Prisão de Bolsonaro pode transformá-lo em
mártir como a facada de 2018, alerta pesquisador
Acuado pelas investigações da Polícia
Federal sobre a tentativa de golpe de 2022 e
outros crimes, Jair Bolsonaro e seus aliados reuniram apoiadores na Avenida
Paulista (SP), na tarde deste domingo (25), para demonstrar força política e
esquentar os motores para a corrida eleitoral deste ano.
Em entrevista
ao GGN, Almeida alertou que a prisão de Bolsonaro neste momento de furor
entre seus apoiadores radicalizados poderia transformá-lo em mártir, o mesmo
efeito político da facada que recebeu na eleição de 2018.
“A ideia
de que Bolsonaro pudesse sair do preso no domingo seria de uma exploração
midiática gigantesca por parte desses grupos, porque recai novamente na
construção da figura do líder. Ter a passagem pela cadeia é prova de martírio.
Isso é fundamental para a construção de um discurso mobilizador”, disse Almeida.
>>> Leia a
entrevista completa abaixo:
·
O que esse ato
promovido por Bolsonaro representa para a democracia brasileira e o que esperar
dele?
Alexandre
Almeida: É um ato que, seguindo o que a Constituição
determina, pode ser realizado. Não há um impedimento que possa evitar esse
evento. [O que espera dele] Vai depender muito dos próximos desdobramentos,
porque a política funciona com uma velocidade muito rápida. A manifestação se
propõe a defender o estado democrático de direito, mas vamos ver como se isso
se dará.
·
O ato pode ser
considerado uma afronta ao Supremo, diante das investigações da Polícia Federal
que mostram que os ataques de 8 de janeiro foram uma evidente tentativa de
golpe?
Almeida: É um ato de enfrentamento, de marcar uma clara posição. A
direita está voltando às ruas e parece que será uma manifestação com bastante
gente. Tudo vai depender também do que será dito ali, se é uma manifestação com
a finalidade de defender o estado democrático de direito. Outra coisa é que
esses políticos, esses organizadores não controlam as pessoas que vão até lá.
Já vi isso em muitas manifestações. Inclusive, as que contam com a presença
dessas personalidades. Não há um controle das pessoas que estão ali, as pessoas
vão ali pedir as suas demandas. Eu apostaria que, certamente, vão ter ataques
ao Supremo. Vai ter uma tentativa de fiscalização por parte dos organizadores,
para evitar esse tipo de fotografia em manchete de jornal. Mas, não sabemos
como pode acabar, até porque temos pessoas do primeiro escalão do governo sendo
ouvidas pela polícia, sendo presas, há um processo de unir essas pessoas e suas
responsabilidades e puni-las, a gente não tinha visto isso antes. Eu acho que
também tem a questão das pautas do dia [que podem inflamar o público]. A fala
de Lula sobre o Holocausto vai ser muito explorada nessa manifestação, até
porque é uma direita brasileira simpática à direita de Israel. Outros temas
estão surgindo, como o caso da Ilha de Marajó. São elementos catalisadores
dessa massa, que pode se comportar de forma contrária àquilo que a organização
espera.
·
GGN: Como estão as
redes bolsonaristas na véspera do ato? Há notícias dando conta de que grupos
estão falando em guerra civil. O Observatório tem monitorado esses grupos?
Almeida: O que o Observatório mapeou até agora é que tem o pessoal mais
exaltado, que fala de um enfrentamento, “é preciso enfrentar o Supremo Tribunal
Federal”. Nas redes sociais das principais personalidades bolsonaristas, todas
estão chamando para o evento. Toda essa rede virtual de apoio ao bolsonarismo
ela está se mobilizando. Mas não é somente um ato em defesa do Bolsonaro, há
outros elementos em questão, como a eleição municipal. Essa manifestação na
Avenida Paulista também serve como palanque, palco para pré-candidato. É lá que
eles irão fazer seu discurso, e tentar ganhar votos [para criar] um partido
conservador. Já anunciaram que vão levar 200 mil fichas de apoiamento do
partido.
·
Considerando que
Bolsonaro está inelegível, qual você diria ser o objetivo do ato?
Almeida: Sim, é especialmente uma ideia de tomar a rua. Sem dúvida,
o uso da internet nas eleições é importantíssimo, ela muda cenários, não é algo
que deva ser desprezado. Mas tomar as ruas é importante. Isso faz parte da
cultura de diversos campos políticos, estar nas ruas e nessas manifestações. De
figuras que são pré-candidato a vereador a deputado estadual. Há diversos aí
nessa manifestação, para além da defesa de Bolsonaro. Mas para Bolsonaro, é sim
uma manifestação para marcar posição. Para ele dizer: ‘Olha, estou estou aqui
me defendendo. Estou sendo perseguido’. Faz parte da construção desse mito
político do líder. Essa ideia de um um líder perseguido injustamente, essa é a
narrativa.
