PF coloca as mãos em Jair e Carlos
Bolsonaro com investigação sobre Ramagem
A Operação Vigilância
Aproximada, que cumpriu mandado de busca e apreensão na casa, no apartamento
funcional e no gabinete do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), deixa a
Polícia Federal (PF) a um passo de desvendar a estrutura criminosa montada por
Jair Bolsonaro (PL) e pelo filho, Carlos, dentro do Palácio do Planalto.
Criado em julho de
2020, o Centro de Inteligência Nacional (Cin), subordinado à Agência Brasileira
de Informação (Abin) comandada por Ramagem, atuava como o "sistema particular" de
arapongagem do clã Bolsonaro no coração do governo.
Antes de ser
oficializada, a "Abin paralela" chegou a ser verbalizada por
Bolsonaro na fatídica reunião ministerial de 22 de abril do mesmo ano, tornada
pública em meio à briga judicial com o ex-ministro da Justiça, Sergio Moro
(União-PR), que deixou o governo acusando o então presidente de interferência
na PF.
Na reunião, Bolsonaro
justificou as trocas de comando na corporação dizendo que "eu não vou
esperar foder a minha família toda".
"Eu não vou
esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não
posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura
nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o
chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra
brincadeira", afirmou, em um surto com os comandados.
Bolsonaro ainda
reclamou: "Pô, eu tenho a PF que não me dá informações" e disse ter
"poder e vou interferir em todos os ministérios, sem exceção".
Após as queixas por
não obter dados sobre investigações em curso, o então presidente revelou que
tinha um "sistema particular" de informações.
“O meu particular
funciona. Os que têm oficialmente, desinformam. E voltando ao tema: Prefiro não
ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu
tenho”, disse.
• "Abin paralela"
As investigações da
Polícia Federal mostram que o desejo de Bolsonaro se concretizou com o auxílio
imprescindível de Ramagem, que teria montado uma "organização criminosa
que se instalou na Abin com o intuito de monitorar ilegalmente autoridades públicas
e outras pessoas, utilizando-se de ferramentas de geolocalização de
dispositivos móveis sem a devida autorização judicial".
Apelidado de
"Abin Paralela", o Cin foi criado com a justificativa de monitorar
“atividades e políticas de segurança pública e a identificação de ameaças
decorrentes da atividade criminosa”.
Capitaneada por
Ramagem, a estrutura de arapongagem usou o sistema FirstMile, que aglutinava
dados em nuvem da empresa de Israel, para monitorar cerca de 30 mil políticos,
autoridades, professores, pesquisadores, juristas e jornalistas críticos a
Bolsonaro e que eram considerados como ameaças. Segundo a PF, os arapongas
também invadiam em massa computadores de adversários políticos e de autoridades
que não se alinharam a Bolsonaro.
Segundo a PF, há
indícios de que os ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, do Supremo
Tribunal Federal (STF), tenham sido alvos da espionagem ilegal.
Ainda de acordo com os
investigadores, os arapongas obedeciam ordens direta de Ramagem que, por sua
vez, era subordinado ao ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional
(GSI), o general Augusto Heleno, e ao presidente, Jair Bolsonaro (PL).
• Ramagem e o clã Bolsonaro
Formado em Direito,
Ramagem entrou para a Polícia Federal (PF) em 2005 e, como delegado, se
especializou no combate ao tráfico de drogas, antes de entrar para a equipe da
PF que atuava na operação Lava-Jato no Rio de Janeiro, em 2017.
No posto, começou a se
interessar pelo submundo da política e e coordenou a operação “Cadeia Velha”
que prendeu a cúpula do MDB na Alerj: os ex-deputados estaduais Jorge Picciani,
Paulo Melo e Edson Albertassi.
Após a vitória de
Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018, Ramagem foi escalado para
coordenar a segurança pessoal do presidente eleito, quando se aproximou de
Carlos Bolsonaro.
A proximidade com o
vereador - com quem passou o reveillon de 2018 para 2019 - fez com que Ramagem
fosse alçado, em março como assessor da Secretaria de Governo, subordinado ao
então ministro, o general Carlos Alberto Santos Cruz.
