quinta-feira, 4 de abril de 2024

Invasores seguem ameaçando indígenas no Vale do Javari

A região do Vale do Javari, no norte do Amazonas, ainda sofre com a presença de invasores não indígenas. Menos de dois anos após os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips por caçadores ilegais, o território segue desprotegido e vulnerável aos invasores, que não se esforçam para esconder os vestígios de sua presença.

O Amazônia Real publicou imagens registradas por um grupo de indígenas Marubo na região do rio Curuçá. Lá, foram encontradas armadilhas, sacos de lixo e de sal, ossos de animais, pilhas, latas e garrafas abandonadas. Além dos vestígios dos invasores, o grupo também encontrou sinais da passagem de indígenas isolados, o que levanta a preocupação por possíveis contatos entre eles e os caçadores não indígenas.

O Vale do Javari é a Terra Indígena com o maior registro conhecido de grupos indígenas em isolamento voluntário – pelo menos 19 comprovados. A interação com não indígenas traz o risco não apenas de ataques e conflitos, mas também de exposição a doenças novas para os  isolados.

“A entrada dos pescadores, dos caçadores, não parou, não freou. Simplesmente continuam os mesmos problemas de antes, durante e pós-morte de Bruno [Pereira]. A prisão do Colômbia [Rubén Dario Villar, apontado pela Polícia Federal como mandante das mortes de Bruno e Dom], a prisão dos executores, isso não mudou absolutamente nada”, lamentou Yura Marujo, ativista e liderança indígena do Vale do Javari.

A principal denúncia dos indígenas é a ausência do poder público no Vale do Javari. No ano passado, o governo federal anunciou diversas ações para retomar a fiscalização no território, como o restabelecimento de bases de proteção etnoambiental que foram abandonadas na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. Porém, essas medidas ainda não se refletiram em mais segurança às comunidades indígenas.

“Precisamos que o Estado brasileiro faça o seu trabalho, porque senão, os Povos Isolados vão acabar morrendo por conta desse contato prematuro. E a fonte desses problemas é justamente os pescadores e caçadores, inclusive, com anuência de lideranças indígenas das comunidades que fazem essa fronteira entre a terra demarcada e não demarcada”, afirmou Yura.

Em tempo:

A Justiça Federal determinou na semana passada a saída dos invasores não indígenas da Terra Alto Rio Guamá, no nordeste do Pará. A decisão atende a um pedido do Ministério Público Federal (MPF), motivado pela volta de cerca de 20 famílias ao território do qual elas haviam sido retiradas há quase um ano. O retorno dos invasores aconteceu depois que um falso juiz anunciou que os invasores tinham o direito de voltar à área.

 

       Novas ações e ferramentas no combate ao desmatamento na Amazônia e no Cerrado

 

A Amazônia e o Cerrado vivem situações distintas quanto à devastação da vegetação nativa. No primeiro bioma, o retorno das ações de fiscalização e combate à ilegalidade vem conseguindo conter o desmate, ainda que os números estejam longe do desmatamento zero. Já no outro, legislações defasadas e contradições envolvendo os governos estaduais não conseguem estancar a escalada da destruição.

Por isso, toda iniciativa para conter a devastação não somente é bem-vinda como necessária. É o caso do “Flying Guardians”, modificação no Flight Simulator, da Microsoft, que permite sobrevoar a Floresta Amazônica e encontrar pontos de garimpo ilegal e desmatamento; e também da força-tarefa formada semana passada entre os governos federal e estaduais para unificar as bases de dados sobre o Cerrado e assim enfrentar o avanço do desmate.

O Flying Guardians é um projeto que reuniu o Greenpeace, a agência AlmapBBDO e a Planet Labs, empresa que obtém imagens de satélite do planeta diariamente, segundo a CNN e O Antagonista. “A ideia é que os jogadores possam sobrevoar esses dois territórios e ver a ocorrência do desmatamento e garimpo em tempo real”, explicou Jorge Dantas, porta-voz de Povos Indígenas no Greenpeace. Dessa forma, o usuário consegue usar o simulador como uma ferramenta ambiental sem perder a experiência imersiva de sobrevoar qualquer lugar do mundo.

