A Índia pode se tornar a próxima
superpotência global?
Na sexta-feira, 19 de
abril, a Índia inicia sua gigantesca eleição geral -
ela dura seis semanas e 969 milhões de pessoas estão aptas a votar. O
primeiro-ministro Narendra Modi e seu partido, o Bharatiya Janata Party (BJP),
buscam um terceiro mandato no poder.
A Índia é um dos
poucos países do mundo a possuir armas nucleares e a pousar uma sonda na Lua. E
desde sua última eleição geral em 2019, tornou-se a nação mais populosa do
mundo, e ultrapassou o Reino Unido como a quinta
maior economia global.
Muitos estão prevendo
que a Índia se tornará a próxima superpotência global, mas sua ascensão tem
sido recebida com uma mistura de otimismo e cautela.
·
Uma economia em
expansão
"A Índia será o
motor de crescimento do mundo", declarou Modi durante uma visita à África
do Sul em agosto passado.
Até o final de 2023, o
país havia consolidado seu título, entre as grandes economias, de crescimento
mais rápido do mundo, com crescimento de 8,4% nos últimos três meses do ano.
As economias mundiais
podem ser classificadas pelo PIB (Produto Interno Bruto), que mede a atividade
econômica de empresas, governos e indivíduos em um país.
De acordo com várias
instituições financeiras, incluindo o banco de investimento norte-americano
Morgan Stanley, a Índia está a caminho de ultrapassar a Alemanha e o Japão para
se tornar a terceira maior economia até 2027.
O que chama atenção é
que a Índia era um dos países mais pobres do mundo em 1947, quando obteve
independência. Décadas de domínio britânico deixaram a nação com infraestrutura
inadequada e uma indústria agrícola incapaz de alimentar sua crescente população.
Naquela época, a
expectativa de vida na Índia era de 35 anos. Hoje, quase dobrou: foi para 67,
de acordo com o Banco Mundial, enquanto
a média global é de 71.
A Índia é a décima
maior nação exportadora do mundo, diz o Banco Mundial. Suas principais
exportações são óleo refinado, diamantes e medicamentos embalados.
Seu boom econômico
foi impulsionado por sua próspera indústria de serviços e pelo desenvolvimento
do setor de telecomunicações e software.
Mas os economistas
apontam que a criação de empregos não acompanhou o mesmo ritmo. Um relatório do
HSBC estimou que a Índia precisava criar 70 milhões de empregos na próxima
década, à medida que sua população cresce, mas diz ser improvável que gere
muito mais do que um terço disso.
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O 'boom populacional'
A população da Índia é
mais jovem do que a de muitos países desenvolvidos. Em 2022, sua idade média
era de 28,7 anos, em comparação com 38,4 na China e 48,6 no Japão, segundo a
ONU.
Atualmente, sua
população total é de 1,4 bilhão, e os economistas indianos Bashar Chakravorti e
Gaurav Dalmia previram que, até 2030, o número de pessoas em idade de trabalho
ultrapassará um bilhão.
Eles disseram à
Harvard Business Review que o salto econômico experimentado por outras economias asiáticas,
incluindo Japão e China, dependia desse "boom populacional em idade de
trabalho".
Mas manter no seu
território todos esses trabalhadores pode ser difícil. A Índia tem o maior
número de cidadãos vivendo no exterior: cerca de 18 milhões, segundo a ONU.
Aproximadamente 2,5
milhões se mudam para o exterior a cada ano, incluindo alguns dos acadêmicos
mais proeminentes.
Mais indianos estão
optando por ficar no exterior indefinidamente, segundo estatísticas do
Ministério das Relações Exteriores que registram o número de pessoas que
renunciam à sua cidadania indiana.
O país não permite
dupla nacionalidade. Em 2022, mais de 225 mil renunciaram à sua cidadania
indiana, o maior número em mais de uma década.
Para muitos que
permanecem no país, encontrar emprego tem sido um desafio.
As estatísticas do
governo colocam a taxa de desemprego da Índia em 8%, em comparação com 3,8% nos
EUA, por exemplo.
Em março, a
Organização Internacional do Trabalho (OIT) disse que pessoas com idades entre
15 e 29 anos representavam 83% dos desempregados da Índia, sendo que a maioria
tinha pelo menos educação secundária.
"Eu viajo
frequentemente pela Índia e converso com jovens. Eles estão deprimidos e muito menos
encantados com qualquer ideia de um milagre indiano", diz o jornalista e
escritor indiano Siddhartha Deb, cujos livros se concentram na ascensão da
Índia.
"O crescimento
econômico trouxe nova infraestrutura, como rodovias e aeroportos, e o número de
bilionários cresceu. Mas as pessoas na Índia em geral estão com
dificuldades", diz ele.
·
Onde estão as mulheres
trabalhadoras?
A proporção de mulheres
trabalhadoras é de apenas 33%, segundo o governo. É
baixo em comparação a 56,5% nos EUA, 60,5% na China e uma média global de 49%,
diz o Banco Mundial.
Embora mais mulheres
indianas estejam continuando os estudos do que no passado, outras que se casam
seguem a expectativa cultural tradicional de ficar em casa.
A professora Ashwini
Deshpande, economista da Universidade Azim Premji, com sede em Bangalore, diz
que muitas mulheres trabalhadoras são autônomas, o que pode deixá-las
vulneráveis.
