Democracia: retrocessos e dissensões sob
Trump
Há 100
dias, Donald Trump assumiu a presidência dos Estados Unidos, marcando um
período de profundas incertezas e retrocessos na política norte-americana. Este
momento, serve como um indicador do rumo que o governo Trump pretende seguir,
sem respeito pelos direitos humanos, sem respeito ao meio ambiente, sem
respeito a convenções, tratados e contratos internacionais, sem respeito à
Democracia.
Entre
as ações mais controversas, estão as ordens executivas relacionadas à
imigração, que afrontam a dignidade de milhares de pessoas, além da tentativa
de reformar o sistema de saúde de forma a beneficiar as grandes corporações,
deixando milhões de americanos sem acesso a cuidados essenciais. Há uma forte
pressão para reduzir regulações ambientais e incentivar o uso de combustíveis
fósseis, o que coloca em risco o futuro do planeta Terra.
Não
causou qualquer surpresa. Os slogans de campanha diziam tudo: “América First”!
“Make América Great Again”. Eleito, Trump rompe acordos comerciais de
forma a favorecer interesses corporativos americanos, impõe impensáveis tarifas
de até três dígitos a importações de antigos parceiros comerciais bagunçando o
comércio mundial e a ordem econômica internacional, promove uma política de
fortalecimento das forças armadas que aumenta o risco de conflitos.
O
momento é confuso. A reforma do Sistema Bretton Woods, construído ao final da
Segunda Guerra Mundial, que favoreceu a hegemonia norte-americana, há muito
vinha sendo questionada pelos países em desenvolvimento que sempre se
consideraram em posição de submissão e reclamavam maior participação. Com
certeza não é essa reforma que Trump e seus asseclas têm em mente.
“Os
primeiros 100 dias do segundo mandato do presidente Trump causaram mais danos à
democracia americana do que qualquer outra coisa desde o fim da Reconstrução”,
ressaltou O Conselho Editorial do New York Times na
quinta-feira, primeiro de maio.
A
"Reconstrução" nos Estados Unidos refere-se ao período após a Guerra
Civil Americana (1861-1865), de 1865 a 1877, durante o qual o país tentou
restaurar o Sul, que havia se separado da União, e integrar os afro-americanos
à sociedade. Foi um período complexo e conturbado da história dos EUA
durante o qual houve a abolição da escravidão, a reintegração dos estados
confederados e os esforços para garantir direitos civis aos
afro-americanos.
O
Conselho Editorial é composto por líderes do departamento de Opinião do Times,
que se baseiam em pesquisa, debate e expertise individual para chegar a uma
visão compartilhada sobre questões julgadas importantes e dignas de um
pronunciamento aos seus leitores.
De
forma resumida, o editorial de 01/05 aponta o caos desses três meses iniciais
de governo, argumentando que as ações de Trump, além de representarem uma
ameaça sem precedentes à democracia americana, desde a segunda metade do século
XIX, buscam consolidar um poder presidencial autocrático, que ignora freios e
contrapesos constitucionais. Os analistas identificam cinco pilares da
democracia sob ataque:
1.
Separação de poderes: Trump desrespeita o Judiciário e o Congresso, ignorando
ordens judiciais e leis aprovadas de forma bipartidária pelo Congresso e
mantidas por unanimidade pela Suprema Corte (como a venda do TikTok). Trump
insultou juízes chamando-os de lunáticos e radicais e pediu o impeachment
daqueles com quem discorda. Ele e seus aliados criticaram juízes de forma tão
dura e pessoal que muitos estão preocupados com sua
segurança física.
2.
Devido processo legal: Decisões unilaterais, como deportações sumárias de
imigrantes sem direito à defesa, violam procedimentos estabelecidos.
Ele demitiu funcionários federais sem o aviso prévio de 30 dias exigido por
lei. Tentou cortar verbas universitárias alegando antissemitismo, sem seguir os
procedimentos estabelecidos para tais casos de direitos civis. Emitiu ordens
executivas punindo escritórios de advocacia por irregularidades inventadas.
A mais
flagrante negação do devido processo legal foi a deportação de 238 imigrantes
para uma notória prisão em El Salvador. As autoridades o fizeram às pressas durante um fim
de semana em março, invocando a Lei dos Inimigos Estrangeiros, uma lei que não
era usada desde a Segunda Guerra Mundial.
3.
Justiça igualitária: Uso político do Departamento de Justiça para proteger
aliados (ex.: perdões a manifestantes de 6 de janeiro) e perseguir opositores
(ex.: investigação à ActBlue). A investigação é um exercício de poder político
bruto, com o objetivo de impedir que o partido da oposição vença as eleições. E
o inquérito do ActBlue faz parte de um padrão. Trump se inspirou no manual de
aspirantes a autocratas, como o primeiro-ministro Viktor Orban, da Hungria, e o
presidente Recep Tayyip Erdogan, da Turquia, que usam o poder de proteger o
governo como um instrumento contra seus oponentes políticos
4.