·
Então Bolsonaro pode
se tornar um mártir? Isso pode afetar a democracia ou render mais atos a favor
dele?
Almeida: É possível sim. É possível sim, e nós tivemos o exemplo em 2018,
quando ele levou a facada. E agora começa a circular nas redes que Adélio
[Bispo, preso pela facada] será solto. Outro tema que pode ser explorado em
discursos na manifestação de domingo. Bolsonaro talvez não seja pessoalmente
tão incisivo nessas questões, porque deve ser moderado, mas claro as pessoas
que estão lá no palanque podem verbalizar isso, e ele não tem controle sobre as
pessoas. Então essa é a ideia de um mártir. A narrativa de perseguição por
parte do sistema judicial é excelente para ele.
·
Em seu discurso,
Bolsonaro pretende abordar três grandes temas: as políticas de seu governo, a
‘perseguição’ que alega estar sofrendo e o futuro do País. Como interpretar
essa estratégia?
Almeida: Faz parte dessa narrativa de construção do líder, né? É um líder
que defende um legado. Qual é esse legado na fala dele? Por exemplo, que foram
quatro anos sem a ameaça comunista. Com a volta do Partido dos Trabalhadores,
vai bater em algumas teclas como, por exemplo, o caso da Ilha do Marajó. Eles
vão dizer: ‘olha, a gente avisou’. Vai um pouco para esse caminho, de defender
legado. E a fala de futuro do país é sempre um futuro catastrófico com o PT. É
só o caos, a destruição e miséria. Isso faz parte do discurso populista.
·
Como o bolsonarismo
tem se mantido ativo ou mobilizado mesmo fora do governo? Há pautas específicas
sendo trabalhadas? O Observatório tem notado alguma estratégia especial nas
redes?
Almeida: Falando um pouco em cima da minha pesquisa. É uma das perguntas
problema, o que será da direita, o que será do bolsonarismo. Um primeiro
elemento é dividir a direita do bolsonarismo. O bolsonarismo é parte da
direita, não representa toda a direita, e a sua eleição abriu uma janela de
oportunidades para um segmento político. Bolsonaro inelegível ou preso não
significa [o fim] do grupo. Isso abre uma janela de oportunidades para toda a
direita. (…) Se a gente acha que a vitória do Lula significou a volta de um
cordão sanitário da democracia em torno da direita, tá muito enganado. O jogo
tá rodando ainda, e principalmente, não há só Bolsonaro agora. É a bola da vez,
mas há outras figuras políticas que trabalham no campo da cultura [propagando
conservadorismo] que estão ganhando muito espaço.
As suspeitas sobre a manifestação de
Bolsonaro. Por Luiz Nassif
De um observador da
cena internacional:
O maior perigo dessa
manifestação bolsonarista, com Caiado e o apoio financeiro de algumas das
fortunas do Agro, é uma tentativa de reeditar um Horst Wessel caboclo, para
redourar os brasões hora tisnados de Jair Bolsonaro. A imagem de um mártir é o
que ex-presidente e seus meninos precisam para tirar o foco de suas mazelas e
atrair milhões de novos incautos.
• Sobre Horst Wessel
Horst Wessel era
membro da Sturmabteilung (SA), a ala paramilitar do Partido Nazista, que se
tornou um símbolo de propaganda na Alemanha nazista após seu assassinato em
1930 por dois membros do Partido Comunista da Alemanha (KPD).
·
Juventude e ativismo político
Horst Ludwig Georg
Erich Wessel nasceu em 9 de outubro de 1907, em Bielefeld, Vestfália, Alemanha.
Ele era filho de um pastor luterano e estudou direito em Berlim. No entanto,
ele abandonou os estudos em 1926 e ingressou no Partido Nazista. Wessel rapidamente
se tornou uma figura proeminente nas SA, conhecido pela sua violência e
fanatismo. Ele também foi um talentoso poeta e compositor e compôs a canção
“Die Fahne hoch” (A Bandeira no Alto), que mais tarde se tornou o hino do
Partido Nazista.
·
Assassinato e martírio
Em 14 de janeiro de
1930, Wessel foi baleado e morto em seu apartamento por dois membros do KPD. As
circunstâncias exatas da sua morte permanecem obscuras, mas a propaganda nazi
retratou-o como um mártir morto pelas suas convicções políticas. A sua morte
foi amplamente divulgada pelo Partido Nazista, que a utilizou para incitar o
sentimento anticomunista e retratar-se como vítima de violência.
·
Propaganda e legado
A morte de Wessel foi
explorada por Joseph Goebbels, o ministro da propaganda nazista, que o
transformou numa figura de culto. Sua canção “Die Fahne hoch” tornou-se o hino
do Partido Nazista e sua imagem foi usada em cartazes, selos e outros materiais
de propaganda. Wessel também foi condecorado postumamente com o Distintivo de
Ouro do Partido, uma das maiores honrarias do Partido Nazista.
