terça-feira, 13 de maio de 2025

China quer conectar toda América Latina com ferrovias

Perito do think tank chinês avalia cenário da cooperação China-CELAC.

Em virtude da realização do 4º Fórum China-CELAC e da visita do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, a Beijing, o diretor do Centro de Estudos Brasileiros da Academia de Ciências Sociais da China, Dr. Zhou Zhiwei, analisou o cenário e os pontos de convergência nas cooperações entre China e os países latino-americanos e caribenhos.

·        Fórum China-CELAC celebra uma década superando meta prevista.

Os dez anos desde a fundação do Fórum China CELAC são justamente a fase em que a cooperação entre a China e a América Latina viveu o seu desenvolvimento mais rápido. Há três fatores que contribuem para esse resultado: o ritmo rápido de intercâmbio bilateral, a cooperação Sul-Sul como prioridade das políticas externas dos dois lados e a ascensão do Sul Global.

Em 2015, na primeira edição do fórum, a China propôs que, depois de uma década, o volume total do comércio bilateral atingisse US$ 500 bilhões de dólares e o investimento chinês da China no continente latino-americano e caribenho somasse US$ 250 bilhões.

Em 2024, o volume do comércio China-CELAC chegou a US$ 518,4 bilhões e os investimentos chineses no continente já ultrapassaram US$ 600 bilhões. Os dados mostram que base em dados, as metas estabelecidas foram atingidas.

Além disso, o mecanismo da cooperação China-CELAC estabeleceu diversos subfóruns na última década, com destaque para o de Infraestrutura China-CELAC. No ano passado, os dois lados realizaram ainda um fórum de cooperação aeroespacial. Podemos dizer que o tópico principal entre China e CELAC passou de comércio e investimento para infraestrutura, agricultura, área de ponta de tecnologia e outros setores.

·        Pautas de integração da América do Sul são de interesse do Brasil

A importância do Brasil na CELAC é incontestável, pois é o maior país da América Latina e também o país com maior influência internacional na região. Falando das pautas em que o Brasil estará interessado, isso depende de até quanto a China pode responder às demandas dos países latino-americanos. Se a resposta for boa, o Brasil terá mais interesse.

A primeira demanda se encontra na manutenção da ordem internacional, basicamente a manutenção do ambiente comercial eficaz. É nisso que o Brasil está mais interessado no momento. Porque desde que Donald Trump chegou ao poder, a política tarifária teve um impacto enorme nos países latino-americanos e o Brasil sofre de forma mais abrangente. Portanto, na atual situação, o Fórum China-CELAC definitivamente oferecerá uma voz unificada e uma expressão conjunta para combater o unilateralismo e o protecionismo.

O segundo foco se encontra na promoção do crescimento sustentável, o que também é uma prioridade para o bloco conduzir as cooperações. Nos últimos anos, a infraestrutura tem sido um tema relevante na parceria China-CELAC. Com a construção do Porto de Chancay, a China pode conectar efetivamente a América do Sul. Reciprocamente, permite que as estradas, ferrovias, portos da região cheguem ao mercado asiático também de forma eficaz.

Há ainda um terceiro aspecto que creio relacionado à cúpula do BRICS. Se trata de um mecanismo de cooperação aberto, inclusivo e multilateral. Já o Brasil como anfitrião da cúpula, pode convidar outros vizinhos para fazerem parte. Então, voltando ao Fórum China-CELAC, o Brasil pode esperar desempenhar um papel construtivo ou uma ponte na discussão das questões geopolíticas polêmicas, incluindo a segurança internacional, a mediação do conflito Rússia-Ucrânia e outras.

·        Estados Unidos se preocupam com China e CELAC compartilharem a mesma visão.

Com que os Estados Unidos ficariam preocupados? Há dois pontos. Eles temem que os países latino-americanos e caribenhos compartilhem da mesma visão com a China, seja sobre a situação internacional, a cooperação bilateral ou quanto ao atual ambiente de comércio internacional. Se todos tiverem a ideia de excluir os Estados Unidos? Esse é um ponto que os preocupa.

