Caso Abin:
‘Governo continua refém dos militares’, diz historiadora Priscila Brandão
O escândalo
de arapongagem na Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o
governo de Jair Bolsonaro (PL) tem raízes profundas na falta de
responsabilização dos militares e na ausência de um efetivo desmonte das
estruturas de perseguição da ditadura (1964-1985). Essa é a avaliação da
historiadora e especialista em segurança pública Priscila Brandão. Para ela,
essa é a principal dificuldade para que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva
(PT) reaja e desarticule o aparelhamento bolsonarista do órgão.
“O governo
continua refém dos militares. O grande problema que nós temos está na Lei de
Anistia de 1979 e na interpretação que o STF deu em 2010, quando ele aceitou a
interpretação que os militares deram. Os militares têm poder de veto efetivo
desde a transição. Enquanto não houver uma possibilidade nem de falar sobre os
crimes da ditadura, ninguém vai achar que vai ter punição nesse país”, afirma
Priscila, em participação no podcast Três por Quatro.
A
historiadora considera que o caso é o mais grave da história brasileira e
representa um risco grande para a segurança do país. Sobretudo pela utilização
de uma agência de Estado que teve sua estrutura desvirtuada para atender aos
interesses políticos e pessoais do clã Bolsonaro.
“Nós
tivemos o caso do grampo no BNDES, que ensejou a criação da CCAI (Comissão de
Controle das Atividades de Inteligência, no Congresso Nacional), mas sem dúvida
agora situação foi elevada a um novo patamar. Eu não entendo isso como uma
‘Abin paralela’. Essa atuação foi desenvolvida sob comando do Ramagem, sob
supervisão do (General Augusto) Heleno – chefe do Gabinete de Segurança
Institucional (GSI) à época – e com conhecimento do Bolsonaro. Nada disso
existia sem haver esse tipo de comando”, avalia.
As
investigações sobre o uso ilegal da Agência Brasileira de Inteligência (Abin)
para monitorar ilegalmente autoridades, políticos e jornalistas durante o
governo de Jair Bolsonaro (PL) ainda precisa esclarecer quais eram os objetivos
da espionagem. A suspeita da PF é de que assessores do vereador do Rio de
Janeiro Carlos Bolsonaro (Republicanos), que também são alvo da operação,
pediam informações para o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem, alimentando uma
rede de difamação. As investigações indicam ainda que a Abin foi usada para
beneficiar Flávio e Jair Renan Bolsonaro, também filhos do ex-presidente, em
investigações das quais eram alvos.
·
Hora de agir
O
ex-presidente do PT, José Genoino, comentarista do podcast Três por
Quatro, considera que o governo Lula errou em não realizar uma transição
efetiva na área durante a mudança de governo. E precisa aproveitar a
oportunidade criada pelo escândalo para fazer uma reforma na Abin, tanto no que
diz respeito ao corpo de agentes, quanto às funções da agência.
“Inteligência
e informação são estratégicos para qualquer país do mundo. Nós não podemos ser
ingênuos com uma coisa dessa. Eu lamento muito que a nossa experiência de
governo tenha sido ingênua de não fazer uma transição. Havia indícios de que o
bolsonarismo se apoderou dentro do GSI. Eu acho que foi um erro o governo Lula
não ter feito a transição na área de inteligência. É bom deixar claro as duas
áreas que não teve transição: inteligência e Forças Armadas. Exatamente as duas
áreas que mais geraram problema no nosso governo”, afirmou.
·
Função da Abin
De forma
geral, uma agência de inteligência deve fornecer informações relevantes que
auxiliem na tomada de decisão de autoridades, por exemplo, em relação a uma
guerra iniciada entre nações estrangeiras, uma epidemia ou negociações
econômicas. No entanto, segundo Brandão, a Abin foi criada com uma proposta
totalmente aberta e age fora do que seria esperado de uma agência do tipo, por
exemplo, realizando escutas ou invasão de dispositivos, algo que seria função
apenas da Polícia Federal, em ações judiciais.
Genoíno
destaca ainda que esse uso político da Abin pode ter outras repercussões, já
que a agência detém informações sigilosas e estratégicas de diversas áreas, que
podem ter sido acessadas e vazadas. “Você tem informações estratégicas do país,
sobre recursos, projetos, áreas. Além disso, a Abin faz parte do SISBIN
(Sistema Brasileiro de Informação). E o que está dentro do SISBIN? Os três
instrumentos das Forças Armadas, Coaf (Conselho de Controle de Atividades
Financeiras), Polícia Federal e P2 (setor de inteligência das polícias
militares). Se a Abin foi vulnerável, tudo isso pode ter sido vulnerável”,
afirma.
