Governador de SP contradiz especialistas sobre câmeras em PMs
O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos)
disse nesta terça-feira (2), em entrevista ao Bom Dia SP, que as câmeras nas
fardas não oferecem segurança efetiva na vida do cidadão e admitiu que sua
gestão não irá investir em novos equipamentos.
"A gente não descontinuou nenhum contrato. Os
contratos permanecem. Mas qual a efetividade das câmeras corporais na segurança
do cidadão? Nenhuma."
O uso do equipamento nos uniformes da PM em SP
evitou 104 mortes, segundo levantamento da FGV em dezembro de 2022 e a
letalidade dos policiais em serviço foi a menor da história no ano passado.
Em recente levantamento divulgado pela GloboNews,
após a implantação de câmeras corporais, o índice de detenções de policiais
caiu 30%.
Durante a entrevista, Tarcísio defendeu o aumento
de efetivo, com a contratação de mais policiais, e o investimento em tecnologia
- mas não nas fardas dos policiais - para coibir a violência.
"Preciso investir pesado em monitoramento.
Isso custa muito dinheiro. É a melhor aplicação do recurso que a gente está
buscando para proteger o cidadão".
Segundo o governador, o plano é ter mais cinco mil
homens no Centro da capital paulista este ano e 500 viaturas atuando na região.
"Se você aumenta policiamento ostensivo, você
vai fazer menos abordagem porque vai dissuadir o crime. E combinar mais
investimento em iluminação pública para dissuadir o crime, porque iluminação
pública afasta o criminoso".
Ela disse ter conversado sobre o assunto com outros
governadores, e pretendem apresentar um projeto pedindo o endurecimento da
legislação penal para tentar resolver o problema. "Precisa aumentar o
risco do crime. Impressiona a quantidade criminosos condenados pela Justiça
soltos".
• Histórico
No final do ano passado, a gestão de Tarcísio
cortou R$ 98 milhões de ações da pasta da Segurança Pública do estado e deixou
de investir em programas importantes na área, como o Olho Vivo, responsável
pelas câmeras corporais usadas pela Polícia Militar.
A atual administração tirou R$ 15 milhões do
orçamento de R$ 152 milhões previsto para o programa em 2023, o que significa
diminuição de cerca de 10% do valor destinado à manutenção das câmeras.
O Olho Vivo foi implantado em agosto de 2020 e
começou com 585 câmeras acopladas aos coletes usados pelos policiais militares.
Em dezembro de 2022, no término do mandato de Doria
e Garcia, a corporação contava com 10 mil equipamentos à disposição. Antes,
testes foram feitos com policiais usando 30 unidades.
Mortes cometidas por PMs em serviço aumentam 34% em 2023, 1º ano de Tarcísio
O primeiro ano de Tarcísio de Freitas
(Republicanos) à frente do governo de São Paulo foi marcado pelo aumento das
mortes cometidas por policiais militares no estado.
Depois de um ano com o menor número de mortes
praticadas por PMs em serviço da história, após a implementação das câmeras nos
uniformes, o estado registrou aumento de 34% no número de pessoas mortas em
2023, de acordo com levantamento do g1 feito com base nos números do Grupo de
Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial,
do Ministério Público.
Em 2022, 248 pessoas foram mortas por policiais
militares em serviço, contra 333 em 2023 (até 20 de dezembro de ambos os anos).
Se somarmos as mortes cometidas por PMs de folga, o
aumento da letalidade policial como um todo foi de 15,7% — 434 pessoas mortas
por policiais militares ao longo do ano contra 375 em 2022, ou seja, mais de
uma pessoa foi morta por dia por um PM no estado.
O aumento coincide com o congelamento de
investimento no programa "Olho Vivo", ou como disseram especialistas
ouvidas pelo g1: com a "desidratação" do programa das câmeras. A
gestão Tarcísio de Freitas confirmou que não adquiriu novas câmeras em 2023
mesmo com orçamento disponível e o número de equipamentos se manteve em 10.125
em todo o estado.
