Nova onda global de branqueamento de corais
é sinal da morte dos oceanos?
Os corais em todo o
mundo estão embranquecendo e até morrendo, à medida em que o calor recorde dos
oceanos causa um impacto devastador na vida marinha.
O calor desencadeou a
quarta onda global de branqueamento em massa de corais, de acordo com a agência
de Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (Noaa, na
sigla em inglês).
A Noaa confirmou que
todos os oceanos – Atlântico, Pacífico e Índico – sofrem com a situação. A
quarta onda de branqueamento foi registrada de fevereiro de 2023 até o momento.
É a primeira evidência
global de como o calor está afetando a vida marinha.
O branqueamento
acontece quando o coral passa por condições adversas, como a água muito quente.
Os corais sustentam a
vida oceânica e a pesca, além de gerarem trilhões de dólares em receitas
anualmente.
O coral esbranquiçado
pode parecer bonito nas fotos, mas os cientistas que estão observando essas
formações de perto dizem que as estruturas estão claramente doentes e em
decomposição.
Os primeiros sinais de
alerta surgiram no Caribe no ano passado. Depois, o calor seguiu para o
hemisfério sul.
Ele já afetou mais de
metade dos corais do mundo, incluindo na Grande Barreira de Corais da Austrália
e nas costas da Tanzânia, Ilhas Maurício, Brasil, ilhas do Pacífico, bem como
no Mar Vermelho e no Golfo Pérsico.
Em agosto do ano
passado, a temperatura média global dos oceanos bateu o recorde histórico e tem
estado acima da média quase todos os dias desde então.
As mudanças climáticas
estão aumentando as temperaturas da superfície do mar, à medida que os oceanos
absorvem os gases gerados pela queima de petróleo, carvão e outras fontes.
O El Niño, um fenômeno
climático natural, também contribuiu para o aumento das temperaturas desde
junho passado, embora haja sinais de que ele está agora enfraquecendo.
Por 10 dias em
fevereiro, o cientista Neal Cantin pilotou um avião sobre a Grande Barreira de
Corais para o Instituto de Ciências Marinhas da Austrália.
O patrimônio mundial
estende-se por 2.000 km — aproximadamente a extensão da costa leste dos EUA.
"Pela primeira
vez, registramos níveis muito elevados de branqueamento nas três áreas do
Parque Marinho da Grande Barreira de Corais", diz Cantin.
Esses níveis
provavelmente matarão muitos corais, acrescenta.
Os corais são vitais
para o planeta. Apelidados de arquitetos do mar, constroem vastas estruturas
que abrigam 25% de todas as espécies marinhas.
Corais em condições
adversas provavelmente morrerão se ficarem submetidos por dois meses a
temperaturas 1°C acima do seu limite térmico. Se as águas estiverem 2ºC mais
quentes, podem sobreviver por cerca de um mês.
Sem os corais,
criaturas como os peixes, que navegam usando o ruído dos corais, podem ter
dificuldade para encontrar o caminho de casa.
Há três décadas, a
cientista Anne Hoggett mergulha na Ilha Lizard, na Austrália — um belo recife
que aparece no filme da Netflix Em busca dos corais.
Como muitos
pesquisadores, ela ficou chocada quando viu o primeiro branqueamento em massa
em 1998.
"Agora, estou
furiosa porque está sendo permitido que isso aconteça novamente",
desabafa.
O coral pode se
recuperar do estresse térmico, mas precisa de tempo — de preferência, vários
anos. Quando essas estruturas ficam enfraquecidas, ficam mais suscetíveis a
doenças e podem morrer facilmente.
"Se tiverem uma
chance, os corais são realmente resilientes e podem se recuperar. Mas à medida
que o branqueamento se torna mais frequente e mais forte em intensidade,
estamos realmente estreitando essa janela", diz Emma Camp, da Universidade
de Tecnologia de Sydney, Austrália.
O último branqueamento
global em massa ocorreu entre 2014 e 2016. Desde então, as temperaturas dos
oceanos ficaram tão mais quentes que a NOAA teve de emitir três novos níveis de
alerta de calor.
Do Quênia, o
ecologista David Obura recebe mensagens de centenas de guardas florestais,
cientistas e comunidades pesqueiras do Oceano Índico quando observam o branqueamento.
Em fevereiro, o
processo começou em Madagascar e depois espalhou-se pela Tanzânia e Comores.
Os pescadores conhecem
intimamente os corais, diz Obura, e percebem imediatamente quando algo está
errado.
Eles também sabem que
seu futuro depende disso: se os corais morrerem, isso afetará os padrões de
alimentação dos peixes e, por sua vez, os seus meios de sobrevivência.
Uma pesquisa publicada
em abril deu alguma esperança de que os corais que vivem em águas mais frias e
profundas — entre 30 e 50 m de profundidade — na Grande Barreira de Corais
possam sobreviver por mais tempo do que os corais rasos à medida que o planeta
aquece.
A pesquisa mostra que
os corais de águas mais profundas poderiam sobreviver a um aquecimento global
de até 3°C em comparação com o período pré-industrial, diz Jennifer McWhorter,
da Noaa, autora da pesquisa com a Universidade de Exeter (Reino Unido).
Mas todos os
especialistas em corais com quem a BBC conversou disseram que devemos aceitar
que os recifes tal como os conhecemos mudarão permanentemente e que o trabalho
de restauração em pequena escala não poderá salvar os corais a nível global.
Só uma redução rápida
e global das emissões de gases do efeito de estufa que limite o aquecimento dos
oceanos garantirá que restem pelo menos alguns corais, dizem.
"É como passar de
corais que fornecem casas e edifícios para a vida marinha a apenas andaimes.
Quem realmente quer viver em andaimes?", aponta McWhorter.
Os corais formam um
sistema de alerta precoce para os impactos do aquecimento global na natureza.
“Precisamos aprender
com isso para não fazer o mesmo com outros ecossistemas”, diz Obura.
Fonte: Por Georgina
Rannard, repórter da BBC para assuntos climáticos
Nenhum comentário:
Postar um comentário