Enquanto montava o
chamado Gabinete do Ódio no Palácio do Planalto, Carlos Bolsonaro ficou cada
vez mais íntimo do delegado da PF.
À época, a instalação
de uma "Abin paralela" já fazia parte dos planos do filho
"02" de Jair Bolsonaro.
O desejo de Carlos
Bolsonaro foi revelado em entrevista ao Roda Viva pelo ex-secretário geral da
Presidência, Gustavo Bebianno, no dia 3 de março de 2020. Bebianno morreu 11
dias depois da entrevista.
Na ocasião, o
ex-secretário geral da Presidência revelou que o filho de Bolsonaro articulava
com "um delegado da PF" a montagem da Abin paralela logo nos
primeiros meses de governo.
"Um belo dia o
Carlos Bolsonaro aparece com um nome de um delegado federal e três agentes que
seriam uma Abin paralela. Isso porque ele não confiava na Abin".
Ainda segundo o
ex-secretário, ele e o general Santos Cruz afirmaram a Bolsonaro que eram
contra a ideia.
"O general Heleno
(chefe do gabinete Institucional da presidência) foi chamado. Ficou preocupado.
Mas ele não é de confronto e o assunto acabou comigo e o general Santos Cruz.
Nós aconselhamos o presidente a não fazer aquilo porque também seria motivo de
impeachment. Eu não sei se isso foi instalado porque depois eu acabei saindo do
governo".
Questionado se o
delegado seria o atual diretor da Abin, Alexandre Ramagem, Bebianno preferiu
não responder. “Eu lembro o nome do delegado. Mas não vou revelar por uma
questão institucional e pessoal”, afirmou.
Na mesma entrevista,
Bebianno revelou que Carlos Bolsonaro comandava o Gabinete do Ódio.
“Eu disse ao
presidente que as notícias falsas não podiam estar dentro do Planalto porque
poderiam dar em impeachment. Mas a pressão que o Carlos faz é tão grande que o
pai não consegue se contrapor ao filho. É como aquela criança que quer um
presente no shopping, esperneia e o pai não tem pulso para dizer não”, contou.
• Gabinete do ódio e "Abin
paralela"
Após se aproximar de
Ramagem e em meio à tentativa de criar a "Abin paralela" para atuar
junto ao Gabinete do Ódio, Carlos Bolsonaro instalou a primeira grande crise no
Planalto.
O alvo era justamente
o general Carlos Alberto dos Santos
Cruz, que se opôs aos planos do filho de Bolsonaro e foi demitido em 13 de
junho de 2019.
Menos de um mês
depois, Ramagem foi nomeado por Bolsonaro como diretor-geral da Abin e, sob o
aval de Augusto Heleno, iniciou a instalação da Organização Criminosa que virou
alvo da PF - e resultou na ação contra o agora deputado federal nesta
quinta-feira (25).
A investigação da PF
segue a mesma linha de raciocínio exposta por Bebbiano e escancara a relação
espúria com o clã Bolsonaro que fez Ramagem alavancar sua carreira política e
se lançar pré-candidato à prefeitura do Rio - tendo como coordenador de redes sociais,
Carlos Bolsonaro.
Cabe destacar alguns
fatos que levam luz ao que Bebianno deixou de revelar com sua morte 11 dias
após revelar a atuação de Carlos Bolsonaro no Gabinete do Ódio e dos planos de
implantar, juntamente com Ramagem, uma Abin paralela.
Vamos a eles:
• O software FirstMile, usado pela
"Abin Paralela", foi comprado com dispensa de licitação pelo general
Walter Braga Netto no final de 2018, ainda durante o governo Michel Temer
(MDB), quando o militar comandava o Gabinete de Intervenção Federal no Rio de
Janeiro;
• A compra do software junto à empresa
israelense Cognyte, que integra o grupo Veinrt Systems Inc e tinha como
representante no Brasil Caio Santos Cruz, filho do general Santos Cruz;
• Segundo a PF, a estrutura foi montada
para obter, entre outras informações, dados de investigações envolvendo os
filhos de Bolsonaro, especialmente Flávio Bolsonaro - no caso do esquema de
corrupção das "rachadinhas" - e de Jair Renan.
