O que se sabe sobre enorme apagão que causou
caos em Portugal, Espanha e outros países da Europa
A energia elétrica na Espanha foi quase
totalmente restaurada e as subestações em Portugal foram reativadas após os
apagões em massa registrados na segunda-feira (28/4).
Os grandes cortes de energia causaram grandes
transtornos — e um estado de emergência permanece em vigor na Espanha.
Foram registradas cenas de confusão em
estações de trem, e as aulas foram suspensas em muitas áreas da Espanha nesta
terça-feira (29/4).
Segundo informações divulgadas até o momento,
mais de 500 voos foram cancelados.
A causa do apagão ainda é desconhecida.
O primeiro-ministro português, Luís
Montenegro, afirmou que "não há indícios" de um ataque cibernético,
enquanto o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, alertou contra qualquer
especulação enquanto as investigações não avançarem.
• Como
o apagão começou
O enorme apagão atingiu Portugal e Espanha na
segunda-feira (28/4) e provocou confusão e problemas em diversos serviços.
Andorra e partes da França também relataram
cortes de energia.
Na Espanha, restaurantes e lojas ficaram sem
luz, e o Aberto de Tênis de Madri foi suspenso.
Da mesma forma como em Portugal, o metrô
parou de funcionar, assim como os semáforos, o que gerou um grande caos no
trânsito.
Nas redes sociais, circularam vídeos de
passageiros caminhando pelas estações escuras de metrô.
Os aeroportos também registraram cancelamento
de diversos voos. A companhia aérea portuguesa TAP chegou a fazer um alerta
para que passageiros não se dirijam ao aeroporto.
A causa do apagão que deixou milhares de
pessoas sem luz, telefone, internet e transporte, ainda não foi divulgada, mas
o primeiro-ministro de Portugal e também presidente do Conselho Europeu, Luis
Montenegro, disse que "não há indícios" de que um ataque cibernético
esteja por trás do corte de energia.
Mais tarde, a entidade comercial que
representa o setor elétrico na Europa informou ao programa The World Tonight,
da BBC, que ocorreu um problema com a conexão de energia entre a França e a
Espanha.
Kristian Ruby, secretário-geral da
Eurelectric, também descreveu a interrupção como "algo muito, muito
raro".
"Houve um problema técnico específico
que surgiu e, portanto, a rede espanhola foi desconectada da rede europeia mais
ampla hoje mais cedo", afirmou Ruby.
"Agora, a julgar apenas por essa
situação, não se poderia imaginar que isso causaria um corte de energia em toda
a Península Ibérica, então minha avaliação é que
Nos dois países, centenas de pessoas correram
para os caixas eletrônicos para sacar dinheiro, já que muitas lojas não
conseguiam receber pagamentos com cartões.
"Um amigo disse que os caixas
eletrônicos estão cheios, e todos estão sacando dinheiro físico por
segurança", relatou à BBC News Brasil a professora brasileira Laura
Beatriz Faleiro Diniz, que vive no Porto, em Portugal.
A brasileira Nina Alves, que vive em
Barcelona, conta que precisou caminhar por quase cinco quilômetros para voltar
para casa.
"Tive que andar mais de 1 hora para
chegar em casa, porque não tinha metrô, nem táxi livre, os ônibus estavam todos
apinhados de gente e o trânsito um caos", relatou à BBC News Brasil.
Após chegar em casa, ela conta que foi até a
escola dos filhos, muito preocupada, pois além da eletricidade, eles estavam
sem telefone também. "Mas estava tudo bem, porque a escola tem
gerador."
"Depois começamos a andar pelo bairro,
para tentar comprar comida que não precisasse ser cozida, porque nosso
apartamento só tem forno e fogão elétricos. Mas todos os mercados estavam
fechados. Achamos uma padaria aberta, mas que só vendia com dinheiro em
espécie. E quem anda com dinheiro hoje em dia? Eu, pelo menos, não",
conta.
Ela afirma que a família acabou se
alimentando com pães, biscoitos e sucos que já tinham em casa.
A Espanha declarou estado de emergência e
diversas regiões solicitaram que o governo central assuma a ordem pública e
outras funções.
Na manhã desta terça-feira, praticamente
todas as áreas da Espanha estavam com a rede elétrica restabelecida. O mesmo
aconteceu em Portugal.
Em Madri, a energia começou a ser
restabelecida aos poucos na segunda-feira, a começar por algumas lojas e o
metrô, assim como em Portugal.
Ainda assim, a interrupção de energia teve
enorme efeito nos dois países.
Os serviços de trem continuaram suspensos, e
milhares de pessoas ficaram presas ao longo do dia.
Lojas em algumas áreas relataram prateleiras
vazias, à medida que as pessoas estocavam suprimentos básicos.
As autoridades tentaram projetar um clima de
calma, mas, ao mesmo tempo, aumentaram a mobilização das forças de segurança.