Outra preocupação é se a China e a CELAC podem alcançar um relacionamento mais próximo por meio deste fórum, especialmente quando isso se coloca num contexto de protecionismo, unilateralismo e comportamento egoísta cada vez mais evidentes dos Estados Unidos. Eles não mostram vontade de aprofundar a cooperação com a América Latina e Caribe. Nessas circunstâncias, a CELAC sente necessidade de ampliar seus canais de cooperação e diversificar seus parceiros. Então, a postura aberta da China certamente está em linha com as atuais demandas políticas da CELAC.

Tais fatores possibilitam novos acordos de cooperação entre a China, os países latino-americanos e caribenhos, envolvendo setores como produtos agrícolas, energia, infraestrutura, tecnologia, etc. Portanto, quando houver mais plataformas e acordos de cooperação, é claro que o relacionamento se tornará mais estreito. Isso pode exigir cautela por parte dos Estados Unidos.

Da perspetiva atual, tanto os países quanto a América Latina como um todo, estão contando com uma autodeterminação estratégica elevada. Por que digo isso? A ascensão do Sul global faz com que um grupo de irmãos pobres possa se levantar agora e lutar por seus próprios direitos. Para os países na posição desfavorecida, é uma tendência que eles se ajudem uns aos outros. Com a ascensão coletiva do Sul Global, o grupo ganha mais força.

Há um terceiro ponto que envolve o próprio relacionamento entre os Estados Unidos, a América Latina e o Caribe, com uma história de mais de 200 anos. Todo esse processo já deu uma lição muito clara: é impossível obter autodeterminação por meio de concessões. Quanto mais você se comprometer, menor será seu espaço de autodeterminação. Com base na experiência histórica, a CELAC aumentará ainda mais suas demandas por autodeterminação.

Nos últimos dois anos, a diplomacia brasileira tem se mostrado muito ativa e confiante, principalmente no que se refere à questão da hegemonia do dólar americano e da reforma do sistema monetário internacional, que vem sendo promovida por meio de swaps cambiais entre os países do BRICS, com o objetivo de impulsionar as relações comerciais entre si. Isso reflete num forte senso de autodeterminação.

É momento oportuno para concretizar a Ferrovia Bioceânica.

Comparado ao passado, a China agora está mais interessada e entusiasmada com a Ferrovia Bioceânica. Os países sul-americanos, incluindo o Brasil, também mostram o mesmo interesse.

Na verdade, a ideia de interligar a infraestrutura de toda a região surgiu há muito tempo. O que atrapalhou? A capacidade de investimento desses países é ainda insuficiente. Nesse caso, a reação positiva da China certamente promoverá o financiamento para projetos de infraestrutura na América do Sul.

Atualmente, o Banco de Desenvolvimento da China, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social do Brasil, bem como o Banco de Desenvolvimento da América Latina( o CAF), estão conduzindo negociações de financiamento para certos projetos de infraestrutura da América do Sul. Além disso, um componente importante de política econômica do governo Lula é o Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, que na prática, necessita ser alavancado através de investimento em infraestrutura.

Afinal de contas, quando olharmos a orientação de políticas dos dois lados, será possível alcançar um acoplamento perfeito.

·        Avanços tecnológicos da China encorajam outros países em desenvolvimento.

A ciência e tecnologia fazem parte importante da cooperação entre China, Brasil e América Latina. Por um lado, reflete o avanço da China em ciência e tecnologia, que conseguiu um progresso em chips, alcançando uma independência tecnológica, o que dá confiança a outros países em desenvolvimento. Ou seja, muitas coisas não são realizadas apenas pelos países desenvolvidos, mas também pelos países em desenvolvimento.

Em segundo lugar, os países latino-americanos têm um forte desejo e demanda por independência tecnológica, porque em áreas de ponta, a tecnologia é monopolizada pelos países desenvolvidos e, se eles quiserem usá-la, terão que pagar um custo muito alto. O governo de Lula também quer desenvolver tecnologia de chips e obter independência nessa tecnologia. Não podemos simplesmente importar chips dos países desenvolvidos, mas sim concretizar a independência nessa tecnologia.

Enfim, o Brasil também possui vantagens tecnológicas únicas, como agricultura tropical, extração de petróleo em águas profundas, vacinas, etc. Acredito que essas são áreas importantes de cooperação científica e tecnológica entre a China e o Brasil nos últimos anos. Se aproveitarmos essas vantagens, podemos quebrar o monopólio tecnológico dos países desenvolvidos. Necessitamos pensar em como combinar nossas vantagens para realizar uma cooperação eficaz.

