Venda da Avibras reflete 'declínio na
ambição nacional', diz ex-ministro da Defesa
Em meio a dificuldades
financeiras, a Avibras Indústria Aeroespacial, uma das principais companhias
brasileiras da Base Industrial de Defesa (BID), está avaliando sua venda para o
grupo australiano DefendTex. Em entrevista à Sputnik Brasil, o ex-ministro da
Defesa Aldo Rebelo avaliou a situação como "um capítulo triste e
lamentável".
Desenvolvedora de
mísseis e foguetes para aplicações militares, como o Skyfire e o lançador
Astros II, a Avibras integra o grupo de Empresas Estratégicas de Defesa (EEDs)
do Brasil, grupo seleto de companhias consideradas fundamentais no
desenvolvimento tecnológico e científico e na promoção da segurança e defesa
nacionais.
Para estar nessa
categoria, a empresa precisa atender a alguns requisitos específicos: ter sede
no país, ter brasileiros no controle acionário e manter a produção no país. Em
troca, o negócio recebe incentivos tributários como a isenção de PIS/Cofins e IPI.
Com grande parte de
seus clientes no exterior — como Forças Armadas do Iraque, Arábia Saudita,
Catar, Angola, Líbia, Indonésia e Malásia —, essa é a terceira crise financeira
que atinge a Avibras em seus 60 anos de história.
Dessa vez, no entanto,
a Avibras está sob o risco de ser vendida para uma companhia australiana, a
DefendTex, movimento criticado tanto por analistas independentes quanto pelo
Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região, que representa os trabalhadores
da empresa.
Para eles, a
transferência das tecnologias desenvolvidas pela Avibras para o exterior
compromete a soberania nacional e a defesa do país.
·
Avibras passa por recuperação judicial
À Sputnik Brasil, Aldo
Rebelo, ex-ministro da Defesa da gestão Dilma Rousseff (PT) e atual secretário
de relações internacionais de São Paulo, afirmou que o episódio da Avibras é
"apenas um reflexo das deficiências mais amplas do Brasil em matéria de
defesa".
"O Brasil perdeu
capacidade de tecnologia de defesa porque perdeu capacidade tecnológica. O
Brasil perdeu capacidade de inovação em matéria de defesa porque […] perdeu
capacidade de inovação em economia em geral", afirmou.
Com dívidas acumuladas
em pelo menos R$ 600 milhões — estimativas do mercado financeiro colocam o
montante acima de R$ 1,2 bilhão —, a Avibras se encontra em processo de
recuperação judicial.
Marcello Marin, mestre
em governança corporativa e especialista em recuperação judicial, explica à
Sputnik Brasil que a recuperação judicial é um mecanismo criado para impedir a
falência das empresas. Graças a ele, em aproximadamente 95% dos casos as companhias
conseguem se reerguer, garante.
Durante esse processo
jurídico, a empresa recebe uma proteção que impede que os credores acessem seus
ativos, permitindo reorganizar suas finanças e negociar dívidas, seja por meio
da venda de ativos ou da distribuição de participação acionária.
Atualmente, cerca de
98% das ações pertencem a João Brasil Carvalho Leite, filho de João Verdi
Carvalho Leite, engenheiro formado no Instituto Tecnológico de Aeronáutica
(ITA) e um dos fundadores da Avibras.
Detalhes da
recuperação judicial da companhia são escassos. Em declaração ao Valor
Econômico, Guilherme Marcondes, advogado da Avibras, afirmou que R$ 386 milhões
de passivo fiscal foram renegociados para R$ 63 milhões, graças ao mecanismo de
transação tributária.
"O governo é o
que menos sofre em uma recuperação judicial. Muitas vezes, as empresas que
entram em recuperação judicial têm alguns benefícios do governo para fazer
parcelamento das dívidas, muitas vezes excluindo ali multas, alguns juros ou
dando algum desconto", disse Marin.
Já as dívidas
trabalhistas, estimadas em R$ 14,5 milhões, foram negociadas de forma a dar a
escolha aos funcionários: receber 82% do valor devido ou aguardar até agosto
deste ano para receber 100% dos débitos.
"Cada caso de
recuperação judicial é um caso", afirma Marin, e gerir um processo desses
requer um profundo conhecimento da situação da empresa. Algumas companhias
possuem ativos que podem ser vendidos para quitar as dívidas, enquanto outras
enfrentam dificuldades para liquidar esses ativos.
