segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Hugo Albuquerque: é a política externa, estúpido

As eleições nacionais nos Estados Unidos deste ano serão tanto para presidente quanto para o Congresso – todas as cadeiras da Câmara e renovação parcial do Senado. A tendência é uma nova disputa entre Joe Biden, a pessoa mais velha a já ter vencido uma eleição presidencial, e o recordista anterior, Donald Trump – os dois últimos presidentes, dentro de um sistema eleitoral onde votam os estados, conforme seu peso, mais do que os cidadãos. 

Apesar de Biden ter vencido em 2020 com uma diferença de 7 milhões de votos – cerca de 5 pontos percentuais –, o que realmente determinou a vitória dele em 2020 foram as vitórias nos estados da Geórgia, Arizona e Wisconsin, que juntos lhe deram um saldo de míseros 40 mil votos. Se Trump tivesse revertido essa pequena margem, ele teria vencido no Colégio Eleitoral, embora continuasse perdendo nacionalmente por milhões de votos – graças ao sistema eleitoral.

Neste fevereiro de 2024, Trump lidera no agregado das pesquisas de voto popular, mas sua vantagem no Colégio Eleitoral é mais confortável, uma vez que ele está à frente nos estados-chave, os chamados swing states, os estados pendulares, nos quais a eleição realmente se decidirá. Em resumo, as maiorias eleitorais já estão consolidadas, restando uma margem pequena ainda em disputa entre Biden e Trump. Mas quem seria essa margem?

·        Os fiéis da balança

Segundo o Edison Group, o eleitorado evangélico branco dos Estados Unidos pulou para cerca de 28% do total em 2020 contra 26% de 2016 – mas, aparentemente, ele se tornou menos trumpista, apoiando o republicano em 76%, contra 81% de 2016. O eleitorado católico, entretanto, virou o voto, após dar uma surpreendente vitória para Trump em 2016 –  e aumentou sua participação em cerca de 2 pontos percentuais, chegando a 25% do total.

No geral, Biden venceu Trump por 52 a 47 entre os católicos (25% do total em 2020), enquanto Hillary perdeu de  45 a 52 nesse mesmo setor (23% do total em 2016). Isso explica a vitória de Biden por 5 pontos contra os 2 pontos de saldo positivo de Hillary, que foram insuficientes: ela perdeu de 304 a 227 votos no Colégio Eleitoral, enquanto Biden venceu por 306 a 232 em 2020. 

Dos 3 estados decisivos, Wisconsin e Arizona estão acima da média em católicos, mas na Geórgia a questão é o tamanho da participação eleitoral dos negros, geralmente muito pró-democrata. O fator católico, entretanto, está presente em outros estados vencidos por pequena margem em 2020, como Michigan ou Pensilvânia, cuja proporção de católicos é maior do que a média dos Estados Unidos – e eles são um raro eleitorado variável.

Assim, o Santo Graal do voto nos Estados Unidos poderia, muito bem, ser os católicos de origem irlandesa e italiana, cerca de metade do total. Ao contrário dos católicos hispânicos, eles poderiam optar por votar no Partido Republicano, pois não estariam tão dependentes de pautas como imigração e inclusão – e, assim, ter uma variação mais ligada ao desempenho econômico. Esse fator não estaria em função da economia?

·        Putin e a Palestina

Sim e não, é a economia, mas há de se tomar cuidado com a fala imortalizada pelo estrategista eleitoral de Bill Clinton em 1992, o famoso “é a economia, estúpido”. A questão, neste caso, é menos a gestão econômica direta e quais as grandes medidas que afetaram, economicamente, a vida financeira dos americanos nos últimos anos. Uma dica: a maior delas nos tempos recentes tem a ver com a política externa.

