Como a ditadura nazista usava o esporte para
seus objetivos
Neste mês de maio comemoram-se 80 anos do
final da Segunda Guerra Mundial, data que vem sendo lembrada com retrospectivas
históricas sobre a ditadura nazista que governava a Alemanha e buscava
controlar esferas variadas da vida dos seus cidadãos, inclusive o esporte.
Os nazistas em geral usavam outro termo para
se referir ao esporte: "educação física". O objetivo principal era
promover a saúde e a eficiência – para uma economia produtiva e estar apto para
a guerra. Os esportes individuais ficavam em segundo plano.
Tratava-se do coletivo, da massa, do chamado
volkskörper ("corpo nacional"), para o qual cada alemão, como
indivíduo, deveria contribuir da melhor maneira possível. Fiel à ideologia
nazista, o que sempre importava era a força e a capacidade de se defender.
"Os fracos devem ser massacrados",
diz uma citação atribuída a Adolf Hitler. "Nos meus campos de treinamento,
crescerá uma juventude que assustará o mundo. Quero uma juventude violenta,
dominadora, destemida e cruel. (...) Eu os treinarei em todos os exercícios
físicos."
Esses exercícios físicos eram obrigatórios em
muitas organizações coletivas nazistas, como a Juventude Alemã (DJ) e a
Juventude Hitlerista (HJ), entre outras. Também era recomendado se tornar
membro de um clube esportivo.
Na Juventude Hitlerista, mas também no
esporte escolar, os exercícios físicos serviam, especialmente entre os garotos,
para formar um comportamento militar e de soldado e selecionar os jovens que
mais tarde poderiam ser considerados para posições de liderança na Wehrmacht,
as Forças Armadas da Alemanha nazista.
Mas os nazistas tinham uma visão crítica de
competições esportivas internacionais, especialmente em sua fase inicial.
"Isso representava a internacionalidade, o movimento olímpico, a união, a
compreensão internacional", diz o historiador Ansgar Molzberger, da
Universidade Alemã de Esportes de Colônia, à DW. "Isso foi rejeitado por
motivos ideológicos".
• Por
que os nazistas ainda sediaram os Jogos Olímpicos em 1936?
Os Jogos Olímpicos foram concedidos a Berlim
pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) em 1931, ainda durante a República de
Weimar. Os nazistas na época eram claros oponentes do movimento olímpico, o que
eles admitiam abertamente.
A ideia cosmopolita dos Jogos Olímpicos era
incompatível com sua visão de mundo. Competições atléticas com membros das
"nações inimigas" da Primeira Guerra Mundial iam contra seu senso de
honra. E eles rejeitavam, por racismo, os regulamentos do COI segundo os quais
judeus e negros eram iguais a outras raças.
No entanto, os que estavam no poder
rapidamente reconheceram – especialmente Hitler – a oportunidade que os Jogos
ofereciam para se apresentarem ao mundo como um Estado jovem, aberto e amante
da paz. "Eles fizeram uma reviravolta de tirar o fôlego", diz o
historiador Molzberger. "Assim como rejeitaram estritamente até o final da
era de Weimar o movimento olímpico, com seus ideais de entendimento entre os
povos e internacionalidade, eles agora se apresentavam como os grandes
apoiadores do movimento olímpico."
Além disso, eles queriam usar os Jogos para
demonstrar seus pontos fortes, boa organização e sucesso esportivo.
• Havia
algum esporte particularmente promovido pelos nazistas?
"Um esporte que pode ser explicitamente
destacado no contexto escolar foi o boxe, que os nazistas tornaram obrigatório
para meninos mais velhos", diz Molzberger. "Todos tinham que aprender
boxe nos esportes escolares."
Esportes coletivos, como futebol e handebol,
continuaram existindo, mas a ênfase sempre foi no aspecto combativo. "O
que importava era a capacidade de se defender, de ousar fazer algo em
conjunto", disse Molzberger. "Isso devia ser enfatizado repetidamente
também por meio de esportes coletivos."
• Como
era o esporte para mulheres e meninas?
As atividades esportivas para mulheres também
eram fortemente influenciadas pela ideologia. As mulheres eram limitadas
principalmente ao papel de mães e donas de casa. Para cumprir bem essas
funções, elas também deviam treinar seus corpos, melhorar sua saúde e
condicionamento físico e fortalecer sua disciplina.
A Liga das Meninas Alemãs (BDM), organizada
para meninas de 10 a 18 anos, também oferecia exercícios físicos que tinham
como objetivo treinar as meninas não apenas fisicamente, mas também
ideologicamente, e prepará-las para seu futuro papel na sociedade.
• Judeus
podiam praticar esportes?
Pouco depois da tomada do poder pelos
nazistas, foi aprovada uma lei em 7 de abril de 1933 segundo a qual os
funcionários públicos deveriam ser de ascendência ariana; caso contrário, não
poderiam mais trabalhar no serviço público.
O chamado "parágrafo ariano" foi
gradualmente expandido para excluir os judeus da vida profissional e social,
afetando médicos, estudantes, os serviços de rádio, a imprensa, os teatros e
outras instituições e associações culturais.
O parágrafo também se aplicava a clubes
esportivos, mas a liderança do Reich inicialmente não exigiu consistentemente
sua implementação tendo em vista os Jogos Olímpico de 1936 – eles não queriam
manchetes negativas e dar razões para um possível cancelamento dos Jogos ou
boicotes. Mas houve críticas e pedidos de boicote mesmo assim, que se
intensificaram após as Leis Raciais de Nurembergue serem aprovadas em 1935, que
mais tarde formaram a base legal para a perseguição e o extermínio dos judeus.
No entanto, muitos clubes e associações
esportivas nos quais a liderança era particularmente fiel ao regime nazista
implementaram o parágrafo ariano desde o início, por conta própria e em
obediência antecipada. Por exemplo, a Associação Alemã de Ginástica, na época a
maior associação esportiva alemã, com 1,5 milhão de membros, excluiu os judeus
apenas um dia após a aprovação da lei.
Outras associações, como de natação, remo e
esqui, seguiram o exemplo. A Federação Alemã de Futebol (DFB) reagiu de forma
menos radical e permitiu que os judeus continuassem jogando. No entanto, eles
não tinham mais permissão para ocupar cargos de liderança em clubes de futebol.
Um exemplo proeminente é Kurt Landauer, que foi presidente do Bayern de Munique
por muitos anos durante o período de Weimar e teve que deixar seu cargo em
1933.
Como resultado das exclusões, os clubes
esportivos judaicos cresceram muito entre 1933 e 1936, com novos associados.
Entretanto, quando os Jogos Olímpicos de 1936 terminaram, a situação dos judeus
na Alemanha piorou.
"Depois dos Jogos, já era possível tirar
a máscara", diz o historiador Ansgar Molzberger. "Com o início da
perseguição aos judeus propriamente dita a partir de 1938, o esporte judaico
também foi consistentemente destruído."
Fonte: DW Brasil

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