Desafio do bolsonarismo e o papel da
esquerda
O bolsonarismo
realizou um novo ato público neste domingo (21), em Copacabana, no qual houve
uma quase repetição das falas e do conteúdo mostrado em outro evento, o da
Paulista, em 25 de fevereiro. Mas também chamou atenção, desta vez, uma atenção
mais pronunciada para as eleições municipais.
Não que o
assunto tenha passado batido no ato da Paulista. Na ocasião, Michelle Bolsonaro buscou legitimar a união entre
religião e política e seu marido falou que “[em] 2024 temos eleições
municipais. Vamos caprichar no voto, em especial, para vereadores.” Ali a fala
do ex-presidente evidenciava uma das prioridades táticas da extrema direita e
do campo conservador: eleger o máximo possível de candidatos à Câmara Municipal
neste ano.
O objetivo, por meio
da eleição de vereadores, é fazer das Câmaras municipais um lugar para ecoar as
mensagens de cunho moralista que agradam suas bases e preparar um salto para
2026. Daqui a dois anos, além das eleições para as assembleias estaduais e Câmara
dos Deputados, haverá duas vagas para o Senado na disputa de cada estado. E é
nesta casa que o bolsonarismo sonha com uma ampliação da sua presença, até para
possibilitar a instauração de eventuais processos de impeachment para ministros
do Supremo Tribunal Federal (STF).
Uma mostra dessa
disposição foi um fato incomum para um evento realizado no Rio de Janeiro: uma
pré-candidata a vereadora de São Paulo ter sido apresentada por Bolsonaro. A
cubana Zoe Martínez, ex-comentarista da rádio Jovem Pan, é tida como possível
puxadora de votos para o PL chegar a uma bancada de dez vereadores na capital paulista, meta ousada que tornaria a legenda possivelmente a maior
bancada da casa.
Mas além disso, o ato
do Rio deu a vez aos pré-candidatos a prefeito. Sete deles puderam associar
diretamente sua imagem à de Bolsonaro, em um ambiente festivo, que será
explorado nos próximos dias nas redes sociais do segmento. Alguns, como
Alexandre Ramagem (PL-RJ), Bruno Engler (PL-MG), Gustavo Gayer (PL-GO) e Éder
Mauro (PL-PA), são parlamentares que, mesmo se forem derrotados no processo
eleitoral, voltam a seus mandatos de deputado federal com mais projeção e já
despontariam como possíveis candidatos a cargos maiores (no próprio Senado, por
exemplo) em 2026.
- 2024 não é 2020
A mobilização foi
menor do que se esperava, com pico de aproximadamente 33 mil pessoas, segundo
grupo de estudos da USP que estimou a presença de 185 mil na Paulista em
fevereiro. Ainda assim, é importante não cometer o erro de subestimar a
capacidade de mobilização do extremismo brasileiro. Atos presenciais criam um
vínculo mais forte e ajudam a impulsionar as ações no meio digital.
Foi uma manifestação
política com um forte viés eleitoral, pelos pré-candidatos que estavam ali e
pelo reforço das pautas que são caras ao bolsonarismo. Isso mostra um cuidado e
uma organização em relação às eleições municipais que não houve em 2020. À época,
Bolsonaro se via com a popularidade em xeque por conta da condução do combate à
pandemia e manifestações e reuniões públicas – um ativo do grupo desde que a
direita deu as caras nas ruas – não eram possíveis. Isso fez com que o
resultado nas urnas não correspondesse ao sucesso de 2018. Agora, a história
pode ser outra.
Não só existe uma
atenção maior ao pleito como os temas cultivados pelo bolsonarismo têm
encontrado ressonância e destaque no Legislativo, em especial na Câmara dos
Deputados onde a hostilidade do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), em
relação ao governo Lula abre espaço para que tais parlamentares ganhem voz.
A tradição política
aponta que as eleições municipais têm um caráter distinto das gerais. Nelas, em
condições normais, os problemas do dia a dia, de interesse local, têm uma
influência muito maior do que os vieses ideológicos poderiam indicar. As
conexões com lideranças de bairro também contam muito na escolha de um
candidato. Mas o Brasil viu nos últimos anos um movimento grande de “invasão”
de pautas de cunho moralista, muitas imaginárias como a questão da “ideologia
de gênero” nas escolas, ganharem corpo. E são questões que podem passar a ter
importância local.
Além disso, como
Michelle Bolsonaro fez questão de mostrar em seus dois discursos na Paulista e
em Copacabana, denominações neoptencostais terão ainda menos pudores para
tentar vincular voto e religião.
