sábado, 5 de abril de 2025

Brasil responderá tarifaço dos EUA aliando-se à União Europeia

O Brasil usará a iminente guerra comercial acionada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com o tarifaço mundial para se aproximar da União Europeia e destravar o acordo entre o Mercosul e o bloco europeu. A reação do governo brasileiro está sendo trabalhada junto às autoridades internacionais e ocorre de forma distoante de outros países, que já preparam, individualmente, retaliações unilaterais.

A articulação vinha sendo trabalhada, mas não era certa. Não foi coincidência que o Congresso brasileiro deixou a Lei da Reciprocidade pronta para o presidente Lula sancionar exatamente no mesmo dia em que o presidente Donald Trump anunciava o tarifaço mundial. O Senado aprovou o texto nesta terça (01), seguida da votação urgente dos deputados na quarta-feira, de forma a possibilitar uma resposta imediata do governo brasileiro, que já previa não sair isento da guerra comercial.

Mas estar entre os países “menos taxados” não era seguro. E, mesmo diante do que ainda pode desencadear uma grave crise global, o Brasil decidiu adotar outra estratégia: não apelar a uma postura individual, mas utilizar a “vantagem” da América Latina, de estar entre os países mais poupados pelos EUA, para mostrar apoio à Europa e destravar o grande acordo comercial com a União Europeia.

Foi a postura do vice-presidente, que como ministro do Comércio Exterior assumiu como porta-voz do governo neste embate, que revelou o tom: um dia antes do anúncio de Trump, Alckmin disse que o governo iria definir qual seria a sua linha de ação após a decisão da Casa Branca.

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Com o Brasil na lista dos “menos piores” taxados, tardou algumas horas para Alckmin voltar a se posicionar. “Fomos incluídos na tarifa menor, mas não achamos justo isso”, resumiu o vice-presidente sobre o sentimento do governo, ao final da tarde desta quinta (03). Aquela altura, a lei de Reciprocidade já estava no gabinete do presidente Lula, pronta para ser assinada.

A fala do ministro foi dada em entrevista ao Blog do Magno, da Folha de Pernambuco, que já estava agendada para a quarta-feira, mas foi adiada para o início da noite de quinta-feira, diante das reuniões emergenciais convocadas por Lula junto a Alckmin e seus ministros para definir a atuação do governo brasileiro.

A entrevista se tornou, assim, a primeira resposta do governo brasileiro sobre o que iria fazer.

“Entendemos que a decisão unilateral dos EUA não é boa para o comércio porque cria imprevisibilidade, cria insegurança, isso diminui investimento. Mesmo o Brasil tendo ficado com a menor tarifa, para os outros países, foi 10%, para outros países foi muito pior, mas mesmo para nós também foi ruim. O caminho que vemos é o caminho do diálogo, da negociação, é isso que nós vamos fazer”, disse.

Questionado sobre a Lei da Reciprocidade, Alckmin respondeu: “É uma boa legislação, necessária, importante. Mas nós não pretendemos usá-la.”

“O que nós queremos fazer é o diálogo e a negociação. Mesmo o Brasil ficando com a menor tarifa de 10%, ela é ruim. Ninguém ganha numa guerra tarifária, ninguém ganha, perde o conjunto”, continuou.

Em seguida, em tom otimista, Alckmin afirmou que as tarifas dos EUA contra as importações mundiais deverá “acelerar o acordo entre o Mercosul e a União Europeia”.

“É o maior acordo do mundo, hoje. São 720 milhões de pessoas, 22 trilhões de dólares. Os 5 países do Mercosul, com a entrada da Bolívia e 27 dos países mais ricos do mundo na União Europeia. É um ganha-ganha.”

·        A Lei de Reciprocidade

O texto aprovado pelo Congresso nesta semana e enviado deve ser sancionado pelo presidente Lula em breve, apesar de o governo já ter anunciado que não quer utilizar a nova lei contra o tarifaço dos Estados Unidos.

Até então, o Brasil adotava, somente, uma normativa da Organização Mundial do Comércio (OMC), que impede os países de favorecer ou penalizar com as tarifas outros parceiros comerciais. Mas a nova lei aprovada pelo Congresso, que recebeu amplo apoio no Legislativo, incluindo bancadas conservadoras e ruralistas, permite que o princípio da OMC seja descumprido.

Na prática, permitirá que o governo brasileiro adote retaliações comerciais e contramedidas a barreiras comerciais ou legais decretadas no mercado internacional contra produtos brasileiros. Assim como fez Trump, Lula poderia iniciar uma sobretaxação contra importados dos EUA, de forma isolada, que não seja proporcional às taxas aplicadas pelo Brasil para outros países.