Mortes cometidas por PMs em serviço aumentam 34% em
2023
MDIP 2022* 2023*
em serviço 248 333
total = serviço + folga 375 434
*
até 20 de dezembro * até 20 de
dezembro
Fonte: Grupo de Atuação Especial da Segurança
Pública e Controle Externo da Atividade Policial
O governador disse ao Bom Dia SP, em entrevista
veiculada nesta terça-feira (2), que as câmeras nas fardas não oferecem
segurança efetiva na vida do cidadão e admitiu que sua gestão não irá investir
em novos equipamentos.
"A gente não descontinuou nenhum contrato. Os
contratos permanecem. Mas qual a efetividade das câmeras corporais na segurança
do cidadão? Nenhuma", afirmou Tarcísio.
Já em nota, a Secretaria da Segurança Pública
afirmou ao g1 que "investe permanentemente no treinamento das forças de
segurança e em políticas públicas para reduzir as mortes em confronto, com o
aprimoramento nos cursos e aquisição de equipamentos de menor potencial
ofensivo" (leia nota completa abaixo).
Além de não adquirirem novas câmeras, há relatos de
mau uso do equipamento ou mesmo da obstrução do equipamento, como em mortes
ocorridas durante a Operação Escudo, na Baixada Santista.
"O programa olho vivo não acabou formalmente,
mas foi sendo minado por dentro, vide as denúncias de policiais que não
utilizavam câmera ou que comprometeram a gravação deliberadamente colocando
algo em frente da bodycam", diz Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum
Brasileiro de Segurança Pública.
Samira lembra ainda que um dos argumentos dados
pelo governo era o de adquirir um equipamento com ainda mais funcionalidades,
mas até agora o governo não lançou edital para tal.
"Os contratos vencem no meio do ano, haverá
aditivo? No início da gestão, o secretário da Segurança tinha afirmado que as
câmeras precisavam de mais funcionalidades para serem mantidas porque
supostamente o custo é muito alto pelo que oferecem. Mas nem isso parece ser
algo que eles foram atrás, porque uma licitação internacional desse porte leva
mais de ano", diz.
"Se o objetivo fosse mesmo esse, por que não
anunciaram um novo edital? Ou uma lista de requisitos novos para renovação de
contrato com a própria empresa?", questiona.
A diretora-executiva do Instituto Sou da Paz,
Carolina Ricardo, acredita que além das câmeras, a gestão anterior, João
Doria/Rodrigo Garcia (PSDB), criou um programa de gestão do uso da força que
não foi mantido pelo governo Tarcísio.
"Além das câmeras, você teve a aquisição e uso
de armamento menos letal, as pistolas Taser, que foram bastante adquiridas e
usadas, e elas minimizam casos de letalidade policial. Você teve comissão de
mitigação de risco, que significa que em cada caso de mortes decorrentes de
intervenção de letalidade você tinha um estudo técnico no batalhão, na área
onde acontecia, para fazer uma avaliação se o uso foi correto da força, se não
foi, se foi abusivo, se foi um mau procedimento. Então, você vai dando um
recado para a tropa que usar força letal não é uma coisa banal. Ela tem
consequências quando você faz essa comissão de mitigação de risco, que gera
várias consequências para os policiais, diz.
"Teve investimento em acompanhamento
psicológico, numa apuração mais célere dos casos, num discurso muito nítido de
que a letalidade policial não era mais aceita, não é algo que se busque,
tolerado, enfrentar os bandidos a qualquer custo. O discurso público do gestor,
do comandante, faz muita diferença. E junto o programa Olho Vivo, claro, que dá
o recado importante em relação ao uso da força para a tropa. Então me parece
que nessa gestão a profissionalização do uso da força não foi uma prioridade",
completa.
Para Carolina, o discurso do atual secretário da
Segurança, Guilherme Derrite, é todo voltado "para enfrentar o crime a
qualquer custo".
