José Luiz Toro da Silva: É preciso repensar
os planos de saúde
Dois interessantes
artigos, publicados no período de festas, trazem uma importante reflexão sobre
a necessidade de se repensar os planos de saúde, principalmente dando ênfase
aos programas de atenção primária à saúde (APS).
Zeliete Linhares Leite
Zambon, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina da Família e Comunidade,
sustenta que a atenção primária é um “alicerce de uma saúde suplementar
mais resolutiva e econômica”, enfatizando que com “o envelhecimento
populacional, aumentam os episódios de alta complexidade”, se fazendo
necessária uma saúde suplementar “menos custosa e mais resolutiva”,
sendo que os esforços devem ser destinados à prevenção e à educação em saúde,
assim como ocorre na Europa, onde a APS é a “principal porta da rede
suplementar”.
Anderson Mendes,
presidente da União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (Unidas),
também defende que todos ganham com a APS, “tanto os planos, que
reduzem os gastos, uma vez que as internações representam cerca de 50% dos
custos do setor, e acima de tudo, os beneficiários, porque passam a ter uma
vida mais saudável, com acompanhamento de qualidade e direcionado para a
necessidade individual”. Menciona que a implantação da APS, além de
representar uma “transformação cultural”, “passa por ter estratégias de
cuidado, o que significa ter um mapeamento prévio de fatores de riscos e linhas
de cuidado de atenção que ofereçam qualidade de vida e de bem-estar, diminuindo
a incidência de doenças, especialmente em casos que os quadros são evitáveis”.
Ora, tais reflexões
devem ser avaliadas com atenção, principalmente quando se noticia que o
“Reajuste do plano de saúde para empresa deve ser de 25%” . Empresários e
trabalhadores necessitam refletir com mais atenção sobre os fatores que
impactam os custos dos planos de saúde, pois os índices que anualmente são
aplicáveis, inclusive, nos planos individuais/familiares, são manifestamente
superiores aos reajustes obtidos nas relações laborais e comerciais, obrigando
os contratantes a procurarem planos com tickets médios menores, muitas vezes
com qualidade inferior àquela anteriormente praticada. Chegará o momento em que
muitas empresas não conseguirão oferecer tal benefício aos seus empregados, nem
mesmo estes conseguirão arcar, mesmo que de forma parcial, com tais
contraprestações, sem contar com aqueles que, ao se aposentarem, terão que
arcar integralmente com tais custos. Esta equação, mais cedo ou mais tarde, não
fechará.
Portanto, como adverte
Anderson Mendes, precisamos repensar o sistema, procurando viabilizar planos de
saúde e não de doenças.
Entendemos que “o
modelo que nos trouxe até aqui não é o que vai nos levar adiante”, sendo que a
regulação desta importante atividade econômica não somente se dá através da lei
e da agência reguladora, mas, principalmente, através dos contratos firmados com
os beneficiários, com seus mecanismos de regulação, mas principalmente com a
rede credenciada, dando ênfase à APS e a mudança gradual do mecanismo de
pagamento, alterando a dinâmica do fee for service para a
busca de uma remuneração baseada em valor, sendo que ao invés de pagar por
quantidade, se deve pagar por qualidade.
Além da mudança
cultural, o contrato é que pode ser o instrumento de implantação de uma nova
realidade, inclusive na APS, alinhada em torno da qualidade, que priorize a
saúde e não a doença, principalmente na relação das operadoras de planos
privados de assistência à saúde com a sua rede de atendimento, objetivando a
redução de custos e desperdícios. Precisamos mudar o modelo de atenção à saúde
e de pagamento desses prestadores, estabelecendo um novo modelo de contrato
– alternative quality contract – priorizando,
preferencialmente, um pagamento global destinado a cobrir todos os serviços
médicos para uma população de pacientes definida, uma forma de correção anual
dos valores baseado na inflação ou outra forma de correção, e o estabelecimento
de bônus com base em medidas de desempenho. Outras formas alternativas ou
mistas também podem ser adotadas no contrato, inclusive na implantação da APS.