Após o fim da Segunda
Guerra Mundial, o uso da música e da imagem de Wessel foi proibido na Alemanha.
No entanto, ele continua a ser uma figura controversa e o seu nome ainda está
associado ao extremismo de extrema direita.
Ø
O grande ato ou a grande bravata? Por Luís
Felipe Miguel
O ato deste domingo
foi uma cartada importante para Bolsonaro.
Ele teve um único
propósito: escapar da cadeia. Com o ato, quis atingir dois objetivos que servem
a esse propósito.
O primeiro é mostrar
que tem força popular. Passar, a um Judiciário tão preocupado com o impacto
político imediato de suas ações, o recado de que não é fácil mexer com ele.
Idealmente, o recado
seria de que sua prisão geraria uma revolta popular espontânea, poria fogo no
país. Mas nem Bolsonaro acredita nisso.
Mostrar que tem
capacidade de mobilização já está de bom tamanho. O problema é que métrica vai
ser usada para calcular isso.
Com tanto investimento
na convocação do ato, ele tem que ser realmente gigantesco, pelo menos tão
grande quanto os maiores de seu período na presidência.
Claro que as Carlas
Zambellis e os Nikolas Ferreiras vão dizer de qualquer jeito que foi monumental
e contar o público na casa dos milhões. Mas o recado que Bolsonaro quer passar
não é pro cercadinho. É pra fora. E aí tem que ser mais convincente.
O segundo objetivo é
forçar a direita a se unir em torno dele – exatamente no momento em que as
investigações se fecham e a prudência recomenda ganhar distanciamento. Por isso
a pressão sobre os governadores, Tarcísio de Freitas em primeiro lugar, para que
compareçam.
Muitos vão comparecer,
mesmo sabendo do potencial desgaste. Mas, se eu fosse Bolsonaro, não contaria
muito com a lealdade deles. Afinal, todo político é proverbialmente um peixe
ensaboado – sempre escapa das mãos de quem quer prendê-lo.
O desafio de Bolsonaro
é se manter dentro do script – evitar bravatas, novos ataques ao Supremo, novas
ameaças à democracia.
Ele é um covarde –
esse é um dos traços que o definem. Sempre amarela quando o confronto parece
sério. Mas um de seus medos é o medo de se assumir como covarde diante de seus
seguidores. Por isso, a tentação de soltar uma bravata é grande.
Ø
Blogueiro Paulo Figueiredo ameaça STF ao
lado de Eduardo Bolsonaro
O blogueiro de
extrema-direita, Paulo Figueiredo, neto do ex-ditador João Baptista Figueiredo,
ameaçou em alto e bom som o Supremo Tribunal Federal (STF) durante uma live nas
redes sociais.
Ao lado do deputado
federal Eduardo Bolsonaro (PL), Figueiredo confessou que a manifestação deste
domingo (25), na Avenida Paulista, em São Paulo, teve sim como objetivo
pressionar a Suprema Corte e chega a dizer: “a única maneira de vocês manterem
as pessoas caladas vai ser através da força”, disse.
“E como alguns, e eu
me coloco entre eles, não vão se calar, vocês vão precisar de baionetas. Vocês
vão ter baionetas? E de quem virão essas baionetas, das Forças Armadas?”,
ironizou.
O corte do vídeo foi
postado por Vinícios Betiol, mestre em Geopolítica e autor do livro “A arte da
guerra online: como enfrentar as redes de extrema direita na internet”.
Ø
Bolsonaro não consultou ninguém para ato na
Paulista; nem os filhos
O ato na avenida Paulista deste domingo (25), foi ideia do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) junto
com o pastor Silas Malafaia. E mais ninguém. Segundo Felipe Pereira, do UOL, ele não
consultou os filhos e tampouco o presidente do PL, Valdemar
Costa Neto.
Para os filhos, a
atitude de Bolsonaro faz parte de seu "instinto
político". Segundo eles, este jeito de resolver as coisas é um
atributo d ex-presidente que ajudou a leva-lo ao Planalto.
·
Virou piada
A iniciativa acabou
aprovada por parlamentares bolsonaristas, que pode levar milhares de pessoas a
São Paulo. Por outro lado, a falta de consulta aos aliados virou motivo de
piadas de políticos aliados e também da oposição.
O pastor teria virado
o conselheiro político de Bolsonaro, segundo eles.
Flopado ou cheio, uma
coisa é certa para todos. O evento é de responsabilidade de Bolsonaro e mais
ninguém. O PL está de fora e não pode ser vinculado ao que acontecer.
Fonte: Jornal
GGN/Fórum
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