"Se é enfrentar a qualquer custo, você
autoriza, de alguma forma, usar força para fazer esse enfrentamento. E é só
ver, por exemplo, o caso agora, da menina que tomou o tiro da pistola de
airsoft. É bizarro, como é que o policial atira simplesmente em um motoqueiro
com uma criança na garupa? Isso mostra que, de fato, o uso da força voltou a
ser banalizado. O uso excessivo da força está sendo legitimado em função de
outras prioridades", diz.
"Em nenhum momento você vê no discurso público
do secretário valorizando isso [câmeras e ação para redução do uso da força].
As câmeras não entram nesse pacote como se elas fossem contra o policial, as
câmeras não são contra o policial, elas fazem parte. Elas são segurança
inclusive para o próprio policial", completa.
Samira concorda e diz que tem a impressão de
Derrite ter recebido carta branca para agir.
"E tendo carta branca, a primeira coisa que
era de se esperar era justamente o aumento da letalidade policial. Derrite foi
oficial da Rota, se elegeu com a plataforma bandido bom é bandido morto",
diz.
·
Outros crimes
Mas para Samira, mesmo com a carta branca, a
segurança como um todo do estado não teve melhorias. Houve aumento de estupros
no estado, por exemplo, e de roubos no Centro de São Paulo. Ao todo, foram
registradas 16.569 ocorrências de roubo nas oito delegacias da região central
entre janeiro e setembro deste ano — o maior número para o período desde 2001.
Os furtos aumentaram 7% na capital em 2023. A
cidade de São Paulo registrou 229.639 furtos entre janeiro e novembro do ano
passado, uma média de 28,6 furtos por hora na capital, 15.219 ocorrências a
mais do que no ano anterior.
Na mesma entrevista ao Bom Dia SP, Tarcísio colocou
a segurança pública como prioridade.
“É hoje aquilo que mais me preocupa. A questão da
segurança pública? A questão da segurança pública. Não adianta eu chegar pra
você e falar que aumentamos a apreensão de drogas, apreendemos 250 toneladas,
impusemos um prejuízo pro crime. Ninguém se alimenta de estatística. A gente tá
vendo todo o dia alguém perdendo o celular", afirmou.
·
O que diz a SSP
"A SSP investe permanentemente no treinamento
das forças de segurança e em políticas públicas para reduzir as mortes em
confronto, com o aprimoramento nos cursos e aquisição de equipamentos de menor potencial
ofensivo, entre outras ações voltadas ao efetivo. Uma Comissão de Mitigação e
Não Conformidades analisa todas as ocorrências de mortes por intervenção
policial e se dedica a ajustar procedimentos e revisar treinamentos.
Em 2023, a Secretaria de Segurança Pública investiu
em tecnologia e equipamentos para fortalecer o trabalho das forças de segurança
no combate ao crime, incluindo novas armas e viaturas, num investimento de mais
de R$ 640 milhões. O “Muralha Paulista”, presente em mais de 620 municípios do
Estado, é um exemplo dessa nova política de segurança pública, que manteve em
sua integralidade o programa de câmeras corporais, com 10.125 câmeras em
funcionamento e com recurso destinado para continuidade do programa já
existente."
Os números de mortes decorrentes de intervenção
policial (MDIP) indicam que a causa não é a atuação da polícia, mas sim a ação
dos criminosos que optam pelo confronto, colocando em risco tanto a população
quanto os participantes da ação. Todos os casos dessa natureza são
rigorosamente investigados, encaminhados para análise do Ministério Público e
julgados pelo Poder Judiciário. Vale ressaltar, que o trabalho das forças
policiais no Estado, nos onze primeiros meses deste ano, resultou, na detenção
de 172.223 infratores, 6,0% a mais que no mesmo período de 2022. No período,
ocorreram 339 mortes decorrentes de intervenção de policiais em serviço,
representando 0,19% do total de prisões realizadas.
Fonte: g1
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