Ø Forças armadas são parte do serviço público e precisam cumprir
seu papel institucional
A Condsef,
Ascema, Ansef e INA, entidades que representam os servidores públicos federais
do meio ambiente (Ibama, MMA, ICMBio e SFB) e da Funai, vêm a público
manifestar sua indignação e repúdio à forma como as Forças Armadas têm atuado
na operação Yanomami, que visa combater o garimpo ilegal na terra indígena,
localizada nos estados de Roraima e Amazonas.
A operação
Yanomami, iniciada em maio de 2023, é uma ação conjunta entre o Ibama, a Funai,
a Polícia Federal e as Forças Armadas, coordenada pelo Ministério da Justiça e
Segurança Pública. O objetivo é proteger os direitos dos povos indígenas,
preservar o meio ambiente e garantir a soberania nacional na região, que é alvo
de invasões de garimpeiros que exploram ilegalmente o ouro e outros minérios,
causando graves danos ambientais e sociais.
No
entanto, as Forças Armadas estão deixando de cumprir sua missão de apoiar e
facilitar o trabalho dos demais órgãos envolvidos nas ações de fiscalização e
repressão ao garimpo ilegal. Segundo diversas reportagens e denúncias, as
forças armadas têm:
- Negado
ou atrasado o uso de aeronaves para o transporte de servidores,
equipamentos e materiais, prejudicando a logística e a eficiência das
operações;
- Impedido
ou dificultado o sobrevoo de entidades civis e indígenas sobre o
território Yanomami, restringindo o acesso à informação e à fiscalização
independente;
- Deixado
de colaborar ou se omitido nas ações das instituições que envolvem
destruição de maquinários, pistas de pouso e acampamentos dos garimpeiros,
o que permite que eles continuem suas atividades ilegais;
- Falhado
em garantir a segurança dos servidores públicos e dos indígenas, que
sofrem constantes ameaças, ataques e violências por parte dos garimpeiros
armados;
- Negado
sobrevoar o território com autoridades do governo;
- Desmobilizado
pontos de apoio dentro do território indígena para abastecimento das
aeronaves das instituições de proteção ambiental.
Tais
atitudes colocam em risco a vida dos servidores dos órgãos envolvidos na
operação e demonstram descompromisso com o serviço público, desrespeito aos
povos indígenas, ao meio ambiente e à Constituição Federal, que estabelece as
competências e as responsabilidades das instituições públicas. As forças
armadas integram o serviço público brasileiro e têm que fazer sua parte nessa
operação.
Cabe
destacar que é atribuição das Forças Armadas a proteção, controle e
monitoramento do território brasileiro em região de fronteira. Para tanto, há
03 (três) Pelotões Especiais de Fronteira (PEFs) do Exército na região Yanomami
– em Maturacá, Surucucu e Auaris. Então, não é aceitável que a atuação das
Forças Armadas na Operação Yanomami se restrinja ao apoio logístico. Faz-se
necessário que cumpram suas atribuições institucionais de proteger o território
brasileiro de ações criminosas de garimpo ilegal, por meio de participação
ativa nas ações de fiscalização.
Além
disso, as entidades denunciam que o Ministério da Defesa não acatou as
diretrizes presidenciais de oferecer o apoio logístico adequado na Terra
Indígena, contrariando o decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da
Silva em janeiro de 2023, que atribuiu às Forças Armadas o papel de dar o apoio
logístico necessário aos diversos órgãos envolvidos na retirada dos garimpeiros
e no socorro aos indígenas.
Segundo a
APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), principal organização
indígena do país, o Ministério da Defesa se recusou a corrigir cerca de 50
pistas de pouso que ajudariam na operação, atrasou a distribuição de cestas
básicas, falhou no controle do espaço aéreo e retirou um posto de suprimento de
combustíveis.
Agora, de
acordo com a matéria da FSP, as Forças Armadas pedem quase um milhão de reais
por dia para manter sua atuação! Por qual razão? Qual a necessidade dessa
quantia se o soldo dos militares está garantido? Que outras missões as Forças
Armadas estão cumprindo que não poderiam dispor de contingente e equipamentos
para atender essa operação?
As
entidades signatárias exigem que o governo tome as necessárias providências
para garantir que as forças armadas passem a colaborar efetivamente com a
operação Yanomami, respeitando e apoiando os demais órgãos envolvidos,
cumprindo as determinações legais e judiciais, e atendendo aos interesses da
sociedade brasileira, que clama pela proteção dos direitos humanos, da
biodiversidade e da soberania nacional.
Brasília-DF,
30 de janeiro de 2024.
Confederação
dos Trabalhadores no Serviço Público Federal – Condsef
Associação
Nacional dos Servidores da Funai – Ansef
Indigenistas
Associados – INA
ASCEMA
Nacional – Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista
em Meio Ambiente e PECMA.
Fonte:
Brasil de Fato/Indigenistas Associados
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