A Lei da Reciprocidade também permite que o Brasil suspenda as obrigações com acordos comerciais estrangeiros, permitindo uma autonomia de decisões que podem escapar das regras junto aos blocos econômicos que detem acordos.

Em um terceiro fator de retaliação, a nova lei permite que o Brasil suspenda o pagamento de royalties e de registro de patentes de indústrias e indivíduos estrangeiros como forma de retaliação direta, em “caráter excepcional”. Esta modalidade é uma das que mais afeta indústrias e laboratórios internacionais.

<><> Acordo comercial com o Mercosul é uma "grande oportunidade" devido às tarifas dos EUA, diz União Europeia

Fechar um acordo comercial com o bloco Mercosul seria uma "grande oportunidade" para a União Europeia, dadas as incertezas provocadas pela decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de adotar uma nova rodada de tarifas, disse um porta-voz da UE nesta sexta-feira.

"Vamos investir muito tempo e energia com os Estados membros para finalizar o acordo", acrescentou.

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Apesar das reservas anteriores, a França realizou na quinta-feira uma reunião com 10 países da UE para discutir um possível acordo comercial com o Mercosul, sinalizando disposição de diversificar as parcerias comerciais.

¨      Estratégia do governo Lula frente ao tarifaço de Trump será a negociação

Diante da nova onda de tarifas comerciais impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre o aço e o alumínio brasileiros, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva traça uma estratégia que prioriza o diálogo e a via diplomática, embora não descarte a possibilidade de retaliação. A informação foi publicada nesta quinta-feira (4) pela Folha de S.Paulo, que revelou bastidores e posicionamentos de autoridades brasileiras frente ao tarifaço norte-americano.

A abordagem definida pela administração Lula prevê uma atuação em duas frentes: de um lado, o Brasil envia sinais públicos de que tem meios legais para reagir e adotar contramedidas; de outro, trabalha para avaliar o real impacto das tarifas e manter canais de negociação com os Estados Unidos, com o objetivo de reabrir cotas para exportações de produtos siderúrgicos brasileiros.

A importância do setor é inegável. Apenas em 2024, as exportações de produtos semiacabados de ferro ou aço para os EUA somaram US$ 3,5 bilhões. O governo brasileiro sustenta que há argumentos sólidos a seu favor: o Brasil exporta materiais semiacabados, o que não compete diretamente com a indústria americana, e é um dos grandes compradores de carvão metalúrgico dos próprios Estados Unidos.

<><> Cotas na siderurgia

O Instituto Aço Brasil, que representa as siderúrgicas nacionais, reforçou que a prioridade é restaurar o acordo de cotas, encerrado recentemente, que previa isenção tarifária para esses produtos. A entidade defende a solução negociada como o melhor caminho para preservar empregos e a competitividade do setor.

Em evento realizado na quinta-feira (3), o presidente Lula foi enfático: “O Brasil respeita todos os países, do mais pobre ao mais rico, mas exige reciprocidade. Diante da decisão dos EUA, de impor sobretaxa aos produtos brasileiros, tomaremos todas as medidas cabíveis para defender nossas empresas e nossos trabalhadores brasileiros”. Ele também mencionou a Lei da Reciprocidade, aprovada pelo Congresso Nacional, e destacou que o país não aceitará passivamente ataques ao seu setor produtivo: “[O Brasil] não bate continência para nenhuma outra bandeira que não seja a verde e amarela”.

O tom presidencial, contudo, contrasta com a postura mais cautelosa expressa pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin. Também na quinta-feira (3), durante entrevista a um podcast, Alckmin declarou: “[É] uma boa legislação, necessária, importante, mas não pretendemos usá-la. O que queremos fazer é o diálogo e a negociação. Mesmo o Brasil ficando com a menor tarifa, 10%, ela é ruim. Ninguém ganha numa guerra tarifária, perde o conjunto”.

Nos bastidores, membros do governo acreditam que os esforços diplomáticos já produziram efeitos positivos. A tarifa aplicada ao Brasil foi inferior à imposta a outros países, o que seria reflexo da insistência brasileira em ressaltar dados concretos: o país aplica apenas 2,7% de tarifa média a produtos americanos e os EUA acumulam superávits comerciais recorrentes nas trocas com o Brasil ao longo dos últimos 15 anos.

<><> Impactos negativos

Entretanto, os impactos negativos já preocupam setores industriais. A Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) alertou que a elevação tarifária afeta diretamente a competitividade brasileira. Em 2024, 25% das exportações do setor foram destinadas aos Estados Unidos. “Seremos menos competitivos em relação à indústria local [americana] de máquinas e equipamentos. Podemos citar como exemplo máquinas agrícolas, rodoviárias e máquinas para a indústria de transformação”, apontou a associação.