Também pediram aos cidadãos que limitassem o
uso de celulares, com as redes sob pressão, e que não fizessem viagens
desnecessárias.
"Não saímos de casa, só para ir ao
mercado, estamos tentando usar o celular com moderação para poupar bateria e
poupando também a água que temos para consumo", contou Laura Diniz, que
vive no Porto.
"Nossa casa não tem água porque a maior
parte dos prédios aqui contam com caixas subterrâneas, ou seja, precisa da
bomba funcionar para a água subir, e essa bomba precisa de energia", disse
ela.
Pessoas com passagens para viajar a partir da
estação de trem de Barcelona passaram a noite no local e ainda não conseguiram
sair na manhã de terça, o que gerou uma frustração crescente.
Em entrevista à BBC News, Ariani contou que
está na estação desde as 20h da noite passada com uma menina de 10 anos e
"não obteve respostas" sobre quando elas poderiam começar a viagem
marcada, cujo destino é a capital Madri.
Ela afirma que outras pessoas com passagens
para hoje ganharam prioridade.
"Pessoas com trens às 5h estão chegando
de banho tomado, dormiram em casa e vão direto", disse ela.
"E nós dormimos todos no chão como
cachorros."
• 'Kit
guerra'
No fim de março, a Comissão Europeia propôs
que os europeus mantenham em casa "kits de sobrevivência" para 72
horas, como medicamentos, lanterna, pilhas, alimentos e dinheiro.
A iniciativa faz parte de uma estratégia para
enfrentar desastres naturais, pandemias, ciberataques ou até mesmo uma guerra.
"Eu achei um exagero", conta o
brasileiro Marcelo Casarini, que vive em Caxias, a cerca de 20 minutos de
Lisboa.
"Ninguém fez esse kit. Agora acabei
gastando 98 euros (cerca de R$ 632) em enlatados, porque eu não sabia quando a
energia ia voltar."
"Há um tempo atrás o governo nos alertou
a fazer kits emergenciais para 72h de reclusão e todos estamos pensado sobre
isso agora", contou Laura Diniz, que vive no Porto.
"Esse apagão aconteceu poucas semanas
depois de a União Europeia mandar todo mundo comprar um 'kit guerra'. Tem muita
gente assustada", afirmou Nina Alves, de Barcelona.
Em Madri, a professora inglesa Hannah Lowney
disse que estava no meio da compra do supermercado quando a luz caiu.
"Os semáforos se apagaram. As pessoas
estão deixando seus escritórios e indo a pé para casa, porque não sabem que
horas os ônibus vão passar. Parece que ninguém tem ideia de quando a luz vai
voltar. É um pouco preocupante que esteja assim no país todo, nunca passei por
algo assim antes", contou à repórter Barbara Tasch, da BBC News.
"É uma loucura, estamos tentando pagar
por nosso almoço, mas está tudo desligado", disse Emily Lansdown, uma
turista na cidade.
Fotos circulando na internet mostraram
grandes filas em caixas eletrônicos. Uma imagem mostrava um chef de cozinha que
usava a lanterna de seu telefone para conseguir trabalhar.
Os apagões começaram pouco depois do meio-dia
no horário da Espanha (8h no horário de Brasília), e atingiram diversas cidades
nos dois países. A operadora nacional de trens, Renfe, disse que toda a
eletricidade foi cortada às 12h30, e todos os trens pararam.
O prefeito de Madri, José Luis
Martínez-Almeida, publicou um vídeo nas redes sociais pedindo que as pessoas se
deslocassem o mínimo possível.
"Eu peço a todos os residentes de Madri
que mantenham seus movimentos ao mínimo absoluto e, se possível, que fiquem
onde estão. Queremos manter todas as estradas livres", disse o prefeito.
Ele também pediu que as pessoas só entrassem
em contato com serviços de emergência em casos de extrema necessidade. Quem não
conseguir contato e ainda assim precisava de ajuda deveria se dirigir a
delegacias, estações de bombeiro ou hospitais.
Em novembro de 2006, cerca de 10 milhões de
pessoas ficaram sem energia elétrica após uma série de panes na rede da
Alemanha, que atingiu diversos países do continente, chegando ao Marrocos e
norte da África.
Na época, a empresa alemã de energia E.On
apresentou um relatório afirmando que se tratou de falha humana na rede.
Legenda da foto,Passageiros buscam
informações sobre trens remarcados após apagão que atingiu Espanha e Portugal
• O
apagão está relacionado a um ataque cibernético?
Para Joe Tidy, correspondente de
cibersegurança da BBC News, a resposta simples é sim, pode ser um ataque
cibernético, já que nunca se pode dizer "nunca" quando o assunto é
vulnerabilidade das redes de internet.
No entanto, segundo ele, é muito cedo para
confirmar os motivos do apagão — e é muito mais provável que algum tipo de
acidente ou erro técnico tenha causado a interrupção no fornecimento de
eletricidade.
