Cuidado com depressão na atenção primária
traria R$ 64 bilhões de economia ao Brasil
Os cuidados com a
saúde mental da população são um dos principais gargalos do Sistema Único de
Saúde (SUS). A adoção de estratégias de cuidados para depressão, através da
atenção primária, poderia trazer uma economia de 64 bilhões de reais para
o Brasil. A constatação foi feita em estudo da ImpulsoGov, organização sem fins
lucrativos que apoia a
gestão pública, obtido com exclusividade por Futuro da Saúde.
Com uma estimativa
anual de 8,755 milhões de novos casos de transtornos depressivos em adultos
acima dos 20 anos, de acordo com dados utilizados do Instituto para Métricas e
Avaliação em Saúde da Universidade de Washington, o estudo apontou que o
custo-médio de tratamento, com internações, medicamentos e terapias, está em
torno de R$ 6.725,10 por pessoa.
Ainda, estima-se que
cada paciente tem um impacto de R$ 33 mil ao ano, por conta da perda de
produtividade. No total, o custo social de cada caso de depressão não
resistente ao tratamento é de aproximadamente 40 mil reais. Por isso, é
importante que os serviços de saúde atuem antes do agravamento dos transtornos.
No estudo, a
ImpulsoGov estimou a implementação do SUS em realizar um tratamento precoce
utilizando Acolhimento Interpessoal (AIP), considerando que profissionais da
saúde que não sejam especialistas em saúde mental poderiam
aplicar, como enfermeiros, técnicos de enfermagem e agentes comunitários de
saúde. O tratamento seria realizado por 9 semanas com duração de 1h30 a cada
sessão.
Considerando os investimentos para adequação da atenção primária, o estudo
apontou um impacto de R$ 1.457,32 por paciente por ano, ou seja, para cada real
investido o país pode ter um retorno de R$ 5,03, referente à economia com o
custo social da depressão. No total, mais de 64 bilhões de reais seriam
poupados.
De acordo com o
estudo, o tratamento utilizando tem como referência a Terapia Interpessoal
(TIP), que pode ter uma um impacto significativo em reduzir 22% os sintomas da
depressão. Eles apontam que a terapia possui metodologia com comprovação
científica e é recomendada pela Organização
Mundial da Saúde (OMS). Por ser a porta de entrada para os serviços de saúde, a
atenção primária é vista como uma oportunidade de mudar o cenário das
doenças e transtornos mentais no país.
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Aumento da demanda por saúde mental exige
profissionais mais capacitados e trabalho multidisciplinar
Com o aumento de casos
de transtornos mentais no mundo e no Brasil – dados da Organização
Mundial da Saúde (OMS) apontam que 86% dos brasileiros sofrem com condições
como ansiedade e depressão –, cresceu também a procura por especialistas para
lidar com esses pacientes. Em conjunto com essa demanda veio também a exigência
por profissionais ainda mais capacitados e com foco no trabalho
multidisciplinar, o que tem configurado um novo perfil da psiquiatria.
De acordo com Marcelo
Feijó de Mello, psiquiatra e professor da Faculdade Israelita de Ciências da
Saúde Albert Einstein, “o estigma que envolve a psiquiatria diminuiu muito.
Existe um trabalho de disseminação de informações sendo feito há bastante tempo
e na pandemia isso ficou evidente. Hoje, o preconceito com a procura por esse
tipo de especialista está bem menor e já se tem a noção de que a saúde mental é
uma parte da saúde como um todo. Os próprios psiquiatras têm sido mais
reconhecidos e não trabalham mais sozinhos, como antes. É uma nova era,
certamente, para a especialidade”.
Essa transformação
chega em um momento em que o cenário é devastador. “No Hospital Mboi Mirim, na
zona sul da São Paulo, que é administrado pelo Einstein, temos visto um
crescimento grande de casos de ansiedade e depressão e de uso de novas drogas,
por exemplo, e em todas as classes sociais, que culmina também em mais
transtornos mentais. A área de psiquiatria passou a ser de muito interesse para
o Ministério da Saúde exatamente porque tem muita demanda e poucos
profissionais”.
Para se ter ideia, de
acordo com o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), o
total de mortes no país por lesões autoprovocadas dobrou nos últimos 20 anos –
passando de 7 mil para 14 mil. E o número de psiquiatras não chega nem a esse
total: são 13.888 especialistas, segundo o último estudo da Demografia Médica no Brasil, feito pela Associação Médica Brasileira (AMB).
