Pepe Escobar: ‘Vendo o rio da China correr’
A importante página da
web Guancha publicou
a transcrição da excelente palestra proferida na Universidade de Renmin sobre
as relações China/ Estados Unidos por Martin Jacques, autor de When
China Rules the World (Quando a China dominar o mundo). Jacques é um
dos pouquíssimos ocidentais com experiência no terreno que de fato entendem a
psique e o modo de vida chineses em comparação com o Ocidente.
Um trecho
particularmente intrigante dessa palestra trata da pesquisa realizada por Danny
Quah, reitor do amplamente respeitado Instituto Lee Kuan Yew, de Cingapura. O
assunto é dinheiro:
“Entre 1980 e 2020, a
participação da Europa no PIB global caiu de 26% para 15%. Em outras palavras,
caiu 11 pontos percentuais, uma queda muito significativa. Embora o declínio
nos Estados Unidos tenha sido menor, verificou-se uma queda de 21% na década de
1980 a menos que 16% em 2020. De uma outra perspectiva, a Ásia e o Leste
Asiático estão em permanente ascensão. Sua participação em 1980 era de 11,5%,
subindo para 25% em 2020. Nesses 25%, a maior parte corresponde à China, que
reponde por 18%”.
O que isso ilustra de
forma patente é o agudo deslocamento do centro de gravidade econômica mundial –
independentemente dos tsunamis retóricos vindos do Hegêmona. Em 1980, o centro
econômico era atlanticista. Quah, no entanto, acredita que o centro econômico
só atingirá a fronteira sino-indiana em 2050.
Quando acrescentamos à
China os 10 membros da ASEAN, sem ao menos levar em conta o Sul da Ásia,
pode-se afirmar que o centro econômico já estará no Leste em 2030, e será
sino-indiano até 2040.
Jacques está correto
quanto a que, nessa época, a “Idade Asiática” irá substituir a “Idade
Ocidental”, vigente no mundo desde 1750. Falando em termos pessoais, depois de
viver e trabalhar na Ásia pela maior parte das últimas três décadas, considero
nosso século o “Século Eurasiano”.
E, resumindo, essa é a
razão de as elites hegemônico/atlanticistas estarem em modo Pânico Profundo. O
almoço grátis – de explorar as riquezas do Sul Global – está chegando ao fim.
·
Hong Kong de novo sob
holofotes
A China já formulou o
plano-mestre de seu desenvolvimento até 2035, e em vários aspectos, indo até
2049. A atual conjuntura, entretanto, é extremamente complexa.
O Banco Popular da
China vem levando muito a sério os tão necessários ajustes na economia. No
início desta semana, o Banco anunciou cortes nas taxas das hipotecas existentes
e na taxa de reserva obrigatória: esse é o montante de dinheiro que os bancos
comerciais têm que manter como reserva. O Banco Popular da China também efetuou
cortes na política cambial de referência e reforçou os mercados de capital.
Então o Politburo,
presidido pelo Presidente Xi Jinping em pessoa, interveio com força total,
comprometendo-se a proteger a iniciativa privada chinesa, a finalmente
estabilizar o sempre claudicante mercado imobiliário e a adotar as despesas
fiscais necessárias.
Isso no que concerne o
front interno. No front externo, a China vai de vento em popa. A prioridade
mais alta é a lenta mas segura internacionalização do yuan. E é aí que entra o
papel crucial de Hong Kong – tal como detalhado em um relatório da Universidade
Renmin.
A China já vem
desdolarizando em ritmo vertiginoso. A participação do dólar dos Estados Unidos
no comércio bilateral caiu de 80% para menos de 50%.
O comércio externo
chinês vem sendo conduzido principalmente em yuan – e o petroyuan nem ao menos
atingiu força máxima. Desde o início da Operação Militar Especial da Rússia na
Ucrânia, em fevereiro de 2022, o yuan se converteu de fato na moeda de reserva
asiática para a Rússia. Paralelamente, Pequim vem acelerando os swaps de moeda
por todo o espectro e designado um maior número de bancos de compensação por
todo o mundo.
Hong Kong está em uma
categoria incomparável quando se trata de instituições financeiras
estado-da-arte. Daí a conexão ser inevitável para os investidores globais:
acordos de todo o tipo são possíveis na China por intermédio de Hong Kong, com
o bônus adicional de evitar as sanções do Hegêmona.
De agora em diante,
portanto, Hong Kong se tornará, mais que nunca, o Santo Graal para todos os
tipos de transações denominadas em yuan. Temos aí um ímã para os craques em
tecnologia financeira.
Hong Kong já é o maior
mercado do mundo para o yuan offshore – processando quase 80% de todos os
pagamentos. Três meses atrás, segundo a Autoridade
Monetária de Hong Kong (HKMA), a
Região Administrativa Especial tinha 151,7
bilhões em depósitos offshore.
