quinta-feira, 4 de abril de 2024

Legado da Operação Escudo: recorde de assassinatos, casos de tortura e movimentações suspeitas na Cúpula da PM de SP

A carnificina de Tarcísio nomeada “Operação Escudo” foi encerrada no dia 1° de abril com o saldo de ter sido a operação policial com o maior número de mortes desde o Massacre de Carandiru, em 1992. De acordo com os números oficiais, 56 pessoas foram assassinadas pelas incursões. Segundo evidências e testemunhas, muitas delas em execuções sumárias. Torturas, invasões de casa, destruições de câmeras e intimidações a familiares de feridos pelos PMs também foram práticas recorrentes durante a operação, denunciada por diferentes entidades. Mesmo assim, o feito foi elogiado pelo governador do estado de São Paulo, Tarcisio de Freitas (Republicanos) e o secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite. Ao longo do mês de março, protestos e audiência públicas condenaram e exigiram o fim da operação.

O fim da operação foi anunciado seis dias depois da morte de Edneia Fernandes, de 31 anos e mãe de seis filhos. Edneia foi assassinada por uma “bala perdida” disparada por, ao que tudo indica, um policial militar. Um dia antes de Edneia, o jovem Matheus Souza Santos, de 21 anos, também foi executado por PMs. Testemunhas relatam claramente que o jovem estava desarmado quando foi assassinado e que gritou que “não trabalhava na boca [de fumo, tráfico]” antes de ser atingido pelos tiros dos policiais. 

Concomitantemente à Operação Escudo, todo o estado de São Paulo passou por uma alta de mortes por violência policial. Na Baixada Santista, o aumento foi de 427% se comparado ao primeiro trimestre do ano passado, enquanto em todo o resto do estado a alta foi de 86%. Em números reais, isso significa um salto de 106 para 197 mortes em SP, e de 15 para 79 na Baixada Santista. São mortes causadas por PMs de serviço, mas também de folga.

Em meses anteriores, a Operação Escudo, também chamada de operação verão, já havia sido denunciada por outras violações. Moradores da região denunciaram ao longo das incursões que era comum ter as casas invadidas pelos PMs. “Teve uma família, que eu atendi, que o policial entrou na casa da pessoa, começou a revirar a casa toda e pediu pra mulher: ‘fala pra essa criança calar a boca, senão eu vou te matar aqui na frente dela’. As crianças não podem ver policial que já começam a tremer e a chorar. É revoltante”, relatou a ativista Fran L’esraistre à Ponte Jornalismo.

Uma outra casa invadida foi a da família do deficiente visual Hildebrando Simão Neto e do jovem Davi Gonçalves Dias. Ambos estavam em casa, junto com a família, quando os PMs invadiram a residência. Com exceção de Simão e Davi, todos foram expulsos da casa. Do lado de fora, ouviram os tiros que executaram, sumariamente, os dois.

Além de executarem moradores a sangue frio em sua guerra reacionária contra o povo, os policiais recorrentemente eram denunciados pelas alterações das cenas de execuções. Organizações como o Fórum Brasileiro de Segurança Pública denunciaram que a padronização vista nos registros de ocorrência levantavam suspeitas para essas alterações.

Mesmo com esse saldo, o secretário da Segurança Pública paulista declarou que a operação “cumpriu seus objetivos” e que “o combate será constante”. Semanas antes, quando confrontado com as provas inquestionáveis das violações e execuções, o governador Tarcisio apoiou a operação e debochou dos relatórios. “Temos muita tranquilidade sobre o que está sendo feito, então o pessoal pode ir na ONU, na Liga da Justiça, no raio que o parta, que eu não tô nem aí”, disse.

Tarcisio de Freitas e Guilherme Derrite celebraram números da ação. Foto: Reprodução/Governo do Estado de SP

Reformas suspeitas e ‘exército pessoal’

A Operação Escudo também foi atravessada por movimentos suspeitos entre as cúpulas do governo do estado de São Paulo e da PM. No final de fevereiro, Tarcísio e Derrite trocaram 34 dos 63 coroneis da PM paulista, em um movimento que favoreceu a ala linha dura da cúpula, mais próxima de Derrite.

Além do novo subcomandante, amigo próximo de Derrite, três outros oficiais da nova cúpula foram integrantes da Rota, batalhão “de elite” da PM de SP, responsável pela Operação Escudo e do qual Derrite participou, cultivando laços. Foi uma movimentação suspeita, que levou à cúpula da PM, para o comando de postos-chave, militares comprometidos politicamente e fisiologicamente com o governo reacionário de Tarcísio de Freitas.

“Isso mostra bastante a essência dessa movimentação que o Tarcísio está fazendo aqui em São Paulo: ele quer uma polícia cada vez mais próxima, como se já não fosse o suficiente, mas também quer uma polícia cada vez mais próxima dessa política policial bélica”, apontou o advogado e pesquisador Almir Felitte, em entrevista à Ponte Jornalismo.

