segunda-feira, 28 de abril de 2025

O segredo por trás da fumaça do Vaticano na eleição do papa

Poucos símbolos são tão emblemáticos quanto a fumaça que sai da chaminé da Capela Sistina durante a escolha de um novo papa.

É um rito antigo, acompanhado por milhões ao redor do mundo, que aguarda ansiosamente o momento em que a fumaça branca anunciará: Habemus Papam, ou seja, temos um novo papa.

Mas, por trás dessa imagem quase mística, existe um processo muito mais terreno — e surpreendentemente químico.

Para que o que sai da chaminé seja preta ou branca, receitas de pequenas bombas de fumaça são utilizadas durante o conclave.

Após a morte e o funeral do papa Francisco, nascido Jorge Mario Bergoglio, aos 88 anos, na última segunda-feira (21/4) a Igreja Católica inicia um processo para escolher um novo pontífice para ao cargo.

•        Como a fumaça é feita

A partir do início dos anos 1800, as cédulas usadas pelos cardeais eram queimadas após cada votação como forma de indicar que não havia sido alcançado um consenso para a eleição. A ausência de fumaça, por outro lado, sinalizava que um novo papa havia sido escolhido.

Desde 1914, essa prática foi aprimorada: a fumaça preta indica que os cardeais reunidos ainda não chegaram ao consenso de dois terços necessário para eleger um novo papa. Quando esse momento chegar, a fumaça sairá branca.

A origem da fumaça está na queima das cédulas de votação em um forno especial.

Para colorir a fumaça, porém, são usados aditivos químicos queimados em um segundo forno. No passado, o Vaticano utilizava métodos mais simples: palha úmida produzia a fumaça branca e piche produzia a preta.

Quem já acendeu uma fogueira sabe que grama molhada cria uma fumaça clara e que jogar pneus velhos no fogo vai gerar uma fumaça preta densa e tóxica — cheia de partículas de carbono prejudiciais à saúde e potencialmente cancerígenas.

A mudança de método, no entanto, não foi motivada por preocupações ambientais. O problema era outro: em conclaves anteriores, a fumaça saía acinzentada e ambígua, gerando confusão. Por isso, a partir de 2005, decidiu-se adotar uma técnica mais precisa, baseada em compostos químicos.

Recentemente, o Vaticano divulgou os ingredientes. Para a fumaça preta, usa-se uma mistura de perclorato de potássio, antraceno e enxofre. Já a fumaça branca é feita com clorato de potássio, lactose (açúcar do leite) e resina de coníferas, conhecida como rosin, usada por músicos para aumentar o atrito em arcos de violino.

Na prática, estão apenas produzindo versões simples de bombas de fumaça comuns. Essas bombas funcionam combinando uma substância rica em carbono — como açúcar — com um agente oxidante, que fornece o oxigênio necessário para a queima. Perclorato e clorato de potássio são os oxidantes mais comuns. Já o carbono vem do antraceno, da lactose e da resina.

O antraceno, presente no alcatrão de carvão, é excelente para gerar fumaça preta densa, mas deixou de ser usado em fogos de artifício por ser cancerígeno. O enxofre, que também queima bem, era parte essencial da pólvora — e a mistura do Vaticano para a fumaça preta lembra bastante essa antiga fórmula, substituindo apenas o salitre pelo perclorato.

Para a fumaça branca, em aplicações militares, costuma-se usar pó de zinco e hexacloroetano — um solvente tóxico que, embora eficaz, pode causar danos ao fígado e problemas respiratórios. Não é surpresa, portanto, que o Vaticano tenha optado por uma versão mais segura.

Hoje, o sistema é altamente controlado. Aquecedores elétricos e ventiladores garantem que a fumaça saia com força, e o processo foi testado para evitar que a fumaça preta se desfaça em partículas menores e acabe parecendo branca — um efeito que às vezes acontece em fogueiras.

•        Como um novo papa é escolhido?

Quando um papa morre, nove dias de luto são declarados e o enterro ocorre entre o 4º e o 6º dia após a morte.

O funeral é organizado pelo camerlengo (título do tesoureiro nomeado da Santa Sé), que também organiza o conclave que escolhe o próximo papa.

Atualmente, essa função de camerlengo é desempenhada pelo cardeal irlandês Kevin Farrell.

Os papas são tradicionalmente escolhidos por cardeais em um processo eleitoral extremamente secreto que remonta à época medieval.

Os cardeais devem se reunir no Vaticano entre o 15º e o 20º dia após a morte do papa, onde ficarão em acomodações especiais enquanto as eleições acontecem.

