sábado, 5 de outubro de 2024

Pires na mão e sucessivas derrotas: está na hora de Zelensky encarar a realidade sobre a Ucrânia?

A cada dia, o cansaço do Ocidente com o conflito na Ucrânia e as mudanças bruscas no panorama global têm intensificado as pressões sobre Vladimir Zelensky. A última na conta das consecutivas derrotas do ucraniano no campo de batalha é a fracassada invasão ao território russo de Kursk.

A pouco mais de dois meses para as eleições que podem mudar os rumos do principal fiador da Ucrânia no conflito com a Rússia, Vladimir Zelensky esteve nos Estados Unidos em meio à Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e, como sempre, com o pires na mão em busca de novos recursos.

Do temor para a possível vitória de Donald Trump, que promete acabar com o conflito antes mesmo da posse em 2025, para a acusação de usar recursos públicos norte-americanos em favor da campanha da democrata Kamala Harris — cujos sinais demonstram seguir o mesmo caminho do presidente Joe Biden, caso vença —, o ucraniano parece se ver cada vez mais próximo de um beco sem saída.

Em busca de reanimar os aliados ocidentais para uma improvável vitória da Ucrânia, Zelensky apostou novas fichas com a invasão das tropas de Kiev na região russa de Kursk. Porém, a cada dia os confrontos mostram mais um fracasso na conta do ucraniano, que em breve terá de enfrentar outro inverno, época em que o Exército do país sofre ainda mais perdas frente aos desafios trazidos pela estação. Aliado a isso, a mídia ocidental também passou a veicular que até os militares de Kiev que estão na linha de frente defendem o início das negociações com a Rússia.

"Neste momento, estou pensando mais em como salvar o meu pessoal. É muito difícil imaginar que conseguiremos levar o inimigo de volta para as fronteiras de 1991", chegou a declarar um comandante de batalhão ucraniano.

Enquanto isso, a fórmula de paz defendida por Zelensky sofre também com a falta de aderência do Sul Global e até atores da União Europeia, como a Hungria, enquanto a proposta de Brasil e China ganha fôlego mundo afora e deixa o ucraniano isolado. Para piorar o panorama, a preocupante escalada da guerra no Oriente Médio, inclusive com o possível envolvimento do Irã em um conflito com Israel, voltou a tirar o foco da situação de Kiev. E como essa sucessão de fatores pode afetar a Ucrânia?

Larissa Caroline Souza, mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), pontua à Sputnik Brasil que todos os cenários estão na mesa.

"Não sei se tudo isso chega a pressionar Zelensky para conversar com [o presidente russo Vladimir] Putin, mas claramente aumenta a desconfiança das pessoas com o governo. Além disso, dependendo do que possa acontecer nos próximos meses e qual será a resposta da Rússia, podemos, sim, ter maior pressão para Zelensky se sentar à mesa. E já vemos isso acontecendo em alguns comentários de forças ocidentais, dizendo que está na hora de Zelensky conversar, mas muitas coisas podem acontecer. Não dá para dizer se esse ou aquele será o motivo", afirma.

Para a especialista, a invasão de Kursk inicialmente trouxe fôlego para a Ucrânia retomar espaço na mídia, cenário que rapidamente se alterou. "A Ucrânia queria quebrar um pouco essa fadiga com o conflito e a sua perda de força", resume.

Já o pesquisador do Laboratório de Estudos Políticos de Defesa e Segurança Pública da UERJ Lier Pires Ferreira explica, também em declarações à Sputnik Brasil, que o eixo Washington-Bruxelas busca a todo momento testar os limites da Rússia e, para isso, segue apostando na continuidade dos confrontos.

"O povo ucraniano está sofrendo imensamente, e relatórios da ONU apontam que há contração econômica, desemprego, fome e muitas outras mazelas, inclusive uma dívida impagável com o Ocidente", diz.

·        OTAN e a influência na manutenção do conflito ucraniano

Mais uma vez, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) aparece como protagonista para a manutenção de um conflito que já poderia ter sido encerrado e poupado tantas dificuldades. Ferreira recorda que o acordo de 1990, firmado pela aliança com a então União Soviética, que se comprometia a não expandir forças para o leste, não foi cumprido.

"Logo, assim como os EUA não permitiram a implantação dos mísseis nucleares em território cubano, gerando nos anos 1960 a Crise dos Mísseis, o arrepio do direito internacional, do ponto realista e pragmático, a Rússia não permitirá o ingresso da Ucrânia ou da Geórgia na OTAN", enfatiza.