Ademais, Derrite tem beneficiado militares da “linha dura” próximos a si com cargos na própria Secretaria de Segurança Pública (SSP), articulando um verdadeiro “exército pessoal”. Ao longo do ano passado, também marcado por uma sanguinária Operação Escudo, Derrite aumentou o número de militares assessores da SSP de 183, em novembro de 2022, para 243, em novembro de 2023 (um mês antes do início da nova operação). O número é maior do que o efetivo policial de 91,2% das cidades de SP, segundo o jornal monopolista Folha de São Paulo.

Ao que tudo indica, e como já foi admitido por Derrite, o governo não pretende encerrar a guerra reacionária contra o povo, marcada pelas chacinas sucessivas do povo pobre, principalmente preto.

Por outro lado, como registrado em protestos posteriores à primeira operação escudo e durante à segunda edição, os moradores das periferias paulistas têm elevado a luta e as denúncias contra a violência policial. A intensificação dessa luta popular, independente e combativa contra a guerra civil reacionária contra o povo, aliada a diversos setores das massas populares de todo o estado de SP, se destaca como um caminho importante para a derrota dos planos reacionários e sanguinários do governo reacionário do novo candidato a chefete da extrema-direita, Tarcísio de Freitas.

 

       A resposta chocante de Derrite sobre número de mortos na Operação Verão

 

O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, afirmou que desconhecia o número total de mortos na Operação Verão, na Baixada Santista, a mais letal desde o Massacre do Carandiru, e que foi encerrada nesta segunda-feira (1°).

"Eu nem sabia que eram 56, eu não faço essa conta", afirmou Derrite, durante agenda na capital paulista com o prefeito Ricardo Nunes (MDB).

"Pra mim, o ideal é que não fosse nenhuma, mas no mundo real em que a gente vive, a negligência do combate ao crime organizado no Brasil e no estado de São Paulo chegou num ponto que qualquer viatura policial vai sofrer disparo de arma de fogo", acrescentou o secretário.

•        Operação Verão

A Operação Verão, antes chamada de Operação Escudo, deixou 56 mortos entre janeiro e março deste ano. Somada com a primeira fase, que aconteceu no ano passado, são mais de 80 mortes.

A operação foi alvo de críticas por entidades de direitos humanos devido à violência e alta letalidade. Em relatório feito por 13 organizações, relatos de moradores apontaram execuções sumárias, torturas, obstrução de justiça, invasões de domicílio e abordagens policiais violentas. A operação chegou a ser denunciada na Organização das Nações Unidas (ONU) duas vezes, uma em setembro do ano passado e outra em março deste ano.

Na sexta-feira (29), a operação fez a primeira vítima de bala perdida.Edneia Fernandes Silva, de 31 anos, foi morta com um tiro após a chegada de três policiais que faziam patrulhamento de moto, na Praça José Lamacchia, no bairro Bom Retiro, na Zona Noroeste de Santos. Ela deixou 6 filhos.

Já nesta segunda-feira (1°), um vídeo, gravado por um morador, mostrou policiais disparando 188 tiros de fuzil contra três "suspeitos" no Morro Nova Cintra, em Santos.

Mesmo com o fim da operação, o secretário informou que a segurança na Baixada Santista receberá um reforço significativo. Um contingente de 341 policiais militares, entre soldados, cabos e sargentos, passará a atuar permanentemente na região. Ademais, há previsão para o aumento do número de policiais civis, com a formação de novos agentes ainda em 2024.

 

       PM de Tarcísio: Tchutchuca com Porsche, violenta com cadeirante pobre. Por Antonio Mello

 

Dois acontecimentos seguidos, em locais e com pessoas de classes sociais bem diferentes, mostram como age a PM do governador Tarcísio de Freitas.

Cena 1

Na madrugada de domingo, 31 de março, o estudante e empresário Fernando Sastre de Andrade Filho pilotando seu Porsche, avaliado em mais de R$ 1 milhão, em alta velocidade, entrou em cheio na traseira de um carro de aplicativo matando o motorista Ornaldo da Silva Viana, de 52 anos.

A mãe do jovem chegou ao local e pediu aos policiais de Tarcísio para levar o filho ao hospital, porque ele estava com um pequeno ferimento na boca. Os PMs autorizaram, sem nem ao menos realizarem um teste de bafômetro.

A mãe e o jovem não foram ao hospital onde afirmaram que iriam, e o estudante só deu as caras ontem, quando se apresentou com advogados e conseguiu liberação da Justiça para responder pelo crime em casa.

Cena 2

Corte rápido para outro local, agora na periferia de São Paulo. A mesma PM de Tarcísio aborda violentamente um jovem negro e sua família, inclusive o pai cadeirante.

Em duas cenas, o retrato nu e cru da Polícia Militar de Tarcísio de Freitas: toda tchutchuca e respeitadora dos direitos dos milionários. Violenta e assassina com os pobres e pretos da periferia.

