Condenadas pelo 8 de janeiro tentam fugir
para o Uruguai
Pelo menos três
manifestantes que depredaram o Palácio do Planalto no dia 8 de janeiro de 2023 e
aguardam o fim de seus julgamentos no Supremo Tribunal Federal tentaram fugir
para o Uruguai no dia 16 de janeiro. Elas pediram refúgio político no país por
meio do consulado uruguaio em Santana do Livramento (RS), cidade que faz
fronteira com o país vizinho.
As informações foram
repassadas ao Brasil de Fato por fontes e confirmadas pelo
advogado das manifestantes. Procurada no dia 19 de janeiro, a embaixada do
Uruguai só retornou os contatos da reportagem na última sexta-feira (26/01),
sem confirmar ou negar a informação. O órgão alega que os pedidos de refúgio
político tramitam sob sigilo.
"Cabe lembrar
dois princípios fundamentais da figura do refúgio, nomeadamente: o princípio da
não rejeição na fronteira e a confidencialidade. A primeira garante que
qualquer controle migratório se absterá de proibir a entrada em território
nacional de qualquer pessoa que manifeste a intenção de solicitar refúgio. Esta
disposição será aplicável mesmo quando o requerente não possua a documentação
exigida pelas disposições legais de imigração ou esta seja visivelmente
fraudulenta ou falsificada", disse a embaixada em nota. As três
brasileiras que tentaram fugir estão com o passaporte retido por ordem do
Supremo Tribunal Federal (STF).
As manifestantes são
Alethea Verusca Soares, condenada em 27 de novembro pelo STF a 16 anos e seis
meses de prisão; Rosana Maciel Gomes, condenada em 10 de novembro a 13 anos e
seis meses de prisão; e Jupira Silvana da Cruz Rodrigues, cujo julgamento foi
suspenso no dia 3 de outubro após um pedido do ministro André Mendonça para
levar o julgamento do plenário virtual para o plenário físico da corte.
As três respondem
pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático, golpe de estado, dano
qualificado, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada.
No caso de Alethea e Rosana, apesar da condenação, os processos ainda não transitam
em julgado, isto é, não se encerraram as possibilidades de recursos.
O julgamento de Jupira
começou no plenário virtual, com voto de Alexandre de Moraes pela condenação a
14 anos de prisão. O relator foi seguido pela maioria dos ministros: Edson
Fachin, Rosa Weber, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Cristiano
Zanin. Como André Mendonça pediu que o caso fosse destacado para o plenário
físico, o processo ainda não foi encerrado.
·
‘Buscam ficar legalizadas em outro
país’
Por meio de nota, o
advogado Hélio Júnior, representante das três, confirmou a tentativa de fuga e
disse que elas já não estão mais no Uruguai. "Tomei conhecimento que foram
pedir refúgio político em outro país. Elas foram condenadas sem provas e agora
buscam ficar legalizadas em outro país. Todas foram torturadas física e
psicologicamente na Colmeia e temem por suas vidas". O atual paradeiro das
mulheres não foi informado.
Presas no Palácio do
Planalto no dia 8 de janeiro de 2023, elas chegaram a ficar sete meses detidas
na Colmeia, a penitenciária feminina do Distrito Federal. Na nota, o advogado,
que representa outros envolvidos no 8 de janeiro, ainda afirma que "a grande
maioria dos meus assistidos permanecem no país cumprindo rigorosamente as
regras estabelecidas pelo STF".
Segundo apurou o Brasil
de Fato, as três teriam ido buscar refúgio no país vizinho juntas com
outras duas mulheres, ainda não denunciadas por envolvimento no 8 de janeiro. O
grupo pediu refúgio no consulado do Uruguai em Santana do Livramento, cidade
gaúcha que faz fronteira física com Rivera, no Uruguai, e por meio da qual é
possível chegar ao país vizinho sem sequer passar pelos controles de fronteira,
já que as cidades se encontram e há até uma praça internacional na região com
uma parte no Brasil e outra no Uruguai.
No consulado, elas
teriam informado que há um grupo de 84 pessoas com os mesmos objetivos de
buscar refúgio no país, atualmente governado pelo presidente conservador Luis
Lacalle Pou.
A reportagem também
entrou em contato por e-mail com o Itamaraty, a Polícia Federal e o Ministério
da Justiça sobre o caso, mas não obteve retorno.
Confira abaixo a
íntegra da nota encaminhada pela Embaixada do Uruguai no Brasil:
"De acordo com o
disposto na Lei 18.076 de 2006, marco integral para o refúgio no Uruguai, toda
pessoa tem o direito de solicitar refúgio no território nacional, para
salvaguardar sua vida, integridade física, moral e intelectual, liberdade e
segurança. Este direito está consagrado no seu artigo 1.º.
Também cabe lembrar
dois princípios fundamentais da figura do refúgio, nomeadamente: o princípio da
não rejeição na fronteira e a confidencialidade. A primeira garante que
qualquer controle migratório se absterá de proibir a entrada em território
nacional de qualquer pessoa que manifeste a intenção de solicitar refúgio. Esta
disposição será aplicável mesmo quando o requerente não possua a documentação
exigida pelas disposições legais de imigração ou esta seja visivelmente
fraudulenta ou falsificada (art. 12).
Em referência à
confidencialidade, o artigo 17 estabelece que a Comissão para os Refugiados, o
seu Secretariado Permanente e os seus membros não podem fornecer qualquer
informação relacionada com requerentes ou refugiados. Todas as informações
recebidas de ou sobre requerentes e refugiados são confidenciais. Só poderá ser
revelada mediante autorização expressa e escrita do interessado ou por
deliberação fundamentada da Justiça competente.
Deve-se notar que as
regulamentações nacionais se baseiam tanto na Convenção relativa ao Estatuto
dos Refugiados de 1951 e no seu Protocolo de 1967, como na Declaração de
Cartagena de 1984.
Tanto na
regulamentação nacional como no direito internacional, a confidencialidade dos
pedidos, bem como o estatuto de refugiado, goza da mais absoluta
confidencialidade. Isto é instrumentalmente reforçado no Manual do ACNUR para a
Determinação do Estatuto de Refugiado, que estabelece que a confidencialidade
do pedido, o resultado da determinação do caso, bem como todas as informações
recolhidas no decurso do mesmo, deve permanecer estritamente confidenciais.
Portanto, é
inadmissível qualquer pedido de terceiro relativamente ao pedido ou ao seu
estatuto, circunstância agravada quando provém do país onde os requerentes
consideram que está em perigo a salvaguarda da vida e da sua integridade
física, moral e intelectual.
Ressalte-se que de
acordo com a normativa anteriormente citada (Lei 18.076) a violação do sigilo é
tipificada como crime, prevendo pena de três meses de reclusão a três a três
anos de reclusão.
Com base no exposto,
na regulamentação nacional vigente e nos compromissos assumidos a nível
internacional, entende-se que o Uruguai não está autorizado a fornecer
informações sobre a existência de pedidos de refugiados ou o estado dos seus
procedimentos".
Fonte: Brasil de Fato
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