Para Anderson Silva, especialista em simulador de voos que esteve envolvido no projeto, o Flying Guardians criou uma espécie de missão aos usuários, que antes não exploravam a região por não haver nenhum tipo de interação no local. “Hoje você nota que algumas pessoas já estão começando a sobrevoar a região. Essa interação que o jogo permite torna tudo mais interessante, porque desperta uma curiosidade. ‘Será que eu vou encontrar alguma coisa ali?’, vira um desafio”, explicou.

Na simulação, os jogadores podem acessar quatro torres de comando para informar as coordenadas geográficas de destruição nos Territórios Indígenas Munduruku e Yanomami, além de comandos para assinar o abaixo-assinado Amazônia Livre de Garimpo. Há também os canais tradicionais do próprio simulador, e outros canais do Flying Guardians que oferecem conteúdos informativos sobre o desmatamento, o papel da Planet Labs, narrativas fictícias e apoio ao jogador.

Se um dos maiores simuladores de vôo do mundo serviu de base para uma ferramenta de vigilância da Amazônia, no Cerrado a tarefa não envolve tanta tecnologia, mas é fundamental para a preservação do bioma: informações precisas e compartilhadas. Assim, uma reunião entre ministros e governadores na semana passada definiu a unificação das bases de dados dos estados com o governo federal como parte de uma força-tarefa para reverter os crescentes números de desmate, informam ((o))eco, g1, Agência Brasil e Sagres.

A ideia é retomar a alimentação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), que foi enfraquecida no governo anterior, levando os estados a desenvolverem suas próprias plataformas de acompanhamento da situação dos imóveis rurais. Além da unificação e do cruzamento de informações, um grupo de trabalho entre ministros e governadores se reunirá periodicamente para acompanhar os dados e tomar decisões.

A situação no Cerrado é mais grave e preocupante na região conhecida como MATOPIBA, localizada nos estados do Maranhão, de Tocantins, do Piauí e da Bahia. A área, apontada como a nova fronteira agrícola do país, é onde ocorrem quase 75% do desmatamento no Cerrado.

 

       Funai defende anistia para todos os povos indígenas do Brasil por danos causados pela ditadura militar

 

A presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, destacou nesta terça-feira (2), a importância da reparação coletiva do Estado brasileiro aos danos causados pela ditadura militar aos povos Guarani-Kaiowá, do Mato Grosso do Sul, e Krenak, de Minas Gerais. E também a importância de mais povos indígenas serem visibilizados, não apenas em relatórios, mas de maneira que a política indigenista seja de fato implementada porque todos merecem justiça social, ambiental e territorial.

A declaração foi feita durante a abertura da primeira sessão de julgamento dos inéditos pedidos coletivos de anistia dos povos Guarani Kaiowá e Krenak, pela Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). O colegiado deferiu os requerimentos e foi feito um pedido formal de desculpas aos dois povos por terem sido vítimas de perseguição e tortura no período do regime militar.

“É importante para a história de um país e para a história de um povo, quando se é reconhecido como parte da sociedade para que não sejamos excluídos. A memória tem uma importância muito grande para os povos indígenas porque, com ela, sabemos de onde viemos e para onde queremos ir. Ela não é simplesmente apagada, mas serve para corrigir erros e fazer acertos, principalmente, na administração de um país”, enfatizou Joenia Wapichana.

Para Joenia, essa justiça pode começar a partir de dados a serem acessados. Nesse sentido, ela informou que a Funai, em uma estratégia com o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e o Arquivo Nacional, está trabalhando em um projeto para que essa memória seja preservada a partir de documentos públicos.

“Essa é uma estratégia que mostra uma nova Funai. Uma gestão que, no passado, foi totalmente contraditória aos princípios constitucionais. Essa nova Funai, com uma gestão indígena, traz a participação não de povos, mas com os povos indígenas, reconhecendo que não existe uma etnia ou um povo, mas existem vários povos e várias línguas”, evidenciou a presidenta referindo-se também à mudança de nome do órgão indigenista passando de Fundação Nacional do Índio para Fundação Nacional dos Povos Indígenas. “A Funai está aqui ao lado dos povos indígenas para juntos lutarmos pela justiça de todos”, complementou.

<<< Sessão

Joenia Wapichana compôs a mesa de abertura ao lado da presidenta da Comissão de Anistia do MDHC, Eneá de Stutz; do assessor de Participação Social e Diversidade do MPI, Jecinaldo Sateré, representando a ministra Sonia Guajajara; do assessor especial de Defesa da Democracia, Memória e Verdade do MDHC, Nilmário de Miranda; e da deputada federal Célia Xakriabá (MG).