 

       Tarcísio e a ‘riodejaneirização’ de SP em ação da PM com 188 tiros de fuzil. Por Henrique Rodrigues

 

No dia em que a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) anunciou o fim da Operação Verão, que deixou 56 mortos em pouco menos de dois meses na Baixada Santista, após dois PMs terem sido mortos em comunidades da região, um vídeo estarrecedor viralizou nas redes sociais ao mostrar policiais disparando 188 tiros de fuzil na Vila Progresso, em Santos, com o argumento de que tentavam capturar três suspeitos que teriam reagido à bala a uma incursão das forças de segurança.

Cenas desse tipo se tornaram comuns nos meios de comunicação brasileiros nas últimas décadas, tendo como pano de fundo sempre localidades do Rio de Janeiro, onde o “enfrentamento” da PM com o crime organizado tomou ares de filme de guerra. Rajadas, explosões, projéteis traçantes e paredes de imóveis totalmente furadas como peneiras se banalizaram, enquanto as mortes de civis inocentes por balas perdidas, ou confundidos, se somam às milhares com o passar dos anos.

Esse era um tipo de episódio exclusivamente registrado no Rio, unidade federativa onde há anos optou-se por tal forma de ação, que na prática não traz resultado positivo algum. Não enfraquece o crime, pelo contrário, o fortalece, e ainda instala o terror nesses bairros pobres. Tarcísio de Freitas, que nos últimos anos foi alvo de piadas por ser um carioca da gema sem qualquer relação com São Paulo ao se lançar candidato a governador (e que inacreditavelmente foi eleito sem sequer conhecer o mínimo sobre o estado), parece estar decidido a implantar tal modus operandi estúpido e sangrento em terras paulistas, haja visto o que está fazendo no litoral para obter lucro político, sob o puritano e cretino argumento de que a polícia reagirá “de forma dura” sempre que for atacada.

As ocorrências com PMs disparando tiros e mais tiros com o moderno fuzil belga FN Scar 7.62 se multiplicaram na Baixada Santista do início de fevereiro para cá. Na maior parte das ocorrências com registros de mortes, o emprego dessas armas de guerra longas virou um ponto comum. Uma liderança do PCC morta no Guarujá, um outro “torre” em Santos, em pleno carnaval, vários suspeitos que foram “abatidos” em morros de algumas cidades da região, enfim, sempre estavam lá os fuzis sendo acionados. Para os incautos, bem como para os que se fazem de ingênuos, uma “demonstração de força” e de que a PM “não dá moleza” para os bandidos. Um ledo e estúpido engano.

Ao banalizar esses confrontos que não resultam em nada de positivo, o próprio crime organizado passa a agir com mais violência, passa a atirar sem hesitar em qualquer circunstância e ainda reforça seus paióis. A exemplo do que ocorreu e segue ocorrendo no Rio, assim como em algumas localidades do México, sair desfilando nas ruas com ‘caveirões’, os famigerados blindados para incursão em favelas e morros, assim como descarregar pentes e pentes de balas de fuzil, não ocasionará uma vitória sobre a delinquência organizada, tampouco acabará com sua lucrativa renda oriunda do narcotráfico. Os conflitos só aumentarão, a violência não retrocederá um milímetro e os inocentes mortos e aterrorizados se multiplicarão. Esse é o motivo óbvio e simples que faz com que a maior parte dos governos (minimamente responsáveis) do mundo não embarquem em tal aventura.

Mas Tarcísio de Freitas, não. Ele quer essa ‘riodejaneirização’ de São Paulo. Coloca os ‘caveirões’ do GER e os quase-tanques do Choque para descer a serra, além de encher as comunidades mais pobres das cidades litorâneas de unidades de elite armadas até os dentes, como se estivesse prestes a entrar nas ruas de Mossul, na Síria. Bala pra todo lado, corpos espalhados no chão, sangue escorrendo pelas sarjetas. Só que nesse bojo morreu garçom que estava de folga, garoto cego acusado de ser traficante, funcionário de farmácia que descia a Anchieta para pegar uma praia, mãe de seis filhos que esperava o caçula cortar o cabelo no salão instalado numa praça movimentada, à luz do dia.

A burguesia e os pobres sem consciência de classe, enfeitiçados pela seita bolsonarista e excitados quase que sexualmente pelos estampidos dos disparos, gritam esfuziantes. Os megatiroteios com rajadas e mais rajadas de fuzil os fazem sentir uma espécie de senso de vingança que nem eles mesmos sabem explicar, sem contar com o fato de que aciona a verve infantilizada do tesão por armas e fardas. Tudo vira um grande episódio do Tropa de Elite, e agora ali, em sua cidade até então ‘pacata’.

O problema é que, quando a criminalidade organizada passar a fazer assaltos simples a comércios e transporte público em bairros mais “nobres” usando os tais ‘bondes’ (dezenas de criminosos juntos em comboio, utilizando dois ou três veículos) e empregando fuzis e metralhadoras, como já acontece há anos no Rio de Janeiro, esses entusiastas dos tiroteios terão um inferno para chamar de seu bem na porta de casa. Só então eles vão perceber ao que levou a “política de segurança” de Tarcísio de Freitas.

 

Fonte: A Nova Democracia/Fórum

 

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