Ártico: a geopolítica do extremo Norte do
mundo
A região do Ártico,
com o degelo progressivo causado pelo aquecimento global, apresenta novas possibilidades
como rotas de transporte e é área com muitos recursos minerais a serem
explorados, o que a fez ganhar importância na geopolítica, numa disputa que
envolve grandes potências como Rússia, EUA e China e outros atores regionais,
com menor influência, como Canadá e países escandinavos.
No ano de 2009 a
Rússia fincou uma bandeira de titânio no solo oceânico do Ártico. O
procedimento foi parte de expedição científica para que o país solicitasse
direitos, de acordo com legislação marítima internacional, sobre o leito do
Ártico. Mas foi visto também como uma demonstração de força e posicionamento
geopolítico no extremo norte do planeta.
A Rússia tem buscado
desenvolver uma via marítima pelo seu “mar territorial” do Ártico para conectar
Europa e Ásia principalmente. O degelo do Ártico, como mencionado no parágrafo
anterior, proporcionado pelo aquecimento global, está tornando viável o investimento
nesta rota marítima, com a vantagem de ter potencialmente a capacidade de
suportar um número bem maior de navios do que o Mar Vermelho ou o Canal do
Panamá. A costa ártica russa tem 25 portos. O termo “potencialmente” é usado
porque no caso desta rota do Ártico os deslocamentos dependem, por ora, de
poderosos navios nucleares quebra-gelo. A Rússia é o único país do mundo com
frota também deste tipo de embarcação, os demais possuem navios quebra-gelo
convencionais. E com o projeto de exploração econômica, a Rússia,
aproveitando-se neste caso da geografia que lhe é favorável (tem a maior área
banhada pelo Oceano Ártico), tem lançado navios para a exploração dos recursos
naturais.
De forma complementar,
para proteger estas atividades, posicionou-se estrategicamente antes dos rivais
e implantou 21 bases militares na região, além de ter posicionado submarinos
nucleares de ataque. É o país com maior capacidade militar na região. É importante
salientar o caráter geoestratégico da questão para a Rússia (e também para a
União Soviética ao seu tempo). Com saídas para o mar ao sul (Mar Negro) e leste
(Mar Báltico) em zonas mais disputadas e sem acesso direto aos oceanos
Atlântico e Índico, o Ártico se coloca para a estratégia russa como importante
área de projeção do poder naval e elemento de garantia da segurança do país.
Para o desenvolvimento
da chamada Northern Sea Route (Rota Marítima do Norte) a Rússia tem buscado
parceria com a China, ator bastante interessado na viabilização desta rota. Os
chineses têm interesse neste novo corredor, assim como em fornecer insumos e
equipamentos para a infraestrutura necessária como navios quebra-gelo, navios
de escolta, satélites, portos, etc. Os chineses podem também prover seguros aos
navios russos, operações impossibilitadas pelas sanções ocidentais a Moscou,
pela invasão da Ucrânia. Os chineses serão, portanto, compradores permanentes
dos serviços da infraestrutura russa. Europeus, japoneses, coreanos e outras
nações asiáticas serão clientes desta rota, mas os chineses serão os
principais.
A China denomina sua
estratégia para o Ártico como parte da Belt and Road Initiative ou “Rota da
Seda”, no caso a “Rota da Seda do Ártico”, termo que citam em seu último “livro
branco”, com as diretrizes estratégicas do país. A viagem por esta via demora
40% menos tempo do que pelo Canal de Suez, no Egito, o que significa ganho
logístico de tempo e grande economia de combustível. As opções de rotas são
poucas e com potenciais problemas. O Canal de Suez está saturado e está
localizado no Oriente Médio, área instável, como se vê neste momento com o
conflito em Gaza e os ataques dos Houthis no Mar Vermelho, a Rota do Noroeste
passa por águas reivindicadas pelo Canadá e sob influência estratégica direta
dos EUA e o Canal do Panamá serve essencialmente para o comércio com o
continente americano.
A região é muito rica
em recursos naturais. No caso dos combustíveis fósseis, de acordo com o serviço
geológico do governo dos Estados Unidos, o US Geological Survey, o Ártico
contém cerca de 90 bilhões de barris de petróleo, 13% das reservas globais e em
torno de 44 bilhões de barris líquidos de gás natural. A China, portanto, tem
grande interesse tanto na rota do Ártico quanto na exploração dos recursos
naturais. Nesta associação com a Rússia, os chineses já investiram 90 bilhões
de dólares em projetos ligados a combustíveis fósseis e minerais.
Num movimento
unilateral e que amplia disputas e tensões em relação à região, os Estados
Unidos reivindicaram, em dezembro de 2023, a expansão de sua plataforma
oceânica continental em mais de um milhão de quilômetros quadrados no Ártico e
Mar de Bering. Washington quer assegurar direitos sobre o leito do mar e seus
recursos. Porém, o não reconhecimento internacional destas demandas e a
inclusão da Finlândia e, ainda por ser aprovada, da Suécia à OTAN, que se
juntam aos demais nórdicos Noruega, Islândia e Dinamarca (que tem soberania
sobre a Groelândia) na organização militar liderada pelos EUA, apontam para o
risco de militarização da região.
Estas disputas
deveriam, em tese, ser arbitradas pela Comissão de Limites da Plataforma
Continental, da ONU. Os Estados Unidos não ratificaram, contudo, a Convenção
das Naçôes Unidas para Direito do Mar (UNCLOS, na sigla em inglês). A falta de
acordos entre os participantes deste tabuleiro geopolítico leva também a
preocupações de natureza ambiental, dada a sensibilidade dos ecossistemas da
região. A exploração de petróleo, gás e outros minerais sem limites claros e
regras para a sua operacionalização, aceitas por todos os participantes, embute
sérios riscos a uma a fauna já bastante sensível dados os graves efeitos
provocados pelo degelo da calota polar.
Em relação à Rússia e
pode-se dizer também à sua “sócia” na exploração do Ártico, a China, que não é
banhada por esse oceano, mas está, como descrito, com importante presença na
região, inclusive com exercícios conjuntos de sua marinha com a marinha russa,
os Estados Unidos estão atrasados. E a assertividade das reivindicações
recentes, sem nenhuma proposta de mediação ou negociação, tendem a tornar o
Ártico região de forte disputa geopolítica entre as grandes potências nos
próximos anos.
Fonte: Por Wagner
Sousa, em Outras Palavras
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