Joe Biden convenceu os americanos a derrotarem Vladimir Putin, o presidente russo, em uma guerra por procuração na Ucrânia, mas não atingiu seu objetivo até agora. E os efeitos econômicos da guerra, a inflação mais alta e, depois, o aumento do endividamento das famílias, gerou incômodo social e crítica à gestão econômica do governo – considerado o ponto mais fraco da administração Biden pelos eleitores em geral.

Porém, nem tudo é “economia” ou efeito econômico. O massacre cometido por Israel contra civis palestinos, na esteira dos ataques do Hamas de 7 de outubro de 2023, gerou manifestações em massa, as quais foram protagonizadas pela base eleitoral de Biden. O eleitorado democrata critica firmemente a ação de Israel, mas Biden atua em descompasso com sua base, assinando um cheque em branco ao premiê israelense Benjamin Netanyahu.

Em resumo, os católicos não-hispânicos, potencialmente flexíveis na hora do voto, estariam condicionados a uma economia que, no entanto, não flui em razão de uma decisão chave – mas a política externa dita também o interesse de setores mais progressistas, como no caso palestino; logo, temos um setor centrista atingido pela Rússia, enquanto potenciais e animais ativistas anti-Trump estão em convulsão por causa do apoio ou a complacência com Israel. 

·        Cui Bono?

Além de Trump, veremos possivelmente a candidatura independente de Robert Kennedy Jr, o sobrinho do ex-presidente John Kennedy, que parece emular um “trumpismo democrata” e tirar por igual votos dos dois candidatos. Já Cornel West veicula uma retórica de esquerda e muito crítica – que, possivelmente, tira votos de Biden. Nenhum dos dois parece ser capaz de vencer sequer em um estado; mas onde e de quem eles tiram votos pode sim fazer a diferença.

Nesse sentido, Biden entra em baixa no ano eleitoral, com um calcanhar de aquiles na área econômica – em razão dos efeitos de um conflito por procuração – e pela contradição performática no assunto palestino – que despertou muitos dos maiores protestos no país desde o Vietnã. Trump não parece ser solução para nada disso, mas se os eleitores democratas não estiverem felizes, eles simplesmente não irão às urnas ou não farão campanha.

A falta de opções e a repetição da disputa parece suscitar uma crise de renovação da classe dirigente americana, quando a única “novidade”, o trumpismo, nem é mais tão nova assim, além de sempre ter apelado para o passado – enquanto o movimento socialista local parece ter sido paralisado pelo establishment democrata. Biden e Trump, cada qual à sua maneira, parecem querer que tudo fique igual para que nada mude – em uma subversão curiosa de Lampedusa.

 

Ø  Abstenção e medidas rigorosas de imigração podem fazer Biden perder voto latino no Arizona

 

Em 2020, a mobilização dos eleitores latinos favoreceu a vitória estreita de Joe Biden no Arizona, um estado historicamente republicano, onde os latinos são o segunda maior comunidade. O país saía neste momento de uma presidência difícil, a de Donald Trump, que tinha como alvo os migrantes.

Esta semana, no Arizona, um grupo de representantes republicanos decidiu que a lei estadual precisava ser reforçada para localizar migrantes em situação ilegal. Grupos de direitos humanos latinos estão novamente em pé de guerra. É o caso da organização de esquerda “Lucha”, da qual Gina Mendez é diretora.

“Todos temos um familiar sem visto, outro que tem um pequeno negócio. Aproveitaremos esta oportunidade para fazer com que os eleitores latinos e os eleitores negros votem. Que todos que têm um familiar em situação ilegal possam votar”, disse Mendez, deixando entender, de maneira implícita, que espera que votem nos Democratas.

Ø  Democratas querem medidas mais rigorosas na fronteira

Mas o campo democrata também está mudando seu discurso sobre a fronteira com o México e prometendo medidas mais rigorosas, inclusive no que diz respeito aos requerentes de asilo. Essa situação causa preocupação. “Para mim, ao fazer isso, fechamos portas para oportunidades. Impedimos que as pessoas se unam, avancem e progridam. É impossível quando fechamos a porta para eles. Isto os leva a fazer coisas ilegais para ganhar liberdade e uma vida melhor”, lamenta José Alfredo Gimenez, filho de um imigrante mexicano que vive em Tucson.

