sábado, 5 de outubro de 2024

A lepra de Pablo Marçal e a do Rei Uzias

Pablo Marçal (PM) não tem problema de estima. Suas comparações são sempre hiperlativas. Autopromovido como imbatível, domador de tubarões aos leões da política, dotado de uma capacidade cognitiva tão singular quanto a de Einstein, sua melhor versão sofre uploads de conhecimento na velocidade do personagem Neo, da Matrix. Nesse afã de se fazer conhecer, mirando em heróis da Bíblia para criar identificação com o público evangélico numa espécie de transposição mimética, PM tem errado tanto a mão que, mesmo se apresentando como Davi (por conta do tempo exíguo de TV que tem na campanha), acaba sendo percebido como Golias, o guerreiro filisteu.

Marçal se esqueceu que a grande maioria evangélica é pela paz. Evangélico que gosta de dar tiro, de ver bomba caindo, de ver a mata pegando fogo é da parcela extremista ligada ao fundamentalismo. Estes são uma minoria. No mais, a grande maioria que vai dos moderados aos conservadores, a pregação é pela paz. Eis um dos motivos pelos quais há certo receio dos evangélicos com a esquerda, uma vez que está última foi adesivada como tumultuadora, como “black bloc”. Via de regra o evangélico médio só esquece da pacificação na hora do futebol com os irmãos da igreja; no mais, foge de aglomerações com potencial explosivo. Para você ter uma ideia, até nas igrejas de modelo congregacional em que as assembleias decidem seus rumos, como é o caso das denominações Congregacional e Batista, a frequência dos membros e das reuniões parece estar em desuso. A turma não quer ouvir a palavra “discutir”.

PM, ao fomentar o conflito, ao manobrar um ancião como Datena tirando-o do equilíbrio, ao ter na sua equipe um covarde que ataca seu semelhante em momento de visível distração, criou um bloqueio para com o eleitor evangélico, o mesmo que o incensou em um primeiro momento. Agora, não só as comparações hiperbólicas com personagens da Bíblia; não só o vídeo da cura mal-sucedida; não só a simulação (como a do oxigênio na ambulância) e os consequentes desmentidos: ele foi tomado como um beligerante, um brigão. Um erro de principiante. O águia das redes sociais ainda está no ovo, necessitando nascer (de novo, inclusive) para compreender um pouco o mundo evangélico, incompreensão esta que atinge uma parcela dos antropólogos deste país.

Foi a cadeirada, ela mais uma vez, que marcou PM como a lepra no Rei Uzias. Uzias foi um bom rei, segundo o próprio testemunho bíblico. No entanto, se perdeu na soberba, pleiteando a única função que não lhe cabia, pois não era sacerdote. É provável que estivesse em curso um processo de autodivinização, comum às autoridades com arroubos autoritários.

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Para piorar, circulam vídeos que mostram o desapego de PM com a verdade. Verdade é uma das senhas que abre verdadeiros portais no mundo evangélico; o mesmo que, paradoxalmente, de alguns anos para cá, tem se permitido enredar pelas fake news.

Marçal, como coach destravado que diz ser, se aventurou pela dimensão religiosa-espiritual, como fez Uzias. Todavia, é estranho que alguém que se diz evangélico não saiba que “Deus não se deixa escarnecer”, como lembra o apóstolo Paulo (em Gálatas 6).

É inútil a campanha de PM tentar fazer um “plot twist” narrativo nesse momento. O PM do debate do SBT, pedindo perdão a Tabata, não colou. A lepra (cadeirada) já nasceu. Para Uzias significou o banimento sociopolítico. Para Marçal, espero, pode significar sua circunscrição aos limites do mundo coach e de seus seguidores, o que, convenhamos, conquanto não seja pouca coisa, não deixa de ser uma cerca; latifundiária cerca, trazendo consigo seus limites. Para um coach destravador deve ser horrível saber que seu latifúndio social possui um limite, ainda que fora do alcance da visão.