- E a esquerda?
Se em 2022 foi
possível (e necessária) uma frente ampla para derrotar o bolsonarismo, que não
economizou meios e recursos para vencer as eleições presidenciais, já se sabia
que a repetição disso nas eleições municipais seria impossível. O conflito de
interesses locais divide alguns partidos internamente e entre legendas
distintas isso se torna ainda mais relevante.
Do outro lado, como os
atos bolsonaristas mostram, existe uma concertação em torno de nomes e de
pautas que mobilizam o segmento. Já a esquerda, além de contar com poucas
articulações em nível local que sejam suprapartidárias (como ocorre em São
Paulo, por exemplo), tem hoje dificuldades em unificar bandeiras que agreguem e
tenham poder de estimular a participação.
Em seus primórdios,
uma estratégia do PT para marcar território e ganhar projeção como partido era
lançar candidaturas em todas as capitais, mesmo sem chances de vitória,
estratégia que foi reproduzida em parte pelo PSOL em sua origem. Isso reforçou
a identidade da legenda e criou uma marca, projetando nomes que, mesmo
derrotados, lançaram-se em voos mais altos adiante.
Hoje o contexto é
diferente, o PT tem o governo federal e uma relação complicada com o
Legislativo nacional. Parece às vezes sem rumo. Além disso, a amplitude
ideológica das alianças dá as caras em parte das disputas pelas prefeituras – o
que amarra, nestes casos, a atuação da legenda. Mas isso não precisa levar os
partidos de esquerda a se apresentarem sem horizonte político, como se coubesse
aos prefeitos, em meio à crise civilizatória, apenas administrar
burocraticamente a máquina dos municípios. É possível apresentar visões nítidas
sobre as mudanças necessárias no espaço urbano e no país. Mesmo em cenários nos
quais os candidatos não são favoritos (e talvez principalmente aí), vale pautar
temas caros à esquerda, ainda que enfrentem barreiras do ponto de vista
eleitoral, mas que possam dar norte à militância e impulsionar a eleição de
vereadores. E, assim como faz o bolsonarismo, a esquerda deveria dar dimensão
nacional ao debate destes temas.
Desde 2022 a extrema
direita consegue ter o poder de agenda pública mesmo sem estar no poder
federal. Não fazer o enfrentamento é cavar um buraco que vai erodir nas
eleições de 2026. É possível fazer esse embate de forma estratégica, de acordo
com o lugar e o cenário. Mas é preciso articular diferentes forças do campo e
planejar. Os extremistas já colocaram seu bloco na rua.
Ø “Governo Lula é de centro-direita”, diz José Dirceu: “Exigência
do momento”
O ex-deputado federal
José Dirceu, que presidiu o Partido dos Trabalhadores (PT) entre 1995 e 2002,
declarou que o governo atual de Lula é de centro-direita, atribuindo essa
classificação à presença de partidos dessa orientação na base de apoio. Dirceu
mencionou Republicanos, Progressistas e parte do PL como apoiadores do
presidente.
“Não vou poder
defender o ministro Fernando Haddad. Todos sabem que eu estou na linha de
frente da defesa dele, mas eu queria dizer que o Lula, não só foi eleito nessas
condições, como montou um governo que não é de centro-esquerda não”, iniciou
Dirceu durante o “Brasil Hoje 2024”, evento organizado pela Esfera Brasil na
Zona Sul de São Paulo.
“Lula montou um
governo de centro-direita. Falo isso, e ficam indignados no PT. Mas é exigência
do momento histórico e político que vivemos”, explicou. “O PP e o PL, de certa
forma, estão na base do governo”, afirmou.
Mais tarde, a
assessoria do petista divulgou nota afirmando que, apesar da declaração, Dirceu
considera o terceiro mandato de Lula como “um governo de centro-esquerda,
apoiado por partidos de direita”.
Afirmou ainda que a
fala se deu sob o contexto da polarização política, entendendo que a atual
administração “se pauta pelo diálogo, com o ingresso de partidos como PP e
Republicanos”. A assessoria concluiu dizendo que o político já havia externado
essa avaliação em entrevistas à imprensa.
Durante sua fala ao
público, o ex-presidente do PT também criticou o que chamou de “fundamentalismo
religioso com ataque à democracia” presente no bolsonarismo.
