Vanderlei Tenório: A mídia como ferramenta de guerra
Muitas vezes, nossas opiniões nos foram habilmente
sugeridas pela manipulação da mídia sem que tivéssemos plena consciência disso.
A mídia usa métodos sutis para implantar crenças em nós, enquanto nos faz
acreditar que elas nos pertencem, que nós as escolhemos.
Sob esse olhar, as motivações para a manipulação da
mídia podem ser diferentes, mas, na maioria das vezes, visam à criação de
cidadãos submissos. Aqueles que ignoram informações importantes e não conhecem
seus direitos geralmente não criam problemas para a estabilidade do sistema
político e econômico.
A disseminação de notícias falsas ou a ênfase em
casos limítrofes serve para criar divisões. O amplo espaço dado às opiniões
infundadas ou lógicas difundidas pelas grandes agências de notícias servem
justamente para isso.
Nessa perspectiva, o primeiro meio usado para
direcionar a opinião pública em um sentido ou outro é o alarmismo. Em
consideração a isso, palavras como alarme, guerra, genocídio, ataque,
terrorismo, emergência e perigo são usadas com muita frequência pela mídia
homogênea mundial. Tais palavras servem para fazer as pessoas se sentirem
inseguras e gerar um medo sutil constante nelas.
Outro método eficaz é focar a atenção em notícias
que geram uma forte resposta emocional. As questões que poderiam desencadear
uma reação das massas contra o establishment ficam em segundo
plano para estimular debates inúteis sobre fatos que, infelizmente, não podem
mais ser alterados.
Nesse cenário, a concepção da (falsa)
superinformação é outra técnica de manipulação midiática. Hoje, falamos até a
exaustão sobre um assunto para dar ao ouvinte a impressão de que ele sabe o
suficiente, muito, demais.
Porém, na realidade, as mesmas coisas são repetidas
várias vezes e nada é explicado. Isso é para evitar que o cidadão tenha o
desejo de se aprofundar, buscando informações em outros lugares e, portanto,
construindo um pensamento autônomo sobre ela.
Outro artifício estruturante é o de extrapolar uma
notícia do contexto, o que é útil para direcionar a opinião pública.
Tal artifício é presente na construção narrativa
das guerras. Quando isso acontece, observe que, geralmente apenas o número de
vítimas e os locais são divulgados.
Nesta circunstância, a situação política, social e
econômica desses países nunca é explicada, muito menos os reais motivos que
levaram à violência.
Infelizmente, atualmente, estamos observando isso
presente em todos os noticiários nacionais e internacionais através
da Guerra da Ucrânia e agora do Conflito em Israel.
Sejamos sinceros, para manipular o que pensamos,
basta uma escolha cuidadosa de imagens, palavras ou tom. Desta forma, podemos
automaticamente despertar aprovação ou dissidência para o assunto em questão.
Falando em conflito em Israel, percebo uma
distorção no que se refere à produção de informações equivocadas.
Não sei quanto a você, mas sinto certo desconforto
ao examinar a forma como as notícias relacionadas ao conflito são divulgadas,
especialmente nos últimos dias.
Embora haja uma pretensa “neutralidade”, a questão
palestina e o suposto heroísmo israelita ainda mantêm uma presença dominante.
Paira no ar a omissão de fatos relevantes, entrevistas desequilibradas e
informações incorretas, manipuladas e incompletas. Tudo isso parece enraizado
em uma simplificação maniqueísta.
Nesse ponto, causa-me indignação o modo como os
confrontos no Oriente Médio são abordados pela grande imprensa ocidental.
É imperativo situarmos a atual situação política no
contexto histórico, desde a Nakba em 1948 até a ocupação da Cisjordânia, o
confisco de terras, a imposição da colonização ao povo palestino e a
desconsideração e humilhação dos habitantes árabes de Jerusalém e da
Cisjordânia.
Não estou aqui para defender o Hamas, muito pelo
contrário.
No entanto, afirmar que a atual escalada é
exclusivamente responsabilidade do Hamas é uma análise simplista. É crucial
reconhecer que devemos cessar a prática de absolver o Estado de Israel de suas
responsabilidades neste conflito.