 

¨      Marçal é o capitalismo selvagem contra os trabalhadores e oprimidos

Buscando uma aura de “outsider” contra o “sistema” (diga-se: PT e STF) Pablo Marçal é na verdade um fiel representante do capitalismo mais selvagem contra a classe trabalhadora e as mulheres, negros, LGBT´s e indígenas. Combinando uma teologia da prosperidade com empreendedorismo, Pablo Marçal defende um choque de capitalismo que só poderá se sustentar com mais e mais ataques aos trabalhadores. Para isso ele vai partir, se eleito, do legado do golpe institucional com as reformas trabalhista, da previdência e lei da terceirização irrestrita, além de todo o neoliberalismo feroz da gestão Tarcísio-Nunes em São Paulo com as privatizações e terceirizações do serviço público que se combinou com o banho de sangue no litoral paulista. Mas precisará ir além, e muito além da medida neoliberal do arcabouço fiscal que o governo Lula-Alckmin implementou. Apoiando-se no Arcabouço Fiscal e nos ataques da gestão Bolsonaro, preservadas por esse governo, fortalecerá essa extrema-direita que se renova em São Paulo, apesar de suas divisões e toma fôlego no Rio de Janeiro com Alexandre Ramagem.

Seu programa que busca vocalizar os valores bolsonaristas da “família tradicional brasileira” contra o direito ao aborto e contra a livre identidade de gênero se combina com um empreendedorismo que significa uma ampliação sem precedentes da precarização do trabalho, em particular da juventude utilizando a carteira de trabalho como símbolo dessa prosperidade. O elemento mais fascistizante de seu discurso é o ódio aos comunistas, que ele considera que são “todos os que estão contra ele” em uma caricatura do cenário eleitoral em São Paulo, para demonizar a luta da classe trabalhadora contra o verdadeiro sistema em questão, que é o sistema capitalista. Suas propostas e seus projetos só podem se erguer sobre o suor e sangue da classe trabalhadora, o que significa um exponencial aumento da taxa de lucro sob a bota da exploração capitalista. Se as frações da burguesia considerarem que Marçal é capaz de atender aos seus interesses, sem ser uma figura que desestabilize os planos de normalização do regime político pós-Bolsonaro, não hesitarão em apoiar sua candidatura para avançar em novas reformas neoliberais.

Entretanto, estes cenários ainda estão muito em aberto uma vez que nos últimos anos as frações burguesas optaram por apoiar uma frente ampla contra a instabilidade bolsonarista, retomando as rédeas do controle do país e garantindo que os ataques viessem por parte de um governo que poderia também, via burocracias sindicais, conter possíveis lutas que se desenvolvessem. Ainda assim viemos vendo ao longo dos anos, bravas resistências, como a greve das universidades e institutos federais, IBAMA, INSS, entre outros. Da parte de Marçal, o “anti-sistêmico” já deixou claríssimo que entrará no jogo institucional caso eleito (prometendo colaborar inclusive com Lula no governo), que jogará todas as regras do jogo, porque dele Marçal nunca esteve de fora: o jogo capitalista. Por isso, com seu discurso populista de direita na tentativa de aparecer como pobre, que veio da periferia, com uma carteira de trabalho na mão está levantando um programa que é capitalismo selvagem contra a nossa classe. Um capitalismo que também se ancora na devastação da natureza, sem precedentes, e para a qual Marçal também buscará dar sua contribuição, enquanto respiramos fumaça tóxica, como “amigo” do agronegócio.

Marçal e Nunes estão divididos nesta eleição, mas estarão unidos nos ataques. São distintos tons de bolsonarismo dessa extrema-direita anti-operária. A conciliação de classes que com o governo Lula-Alckmin mantiveram todas as reformas do golpe institucional e do governo Bolsonaro, com articulação do STF, mostraram que estão aí para fortalecer os caminhos que permitem que essas figuras se perpetuem e se reforcem. Por isso, esse combate não pode ficar subordinado às eleições, como quer o jogo burguês de que a política é decidida a cada 2 anos, quando é preciso preparar e impulsionar a ação da classe trabalhadora e dos oprimidos na luta de classes. Para enfrentar seriamente este capitalismo selvagem de Pablo Marçal e o choque neoliberal privatista ultra capitalista de Nunes, junto a todo o regime do golpe institucional, é preciso construir uma força independente.

 

¨      Bolsonaristas trocam Nunes por Marçal na reta final de campanha

Na reta final da campanha pela prefeitura de São Paulo, a candidatura de Pablo Marçal (PRTB) ganhou força com o apoio de figuras influentes do bolsonarismo, que antes estavam ao lado do prefeito Ricardo Nunes (MDB). Com pesquisas indicando um cenário de empate técnico entre Marçal, Nunes e o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), a mudança de apoio pode ser decisiva para determinar quem avançará ao segundo turno.