Segundo Dirceu, a
movimentação de Bolsonaro pelo país nos últimos meses e a presença de
pré-candidatos em várias cidades indicam que o ex-presidente está em campanha
eleitoral. O petista elogiou as medidas contra Bolsonaro adotadas pelo STF e
outras instâncias.
Sobre sua própria
candidatura em 2026, Dirceu não a descartou, afirmando que decidirá sobre o
assunto no segundo semestre de 2025. Ele lamentou seu afastamento da Câmara dos
Deputados em 2005 e suas prisões em 2015 e 2018, no contexto das denúncias do
mensalão e da Lava Jato, respectivamente.
O seminário, que
reuniu lideranças políticas e econômicas, contou com a presença de Dirceu, Aldo
Rebelo (PDT), Juliano Medeiros (PSOL) e Felipe Carreras (PSB). O debate,
intitulado “Unindo ideias, moldando futuros”, promoveu discussões sobre os
rumos do país e suas perspectivas.
¨
Dirceu esclarece
declaração em que afirma ser o governo Lula de "centro-direita"
A assessoria de
imprensa de José Dirceu, ex-ministro da Casa
Civil e quadro histórico do Partido dos Trabalhadores (PT), divulgou uma nota,
nesta segunda-feira (22), em que presta esclarecimentos sobre uma
declaração que gerou controvérsia durante "Brasil Hoje – Diálogos para pensar
o país de agora”, realizado pela Esfera Brasil em São Paulo (SP).
Ao responder a um
questionamento feito pelo advogado Luiz Gustavo Bichara, que mediou a mesa de
debate, sobre o campo político com o qual dialoga o governo Lula, Dirceu
afirmou que o atual presidente da República montou uma administração
de "centro-direita".
"Quando eu falo
isso, todo mundo fica indignado dentro do PT. Porque, realmente, parte
do PL e do PP de certa forma estão na base do governo. Essa
é a exigência do momento histórico e político que vivemos", havia
declarado o ex-ministro.
Horas depois,
entretanto, a assessoria de imprensa de Dirceu afirmou que o petista, na
verdade, considera o governo Lula como
de "centro-esquerda" no campo político.
"A
assessoria de imprensa do ex-ministro José Dirceu (PT) esclarece que ele avalia
o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva como 'um governo de
centro-esquerda, apoiado por partidos de direita', e não um governo de
centro-direita, como acabou afirmando durante o Seminário Brasil Hoje,
promovido pela Esfera Brasil. Sua fala se deu no contexto de análise da
atual polarização política, reforçando a ideia de que o governo se pauta pelo
diálogo, com o ingresso de partidos como PP e Republicanos - 'uma exigência do
momento histórico em que vivemos'", diz o comunicado.
"A ideia de um
governo de centro-esquerda, apoiado por forças de direita para consolidar uma
maioria no Congresso e conquistar uma base social mais ampla, já foi externada
inclusive em entrevistas do ex-ministro à imprensa", prossegue.
- Zé Dirceu de volta ao Congresso
Em entrevista ao programa Fórum Onze e Meia no dia 20 de
março, o jurista Kakay deu detalhes sobre a recente festa de
aniversário do ex-ministro-chefe da Casa Civil Zé Dirceu (PT) e
afirmou que ele deve ser candidato à deputado federal.
Vítima de perseguição
judicial nos casos do Mensalão e da Lava Jato, o político petista teria
confirmado sua intenção de candidatar-se como deputado federal nas próximas
eleições de 2024.
Dirceu é uma figura
histórica do PT, e, apesar da persecução midiática, ainda goza de respeito e
admiração por grande parte da militância do partido.
Em 2002, Dirceu obteve
mais de 556.563 votos para seu mandato como deputado federal.
Segundo Kakay, que é amigo próximo de Dirceu há décadas, ele está voltando
ao cenário político.
Contando sobre o
evento de aniversário do petista, ocorrido no último dia 16, Kakay
relatou: "O Silvio Costa provocou assim, você tem que ser candidato
para ter 500 mil votos. E ele simplesmente aceitou, entendeu? Então, acho que
foi muito importante, importante para ele, importante para o PT, importante
para o trabalho que ele faz", disse.
Questionado por Renato
Rovai se de fato Dirceu será candidato, o jurista respondeu: "Eu acredito
que sim, eu acredito que sim. Eu acho que se tudo estiver dentro da
normalidade, para ele é importante. Aos 78 anos de idade, voltar da Câmara
depois de tudo que ele passou com o Zé, ele sintetizava o que era de bom no
PT", afirmou.
Fonte: Por Glauco
Faria, em Outras Palavras/DCM
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