¨      China deve anunciar R$ 27 bilhões em investimentos no Brasil

O presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), Jorge Viana, antecipou nesta segunda-feira, 12, que empresas chinesas devem anunciar investimentos superiores a R$ 27 bilhões no Brasil. A informação foi divulgada durante o Fórum de Negócios Brasil-China, realizado em Pequim.

O evento ocorre com a participação de representantes dos setores econômicos dos dois países e foi organizado a pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sendo tratado como o principal encontro bilateral dos últimos anos, de acordo com autoridades envolvidas. A iniciativa tem como foco o fortalecimento das relações comerciais e a ampliação da presença brasileira no mercado chinês.

“A China é o mais importante parceiro comercial do Brasil. O fluxo de comércio é de US$ 160 bilhões com a China, que hoje é o objeto de desejo para muitos produtos do mundo, por conta do volume de suas importações. O Brasil é um parceiro extraordinário… Os presidentes Lula, que agora preside os BRICS, e Xi Jinping, realizam um ambiente de negócios de mão dupla”, declarou Jorge Viana durante sua participação no fórum.

Os anúncios previstos englobam não apenas novos aportes no território brasileiro, mas também a ampliação do acesso de produtos brasileiros ao mercado chinês. A abertura de novos canais comerciais, segundo Viana, faz parte de uma estratégia de cooperação voltada para o longo prazo.

Entre os projetos estratégicos discutidos no fórum está a Ferrovia Bioceânica, considerada por Viana como essencial para o aumento da competitividade no transporte de mercadorias entre a América do Sul e a Ásia. O projeto prevê a conexão ferroviária entre o Brasil e o Oceano Pacífico, por meio do território peruano, alcançando o Porto de Chancay.

Segundo o presidente da ApexBrasil, a ferrovia funcionaria como alternativa ao Canal do Panamá, reduzindo o tempo e os custos logísticos das exportações sul-americanas ao mercado asiático. “Os chineses querem financiar essa ferrovia já faz alguns anos”, afirmou.

A proposta de ligação ferroviária contempla um traçado adaptado às características ambientais da região amazônica e visa diminuir o impacto ambiental em relação a outras rotas logísticas. “O projeto da ferrovia, chegando ao Porto de Chancay, no Peru, cria uma alternativa ao Canal do Panamá menos danos ao meio ambiente e que se adequa às condições da Amazônia”, explicou Viana.

O encontro em Pequim ocorre em meio a um cenário internacional marcado por disputas comerciais envolvendo grandes potências. De acordo com Viana, o ambiente bilateral entre Brasil e China é visto como um contraponto ao aumento de tarifas e barreiras comerciais promovido por outros países.

“A maior economia do mundo tensiona o planeta com tarifas e barreiras. Aqui ocorre um crescimento num mar tranquilo, com base na cooperação e no multilateralismo. Para os negócios, é tudo que uma pessoa quer”, disse.

As tratativas conduzidas durante o Fórum Brasil-China fazem parte de uma agenda mais ampla de fortalecimento da parceria estratégica entre os dois países, que inclui ações no âmbito do grupo BRICS, investimentos em infraestrutura, expansão do comércio agrícola e cooperação em setores tecnológicos.

Os detalhes completos dos novos investimentos e dos acordos comerciais serão formalizados ao longo dos próximos dias, com a participação de autoridades de ambos os países e representantes do setor privado.

Segundo a ApexBrasil, o relacionamento comercial com a China representa atualmente a maior fonte de receita para o setor exportador brasileiro. Entre os principais produtos embarcados estão soja, minério de ferro, petróleo bruto, carnes e celulose. Com a possível abertura de novos mercados, outros segmentos poderão ser incluídos nas pautas de exportação.

O governo brasileiro também vê nas parcerias com empresas chinesas uma oportunidade para impulsionar setores como energia, logística, manufatura e tecnologia. A expectativa, segundo interlocutores do governo, é que os acordos firmados nesta edição do fórum gerem efeitos de médio e longo prazo sobre o desempenho da balança comercial brasileira.