Além da questão da gestão da migração, o histórico econômico de Joe Biden não joga a seu favor junto do eleitorado latino. Muitas pessoas culpam o atual presidente pelo aumento do custo de vida, seja do crédito para comprar uma casa ou um carro, ou mesmo do preço do combustível.

RFI não entrevistou nenhum ativista latino pró-Trump. Eles existem no Arizona, mas são minoria. O problema maior dos democratas no estado talvez seja a abstenção, já que não há muito entusiasmo pelas eleições. Várias pessoas entrevistadas disseram que provavelmente não votarão em novembro de 2024.

 

       Milei declara apoio à candidatura de Trump e arrisca a sua relação atual com Biden

 

Visivelmente emocionado e eufórico, o presidente argentino, Javier Milei, declarou o seu apoio político ao aliado Donald Trump num breve encontro pessoal durante a Conferência de Ação Política Conservadora à qual Milei viajou apenas horas depois de receber o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, cujo apoio é crucial para os desafios econômicos da Argentina nos próximos meses.

“O senhor foi um grande presidente e espero que ganhe. Espero vê-lo outra vez. Da próxima vez, como presidente”, declarou o presidente argentino ao republicano que pretende retornar à Casa Branca em janeiro de 2025 se derrotar o democrata Joe Biden na sua tentativa de reeleição em 5 de novembro.

“Eu também espero (ganhar)”, concordou Donald Trump entre abraços com Javier Milei.

A troca de confetes terminou com Donald Trump a repetir o seu clássico “MAGA”, mas trocando “America” por “Argentina”: “Make Argentina Great Again” (Faça a Argentina Grande Novamente). Ao que Javier Milei respondeu com o seu também tradicional “Viva La Libertad, carajo”.

•        Convidado estrela na “Trump Fest”

O encontro de apenas um minuto e meio nos bastidores da conferência aconteceu após discurso de Donald Trump, quem fez da sua apresentação um comício de campanha, a tal ponto que a conferência foi apelidada de “Trump Fest”. O republicano subiu ao palco três horas antes da palestra de Javier Milei, quem o esperava nos bastidores para o afetuoso abraço.

Logo no início do discurso em Washington, Trump deixou claro que Milei era o convidado da extrema-direita mais importante da conferência conservadora.

“Está aqui o presidente da Argentina, Javier Milei, que teve muita publicidade. É um grande senhor. Vocês sabem: ‘MAGA’, Make Argentina Great Again. Ele é um cara fabuloso e um dos poucos que pode realmente fazer (MAGA). Obrigado, Milei. Muito obrigado. É uma grande honra tê-lo aqui”, exaltou Trump.

Já nos bastidores, Milei retribuiu: “Presidente, é um grande prazer conhecê-lo. É uma grande honra para mim. Obrigado pelas suas palavras para comigo. Estou muito contente. (O senhor) é muito generoso”.

“Muito obrigado. Você está fazendo um grande trabalho”, elogiou Trump.

Javier Milei discursou a favor do “anarcocapitalismo” e contra a intervenção do Estado, que ele define como “socialismo”.

“Não deixem o socialismo avançar! Não aceitem as regulações! Não deixem o Estado crescer! Não permitam a agenda assassina do aborto! Não se deixem enganar pelos cantos de sereia da justiça social. Não entreguem as suas liberdades. Se não brigarem pela liberdade, serão levados à miséria”, finalizou Milei para uma plateia que o aplaudia de pé.

•        Aposta arriscada

O apoio eleitoral de Milei a Trump deixa o rival Joe Biden num escanteio, exatamente 24 horas depois de Milei se reunir, na Casa Rosada, com o enviado de Biden, Antony Blinken. Em Buenos Aires, Blinken disse que o governo Biden queria “ajudar a Argentina a estabilizar-se”.