O presidente da ApexBrasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), Jorge Viana, adotou tom realista: “O Brasil não tem que focar em qual vantagem a gente vai tirar disso. Abrem-se muitas possibilidades, mas acho que, antes das possibilidades, vão vir as dificuldades”. Ele acrescentou: “Quando o Congresso cria um instrumento de reciprocidade, já está mandando um sinal para os negociadores dos Estados Unidos de que tem isso [possibilidade de retaliar]. [Precisa] ter cautela e calma nessa hora”.

Nos corredores diplomáticos, há quem veja o episódio como uma oportunidade para acelerar o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, tese defendida por setores europeus. Porém, o embaixador da França no Brasil, Emmanuel Lenain, afirmou que o endurecimento da política comercial americana não reduzirá as resistências francesas às cláusulas do tratado.

O governo brasileiro avalia, neste momento, todas as variáveis. A prioridade é entender os impactos reais da medida sobre a pauta exportadora nacional, antes de tomar qualquer ação retaliatória. O sinal está dado: o Brasil está preparado para agir, mas prefere a via da negociação.

¨      Mesmo tarifa mínima é ruim e Brasil terá nova reunião com EUA na próxima semana, diz Alckmin

O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, afirmou nesta quinta-feira que a tarifa de importação imposta pelos Estados Unidos ao Brasil na véspera é ruim, apesar de ter ficado no nível mínimo de 10%, e que os dois países terão uma nova rodada de negociações na próxima semana.

"Mesmo o Brasil tendo ficado com a menor tarifa, para os outros países foi pior... para nós foi também ruim", disse em entrevista a um podcast do jornalista Magno Martins. "Então, já tem marcado para a próxima semana... negociações entre as equipes técnicas, para a gente trabalhar."

O presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou na quarta-feira uma tarifa de 10% sobre todos os produtos brasileiros exportados para os EUA como parte de seu pacote de tarifas recíprocas impostas aos parceiros comerciais dos EUA.

O governo federal pontuou, em nota após o anúncio, que os EUA registraram superávit comercial em sua relação com o Brasil em 2024, de cerca de US$7 bilhões no caso de bens e de US$28,6 bilhões considerando-se bens e serviços.

Alckmin afirmou que, devido a esses dados, o Brasil não apresenta uma ameaça comercial para os EUA e, por isso, considera injusta a taxação, apontando também que a decisão cria imprevisibilidade e enfraquece o comércio mundial.

"O Brasil não é problema. Por isso, nós fomos incluídos na tarifa menor, mas não achamos justo isso e por isso vamos trabalhar para melhorar essa situação", disse.

O vice-presidente lembrou que o Congresso aprovou projeto, que seguiu para sanção presidencial, que estabelece critérios para a reação do Brasil a barreiras e imposições comerciais de nações ou blocos econômicos contra produtos nacionais. Mas ele destacou que o governo enxerga o diálogo como o melhor caminho de negociação no momento e, portanto, não pretende usar o instrumento.

MERCOSUL E ETANOL

Ao ser questionado sobre os possíveis efeitos das tarifas sobre o etanol, que subiram de 2,5% para 12,5% de acordo com o vice-presidente, Alckmin afirmou o Brasil é um dos maiores produtores do biocombustível no mundo e que é preciso olhar sua comercialização internacional juntamente com a de açúcar.

"Se a gente pegar o açúcar que nós exportamos para os Estados Unidos, tem uma cota muito pequena e acima desta cota não é 10%, é 90% a alíquota de importação. Por isso, a gente deve olhar o conjunto", disse.

Apesar do tarifaço de Trump, Alckmin disse ver chance de que o quadro ajude a acelerar o acordo Mercosul-União Europeia.

"Por outro lado, acho que vai acelerar o acordo Mercosul-União Europeia, que é o maior acordo do mundo hoje... é um ganha-ganha, assim que vejo o comércio exterior", disse.

O comentário de Alckmnin vai na mesma linha do presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), Jorge Viana.

"Já ouvimos e vimos manifestações de líderes europeus que dizem que vão acelerar o processo de validação do acordo Mercosul-União Europeia", disse Viana mais cedo, em entrevista coletiva.

Em dezembro de 2024, Mercosul e União Europeia fecharam o acordo de livre comércio negociado há 25 anos, mas há um longo processo para transformá-lo em realidade. O texto do acordo precisa ser legalizado, traduzido e depois aprovado pelos países-membros dos blocos, e pode até ser bloqueado, sendo a França o oponente mais feroz.

Nesta quinta-feira, porém, apesar das reservas anteriores, a França realizou uma reunião com dez países da UE para discutir o acordo comercial com o Mercosul, sinalizando que essa pode ser uma forma de o bloco europeu compensar o impacto das tarifas dos EUA sobre suas exportações.

 

Fonte: Jornal GGN/Reuters/Brasil 247

 

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