As circunstâncias da
Avibras ainda têm desafios próprios, como questões relacionadas à
"soberania nacional, questões de informação privilegiada, informação
confidencial […], é uma caixa de Pandora um pouco maior", disse Marin.
Por conta disso,
inclusive, muitas vozes do setor pedem algum tipo de intervenção do governo,
seja por meio do Ministério da Defesa, seja da Presidência, para embargar a
venda a investidores estrangeiros. Marin, contudo, esclarece que tudo depende
se a venda já está prevista no processo de recuperação.
"Se essa venda
para investidores estrangeiros foi prevista em recuperação judicial, nada se
pode falar, porque isso já está aprovado. Você simplesmente vai dar sequência
ao que disse que ia fazer."
·
Elites 'negligenciaram' desenvolvimento
nacional
Segundo Aldo Rebelo,
"a venda da Avibras é apenas um capítulo triste e lamentável" da
história do "declínio geral na sua ambição nacional e no seu projeto de se
constituir como nação independente e próspera".
O Brasil, lembrou o
político, já foi líder em setores tecnológicos de ponta no passado. "O
país dominou a informática no seu início por iniciativa das instituições
militares, quando a Marinha e a Universidade Estadual de Campinas [Unicamp]
apresentaram um protótipo do computador Cisne Branco, e a aeronáutica e a USP
[Universidade de São Paulo] construíram o Patinho Feio."
No âmbito nuclear, o
país também alcançou de maneira autônoma a tecnologia de enriquecimento de
urânio, relembrou. "O Brasil dominou a tecnologia do átomo a partir de um
programa próprio, dirigido pela Marinha, o chamado Programa Nuclear Paralelo, que
nos deu uma centrífuga de alta eficiência que permite enriquecer o
urânio."
As deficiências atuais
em defesa, diz Rebelo, são apenas o reflexo de uma questão maior. Para o
secretário, seria uma solução simplista atribuir a responsabilidade a um único
governo. Essa responsabilidade é compartilhada com as elites políticas, econômicas,
intelectuais e empresariais do país, que negligenciaram a capacidade de
planejamento e desenvolvimento nacional.
"Todas elas têm
um grau de responsabilidade. Nós perdemos a capacidade de planejar o Brasil.
Nós tivemos já um período em que elegíamos ou apontávamos os chamados objetivos
nacionais permanentes que todo país deve ter e que o Brasil já teve um dia e
que foi perdendo."
Rebelo ressalta ainda
que a Defesa nacional vai além da disponibilidade das Forças Armadas e seus
equipamentos militares, envolvendo questões demográficas, científicas e
tecnológicas.
"A política de
defesa exige que o país tenha uma economia capaz de produzir os meios para a
Defesa nacional, como converter uma fábrica de tratores em uma fábrica de
tanques ou de aviões, desde que você tenha base industrial e tenha também o
conhecimento e a tecnologia."
Avibras Astros II é
utilizado durante exercício de artilharia das Forças Armadas da
Rebelo conta que,
quando foi ministro da Defesa, chegou a operar com equipamentos da Avibras na
Amazônia e no estado de Goiás. "Essas tecnologias nos davam um grande
poder dissuasório, porque embora fossem tecnologias usadas para finalidades
civis, também podiam ser aplicadas para a área de defesa, tanto a nuclear como
a espacial, […] a cibernética, a de informática."
Estratégica como é, a
venda da Avibras seria uma grande perda não só para toda Base Industrial de
Defesa, como para toda a economia brasileira. "A Avibras desenvolve
tecnologia sensível para mísseis com alcance de até 300 km, dominada por poucos
países."
"É evidente que a
melhor alternativa seria a manutenção da companhia sob controle nacional e a
proteção dessa tecnologia como patrimônio de defesa do país, mas para isso
precisaríamos de outra correlação de forças", afirmou.
"Nós precisamos
tomar a Avibras como uma lição. E para manter a Avibras ou construir ou
reconstruir empresas como a Avibras, o Brasil precisa alterar o rumo da sua
construção nacional."
Ø Força Aérea Brasileira diz estar preparada para resgatar
brasileiros no Oriente Médio
A Força Aérea
Brasileira sinalizou, neste domingo (14), estar de prontidão para resgatar
brasileiros que estão em áreas de conflito no Oriente Médio.
