistas e menos propensas a procurar ajuda para problemas de saúde ou a
adotar rotinas mais saudáveis, acreditando que o declínio é inevitável.
Elas
podem supor, por exemplo, que as pessoas mais velhas são frágeis, e começar a
andar deliberadamente mais devagar e pegar leve, quando isso é exatamente o que
não deveriam fazer em prol de sua saúde física e mental.
Elas
podem esperar esquecer coisas devido à idade, então param de contar com suas
memórias. É até possível que o estresse de se apegar a ideias negativas sobre o
envelhecimento contribua para a inflamação crônica e mais problemas de saúde a
longo prazo.
De
maneira que viver de acordo com o estereótipo de uma pessoa mais velha poderia
aumentar justamente os problemas que temem.
E,
claro, o inverso pode ser verdade também.
As
pessoas que pensam que a velhice começa mais tarde podem estar mais conscientes
sobre sua saúde e condicionamento físico e, portanto, tomar medidas ativas para
se manter em forma.
Elas
acreditam que são mais jovens e, portanto, se comportam de maneira mais jovem,
criando um círculo virtuoso.
Seja
qual for a explicação, o estudo de Kuper e Marmot não é a única pesquisa a
demonstrar benefícios mensuráveis de pensar positivamente sobre o envelhecimento.
Becca
Levy, da Escola de Saúde Pública de Yale, também produziu resultados
extraordinários, usando dados do Estudo Longitudinal de Envelhecimento e
Aposentadoria de Ohio, que acompanhou mais de mil pessoas que tinham pelo menos
50 anos na época.
Levy
descobriu que as pessoas que tinham ideias positivas sobre seu próprio
envelhecimento (que concordavam com comentários como "tenho tanta
vitalidade quanto no ano passado" e que discordavam que à medida que você
envelhece fica menos útil) viveram em média 22,6 anos após terem participado do
estudo pela primeira vez, enquanto aquelas que se sentiam menos positivas sobre
a velhice viveram, em média, apenas 15 anos a mais.
Em
seguida, surgiu um novo estudo conduzido por Susanne Wurm, da Universidade de
Greifswald, no norte da Alemanha, que pode definir o problema com mais
precisão.
E
suas descobertas oferecem boas notícias para as pessoas que pensam mais
negativamente sobre a chegada da velhice. Elas não se mostraram mais propensas
do que a média a morrer cedo.
Mas,
novamente, as pessoas que viam a velhice de forma mais positiva, como um
momento para aprender coisas novas e fazer novos planos, por exemplo, viviam
mais em média.
Neste
estudo, não importava tanto o que as pessoas pensavam sobre as implicações físicas
do envelhecimento, o que importava era se elas acreditavam que ainda iriam se
desenvolver e crescer mentalmente.
Nenhuma
destas pesquisas significa que podemos parar ou reverter magicamente o processo
de envelhecimento.
Visão,
audição, memória, massa muscular, resistência óssea, processos de recuperação:
pode escolher, tudo isso declina. E as pessoas mais velhas são, obviamente,
mais vulneráveis a toda uma variedade de doenças.
Todos
estes grandes estudos são baseados em médias, então dizer que não está na
meia-idade não evitará que todo mundo fique doente.
Mas
no livro The Expectation Effect ("O efeito da expectativa", em
tradução livre), o jornalista especializado em ciência David Robson dá algumas
dicas.
Ele
indica que, em vez de lamentar a perda da juventude, devemos nos concentrar nas
experiências e no conhecimento que adquirimos à medida que envelhecemos — e
perceber o quão melhor lidamos com as situações.
Quando
as pessoas mais velhas não se sentem bem, elas não devem supor que tudo se deve
à idade avançada.
Acima
de tudo, à medida que envelhecemos, nunca deveríamos desistir de tentar ser
mais saudáveis e acreditar que ainda podemos fazer muitas coisas.
Se
adotarmos esta atitude, provavelmente viveremos mais e aproveitaremos estes
anos.
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Fonte:
BBC Future
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