Ao abrir a sessão, Eneá de Stutz fez uma fala dirigida aos indígenas presentes reconhecendo que o território brasileiro pertence aos povos indígenas do Brasil. “Eu quero fazer esse reconhecimento em nome do Estado brasileiro. E, nesse sentido, agradecer e pedir permissão para continuar esta sessão de apreciação dos respectivos casos como Comissão de Anistia do Ministério de Direitos Humanos e Cidadania. E agradeço, mais uma vez imensamente, a história de luta, resistência e todos os ensinamentos que, há mais de cinco séculos, vocês estão nos dando”, destacou. No decorrer da sessão, Eneá formalizou o pedido de desculpas aos povos Guarani Kaiowá e Krenak.

<<< Anistia

Os pedidos de anistia coletiva estão previstos no novo regimento interno da Comissão de Anistia do MDHC, aprovado em 2023. O documento traz a possibilidade dos julgamentos coletivos e a exigência do pedido de desculpas em nome do Estado brasileiro em casos de deferimento.

No requerimento coletivo, não é possível ter reparação econômica. No entanto, os grupos anistiados podem contar, além de um pedido de desculpas formal do Estado brasileiro, com a retificação de documentos e acesso a tratamento de saúde pelo Sistema Único de Saúde (SUS), por exemplo, ou mesmo recomendação para demarcação de territórios, como no caso de indígenas e quilombolas, entre outras medidas.

 

       Sob patrocínio do Centrão, pauta antiambiental avança no Congresso Nacional

 

Quando o assunto é atropelar a proteção do meio ambiente, a turma de Arthur Lira e do Centrão não perde tempo. Como o g1 destacou, menos de dois meses após o início do ano legislativo, a Câmara dos Deputados pisou no acelerador na tramitação de vários projetos que podem enfraquecer o combate ao desmatamento e à mudança do clima. A expectativa é de que o tratoraço antiambiental siga nessa toada em abril.

Seis projetos polêmicos de lei estão na fila da boiada de Lira & Cia. Um deles já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara no mês passado: o PL nº 364/2019, que elimina a proteção de vegetação nativa em “áreas não florestais”. Aprovado em caráter terminativo, o texto deve seguir direto para o Senado sem passar pelo plenário da Câmara.  Como já noticiamos: de acordo com nota técnica da Fundação SOS Mata Atlântica , somente esse PL deixa 48 milhões de hectares do Brasil desprotegidos.

Outro projeto, pautado na Comissão de Minas e Energia da Câmara, pretende autorizar o licenciamento ambiental de garimpos em Reservas Extrativistas e Parques Nacionais. Na Comissão de Agricultura, os deputados estão analisando uma proposta que libera empreendimentos rurais para descumprir medidas de prevenção e combate a incêndios, desde que não haja risco a pessoas, patrimônio ou ao meio ambiente.

Já na CCJ, está em trâmite um projeto que pretende classificar obras de infraestrutura de irrigação como de “utilidade pública”, o que pode agravar e intensificar a segurança hídrica em várias partes do país. O colegiado também analisa um projeto que visa restringir a cobrança da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA) às atividades submetidas à competência de licenciamento da União, o que atinge diretamente o financiamento das atividades do IBAMA.

Por fim, um projeto de lei aprovado no Senado e na pauta da CCJ da Câmara quer excluir a silvicultura da relação de atividades com impacto ambiental. A mudança isentaria essa atividade da necessidade de licenciamento ambiental e da cobrança da TCFA.

O licenciamento ambiental é um dos principais alvos da ira antiambiental no Congresso Nacional. A Folha destacou o impacto potencial do PL que flexibiliza o processo de licenciamento no Brasil e que, na prática, cria um “autolicenciamento” por parte das empresas responsáveis. Se a mudança for aprovada, pelo menos 80 mil empreendimentos poderão ser afetados. O número inclui processos em andamento nos níveis estadual (mais de 76,6 mil) e federal (quase 4 mil).

“Licenciamentos podem e devem ser racionalizados, para assegurar maior previsibilidade aos empreendedores, mas priorizar as dispensas de licença ambiental e o autolicenciamento está longe de ser o caminho adequado”, disse Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do IBAMA. “Querem que o LAC [Licença por Adesão e Compromisso] passe a ser a regra, não a exceção”.

 

Fonte: ClimaInfo/Funai

 

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