Quem é
Boris Nadezhdin, o político que ousa desafiar Putin para tentar ser presidente
No momento,
a oposição na Rússia só pode celebrar pequenas vitórias.
Que Boris
Nadezhdin esteja na cédula das próximas eleições presidenciais é uma delas.
O
político, rival de Vladimir Putin, diz que
conseguiu reunir assinaturas suficientes para se candidatar às próximas
eleições, que serão realizadas de 15 a 17 de março.
Para poder
se apresentar como candidato, ele teve que reunir mais de 100 mil assinaturas,
conforme exigência das autoridades eleitorais. Milhares de russos formaram
filas em todo o país, no frio, para adicionar seus nomes à lista.
Pouco
depois do prazo limite para entregar as assinaturas nesta quarta-feira (31/1),
Nadezhdin publicou uma foto posando diante de várias caixas contendo as listas
assinadas por seus apoiadores.
"Esse
é o meu orgulho: o trabalho de milhares de pessoas durante muitos dias sem
dormir. O resultado das filas que fizeram em meio ao frio glacial está nessas
caixas", escreveu ele no X, antigo Twitter.
Agora, a
Comissão Eleitoral Central (CEC) deve rever e aprovar seu pedido.
Se
"irregularidades" forem encontradas em alguma das assinaturas
apresentadas, a comissão pode desqualificar completamente o candidato, como
aconteceu com Yekaterina Duntsova, uma política independente.
Ela foi
desqualificada quando apresentou sua solicitação de candidatura em dezembro
porque a comissão eleitoral disse que encontrou 100 "erros" em seu
formulário.
Após a
desqualificação da CEC, Duntsova juntou-se aos russos que apoiam a candidatura
de Nadezhdin.
O atual
presidente Putin já se registrou como candidato independente para as eleições
de março, nas quais sua vitória para outro mandato de seis anos é vista como
quase certa.
Se Putin
for mesmo reeleito, ao final de seu mandato somará 30 anos no comando do país
como presidente ou primeiro-ministro.
Mas quem é
o candidato que se atreve a desafiar o atual presidente?
·
Velho conhecido do
Kremlin
Nadezhdin,
60 anos, foi vereador por mais de 30 anos. Em novembro do ano passado ele
anunciou que apresentaria sua candidatura à presidência pelo partido Iniciativa
Cívica, de centro-direita, fundado pelo ex-ministro liberal do Desenvolvimento
Econômico Andrey Nechayev.
Ele é um
velho conhecido na política russa e tem laços antigos com pessoas do Kremlin,
como Sergei Kiriyenko, primeiro-ministro russo em 1998, de quem foi assistente
entre 1997 e 1998.
Também foi
deputado da Duma estatal russa (o equivalente à Câmara dos Deputados no Brasil)
de 1999 a 2003, após trabalhar como assessor do primeiro vice-primeiro-ministro
Boris Nemtsov.
Ele tentou
se apresentar como candidato a governador da região de Moscou, mas não
conseguiu. Desde setembro de 2019 é deputado no distrito da cidade de
Dolgoprudny.
Fora da
política, em 1999, ele fundou o departamento de Direito do Instituto de Física
e Tecnologia de Moscou, dirigindo-o até 2016. É doutor em Ciências Físicas e
Matemática e licenciado em Direito.
·
Antibelicista e
anti-reeleição
A oposição
de Nadezhdin a Putin não é novidade.
Em março
de 2020, ele se opôs à aprovação das emendas à Constituição que permitiram a
reeleição de Putin para um quinto mandato.
Mas nos
últimos meses, ele se tornou mais visível com suas críticas relativamente
abertas a Putin e à invasão russa na Ucrânia.
Antes, no
entanto, apoiou a anexação da Crimeia. Ele dizia se tratar de uma decisão do
povo da Crimeia e chegou até a elogiar o Exército russo.
O lema com
o qual ele se apresenta em sua campanha eleitoral é claro: "Putin deve ir
embora".
Dessa
forma, Nadezhdin se tornou uma rara voz crítica a aparecer com frequência em
entrevistas nos canais de televisão estaduais, onde disse que tenta expressar
"ideias sensatas e justas em um ambiente de loucura geral".
"[Putin]
praticamente destruiu as instituições chave do Estado moderno da Rússia. Meu
trabalho será restaurar essas instituições", disse Nadezhdin recentemente.
Ele também
disse à BBC que, se eleito, sua primeira tarefa será acabar com a guerra.
"Minha
primeira tarefa será pôr fim ao conflito com a Ucrânia e depois restabelecer
relações normais entre a Rússia e a comunidade ocidental".
Nadezhdin
também se juntou a um grupo de mulheres que, em uma atividade incomum na Rússia
atual, se reuniram para criticar publicamente a guerra. Os maridos delas estão
entre os 300 mil reservistas recrutados.
Em um país
onde figuras da oposição foram encarceradas ou mesmo assassinadas, as recentes
críticas de Nadezhdin parecem estar sendo toleradas até agora.
E as altas
esferas do poder também parecem estar tranquilas.
"Não
o vemos como um rival", disse Dmitry Peskov, porta-voz do Kremlin, quando
perguntado sobre Nadezhdin, no início deste mês.
E embora
Nadezhdin tenha recolhido as assinaturas necessárias, ainda há um longo caminho
até que seja considerado um candidato oficial. Primeiro, é preciso que não seja
barrado pela comissão eleitoral e, segundo, que possa fazer campanha
livremente.
·
Candidatos "de
fachada"
Na Rússia
de Putin, muitos candidatos puderam concorrer às eleições, mas sem qualquer
possibilidade real de ganhar e às vezes até sem intenções de derrubar o
presidente.
Esse
cenário mantém uma fachada de democracia e, no caso de Nadezhdin, permitiria
que os russos insatisfeitos com a "operação militar especial", como o
Kremlin chama a invasão da Ucrânia, expressem sua raiva e frustração de uma
forma que não ameace o governo de Putin.
Nos
últimos anos, figuras autênticas da oposição popular, que não aparece na mídia
estatal, como Alexei Navalny e Ilya Yashin, foram condenadas a longas penas de
prisão.
Outros,
como o crítico do Kremlin Boris Nemtsov, para quem Nadezhdin já trabalhou como
conselheiro, foram mortos.
A cena
política da Rússia é dominada por Vladimir Putin desde 2000. E em 2020 foi
aprovada uma emenda constitucional que permitiu que ele siga no poder para além
de 2024.
Uma
vitória em março permitiria que ele permanecesse como presidente até 2030.
Depois disso, poderia ficar mais seis anos até 2036 se decidir se candidatar
novamente.
Nadezhdin,
cujo nome se parece com nadezhda, uma palavra russa que significa
esperança, aproveita-se da semelhança e repete que tem o apoio de "dezenas
de milhões de pessoas".
"Tenho
absoluta certeza de que Putin não governará a Rússia por mais seis anos, porque
cada vez mais pessoas entendem que ele está arrastando a Rússia pelo caminho do
militarismo, do autoritarismo e do isolamento", diz ele, sem medo.
Fonte: BBC
News Mundo
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