Mesmo assim, a entidade dá sinais de que não vai desistir desse plano. Durante a posse nesta quarta-feira (2), o novo secretário-geral da OTAN, Mark Rutte, disse que uma das prioridades da aliança militar é justamente a Ucrânia. Segundo o especialista, nada disso contribui com o diálogo e a negociação entre Moscou e Kiev.

"O segundo [obstáculo para a paz] é o próprio Zelensky. O presidente da Ucrânia apostou todas as suas fichas na resistência, indo muito além do que era possível prever há quase mil dias — quando o conflito começou. Uma negociação absolutamente desfavorável aos interesses nacionais ucranianos seria deletéria ao presidente Zelensky, comprometendo seu futuro político, senão sua própria vida. Pelo muito que há em jogo, do ponto de vista nacional e pessoal, Zelensky é um obstáculo à paz neste momento, embora nós saibamos que os interesses ucranianos serão os menos relevantes em uma futura mesa", afirma.

·        Invasão em Kursk trouxe 'resultados bélicos pífios'

De volta à atuação ucraniana em Kursk, o especialista classifica como pífios os resultados bélicos para o Exército de Kiev, que demonstrou não ter recursos humanos e financeiros para se sustentar no front.

"Se o propósito era cortar as linhas logísticas que sustentam as tropas russas no território ucraniano, isso não só não aconteceu. Para piorar, abriu uma nova frente em que a Ucrânia não é capaz de se sustentar. Pensando do ponto de vista militar, não político ou propagandístico, não creio que os estrategistas ocidentais acreditem hoje na capacidade ucraniana de virar o jogo nos campos de batalha. Os conflitos em Donbass deixaram muito nítidas as insuficiências táticas e estratégicas da Ucrânia. A dificuldade de seus pilotos em operar no limite com os caças F-16 por pura falta de treinamento também. Se os drones estão mudando os fundamentos da guerra, como declarado recentemente por Putin, talvez o complexo industrial-militar russo hoje esteja mais preparado para a guerra do que a OTAN e seus aliados, inclusive os países eslavos e nórdicos do Leste Europeu", argumenta.

·        Zelensky e seu plano de paz descolado da realidade

Mesmo com todos esses fatores que apontam a derrocada de Zelensky, o ucraniano apresentou um plano de paz em dez pontos que, segundo o pesquisador da UERJ, é "deslocado da realidade", principalmente do ponto de vista político, já que desconsidera por completo os interesses russos.

"O plano de Zelensky só faria sentido se a Ucrânia fosse a vencedora, sendo, portanto, um plano imposto pelo vencedor ao vencido. Como não é esse o caso, é insustentável. Para completar, trago à baila que o Plano da Vitória, que Zelensky também tentou vender ao Ocidente em seu mais recente périplo pelos EUA, não inspirou confiança e, sem confiança, não há adesão. Só a intransigência idealista da OTAN e seus aliados sustenta a situação, pois é certo que Putin não irá recuar. A Rússia aprendeu com os erros do passado, quando acreditou nas promessas de paz do Ocidente."

E assim como o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, Vladimir Zelensky depende da escalada do conflito para se perpetuar no poder, enfatiza o especialista.

¨      Exército russo avança na zona da operação em ritmo acelerado graças a novas táticas, diz mídia

Graças a novas táticas, as Forças Armadas russas estão avançando na zona da operação militar especial na Ucrânia em um ritmo nunca antes visto, informou o The Washington Post.

Segundo o artigo, a tática foi sentida de forma especialmente intensa no território da República Popular de Donetsk (RPD).

As perdas recentes pelas tropas ucranianas dos territórios na cidade de Ugledar é resultado dessa nova tática de combate russa.

"As forças russas ganharam território em agosto e setembro em um ritmo não visto desde 2022", cita o jornal um analista finlandês Pasi Paroinen.

Conforme observado no artigo, as forças russas usam táticas eficazes, como ataques em pequenos grupos, o que reduz a probabilidade de detecção e a eficácia da retaliação.

Além disso, o artigo indica que as forças russas aumentaram a comunicação no campo de batalha, o que ajuda a coordenar melhor os ataques.