Não foi por acidente
que um alto executivo da HKMA participou do Fórum Econômico do Leste em
Vladivostok, no início deste mês. Com os altos juros praticados nos Estados
Unidos e os baixos juros do Banco Popular da China, títulos em yuan offshore
serão emitidos como se não houvesse amanhã.
·
Destruição nuclear ou
a evolução de uma nova ordem imperfeita
De Pequim a Hong Kong,
as elites político-econômicas chinesas sentem-se perfeitamente confortáveis com
o fato de que, pela primeira vez na história, a ascensão de uma grande potência
não vem sendo condicionada por imperialismo, guerra, escravidão e pilhagem e
todos os citados acima, mas sob aquilo que foi codificado pelas reformas de
fins da década de 1970, do Pequeno Timoneiro Deng Xiaoping, como
“desenvolvimento pacífico.
Isso se espelha em
conceitos como ganha-ganha, prosperidade mútua, igualdade, “comunidade de um
futuro em comum para a humanidade” e, como projeto-mestre geoeconômico, os
corredores de conectividade entrelaçados cruzando a Iniciativa Cinturão e Rota
(ICR).
Enquanto a China
investe em desenvolvimento de infraestrutura por todo o mundo, o Hegêmona impõe
sanções, bombardeia, apoia variações das Guerras Eternas e financia e arma
revoluções coloridas.
A “estratégia” do
Hegêmona, que mal se qualifica como mediocridade extrema, vai de o governo dos
Estados Unidos financiar uma campanha de 1,6 bilhões de dólares para difamar a
China até os republicanos se dividirem sobre a questão de uma mudança de regime
em Pequim ser sua meta suprema, e o embaixador democrata em Pequim estar
convencido de que a política de Washington para a China não é demasiado
belicista.
Temos então aquele
insignificante funcionário e Secretário de Estado Adjunto Kurt Campbell – o
homem que inventou o “pivotar para a Ásia” no primeiro mandato de Obama –
ordenando que os europeus hostilizem a China e definindo Pequim, em frente à
Comissão de Relações Exteriores da Câmara, como “o maior desafio de nossa
história”.
Na Ásia, muito poucos
QIs acima da temperatura ambiente dão atenção a esses palhaços. Muito diferente
é o que vem emergindo em discussões informadas do Sul ao Sudeste da Ásia, de
que o avanço dos BRICS não será suficientemente seguro se a ênfase continuar
recaindo em decisões consensuais.
Vem surgindo uma
proposta ousada, de que a Rússia e a China – que atualmente lideram os BRICS –
devem anunciar na cúpula a ter lugar em Kazan, no próximo mês, que eles apoiam
uma aliança yuan/rublo/ouro: o que quer dizer que se o mundo tem que escolher entre
a hegemonia do OTANistão ou a alternativa dos BRICS, é melhor começar com
dinheiro sólido (real).
Mais além da
praticabilidade dessa proposta, há uma séria crítica à Utopia. A Maioria Global
deve ser forçada a encarar a dura realidade que tem pela frente – destruição
nuclear ou a evolução de um nova ordem ainda imperfeita – e tomar posição,
urgentemente.
Enquanto isso, como um
rio imperturbado cortando terreno inóspito e rochoso, a China flui
silenciosamente em seu caminho rumo à primazia pacífica.
¨ Laços entre Rússia e China garantem a estabilidade 'na Eurásia e
em todo o mundo', diz Putin
O presidente russo
Vladimir Putin disse que os laços entre a Rússia e a China estão a um nível sem
precedentes, com os países coordenando esforços no interesse de construir uma
ordem mundial justa.
O telegrama enviado ao
líder chinês Xi Jinping por ocasião do 75º aniversário do estabelecimento de
relações diplomáticas entre os dois Estados foi publicado no site do Kremlin.
"Atualmente, os
laços entre a Rússia e a China estão a um nível elevado sem precedentes. Nossos
países cooperam ativamente nas esferas política, comercial e econômica,
científica e técnica e em muitas outras esferas, coordenando efetivamente os
esforços em assuntos regionais e internacionais no interesse da construção de
uma ordem mundial multipolar justa", disse a declaração.
Putin expressou
confiança de que a implementação dos acordos bilaterais alcançados após as
recentes reuniões vai contribuir para fortalecer ainda mais as relações de
parceria abrangente e cooperação estratégica entre a Rússia e a China, além de
garantir a estabilidade e a segurança na Eurásia e em todo o mundo.
Por sua vez, o
presidente chinês Xi Jinping disse que está pronto para expandir a cooperação
pragmática abrangente entre a China e a Rússia.
Xi acrescentou que a
parceria russo-chinesa implica uma promoção conjunta do "desenvolvimento e
modernização de alta qualidade dos dois países".