O Fórum Brasil-China é promovido pela ApexBrasil em parceria com o Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC) e autoridades do governo chinês, e reúne empresários, investidores, diplomatas e membros dos governos dos dois países. A programação inclui rodadas de negócios, apresentações institucionais, painéis setoriais e encontros bilaterais.

O evento também marca uma etapa da presidência brasileira no BRICS, grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, sob a liderança de Lula neste ano. A articulação com a China, nesse contexto, é considerada estratégica para consolidar uma frente de cooperação multilateral e de ampliação da influência comercial do Brasil no continente asiático.

Brasil e China firmam acordo bilionário para aviação verde

Em sua quarta visita de Estado à China – a terceira em pouco mais de dois anos –, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abriu, nesta segunda-feira (12), sua agenda oficial em Pequim. O líder brasileiro participou de quatro audiências com executivos de empresas chinesas ligadas aos setores de energia sustentável e defesa. Os encontros resultaram no anúncio de investimentos de US$ 1 bilhão na produção de SAF (combustível renovável para aviação) por meio da Envision Group, e na criação de um Centro de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em parceria entre a Windey Technology e a Senai-Cimatec na área de energia renovável.

“O presidente atendeu separadamente várias empresas que vão investir no Brasil, fazer parcerias com instituições brasileiras, montar centros de pesquisa, e gerar desenvolvimento de tecnologia na área de energia”, disse o ministro Rui Costa (Casa Civil), ao final dos encontros.

“Concluímos uma audiência com um anúncio de investimento de US$ 1 bilhão para a produção de SAF a partir da cana-de-açúcar no Brasil. O Brasil se tornará um dos maiores produtores de combustíveis verdes de aviação”.

O SAF é uma alternativa ao combustível aeronáutico de origem fóssil, produzido a partir de matérias-primas e processos que atendam a padrões de sustentabilidade.

“Nós assinamos aqui um centro de P&D com a SENAI CIMATEC na área de energia renovável”, continuou o ministro.

“Todas essas sinergias buscam fazer parcerias na área de desenvolvimento tecnológico, incluindo formação de talentos e a instalação de centros de pesquisa e produção no Brasil.”

Entre os acordos, estão iniciativas cruciais que envolvem energia renovável, energia eólica, solar, projetos híbridos e armazenamento em território brasileiro. “O Brasil é um dos países que mais investiu em eólico e solar, mas hoje é carente de poder armazenar essa energia”.

Para o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, “o presidente veio à China para, mais uma vez, fortalecer essa relação bilateral tão fundamental para o desenvolvimento e para a convergência de ambos os países”. Ele também revelou que outros investimentos deverão ser anunciados ainda durante esta visita de Estado.

COMÉRCIO AGRÍCOLA

Os dois governos têm mantido contatos para ampliar e diversificar a pauta comercial agrícola. Em março deste ano, as autoridades sanitárias chinesas anunciaram a habilitação de 38 novos frigoríficos brasileiros exportadores de carne, o maior número de plantas autorizadas de uma só vez na história: 24 plantas produtoras de carne bovina, oito de carne de aves e um estabelecimento de carne bovina termoprocessada, além de cinco entrepostos (um de carne bovina, três de frango e um de suínos). Antes dessa leva de autorizações, o Brasil tinha 106 plantas habilitadas para a China: 47 de aves, 41 de bovinos, 17 de suínos e 1 de asininos. A China foi o destino de mais de um terço de toda a exportação do agro brasileiro (36,2%) em 2024.

INVESTIMENTO

A China figura entre as principais fontes de investimento estrangeiro direto no Brasil. Destacam-se os investimentos nos setores de eletricidade e de extração de petróleo, bem como de transportes, telecomunicações, serviços financeiros e indústria. Desde 2003, de acordo com o Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), o Brasil foi o principal destino de investimentos chineses na América Latina (39% do total). O CEBC estima que, entre 2007 e 2023, os investimentos chineses no Brasil tenham chegado a US$ 73,3 bilhões, resultado de 264 projetos nas cinco regiões do país. Do total de investimentos chineses no Brasil destinados à indústria, destacam-se sobretudo a automotiva, eletroeletrônica e de máquinas e equipamentos. Os 93 projetos industriais e de tecnologia da informação equivalem a 36% do número total de empreendimentos chineses no Brasil.

 

Fonte: CMG/O Cafezinho

 

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