Liberdade de expressão e imprensa: O Sr. Trump gosta de dizer que "trouxe
de volta a liberdade de expressão à América". O Conselho Editorial aponta
várias circunstâncias que comprovam que isso é apenas retórica: “A Academia
Naval removeu centenas de livros de sua biblioteca, principalmente sobre raça,
escravidão ou gênero, incluindo um romance de Geraldine
Brooks, um livro de memórias de Maya Angelou
e histórias dos acadêmicos de Harvard Randall Kennedy e Imani Perry . Trump também processou a ABC, a CBS e
o The Des Moines Register por reportagens das
quais não gostou. Ele usou ordens executivas para punir pessoas por coisas que
disseram, incluindo Chris Krebs, um funcionário de segurança cibernética de seu
primeiro mandato que reconheceu a legitimidade das eleições de 2020.”
O
editorial enfatiza, também, que “entre os maiores alvos estão imigrantes que
criticaram publicamente Israel. O Departamento de Estado cancelou vários de
seus vistos. Em um caso, agentes mascarados prenderam Rumeysa Ozturk, uma
estudante turca de pós-graduação na Universidade Tufts, autora de um ensaio de
opinião pró-palestina no jornal estudantil. Sr. Trump descaracteriza discursos
legítimos como falsos ou antiamericanos e usa poderes governamentais para
disciplinar o orador. A mensagem para todos os outros é: cuidado com o que você
diz.”
O
quinto pilar relaciona-se com enriquecimento ilícito que apadrinha Trump,
familiares e amigos.
5.
Governo para o povo: Enriquecimento pessoal via esquemas de criptomoedas
($Trump/$Melania) e favorecimento de aliados, corroendo a integridade
governamental.
O
Conselho Editorial do NYT defende uma oposição estratégica a partir da
construção de uma coalizão ampla (conservadores, progressistas, religiosos,
seculares etc.). Como exemplos positivos citam a resistência legal de Harvard,
que combinou autocrítica com firmeza contra exigências absurdas, e decisões
judiciais ponderadas da Suprema Corte, que limitaram ações presidenciais.
O
editorial sugere que como Trump está enfraquecido politicamente (aprovação em
queda), sua impopularidade pode dificultar seu projeto autoritário, e faz um
apelo à defesa da democracia pelos norte-americanos: “Os últimos 100 dias
feriram este País, e não há garantia de que nos recuperaremos totalmente. Mas
ninguém deve desistir. A democracia americana recuou antes, durante a era
pós-Reconstrução, as leis de Jim Crow, o Pânico Vermelho, Watergate e outros
períodos. Ela se recuperou não porque sua sobrevivência fosse inevitável, mas
porque os americanos — incluindo muitos que discordavam uns dos outros em
outros assuntos — lutaram bravamente e com inteligência pelos ideais deste
país. Esse é o nosso dever hoje”, conclui O Conselho Editorial do New
York Times.
Trump é
narcisista e neofacista. Elogia seu governo dizendo que é o "melhor início
de 100 dias de qualquer presidente na história", mas quase todas as
análises de especialistas e comentaristas na mídia internacional e na dos
Estados Unidos avaliam no sentido oposto: os primeiros três meses do segundo
mandato do Sr. Trump foram caóticos sob quase todos os aspectos, marcados por
retrocessos, conflitos e muitas controvérsias. Sua postura de intolerância e
autoritarismo preocupa a sociedade americana e causa medo e insegurança ao
mundo como um todo.
¨
Tirania americana:
juízes que decidiram contra Trump se tornam alvo de ataques a suas famílias,
com ação direta de Musk
Uma investigação da
agência Reuters revelou uma preocupante escalada de ameaças e
assédio direcionados a familiares de juízes federais que proferiram decisões
contrárias ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em seu segundo
mandato iniciado em 2025. Ao menos 11 magistrados viram seus entes queridos se
tornarem alvo de intimidação, ataques pessoais e até ameaças de morte após
decisões desfavoráveis à nova administração.
Entre
os casos mais graves está o do juiz James Boasberg, que determinou em abril que
autoridades da administração Trump poderiam ser responsabilizadas por
desrespeitar uma ordem judicial sobre deportações. A resposta veio em forma de
violência digital e ameaça física. Elon Musk, bilionário e aliado do
presidente, compartilhou uma postagem distorcendo o trabalho da filha do juiz.
Imediatamente, seguidores exigiram sua prisão. Alguns pediram a execução da
família Boasberg.
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O juiz
John McConnell também passou por situação semelhante após declarar ilegal o
congelamento de verbas federais por parte do presidente. A ativista de
extrema-direita Laura Loomer publicou uma foto da filha do magistrado,
ex-funcionária do Departamento de Educação. Musk republicou o conteúdo para
seus mais de 219 milhões de seguidores. A campanha rendeu mais de 600
telefonemas e e-mails ameaçadores à corte de Rhode Island, incluindo ameaças de
morte.
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Campanha sistemática e efeitos sobre a democracia
A
ofensiva contra os magistrados é parte de uma estratégia mais ampla de
intimidação, denunciada por juristas entrevistados pela Reuters.