·
Residência em psiquiatria
Não à toa, as
residências em psiquiatria são, hoje, umas das mais competitivas do setor e o
profissional que escolhe essa especialidade precisa se preparar para um cenário
na saúde mais desafiador. Marcelo Feijó de Mello ressalta que a especialidade
sempre contou com poucas vagas e muita procura, mas que a tendência é que o
interesse por essa área aumente cada vez mais.
No começo do ano, o
Ensino Einstein, que já conta com residência em especialidades como
cardiologia, oncologia, ginecologia e mais, montou sua primeira turma de
residentes nessa especialidade – um projeto que vinha sendo construído há três
anos. E assim que foi aprovada a modalidade, ainda sem a quantidade de vagas
disponibilizada – que hoje são apenas quatro –, a instituição já contava com
mais de 85 candidaturas.
“Nem todo mundo sabe
ou pensa nisso, mas o mais interessante sobre a residência em psiquiatria é que
os médicos que fazem a especialização têm, obrigatoriamente, que ser muito bons
profissionais. Eles precisam ter uma boa formação e ser muito capacitados
apenas para passar nas vagas de residência. Então estamos sempre falando de
profissionais de excelência”, aponta o psiquiatra.
Para seguir esse
padrão de qualidade, o Einstein montou um currículo que foi além dos requisitos
mínimos do Ministério da Educação (MEC), que inclui a prática clínica em
diferentes cenários sempre com supervisão. Segundo Feijó, a instituição fez um
minucioso levantamento com serviços de psiquiatria, incluindo os próprios, para
preparar os profissionais da melhor forma possível para que possam atuar nas
mais diferentes áreas de demanda:
“Nós temos um
diferencial que é a nossa conexão com o Sistema Único de Saúde (SUS). O
Einstein administra Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Unidades Básicas de
Saúde (UBS), Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), residências
terapêuticas, hospitais municipais e hospitais privados. São vivências
diferentes, às vezes em locais de grande movimento, com casos complicados e em
regiões de vulnerabilidade social. E em todos esses locais há um grande
aprendizado”.
Os três anos de
programa de residência têm também como foco o trabalho multidisciplinar, seja
por meio de contato com outras especialidades nas emergências dos hospitais, ou
no trabalho com as equipes de saúde mental de centros de atendimento em saúde
primária e na rede de atenção psicossocial (RAPS).
“Dentro de um hospital
geral, os psiquiatras precisam navegar entre as especialidades para ajudar a
criar um plano de tratamento. E nas UBS ou CAPS, eles não trabalham sozinhos,
mas em sintonia com psicólogos, assistentes sociais, enfermeiros e terapeutas
ocupacionais, que discutem os casos sempre em equipe. Essa é uma característica
importante na residência, porque os psiquiatras não trabalham mais isolados em
seus consultórios, essa época ficou para trás. A nova cara da profissão é
essa”.
·
O futuro dos tratamentos em psiquiatria
Assim como a demanda
dos pacientes, os tratamentos em psiquiatria também mudaram nos últimos 20
anos, de acordo com Marcelo Feijó de Mello. Além do desenvolvimento de novas
medicações, de efeitos mais rápidos e com menos reações adversas, existem,
hoje, psicoterapias mais pontuais para cuidar de quadros específicos.
“Os anos 1990 foram
considerados a década do cérebro. Muitas novas pesquisas surgiram, tendo como
resultado intervenções específicas, como neuromodulações, estimulações
eletromagnéticas e, mais recentemente, o uso – ainda experimental – de
substâncias psicodélicas para casos como o transtorno de estresse
pós-traumático (TSPT), sem contar o canabidiol (CDB) e a cetamina,
que têm tido bons resultados. Se for comparar com o que temos hoje, a
psiquiatria é um campo completamente diferente do que eu conheci na minha
formação, por exemplo. E nossos residentes vão estar aptos a participar desse
mercado atual de trabalho”.
E, para acompanhar
essas evoluções e contribuir para avanços ainda mais significativos na área,
também as pesquisas devem fazer parte dessa formação. “Nós incentivamos os
residentes a se envolver nessa área também. Dentro do Einstein, temos um
aparato de nível internacional, no Instituto
do Cérebro (InCe). Ali, o médico pode fazer a pesquisa que quiser, são muitas as possibilidades e é uma oportunidade única, por isso estamos reforçando a parte de pesquisas também, tanto para esses quatro atuais
residentes, quanto para os que devem vir – e quem sabe em um número maior – a
partir dos próximos anos”.
Fonte: Futuro da Saúde
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