"Há uma
necessidade urgente de aumentar a participação das mulheres no trabalho remunerado
regular, com contratos de trabalho e benefícios de seguridade social", diz
ela.
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A desigualdade
persiste
A Índia continua sendo
um dos países mais desiguais do mundo.
Quase metade da
população vive com menos do que o equivalente a US$ 3,10 (cerca de R$ 15,50)
por dia, a linha de pobreza do
Banco Mundial, enquanto o número de bilionários indianos aumentou de uma pessoa
em 1991 para 162 em 2022, segundo a revista Forbes.
Enquanto a classe
média está se expandindo, "há uma vasta desigualdade na Índia",
segundo Ashoka Mody, professor de política econômica internacional na
Universidade de Princeton, nos EUA.
"E essa é uma das
principais razões pelas quais é tolo assumir que a Índia se tornará uma
superpotência sem mudanças estruturais significativas."
Uma das mudanças
necessárias, argumenta Mody, são reformas sociais que abordem essa
desigualdade, incluindo o fortalecimento do sistema de saúde pública indiano.
"Para centenas de
milhões de indianos, empregos são difíceis de conseguir, e a educação e a saúde
são precárias."
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A polarização política
está se intensificando
A polarização política
não é nova na Índia. Desde o século 19, o país debate se deve ser uma nação
secular ou hindu. Cerca de 80% da população é composta por hindus.
A discussão se
intensificou após a vitória esmagadora do partido nacionalista hindu de Modi em
2014.
Os incidentes de
crimes de ódio contra muçulmanos aumentaram e, em março, tanto a ONU quanto o
governo dos EUA expressaram preocupações com a
aprovação de uma lei que facilita obtenção de cidadania para minorias
religiosas não muçulmanas do Paquistão, Bangladesh e Afeganistão.
A autora Devika Rege,
que recentemente publicou Quarterlife, um romance controverso sobre
a Índia após as eleições de 2014, acredita que seu país está passando por uma
onda de "desarmonia comunal".
"A política de
identidade já era um fator na forma como as pessoas votavam [na Índia], mas as
eleições de 2014 polarizaram as pessoas no nível de amigos e família",
diz. "É difícil negar a taxa de crescimento da Índia, mas as liberdades civis
foram comprometidas e a desarmonia comunal está generalizada. Esses conflitos
podem rapidamente acabar com o carnaval se saírem do controle."
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A Índia nem sempre
joga conforme as regras do Ocidente
Por muitos anos,
países ocidentais esperaram que a Índia se tornasse uma força capaz de
equilibrar a influência da China na Ásia.
Além de ser um estado
nuclear, também possui o segundo maior exército do mundo, com 1,45 milhão de
pessoal ativo. Mas a Índia nem sempre se comporta como o Ocidente gostaria.
Nos últimos dois anos,
recebeu críticas por sua postura neutra na guerra entre Rússia e Ucrânia e
por comprar petróleo russo com desconto, apesar das sanções ocidentais contra
Moscou.
Saniya Kulkarni,
especialista em relações internacionais na London School of Economics and
Political Science, diz que o Ocidente pode esperar que a Índia seja "menos
complicada" do que a China, mas adverte que ela tem suas próprias
aspirações.
"Seria equivocado
esperar que a Índia atue como embaixadora do Ocidente", diz ela. "A
ênfase da Índia é ser um ator não ocidental, e não anti-Ocidente."
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Eleições na Índia é marcada
por perseguição religiosa
As eleições na Índia,
maior democracia do mundo, têm início em 19 de abril e, além de reunir o maior
número de eleitores da história, é marcada por forte perseguição religiosa pelo
partido de Narendra Modi.
O
partido Bharatiya Janata (BJP), de Modi, deve conseguir o terceiro mandato
consecutivo e garantir mais cinco anos no poder. Guiado por uma fé nacionalista
Hindu como parâmetro, Modi aguça a luta religiosa na Índia para conquistar
votos. “Ele está usando a perseguição religiosa e o ódio religioso para juntar
votos. É uma escolha complexa em um país que tem tantas divisões e
tantos problemas como a Índia“, diz Trevisan.
Nas últimas eleições,
exatamente com esse excesso religioso, o BJP conseguiu 303 assentos dos 543
disponíveis, o que lhe permitiu impor uma política de forte desenvolvimento no
país. “A Índia é um dos países que mais cresce no mundo. Em 2023, cresceu 7%,
seguido pela China (5%). Todos os demais países do mundo sequer cresceram 3%.
Isso dá uma medida exata do avanço da economia indiana”, afirma o professor de
relações internacionais da ESPM.
Leonardo Trevisan diz
que, ao associarmos o desenvolvimento econômico a esse crescimento demográfico
e à perseguição religiosa, torna-se mais fácil compreender porque Narendra Modi
provavelmente conquistará um terceiro mandato.
As eleições contarão
com 960 milhões de eleitores que irão votar para 543 assentos na Lok Sabha,
Câmara baixa do Parlamento, e se desenvolverá em sete fases, sendo finalizada
em Junho. “Este número de indianos é maior do que a soma dos eleitores na América
Latina e na União Europeia, o que nos dá uma ideia do tamanho e da importância
dessa eleição”, finaliza o especialista da ESPM.
Fonte: BBC News Brasil
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