Desde que reassumiu a presidência, Trump e seus aliados têm atacado membros do
Judiciário que se opõem ao avanço de medidas autoritárias, como a expansão do
poder executivo e o desmonte de agências federais. Desde janeiro, mais de 60
juízes ou tribunais de apelação bloquearam iniciativas da Casa Branca.
“Ameaças
contra juízes e suas famílias são, em última instância, ameaças ao governo
constitucional. É simples assim”, afirmou o juiz Richard Sullivan, do Tribunal
de Apelações, que preside o comitê de segurança da magistratura federal.
Juízes
ouvidos pela Reuters — muitos sob anonimato — relatam
preocupação crescente com a própria segurança e a de seus familiares. A
situação é agravada pela propagação de postagens difamatórias em redes sociais
como o X (antigo Twitter), controlado por Musk, e em sites da extrema-direita
como Gateway Pundit e Patriots.win.
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Mensagens de ódio, apelos por violência e “doxxing”
Entre
fevereiro e abril de 2025, a Reuters identificou mais de 600
publicações em redes sociais com ataques a familiares de juízes. Desses, ao
menos 70 pediam abertamente retaliação física ou prisão. Em um dos casos mais
graves, posts pediam que a filha de Boasberg fosse “introduzida a membros do
MS13”, uma violenta gangue salvadorenha, e exigiam “a construção de forcas”
para executar a família.
O
“doxxing” — prática de expor dados pessoais como endereço e local de trabalho —
também foi usado como forma de intimidação. Em março, Boasberg determinou a
suspensão de uma deportação baseada em uma lei do século XVIII usada pela Casa
Branca para expulsar migrantes sob alegações não comprovadas. A retaliação veio
rapidamente: sua filha teve fotos e informações pessoais amplamente divulgadas
por Musk e Loomer.
A
organização onde a filha de Boasberg trabalhava, uma ONG que oferece
assistência jurídica a imigrantes de baixa renda, removeu suas informações do
site. A família passou a contar com escolta dos U.S. Marshals após as ameaças.
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Risco real e precedentes trágicos
Casos
de violência contra magistrados já deixaram marcas na história judicial dos
Estados Unidos. Em 2005, a juíza Joan Lefkow perdeu o marido e a mãe,
assassinados por um litigante descontente. Em 2020, o filho da juíza Esther
Salas foi morto a tiros por um ex-advogado que buscava vingança. “Não é uma
preocupação teórica”, disse o ex-juiz David Levi, apontando para o risco real
enfrentado pelos familiares.
A
escalada recente acendeu o alerta nas instituições. O Comitê Judicial do
Congresso recebeu um pedido oficial para reforçar a segurança dos magistrados.
A juíza da Suprema Corte, Ketanji Brown Jackson, afirmou em conferência: “As
ameaças e o assédio são ataques à nossa democracia.”
A
investigação da Reuters mostra que, desde o início do segundo
mandato de Trump, os ataques à magistratura adquiriram um novo patamar, com uso
intensivo de redes sociais, campanhas de difamação coordenadas e tentativas
sistemáticas de intimidar juízes e seus familiares.
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A resposta do governo Trump e o impacto institucional
O
governo nega estimular qualquer tipo de ataque. Em nota à Reuters,
o porta-voz da Casa Branca, Harrison Fields, afirmou: “Ninguém leva ameaças à
segurança mais a sério do que o presidente Trump — um líder que sobreviveu a
duas tentativas de assassinato.” Fields acrescentou que a segurança de todos os
americanos é prioridade, e que ameaças serão investigadas e punidas.
Apesar
disso, o próprio presidente e membros do governo mantêm discursos agressivos
contra o Judiciário. Em comício recente, Trump declarou: “Não podemos permitir
que um punhado de juízes comunistas radicais da esquerda obstrua a aplicação da
lei e assuma as funções que pertencem apenas ao presidente dos Estados Unidos.”
A
retórica encontra eco em apoiadores e figuras públicas como Musk, que chegaram
a sugerir punições capitais para magistrados e seus parentes. “Estamos todos
apavorados com onde isso pode chegar”, confessou um juiz federal sob anonimato
à Reuters.
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Consequências para o futuro da Justiça americana
Especialistas
jurídicos alertam para o risco de um efeito paralisante (“chilling effect”)
entre juízes e candidatos à magistratura. “Há uma chance de que pessoas
qualificadas evitem a função com medo das consequências”, declarou Paul Grimm,
da Universidade Duke.
O
cenário traçado pela reportagem da Reuters revela uma erosão
preocupante na independência do Judiciário — um dos pilares do sistema
democrático norte-americano — diante da ofensiva de um presidente que tenta
consolidar seu poder com métodos cada vez mais autoritários. A intimidação de
juízes e suas famílias, longe de ser um caso isolado, parece parte de uma
estratégia sistemática de enfraquecimento das instituições.
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Fonte: Por Maria Luiza Falcão Silva, em
Brasil 247

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