Até mesmo em face da
segurança jurídica necessária para as partes contratantes, a mudança se daria,
basicamente, através da contratualização, não se fazendo necessárias grandes
alterações legais ou normativas, observado o princípio da autonomia da vontade,
lembrando que a Resolução Normativa (RN) nº 503, de 2022, da Agência Nacional
de Saúde Suplementar (ANS), já deixa expresso que “as condições de
prestação de serviços de atenção à saúde no âmbito dos planos privados de
assistência à saúde por pessoas físicas ou jurídicas, independentemente de sua
qualificação como contratadas, referenciadas ou credenciadas, serão reguladas
por contrato escrito, estipulado entre a Operadora e o Prestador”.
A discussão sobre o
repensar os planos de saúde é de interesse de toda a sociedade, não somente das
operadoras e seus prestadores de serviços, sendo que também passa pelo
estabelecimento de mecanismo de regulação, que necessitam ser discutidos com a
ANS, porém muita coisa pode ser feita através da rediscussão dos contratos com
os prestadores de serviços, na priorização da qualidade e não da quantidade.
Como bem disse Albert
Einstein, “insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e
esperar resultados diferentes”, sendo que Leemore S. Dafny e Thomas H. Lee,
professores de Harvard, já afirmaram que “os líderes dos planos de
saúde não aprenderam a alcançar consenso rapidamente, a superar a resistência
cultural à mudança ou a estimular equipes de alta performance”.
Por fim, entendemos
que a mudança deve ocorrer de forma gradativa, principalmente através de
projetos pilotos, com a elaboração de contratos com orçamento global, redução
de despesas médicas e melhoria da qualidade, sendo que tal mudança é de
interesse de toda sociedade, até mesmo visando a sustentabilidade desse
importante setor. Estudar novas formas de contratação é de fundamental
importância para repensar a saúde suplementar no Brasil.
Ø
SEM INTERVENÇÃO: ANS afirma não haver
elementos suficientes para investigar Hapvida
O diretor-presidente
da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Paulo Rebello, disse que não há
elementos que levem à necessidade de abrir investigação ou mesmo de cogitar uma
direção técnica na operadora de planos de saúde Hapvida NotreDame.
Segundo ele, os
indicadores de reclamações contra a operadora não se encontram em um patamar
que demande intervenção. A indicação de um diretor técnico só ocorre quando “há
um colapso no atendimento dos beneficiários, o que não é o caso em questão”,
disse Rabello em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
Direção técnica é o
acompanhamento in loco feito por um agente apontado pela ANS
de fatores que possam afetar a assistência prestada aos beneficiários. A
agência reguladora, no entanto, não faz intervenção na gestão: sua atuação
consiste em analisar informações e definir metas para a operadora.
O diretor-presidente
da agência também disse que, em reunião com representantes da companhia, na
terça-feira (23/1), foi esclarecido que a empresa tem entrado com os recursos
cabíveis nos casos de liminares referentes a procedimentos não incluídos no rol
da ANS.
Rabello disse ainda
ser necessário considerar que a alta de reclamações foi influenciada por
fatores como o aumento no número de beneficiários de planos de saúde em anos
recentes; a demanda reprimida em razão da pandemia de Covid-19; e a lei federal
(14.454/22) que estabeleceu que o rol de procedimentos da ANS é exemplificativo
(o que fez com que o número de tratamentos cobertos pelos planos tivesse uma
alta expressiva).
Mesmo com o aumento
das queixas, a Hapvida NotreDame não está no patamar que leve a medidas como a
suspensão da venda de planos de saúde da empresa. “A gente tem acompanhado um
crescimento do número dessas reclamações. Elas não chegaram num patamar de permanecer
no grau alto a ponto de suspender a comercialização desses produtos”, disse
Rabello ao Estadão.
Ao jornal, a Hapvida
NotreDame disse estar em “relação constante com a ANS” e também estar à
disposição para esclarecimentos. A reunião da terça-feira, afirmou a companhia,
foi um sinal de “comprometimento com a sustentabilidade do setor e o
atendimento de qualidade” aos beneficiários.
Fonte: Conjur
Nenhum comentário:
Postar um comentário