Se de fato o evento está relacionado a um
ataque cibernético, isso seria completamente sem precedentes em escala e
impacto, avalia Tidy.
Redes elétricas já foram desconectadas no
passado — duas vezes, até onde se sabe.
Na primeira delas, hackers patrocinados pelo
Estado russo foram acusados de causar cortes de energia na Ucrânia.
Dezenas de milhares de casas ficaram sem
energia por horas no frio inverno de 2015.
O mesmo grupo é vinculado a uma ação repetida
e bem-sucedida à capital Kiev, um ano depois do primeiro episódio.
Os dois ataques chocaram o mundo cibernético
à época e foram extremamente sofisticados. Eles provavelmente envolveram meses
de trabalho dos invasores.
Mas ambos foram localizados e corrigidos em
poucas horas.
Se o que está acontecendo agora em Portugal e
Espanha fosse algum tipo de ataque, seria uma escalada massiva do que se
pensava ser possível, pontua o correspondente da BBC News.
• As
fake news sobre o apagão na Europa
Um enorme apagão atingiu Portugal e Espanha
nesta segunda-feira (28/4), provocando confusão e problemas em diversos
serviços nos países afetados. Andorra e partes da França também relataram
cortes de energia.
Assim que parte da Península Ibérica ficou
sem energia, uma onda de desinformação tomou conta das redes sociais.
Mensagens no WhatsApp, vídeos no TikTok e até
agências internacionais transmitiram conteúdo falso ou descontextualizado sobre
o blecaute.
Um texto atribuído à CNN Internacional,
assinado desde Bruxelas, apontava "grupos russos apoiados pelo
Estado" como responsáveis por um suposto ataque cibernético que teria
atingido 15 países europeus.
O artigo incluía declarações falsas de Ursula
von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, e declarações falsas do
Kremlin, da Otan e de uma coletiva de imprensa que nunca ocorreu.
A CNN não mantém correspondente em Bruxelas,
e o texto não foi publicado no veículo americano nem na subsidiária portuguesa.
A CNN Portugal, inclusive, publicou um texto em seu site e esclareceu ao vivo
que a informação é falsa.
A causa do apagão ainda não está clara, mas
não há indícios de um ataque cibernético, afirmou Antonio Costa, presidente do
Conselho Europeu.
"As operadoras de rede elétrica de ambos
os países estão trabalhando para encontrar a causa e restaurar o fornecimento
de energia elétrica", escreveu no X.
"Neste momento, não há indícios de
qualquer ataque cibernético."
Notícias com informações ainda não
confirmadas tentaram explicar a origem do apagão.
Uma reportagem da Reuters atribuiu o blecaute
a um "fenômeno atmosférico raro" chamado "vibração atmosférica
induzida".
A reportagem atribuia a informação às Redes
Energéticas Nacionais (REN), responsável pela distribuição de energia em
Portugal.
No entanto, a distribuidora declarou que
ainda é cedo para determinar as causas do apagão e reforçou que "todas as
informações de outras fontes devem ser desconsideradas".
Mas a notícia foi republicada por diversos
veículos de notícias no mundo, inclusive no Brasil. Por volta das 15h, a
agência retificou o erro.
Mais cedo, o chefe de operações da operadora
de rede REN, Eduardo Prieto, em uma coletiva de imprensa, afirmou que o
restabelecimento do fornecimento de energia elétrica na Espanha poderia levar
de seis a dez horas.
Em aplicativos de mensagens, notícias antigas
também ressurgiram.
Uma notícia de 2021, sobre um avião de
combate a incêndios que danificou uma linha de alta tensão na França,
provocando cortes de energia em Portugal e Espanha, foi compartilhada novamente
no WhatsApp e em outros canais.
Embora realmente tenha acontecido, a história
não tem nenhuma relação com o apagão desta segunda-feira.
O reestabelecimento da energia foi outro alvo
de desinformação.
Em vídeos no TikTok, ganhou força a versão de
que a "reposição total da energia elétrica em Portugal levaria pelo menos
72 horas".
A mensagem atribuía a estimativa às
distribuidoras de energia, sugerindo que a "re-energização gradual"
seria tão demorada que consumidores ficariam até o fim de semana sem luz.
Em nota oficial, tanto a REN quanto a E-Redes
desmentiram categoricamente qualquer previsão de três dias para a normalização
do fornecimento.
As gestoras reiteraram que "não há como
antecipar prazos precisos" e que o restabelecimento será feito em fases,
mas certamente muito antes das 72 horas alegadas.
A Red Eléctrica, distribuidora espanhola,
informou que a reposição da energia levaria entre seis e 10 horas na Espanha.
Já a REN, distribuidora portuguesa, disse ser
"impossível prever" quando situação estará normalizada.
No início da tarde, a luz já havia voltado em
algumas regiões da Espanha. O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez,
afirmou que a eletricidade foi restabelecida em algumas áreas do norte e do sul
do país.
Fonte: BBC News

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