"Atribuo grande
importância ao desenvolvimento das relações sino-russas e estou pronto para
trabalhar com o presidente Putin para usar o 75º aniversário do estabelecimento
das relações diplomáticas entre os dois países como uma oportunidade para garantir
firmemente a direção das relações bilaterais, expandir continuamente a
cooperação pragmática abrangente entre a China e a Rússia, promover
conjuntamente o desenvolvimento e a modernização de alta qualidade dos dois
países e dar novas contribuições para manter a paz e a estabilidade em todo o
mundo", disse.
A Rússia e a China
comemoram o 75º aniversário do estabelecimento das relações diplomáticas em 2
de outubro.
A União Soviética se
tornou o primeiro país a reconhecer a República Popular da China no dia
seguinte à sua proclamação.
¨ Xi Jinping promete maiores conquistas e contribuições da China à
paz e ao desenvolvimento da humanidade
Uma recepção para
celebrar o 75º aniversário da fundação da República Popular da China (RPCh) foi
realizada na noite desta segunda-feira (30), hora local, no Grande Palácio do
Povo em Beijing.
O presidente chinês,
Xi Jinping, participou da solenidade e fez um pronunciamento importante. Xi
Jinping reiterou que, desde a fundação da República Popular da China há 75
anos, o nosso Partido uniu e liderou o povo de todos os grupos étnicos do país
a trabalhar incansavelmente, criou dois milagres de rápido crescimento
econômico e estabilidade social duradouro, trazendo uma grande transformação ao
país e um processo histórico irreversível para a revitalização da nação.
Na nova era e nova
jornada, o povo chinês alcançará mais conquistas notáveis e fará maiores
contribuições para a nobre causa da paz e do desenvolvimento da humanidade,
declarou o presidente.
O líder chinês apontou
ainda que a construção de uma nação forte e revitalizada, por meio da
modernização, constitui a tarefa central do Partido e do Estado na nova era e
nova jornada.
A grande revitalização
da nação chinesa é uma aspiração comum de todos os chineses, incluindo os
compatriotas de Hong Kong, Macau e Taiwan, acrescentou Xi Jinping.
O presidente chinês
reiterou que Taiwan é um território sagrado da China. A reunificação completa
do país é uma tendência inevitável que representa a justiça e a vontade da
população, afirmou em seu discurso.
Xi Jinping salientou
que, depois de 75 anos de trabalhos árduos, a modernização chinesa já apresenta
um futuro promissor. Entretanto, o líder chinês afirmou que é preciso pensar
nos cenários piores, permanecer vigilantes contra os perigos, mesmo em tempos
de calmaria, e estar determinados a superar todos os riscos e desafios
incertos. Nenhuma dificuldade pode impedir o povo chinês de avançar ainda mais,
reiterou o presidente da China.
·
China desenvolve
modelo de IA com trilhões de parâmetros em chips próprios
A gigante chinesa de
telecomunicações China Telecom desenvolveu dois grandes modelos de linguagem de
IA utilizando chips de produção própria, sendo um deles com 1 trilhão de
parâmetros, informou o jornal South China Morning Post nesta
segunda-feira.
O modelo de código
aberto TeleChat2-115B e um segundo modelo, ainda sem nome, foram testados em
dezenas de milhares de chips de produção própria, marcando um importante avanço
em meio ao aumento das restrições dos EUA ao acesso da China a semicondutores avançados,
incluindo os chips de inteligência artificial mais recentes da Nvidia, segundo
o jornal.
O desenvolvimento foi
conduzido pelo instituto de pesquisa em IA da China Telecom. O TeleChat2-115B
contém mais de 100 bilhões de parâmetros, enquanto o modelo sem nome possui 1
trilhão de parâmetros. O número de parâmetros envolvidos no processo de treinamento
determina a complexidade e eficiência dos modelos de IA.
Em outubro de 2022, os
Estados Unidos anunciaram uma série de regras restringindo a exportação de
equipamentos e componentes para a produção de chips avançados para empresas
localizadas na China. Um ano depois, o Departamento de Comércio dos EUA emitiu
novas restrições à exportação de tais semicondutores. Essas regras alteraram a
definição de chips de IA e introduziram requisitos adicionais de licenciamento
para seu envio a mais de 40 países, a fim de evitar sua revenda para a China.
Na China, existem mais
de 100 LLMs (modelos de linguagem de grande escala) com mais de 1 bilhão de
parâmetros. Eles podem ser usados em transmissão de informações eletrônicas,
saúde, transporte e em várias outras áreas. Em dois anos, o tamanho dos modelos
de linguagem de grande escala aumentou milhares de vezes, e o custo da potência
computacional continua a cair. A tecnologia LLM está avançando rapidamente e
pode lidar com texto, linguagem e visão, mas, para alcançar a AGI (inteligência
artificial geral, que pode pensar e agir como um humano), os modelos de próxima
geração devem ser maiores, mais complexos e com pensamento lógico de múltiplos
níveis.
Fonte:
Brasil 247/Sputnik Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário