terça-feira, 23 de abril de 2024

Entenda o motivo de a Anvisa manter a proibição do cigarro eletrônico

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) decidiu, ontem, por unanimidade, manter a proibição dos cigarros eletrônicos — os "vapes" ou "pods" — no Brasil. A determinação foi tirada na 6ª Reunião Pública da Diretoria Colegiada, quando foram analisados argumentos favoráveis e contrários à restrição.

Cerca de 80 manifestações em vídeo foram apresentadas de profissionais e entidades de saúde, representantes da indústria do tabaco e autoridades internacionais. Os principais argumentos favoráveis à proibição do cigarro eletrônico foram de que tais dispositivos podem aumentar o número de dependentes da nicotina, algo que está comprovado em experiências internacionais. Para os defensores do produto, a liberação seria por causa de supostos benefícios para aqueles que desejam deixar o cigarro convencional — além de contribuir para combater o mercado ilegal dos "vapes".

A consulta pública da Anvisa atraiu a atenção de aproximadamente 13 mil pessoas. Última etapa para a revisão de uma normativa, a questão envolvendo os cigarros eletrônicos vem sendo analisada desde 2019. Porém, os diretores da agência reguladora não consideram científicos sob qualquer ponto de vista — do médico ao social — os argumentos pela liberação do cigarro eletrônico. E mantiveram a proibição.

"Não há nem mais razão para considerar o cigarro eletrônico uma alternativa segura ao cigarro comum. Ao contrário: tem uma quantidade grande de nicotina e vicia muito mais depressa", criticou o oncologista Drauzio Varella, uma das vozes ouvidas pela manutenção da proibição.

Anselm Hennis, diretor do Departamento de Doenças Não Transmissíveis e Saúde Mental da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), assinalou que "a indústria do tabaco e todos aqueles que trabalham para promover seus interesses não diminuíram esforços para interferir nas políticas públicas e na tentativa de expandir a comercialização de seus produtos".

        Mercado ilegal

Já os representantes da indústria do tabaco chamaram a atenção para o fato de que a proibição estimula o mercado ilegal. "É estimado que mais de 4 milhões de brasileiros utilizam diariamente esses dispositivos. Elas consomem um produto que não possui qualquer tipo de controle de qualidade", afirmou Fábio Sabba, diretor de comunicação da Philip Morris Brasil.

O diretor-presidente da Anvisa e relator da ação, Antonio Barra Torres, foi enfático ao anunciar a manutenção da proibição. "A consulta pública realizada não trouxe argumento científico que alterasse as decisões já ratificadas pelo colegiado. Segue proibida a fabricação, comercialização, distribuição, transporte, propaganda de dispositivos eletrônicos para fumar", frisou.

Além de manter a restrição, a Anvisa acrescentou 27 pontos a serem aprimorados sobre os cigarros eletrônicos. Entre eles está uma cooperação com o Ministério da Educação para a sensibilização de professores sobre os riscos dos "vapes". Também está previsto intensificar as fiscalizações — principalmente nas regiões de fronteira — para combater o mercado ilegal dos dispositivos.

 

       Vape vicia? Tem nicotina? Pode causa câncer? Veja perguntas e respostas sobre cigarros eletrônicos

 

Os vapes, como são conhecidos os cigarros eletrônicos, vão seguir com a venda proibida no Brasil. Foi o que decidiu a Anvisa na sexta-feira (19). A regra vai contra a pressão da indústria, que pedia a liberação da comercialização sob o argumento de que eles são menos nocivos é uma opção para quem quer parar de fumar. Mas, o que dizem os especialistas?

Abaixo, nesta reportagem, o g1 preparou uma lista de perguntas e respostas sobre os cigarros eletrônicos para te ajudar a entender o que baseou a discussão no Brasil e o que diz a ciência sobre o assunto.

<<<< Cigarros eletrônicos são melhores que cigarro comum?

        O que diz a indústria

A indústria argumenta que os cigarros eletrônicos funcionam como "redução de danos" para quem já fuma cigarro comum. Ou seja, de que são uma forma menos prejudicial de acesso à nicotina para pessoas viciadas. Para isso, apresentam um relatório feito pelo King's College, do Reino Unido, que diz que vaporizadores são 95% menos prejudiciais que o cigarro comum.

O documento chega a essa conclusão a partir de uma revisão de artigos publicados e de pesquisas feitas anteriormente por outros institutos com pessoas que usaram cigarro eletrônico, mas durante um curto prazo.

        O que dizem médicos e especialistas

As instituições de saúde e pesquisadores apontam que não há evidência científica que demonstre que o cigarro eletrônico é efetivo como contenção de danos.

Reforçam ainda que há menos tempo no mercado, ele já demonstrou seu potencial de risco com a evali – uma lesão pulmonar que pode levar à morte em um curto espaço de tempo e é causada pelas substâncias presentes nos vapes.

Essa classificação de risco é uma falácia que não tem qualquer evidência científica. Pudemos ver isso com a crise nos Estados Unidos com pessoas morrendo por doenças associadas aos vapes. Precisamos lembrar que é um dado que vem de uma indústria que, quando apresentou o cigarro tradicional, jurou que a nicotina não viciava. Como podemos confiar? — André Szklo, epidemiologista especialista em controle do tabaco do Instituto Nacional do Câncer.

O médico e coordenador da Comissão de Combate ao Tabagismo da AMB, Ricardo Meireles, explica que não existe redução de danos para o tratamento do tabagismo, que mata cerca de 400 pessoas por dia no Brasil. A única forma é cessar o uso de qualquer fumo. “Não existe redução de danos no tabagismo. Estamos vivendo agora o que vivemos um século atrás, quando o cigarro começou a circular. No começo, as pessoas não sabiam que o cigarro fazia mal e foram muitas mortes até que soubéssemos a verdade. Hoje, o cigarro eletrônico está no mercado há poucos anos e já tem uma doença para chamar de sua, que é a evali. Não podemos deixar a história se repetir”, explica.

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<<<< Os cigarros eletrônicos viciam?

        O que diz a indústria

Os cigarros eletrônicos têm nicotina e ela é a responsável pelo vício do tabagismo. No site da Philip Moris, por exemplo, há uma série de perguntas e respostas sobre o produto, ao clicar na questão “vaporizar vicia?” você é levado a um texto que, na verdade, traz a resposta para “a nicotina é ruim para você?”. No texto, a empresa diz: “A nicotina é viciante e não é isenta de riscos. No entanto, são os elevados níveis de substâncias químicas nocivas libertadas quando o tabaco é queimado – e não a nicotina – que são a principal causa das doenças relacionadas com o tabagismo”.

Ou seja, não há uma resposta clara do setor sobre o risco de vício.

        O que dizem os médicos, entidades e especialistas

A nicotina é uma substância altamente viciante e, segundo a Organização Pan-Americana de Saúde, não há quantidade segura para o consumo. Segundo os especialistas, é por causa da nicotina que as pessoas viciam no cigarro.

Os vapes têm sal de nicotina, o que faz com que o composto seja entregue em concentrações até vinte vezes maiores no corpo.

Ou seja, fumar a carga de um cigarro eletrônico no formato de pen drive, pode equivaler a fumar 20 cigarros convencionais.

Um dos pontos levantados na análise técnica da Anvisa é de que a forma como são apresentados, com aromas e sabores, enganam a percepção de quem fuma sobre o vape ter nicotina e seu potencial de vício.

O cigarro eletrônico tem a nicotina em forma de sal, isso entrega mais nicotina e, por isso, tem um potencial muito mais viciante que o cigarro normal. Os relatos são de pessoas que começam com algumas baforadas e perdem o controle sobre o uso. Ou seja, a indústria diz que é mais seguro, mas na verdade está colocando a pessoa em uma armadilha para que ela se torne dependente química. — André Szklo, epidemiologista especialista em controle do tabaco do Instituto Nacional do Câncer.

Margareth Dalcomo, presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisologia (SBPT), diz que a forma como é feita a divulgação e o próprio produto interfere na percepção de quem usa de que aquilo é um cigarro e tem nicotina. “Esses dispositivos têm uma concentração de nicotina muito alta. Com sabores e aromas, eles estão chegando nos adolescentes que são muito mais impactados por esse alto teor de nicotina. Os vapes estão criando uma legião de viciados muito precoces”.

<<<< O vape pode causar câncer?

        O que diz a indústria

O fumo no cigarro eletrônico não funciona pela queima e sim pela vaporização. Com isso, a indústria alega que não há monóxido de carbono e, portanto, menos risco já que seria essa a substância causadora das doenças relacionadas ao tabagismo.

        O que dizem os médicos e especialistas

Há milhares de tipos de cigarros eletrônicos no mercado e cada um com uma composição, o que dificulta saber o que, especificamente, há nos vapes. Não há estudos que relacionem o vape com o câncer, apesar disso, os médicos apontam que há mais de duas mil substâncias nos cigarros eletrônicos e várias delas tóxicas e cancerígenas como: glicerol, propilenoglicol, formaldeído, o acetaldeído, a acroleína e a acetona.

 

Fonte: Correio Braziliense/g1

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