“O povo argentino pode contar conosco enquanto estabiliza a sua economia”, disse o secretário de Estado.

Ao mesmo tempo, Milei arrisca esfriar a relação com Biden, justamente quando a Argentina precisa do apoio do governo Biden para superar uma crise econômica que ameaça desembocar numa hiperinflação, enquanto a pobreza bate recordes de aumento.

“Milei abraça a agenda de Trump, uma agenda que corrói a democracia. E isso inquieta Washington”, indica à RFI.

“O estilo provocador e, muitas vezes, agressivo de Trump é o preferido de Milei, que não gosta do estilo moderado e contemporizador de Biden. No entanto, a aposta por Trump choca com as necessidades de curto prazo de Milei. Se Trump ganhar as eleições, só assumirá em janeiro. Pelos próximos onze meses, de quem Milei precisa de apoio financeiro? De quem precisa apoio político? Quem precisa ter paciência com a Argentina? O governo de Biden”, aponta Tokatlián.

O analista internacional Rosendo Fraga também vê esse ruído nas relações, mas recorda que Milei tem feito o que sempre disse e que confirma a sua personalidade.

“Durante dois anos, Milei sempre disse publicamente que era Trump e Bolsonaro. Agora, por mais que tenha havido um canal diplomático a sugerir que Milei não exiba o seu apoio explícito a Trump, ele conforma a sua personalidade frontal e confrontativa”, destaca.

“Milei ratifica esse alinhamento com a chamada ‘nova direita’ num momento delicado, mas o que mais chama atenção é que uma ‘selfie’ com Milei tenha um impacto positivo numa eleição interna dos Estados Unidos”, observa Rosendo Fraga.

 

Ø  EUA: ex-vice-presidente do Partido Democrata declara apoio a Trump

 

Tulsi Gabbard, ex-congressista democrata do estado do Havaí, EUA, condenou seu antigo partido como sendo um inimigo da democracia e sedento pelo poder e elogiou Donald Trump, candidato republicano na corrida presidencial deste ano.

Gabbard já foi vice-presidente do Comitê Nacional Democrata, entidade que dirige o partido, mas renunciou a posição em 2016 em apoio ao senador Bernie Sanders. Na época, apesar de contar com maior apoio do eleitorado, Sanders foi preterido nas corridas primárias presidenciais em favor de Hillary Clinton.

A política também foi cotada como uma das pré-candidatas do Partido Democrata nas eleições presidenciais de 2020, mas não chegou a concorrer nas primárias.

Em discurso, realizado durante a Conferência Anual de Ação Política Conservadora (CPAC) nos arredores de Washington, Gabbard denunciou a "elite democrata e as criaturas do pântano em Washington" como não tendo respeito pelos norte-americanos e pelos seus direitos, sendo "impulsionados pela sua fome insaciável de poder".

"Dizem que ele [Trump] será o ditador-chefe, que, se for eleito, serão as últimas eleições que este país verá. É ridículo. Isso é tão louco, é ridículo", afirmou.

"Eles justificam as suas ações dizendo a si mesmos que precisam destruir a nossa democracia para salvá-la. É uma loucura e é a mentalidade dos ditadores", ressaltou Gabbard.

A política ainda elogiou Trump como um "lutador", cuja força e resiliência vêm de "um sincero amor e preocupação pelo futuro do nosso país e pelo seu cuidado com o povo".

Já o atual presidente estadunidense, Joe Biden, cuja candidatura ela apoiou, "desmoronaria" frente uma fração da pressão e dos ataques atualmente dirigidos contra Trump.

Gabbard ainda criticou as tentativas de diversos estados norte-americanos de impedir que Trump concorra à eleição, assim como os processos destinados a condená-lo antes da votação de novembro. O julgamento mais recente, afirmou, foi "claramente um golpe de motivação política".

 

Fonte: Opera Mundi/RFI/Sputnik Brasil

 

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