A declaração da FAB
surge em meio ao aumento dos ataques na região.
Via comunicado, a FAB
disse estar "preparada e pronta" para atender a qualquer pedido de
resgate, desde que acionada pelas autoridades competentes.
"Para isso,
mantém-se em constante prontidão, com suas tripulações e aeronaves, para se
fazer presente onde o Brasil precisar. [...] Não somente em relação a missões
específicas, mas a quaisquer necessidades, sendo esta prontidão ininterrupta
para agir em apoio à sociedade", destaca o texto.
O Irã lançou dezenas
de drones e mísseis contra Israel na noite de sábado (13), depois de ameaçar
retaliar um ataque aéreo mortal ao Consulado-Geral do Irã na Síria, que matou
sete membros da elite do Corpo de Guardiões da Revolução Islâmica (IRGC, na sigla
em inglês) há duas semanas, em 1º de abril.
Ø
Brasil monitora possíveis impactos do conflito
entre Israel e Irã no preço do petróleo
Em reação ao ataque à
embaixada iraniana em Damasco, na Síria, o Irã lançou mais de 300 drones e
mísseis contra o território israelense no último fim de semana, o que aumentou
os temores de uma escalada da guerra no Oriente Médio.
Por conta das tensões
na principal região produtora de petróleo do mundo, o ministro de Minas e
Energia, Alexandre Silveira, anunciou nesta segunda-feira (15) a criação de um
grupo de trabalho para acompanhar possíveis impactos do conflito no mercado nacional.
Conforme Silveira, pode ocorrer uma restrição de produção ou comercialização de
petróleo por conta dos ataques.
Além de acompanhar de
perto as variações do preço do barril, o grupo ainda vai avaliar o cenário da
crise internacional. Mesmo com os temores de um aumento, o valor está em US$
90,51 (R$ 469,14), uma queda de 1,09% na comparação com a última cotação. Em 2024,
o produto já registra uma valorização de quase 20% e só em março o aumento
acumula 8%.
"É importante que
a gente esteja atento. O ministério está debruçado. Hoje mesmo já fiz uma
reunião cedo com a Secretaria Nacional de Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis, a fim de que a gente possa, em um grupo de monitoramento
permanente da oscilação do preço do Brent [petróleo cru], que eu acabei de
criar, estar atento e agir de pronto com os mecanismos que nós temos e que
respeitem, mais uma vez, a governança do setor privado e também da própria
Petrobras, que é uma empresa de economia mista", declarou em entrevista
coletiva.
·
Brasil se prepara para cenário mais
crítico, diz Silveira
O ministro de Minas e
Energia declarou ainda que o Brasil se prepara para enfrentar o cenário mais
crítico, apesar de não haver elementos de confrontos diretos entre Israel e
Irã. "Tenho esperança de que não aconteça [acirramento do conflito entre Irã
e Israel]. Mas como foge à nossa esfera de gestão, nos cabe acompanhar de
perto, para que não tenha o mínimo risco de falta de suprimento, muito menos
impactos mais dramáticos na economia nacional", disse.
Além disso, Silveira
pontuou que a pasta está em contato com a Petrobras, distribuidoras e outras
produtoras de combustível para avaliar possíveis impactos no mercado interno.
Ainda no último
domingo (14), Teerã indicou, após o ataque, que considerava o assunto
"concluído". A reunião do gabinete de guerra de Israel terminou sem
uma decisão sobre uma resposta, enquanto os aliados de Tel Aviv têm apelado por
uma desescalada.
A menos que quaisquer
novos ataques retaliatórios perturbem os fluxos de petróleo, a Organização dos
Países Exportadores de Petróleo e aliados (OPEP+) tem capacidade de produção
suficiente para controlar qualquer subida dos preços do petróleo, de acordo com
analistas da Bloomberg.
Em meio à queda da
demanda global por petróleo, apesar da atual crise de segurança europeia, dos
ataques dos houthis contra navios comerciais israelenses, britânicos e
norte-americanos no mar Vermelho e da operação israelense em curso em Gaza, a
OPEP+ suspendeu cortes voluntários de produção no primeiro trimestre de 2,2
milhões de barris de petróleo por dia (bpd) no segundo trimestre, política que
deve permanecer em vigor pelo menos até o final de junho, juntando-se aos
cortes existentes de 3,66 milhões de bpd acordados em 2022.
Fonte: Sputnik Brasil
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