O afastamento de nomes importantes do bolsonarismo em direção a Marçal ficou evidente ao longo das últimas semanas, como aponta reportagem do Globo. Deputados como Nikolas Ferreira (PL-MG), Marco Feliciano (PL-SP) e Ricardo Salles (Novo-SP) declararam publicamente apoio ao ex-coach, enfraquecendo a campanha de Nunes. Em um vídeo publicado nas redes sociais, Feliciano destacou a amizade com Marçal e acusou Nunes de estar alinhado com "políticos e religiosos" que estariam prejudicando a verdadeira agenda da direita. "Eu sou aliado, mas não sou alienado. Sou livre para pensar e apoiar quem eu desejar, é a democracia", afirmou o deputado.

O apoio de Nikolas Ferreira veio no final de semana, quando o parlamentar publicou em suas redes sociais que prefere "dar uma chance para a dúvida (Marçal)" a apoiar Nunes, a quem chamou de "conciliador de vagabundos". O jovem deputado, que tem grande influência entre os bolsonaristas nas redes, criticou duramente a coligação ampla de Nunes, composta por 12 partidos.

Enquanto isso, a ala mais religiosa do bolsonarismo, liderada por figuras como o pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, permanece firme ao lado de Nunes. Malafaia, que organizou duas grandes manifestações bolsonaristas este ano na Avenida Paulista, tem atacado Marçal com frequência, acusando-o de ser um "farsante" e de tentar manipular os evangélicos com discursos espirituais vazios. Vídeos antigos de Marçal, onde ele critica a cobrança do dízimo, reforçaram o discurso do pastor, que vê no ex-coach uma ameaça à influência das grandes lideranças evangélicas.

 

¨      Boulos contra a roleta-russa. Por Florestan Fernandes Jr

Neste domingo à noite (6/10) saberemos quem irá para o segundo turno na eleição da maior cidade do país. Seja pelo gigantismo da capital paulista, seja pela nacionalização da disputa, seja pelo próprio comportamento dos candidatos, a eleição em São Paulo irá definir o futuro do nosso país para os próximos anos. É uma espécie de roleta-russa, onde o tambor do revólver gira com apenas uma bala e o gatilho disparado pelo eleitor definirá entre a vida e a morte do Estado Democrático de Direito. Em outro momento determinante, o dia 8 de janeiro de 2023, naquela roleta-russa, a bala só não explodiu por falta de pólvora (apoios militares e externos). 

Se Ricardo Nunes for o reeleito, a dupla Bolsonaro/Tarcísio de Freitas terá a estrada aberta para retomar o controle do país. Já o arrivista de extrema-direita, Pablo Marçal, por si só já representa uma ameaça futura à democracia. 

Solitário nessa disputa para chegar à próxima fase da eleição está o professor, escritor e deputado federal, Guilherme Boulos. Uma vitória de Boulos é importantíssima, não só para o sucesso econômico e social do país, mas para a preservação da democracia, sustentada hoje a duras penas pelo presidente Lula, sua frente progressista e pelo STF. 

As últimas pesquisas apontam uma leve subida nas intenções de voto de Guilherme Boulos e uma leve queda de Ricardo Nunes. Marçal se manteve estável. Na pesquisa Quaest de 30 de setembro passado, a situação entre os três candidatos era a seguinte: Ricardo Nunes 24% dos votos, Guilherme Boulos, 23% e Marçal, 21%. Mas no mesmo dia da Quaest, a pesquisa AtlasIntel apontava uma mudança total na disputa paulistana. Boulos assumia a liderança com 29,4% dos votos, Marçal passava a ocupar o segundo lugar, com 25,4%, e Nunes caía para 22,9%.

Uma mudança que já vinha aparecendo em trackings de algumas campanhas.

Existe entre alguns marqueteiros e analistas políticos a percepção de que existe um voto envergonhado de conservadores bolsonaristas em Pablo Marçal. E um crescimento da intenção de votos em Boulos nas periferias, por conta do apoio de Lula. 

O PT e as esquerdas têm a tradição de crescer nas retas de chegada. Vamos ver se essa tradição se mantém. O segundo turno, como todos sabem, é uma nova eleição. O tempo de propaganda na televisão é dividido por igual entre os dois candidatos. Pelo bem da nossa democracia e do Brasil, que o eleitor afaste essa roleta-russa para bem longe de nossas cabeças.

 

Fonte: Observatório Evangélico/Esquerda Diário/Brasil 247

 

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