"Os soldados ucranianos disseram que os russos têm recursos suficientes para manter a pressão e que a ajuda ocidental não está compensando o déficit de equipamentos."

Algumas das maiores perdas das Forças Armadas ucranianas estão ocorrendo agora em torno da cidade de Ugledar, que se localiza em uma elevação e é um ponto importante para controlar as planícies ao redor.

As autoridades da RPD disseram que a cidade está quase cercada, com todas as estradas sendo controladas por fogo das tropas russas, por isso os ucranianos precisam ou se render ou escapar por sua própria conta e risco em pequenos grupos.

<><> F-16 atualizados do Exército ucraniano são 'vulneráveis' aos caças russos, afirma ex-general dos EUA

Os caças F-16, que a Ucrânia começou a receber de seus aliados, cedem às aeronaves militares russas em termos de capacidades de combate, disse o general aposentado do Exército dos EUA, Gordon Davis, ao Business Insider.

Os países ocidentais aumentaram sua ajuda militar e financeira à Ucrânia desde o início da operação militar especial da Rússia. Moscou alertou repetidamente contra entregas de armas a Kiev, dizendo que isso levaria a uma maior escalada do conflito.

Após inúmeros apelos e treinamento intensivo, Kiev recebeu alguns F-16 de seus aliados ocidentais. Entretanto, as aeronaves têm "alguns problemas com alcance e vulnerabilidade" e "mesmo os melhores sistemas que podemos colocar nessas aeronaves ainda não as tornarão superiores a algumas das melhores aeronaves russas", disse Davis.

Ele lembrou que a Rússia tem "várias centenas de aviões de guerra bastante avançados", incluindo o caça supermanobrável de superioridade aérea Su-35S, o caça multifuncional Su-30SM e o avião interceptador supersônico MiG-31.

"O ponto principal é que, se você puder dar aos F-16 a capacidade máxima de munição e de guerra eletrônica, eles ainda serão um tanto vulneráveis à defesa terrestre e a alguns dos caças mais avançados da Rússia. [...] isso é um problema e continuará sendo um problema", destacou o general aposentado.

No final de agosto, a Força Aérea ucraniana confirmou que um caça F-16 de fabricação norte-americana, que foi transferido para a Ucrânia por seus parceiros ocidentais, caiu poucas semanas após o primeiro lote de tais aeronaves ter sido entregue a Kiev.

O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, enfatizou que os F-16 "têm sido há muito tempo o principal meio de entrega no âmbito das chamadas missões nucleares conjuntas da Organização do Tratado do Atlântico Norte [OTAN]", então Moscou considera o fornecimento desses sistemas ao regime de Kiev uma "ação de sinalização deliberada da OTAN na esfera nuclear". Ele acrescentou que a presença desses caças na Ucrânia não mudaria a situação no campo de batalha, pois seriam destruídos como outros tipos de armas.

<><> Kiev está pronta para sacrificar últimos tanques ocidentais na região de Kursk, diz mídia

Durante o ataque à região russa de Kursk, a Ucrânia usou seus melhores tanques fornecidos pelo Ocidente, que provavelmente não podem ser substituídos em caso de perda, escreve a revista Forbes.

Entretanto, o Ministério da Defesa russo informou recentemente que as tropas ucranianas já haviam perdido 135 veículos blindados na direção de Kursk.

De acordo com a publicação, o ataque envolve a 21ª Brigada Mecanizada das Forças Armadas ucranianas, que possui veículos de combate de infantaria CV90 e tanques Leopard 2A6 alemães ou Strv 122, a variante sueca do Leopard.

De acordo com a Forbes, essas são algumas das melhores peças de equipamento militar de que Kiev dispõe.

"É pouco provável que a 21ª Brigada Mecanizada, com seus modelos de tanques mais novos, receba novos veículos. Os Exércitos sueco e alemão têm dificuldades de manter suas próprias brigadas de tanques; nenhum deles demonstrou disposição de se desfazer de seus melhores tanques", diz o artigo.

A Forbes também admite que as atividades militares na região de Kursk prejudicam outras cidades vulneráveis e equipamentos ao longo de toda a linha de frente.

Porém, segundo o artigo, o Estado-Maior das Forças Armadas da Ucrânia ignorou as recentes perdas na área de Ugledar, que se localiza em uma elevação e é um ponto importante para controlar as planícies ao redor, e continua tentando combater na região de Kursk.

 

Fonte: Sputnik Brasil

 

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