Um total de 135 cardeais participarão do conclave.

Embora existam 252 cardeais no total, apenas aqueles com menos de 80 anos têm direito a voto.

<><> Quem pode se tornar papa e quem o elege?

Um novo papa é eleito após a morte do titular ou após sua renúncia (como fez o Papa Bento 16 em 2013).

O eleito torna-se o líder da Igreja Católica Romana — o Sumo Pontífice.

Qualquer católico batizado pode ser eleito papa.

No entanto, o cargo invariavelmente fica com um dos altos funcionários da Igreja Católica, os cardeais.

São eles quem elegem o novo papa.

Existem 252 cardeais em todo o mundo, que normalmente também são bispos. Somente pessoas com menos de 80 anos podem votar em um novo papa.

O número desses "cardeais eleitores" geralmente é limitado a 120, mas atualmente há 135 deles com condições para eleger o novo papa.

O papa Francisco havia nomeado 21 novos cardeais em dezembro de 2024.

<><> Como os cardeais elegem um novo papa?

Quando um novo papa precisa ser escolhido, todos os cardeais são convocados ao Vaticano, em Roma, para um Conclave papal. Este é um processo eleitoral que se mantém praticamente inalterado há cerca de 800 anos.

No primeiro dia do Conclave, eles celebram a missa na Basílica de São Pedro. Em seguida, reúnem-se na Capela Sistina do Vaticano. Lá, é dada a ordem extra omnes (latim para "todos fora").

A partir de então, todos os cardeais ficam fechados dentro do Vaticano até que um novo papa seja eleito. A palavra "conclave" significa "com chave".

Os cardeais eleitores têm a opção de realizar uma votação inicial na Capela Sistina no primeiro dia do Conclave.

A partir do segundo dia, realizam duas votações todas as manhãs e duas votações todas as tardes na capela, até que os candidatos a papa sejam reduzidos a apenas um.

Nas votações, cada cardeal eleitor escreve o nome do seu candidato preferido nas cédulas de votação sob as palavras Eligio in Summum Pontificem, que em latim significa "Eu elejo como Sumo Pontífice".

Para manter as votações em segredo, os cardeais são instruídos a não usar sua caligrafia habitual.

Se não houver votação decisiva até o final do segundo dia, o terceiro dia é dedicado à oração e contemplação, sem realização de nenhuma votação. A votação prossegue normalmente após esse período.

Um candidato precisa de dois terços dos votos dos cardeais eleitores para ser eleito papa.

O processo pode levar vários dias, ou às vezes semanas.

<><> O que acontece dentro do Conclave papal?

O Conclave é realizado em estrito isolamento. Os cardeais não podem sair do Vaticano, nem ouvir rádio, assistir televisão, ler jornais ou contatar qualquer pessoa no mundo exterior por telefone.

Ninguém tem permissão para entrar nos aposentos dos cardeais, exceto a equipe de limpeza, os médicos e os padres que ouvem suas confissões. Todos juram segredo.

Entre as votações, os cardeais (tanto os eleitores quanto aqueles com idade avançada para votar) dedicam seu tempo a discutir os méritos relativos dos candidatos.

Ninguém tem permissão para fazer campanha abertamente. O Vaticano afirma que os cardeais são guiados pelo Espírito Santo. Apesar disso, o processo de angariar apoio para um ou outro candidato é considerado muito político.

Duas vezes por dia, durante o Conclave, cédulas usadas são queimadas e pessoas do lado de fora do Vaticano podem ver a fumaça saindo da chaminé da Capela Sistina.

Tinta preta ou branca é aplicada nas cédulas. A fumaça preta significa uma votação inconclusiva; a fumaça branca indica a escolha de um novo papa.

<><> O que acontece quando um papa é eleito?

Após a vitória na votação, pergunta-se ao escolhido: "Você aceita sua eleição canônica como Sumo Pontífice?"

Ele escolhe o nome pelo qual deseja ser conhecido como papa e coloca as vestes oficiais.

Os cardeais prestam homenagem e prometem obediência.

Um anúncio é feito na sacada da Basílica de São Pedro para a multidão abaixo, com as palavras habemus papam, que em latim significa: "Temos um papa".

O nome do novo papa é revelado, e o próprio papa aparece. Ele faz um breve discurso e dá a tradicional bênção urbi et orbi – latim para "à cidade e ao mundo".

Posteriormente, os resultados de cada rodada de votação no Conclave são mostrados ao papa.

Eles são então lacrados e depositados nos arquivos do Vaticano, podendo ser abertos somente sob ordem do papa.

 

Fonte: BBC Future/BBC Word Service

 

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