• Segundo as investigações, "o estado
brasileiro, portanto, efetuou o pagamento de R$ 5 milhões para que empresa
estrangeira realizasse ataques sistemáticos contra a rede de telefonia nacional
para comercializar dados pessoais sensíveis que resultaram na disponibilização
da geolocalização de diversos brasileiros sem qualquer ordem jurídica”.
• Presos em outubro, os agentes Rodrigo
Colli e Eduardo Arthur Yzycky teriam coagido colegas que tinham conhecimento do
suposto esquema de arapongagem para evitar uma possível demissão.
• Ainda de acordo com as investigações,
Alexandre de Moraes era um dos alvos do sistema de arapongagem e a espionagem
teria sido feita, inclusive, durante o período da pré-campanha eleitoral.
Com a investigação
contra Ramagem, a PF aprofunda o que Bebianno revelou antes de morrer e coloca
os dois pés no gabinete do ódio montado pelo clã Bolsonaro no coração do
Palácio do Planalto.
Lira se distancia de bolsonaristas após
operação da PF
A espionagem de
autoridades feita por Bolsonaro acaba com o movimento de seus deputados contra
o STF. A operação de hoje contra Ramagem e outros membros da ABIN é a pá de cal
na pressão que os bolsonaristas queriam fazer, contando com o patrocínio do presidente
da Câmara.
O jogo virou.
Arthur Lira nem
compareceu à reunião da bancada do PL ontem, além de ter sido avisado sobre a
operação por Alexandre de Moraes.
Agora é a própria
Câmara que vai pedir a cabeça de Ramagem. E o Senado também vai pra cima.
Nenhum parlamentar admite ser espionado. A revolta é coletiva.
Como consequência
imediata, está descartada a solidariedade a Jordy e outros deputados da
extrema-direita envolvidos com a tentativa de golpe.
Lira é conservador,
mas não é burro. Entre Xandão e meia dúzia de aloprados, sabe muito bem de que
lado deve estar.
Após estouro de escândalo de espionagem
na Abin, governo exonera delegado da PF investigado no caso
Após o estouro do
escândalo que envolve o uso político da Agência Brasileira de Inteligência
(Abin) pelo governo Bolsonaro, a gestão Lula exonerou o delegado Carlos Afonso
Gonçalves Gomes Coelho do cargo de coordenador de Aviação Operacional da
Polícia Federal (PF). A função responde pelo apoio às ações aéreas do órgão.
A dispensa de Coelho
vem após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) desta quinta (25) que
afastou o delegado de suas funções. O despacho de exoneração foi oficializado
pelo Ministério da Justiça no Diário Oficial da União (DOU) nesta sexta (26).
Coelho está entre os
nomes suspeitos de participação no esquema da "Abin paralela", uma
espécie de núcleo de agentes que teriam colaborado com ações ilegais de
monitoramento de inimigos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) durante sua
gestão. Apurações da Polícia Federal apontam também para o envolvimento do
deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) no caso. Na época, ele atuava no
comando da Abin. Em manifestações dadas à imprensa, o parlamentar negou relação
com o crime.
As investigações da PF
mostram que os envolvidos no caso utilizaram um software israelense chamado
"First Mile", que utiliza uma tecnologia capaz de exercer vigilância
sobre 10 mil celulares a cada ano. O grupo teria monitorado diferentes autoridades
públicas, incluindo o então presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia
(DEM-RJ), os ministros do STF Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, a promotora
de Justiça Simone Sibilio, que atuou no caso Marielle Franco, entre outras
pessoas.
Carlos Afonso Coelho
ocupava o cargo de coordenador de Aviação Operacional desde outubro de 2023 e,
portanto, já na atual gestão de Andrei Passos como diretor-geral da Polícia
Federal. Ele também esteve entre os alvos dos mandados de busca e apreensão cumpridos
pela PF na quinta (25) no âmbito da Operação Vigilância Aproximada, que atingiu
ainda Alexandre Ramagem e cumpriu 21 mandados e medidas cautelares autorizados
por Alexandre de Moraes.
Fonte: Fórum/Brasil de
Fato
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