Por esse ângulo, em relação a notícias, até mesmo o
espaço dado as coberturas internacionais, em especial as de guerra, nos
telejornais – principalmente os de horário nobre – faz parte da manipulação da
mídia, pois confunde as pessoas no conceito de informação. Infelizmente, a
velha dicotomia do bem e do mal, do herói e do vilão, ainda vende muito.
Não é por acaso que nunca ouvimos falar de certos
assuntos muito mais importantes nos noticiários televisivos e nos jornais
impressos, como a senhoriagem bancária, a produção e exportação de armas, e as
atividades do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Logo, graças à manipulação da mídia, as pessoas não
sabem que não sabem. Assistindo TV, lendo jornais ou obtendo informações nas
redes sociais, a maioria de nós está convencida de que sabemos e, acima de
tudo, que estamos definitivamente do lado certo.
Além de que, os meios de comunicação de massa
(rádio-TV-Web) tornaram-se decisivos na criação do senso comum.
Para tanto, a eficácia da manipulação midiática não
depende de símbolos ou metáforas como tais, mas de sua capacidade de criar um
contexto emocional favorável à aceitação de mensagens comerciais e
principalmente políticas (essas diretas e indiretas).
Nesse sentido, a opinião pública é presa na teia da
propaganda política, recebendo apenas estereótipos, ou seja, representações
simplistas da realidade. Sob essa lógica, as redes sociais se tornaram um
terreno fértil para a opinião pública.
Desde a compra do extinto Twitter pelo empresário
multibilionário Elon Musk, passando pela Guerra na Ucrânia, as redes sociais
são amplamente empregadas na manipulação de opiniões, o que molda a mídia e
como ela irá manipular os receptores (nós).
Detalhando melhor esse ponto para análise, as
eleições de 2022 no Brasil foram marcadas por uma intensa manipulação da
opinião pública.
A partir da metodologia do
matemático francês David Chavalarias, do Centro de Análise de Matemática
Social (CAMS), da Escola de Estudos Avançados em Ciências Sociais da França
(EHESS) os três principais tipos de manipulação observados foram:
- Disseminação
de informações falsas: esse é o tipo mais clássico
de manipulação, que envolve a disseminação de informações falsas com o
objetivo de influenciar o voto. Um exemplo disso foi a utilização da
narrativa de que o presidente Lula é um “ex-presidiário” para semear
dúvidas sobre sua idoneidade.
- Divulgação
de dados pessoais ou internos: esse tipo de manipulação
consiste em revelar dados pessoais ou internos de determinados partidos
políticos imediatamente antes de uma eleição, sem dar tempo para verificar
as acusações. Um exemplo disso foi a utilização dos 580 dias em que o
presidente Lula passou preso, que foi usado para criar a narrativa de que
ele é um criminoso inapto para governar.
- Multiplicação
de mensagens online: esse tipo de manipulação
consiste na multiplicação de mensagens online contendo informações
tendenciosas. Geralmente, essas manipulações são realizadas sem revelar a
identidade do autor, ou até mesmo sugerindo outra identidade. Um exemplo
disso foi a rede de desinformação que espalhou notícias falsas e
deturpadas pró-Bolsonaro pelo aplicativo WhatsApp durante as eleições do
ano passado.
É importante destacar que essas técnicas de
manipulação podem ter um impacto decisivo na opinião pública, podendo
influenciar o resultado de eleições e referendos. É por isso que é importante
estar atento a essas técnicas e combatê-las.
Posto isto, a mídia, embora uma ferramenta para o
desenvolvimento da participação democrática, torna-se um risco potencial para a
democracia. Em resumo, a saber, a mídia de notícias e o governo estão
entrelaçados em um círculo vicioso de manipulação mútua, criação de mitos e
interesse próprio.
Jornalistas, analistas e opinião pública precisam
de crises para dramatizar as notícias, e os funcionários dos governos das
grandes potências hegemônicas precisam parecer estar respondendo às
crises.
Enfim, muitas vezes, as crises não são realmente
crises, mas fabricações conjuntas. As duas instituições tornaram-se tão
enredadas em uma teia simbiótica de mentiras que os meios de comunicação são
incapazes de dizer ao público o que é verdade e os governos democráticos são
incapazes de governar efetivamente.
Fonte: O Cafezinho
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