Estudo aponta fatores de risco para
demência precoce que vão além da genética
Um novo estudo europeu
identificou uma série de fatores de risco que podem estar associados ao
aparecimento precoce das diferentes formas de demência, e também outras
circunstâncias que parecem diminuir o risco desses problemas neurológicos.
Trata-se de um dos primeiros trabalhos a ir além das predisposições genéticas
para entender elementos não hereditários que contribuem para a demência
precoce.
O trabalho acaba de
sair na revista especializada Jama Neurology. Coordenado por Stevie Hendriks,
do Departamento de Psiquiatria e Neuropsicologia da Universidade de Maastricht
(Holanda), o estudo também teve participação da Universidade de Oxford e outras
instituições britânicas.
É por isso, aliás, que
os dados que embasam as conclusões da pesquisa são do Reino Unido. Eles vêm do
UK Biobank, um enorme arcabouço de informações médicas sobre mais de 500 mil
moradores do território britânico, que foram recrutadas para participar de um
acompanhamento de longo prazo entre 2006 e 2010.
Os participantes do UK
Biobank têm entre 37 anos e 73 anos, mas os pesquisadores estavam interessados
principalmente nos pacientes com 65 anos ou menos. Essa idade marca a definição
do que seria demência precoce, quando o diagnóstico é feito antes do 65º
aniversário.
Para os propósitos do
estudo, não foi feita diferenciação entre a presença do mal de Alzheimer (uma
das formas mais conhecidas de demência) e os vários outros tipos de problemas
neurológicos que integram essa categoria. A equipe incluiu na sua análise pessoas
que, no momento da inclusão no banco de dados, ainda não tinham sido
diagnosticadas com essas doenças, mas que poderiam desenvolvê-las nos anos
seguintes, sendo rastreadas por seus prontuários médicos ou certidões de óbito,
por exemplo.
Calcula-se a demência
precoce afete pouco menos de 4 milhões de pessoas no mundo hoje. Embora, em
termos absolutos, seja muita gente, ainda se trata de um problema relativamente
raro calcula-se que só o mal de Alzheimer afeta 50 milhões de pacientes. No novo estudo, 485
pacientes acompanhados no âmbito do UK Biobank acabaram desenvolvendo demência precoce.
O que o trabalho fez
foi passar um pente-fino estatístico nas pessoas que têm o problema e as que
não o têm, levando em conta todas as informações médicas sobre elas presentes
no banco de dados, para verificar quais fatores estão associados à presença ou
ausência dessas doenças. Nem todos os fatores necessariamente implicarão algum
tipo de causalidade ou seja, a
probabilidade de que um deles esteja contribuindo diretamente para causar demência ou para evitá-la. Para saber se esse é o caso, é preciso realizar análises mais específicas.
Além da presença de
variantes genéticas já tradicionalmente associadas às formas mais comuns de
demência, como o mal de Alzheimer em idosos, o trabalho mostrou 14 outros
fatores que parecem ter uma associação estatisticamente significativa com o
aparecimento da doença precoce. Entre os mais importantes estão uma condição
socioeconômica ruim, menos educação formal, deficiência de vitamina D,
diabetes, doenças do coração, depressão e isolamento (definido como uma
situação na qual a pessoa não tem contato com parentes e amigos ao menos uma
vez por mês).
Por outro lado, um
nível educacional mais alto e uma condição física melhor (medida por meio da
força do movimento de agarrar da pessoa, avaliada no consultório) estão entre
os fatores que parecem minimizar o risco de demência precoce.
Os problemas de
metabolismo, como diabetes e doenças do coração, tendem a afetar a circulação
do sangue, inclusive a do cérebro, o que aumentaria o risco desses problemas.
Já os níveis educacionais influenciam as atividades cognitivas, o que pode ter
um efeito protetor se elas forem mais desafiadoras.
A grande controvérsia
dos resultados envolve o consumo de álcool, o qual, em nível moderado, está
associado a um risco mais baixo de demência, enquanto nenhum consumo de bebidas
alcoólicas seria um fator de risco. Os autores do estudo dizem que pode estar
havendo alguma confusão estatística: pessoas mais saudáveis por outros fatores
também conseguiriam continuar consumindo álcool, mas não é a bebida que
ajudaria na manutenção de capacidades cognitivas saudáveis.
Pessoas propensas ao Alzheimer podem
apresentar sintoma específico
Recentemente,
cientistas da Universidade de Chicago identificaram que pessoas que apresentam
variante do gene associada ao maior risco de Alzheimer, chamada de APOE e4,
podem apresentar um sintoma em comum.
O sintoma, de acordo
com os pesquisadores, está associado à perda de olfato. Isso porque pessoas com
essa característica podem perder a capacidade de detectar odores mais cedo do
que as pessoas que não carregam a variante do gene. Essa condição representa um
sinal precoce de eventuais problemas futuros de cognição.
Os resultados foram
publicados em 26 de julho de 2023 na revista médica Neurology, da Academia
Americana de Neurologia. “Testar a capacidade de uma pessoa de detectar odores
pode ser uma maneira útil de prever futuros problemas de cognição”, disse
Matthew S. GoodSmith, autor do estudo, da Universidade de Chicago.
“Embora sejam
necessárias mais pesquisas para confirmar essas descobertas e determinar qual
nível de perda de olfato prediz o risco futuro, esses resultados podem ser
promissores, especialmente em estudos com o objetivo de identificar pessoas com
risco de demência no início da doença”, completa o especialista.
• Como foi feito o estudo?
Para entender a
relação entre a perda de olfato e aumento do risco de Alzheimer, o estudo
testou mais de 865 pessoas ao longo de cinco anos – tanto a capacidade de
detectar um odor quanto à capacidade de identificar o odor que estavam
sentindo.
Como efeito de
comparação, as habilidades de pensamento e memória das pessoas também foram
testadas duas vezes, com cinco anos de diferença. Amostras de DNA deram aos
pesquisadores informações sobre quem carregava o gene associado a um risco
aumentado de Alzheimer.
• O que se concluiu?
Para entender os
indicativos obtidos na pesquisa, os cientistas levaram em conta fatores que
poderiam afetar os resultados, como idade, sexo e nível educacional.
Segundo os resultados,
pessoas que carregavam a variante do gene eram 37% menos propensas a ter uma
boa detecção de odor do que as pessoas sem o gene. Além disso, os portadores do
gene começaram a ter detecção reduzida de cheiros entre 65 e 69 anos. Nessa
idade, eles podiam detectar uma média de cerca de 3,2 cheiros, em comparação
com cerca de 3,9 cheiros para as pessoas que não carregavam o gene.
• Olfato e declínio cognitivo
Habilidades de
pensamento e memória, marcadores específicos de comparação clínica,
apresentaram resultados parecidos entre os dois grupos no início do estudo.
Contudo, conforme o esperado, aqueles que carregavam a variante do gene
experimentaram declínios mais rápidos em suas habilidades de pensamento ao
longo do tempo do que aqueles sem o gene.
O estudo, de acordo
com os pesquisadores, que tem ajudado a identificar os mecanismos envolvidos
nessas relações, ajudará a entender o papel do olfato na neurodegeneração.
Fonte: FolhaPress
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