Lula tem menor taxa de MPs aprovadas em ano marcado por disputa no
Congresso
O terceiro mandato de Lula (PT) apresenta o menor
índice de medidas provisórias aprovadas quando comparado a seus antecessores,
considerando o recorte dos primeiros 11 meses de mandato.
Esse cenário ocorre em um ano marcado pela disputa
entre os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-PI), e do Senado,
Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sobre o rito desse tipo de medida, que tinha sido
alterado durante a pandemia. Nesse contexto, parte dessas medidas acabou sendo
apresentada em forma de projeto de lei com urgência.
De 44 MPs, 7 foram aprovadas e sancionadas, no
período de 1º de janeiro a 1º de dezembro. Isso resulta em um índice de 16% de
conversão percentual
que pode aumentar nos próximos
meses, dado que parte delas ainda não teve a tramitação
encerrada. O segundo menor índice para
o mesmo recorte foi no governo de Jair Bolsonaro (PL), que registrou 23%.
É o que mostra levantamento do Observatório do
Legislativo Brasileiro (OLB), realizado pela cientista política Joyce Luz, que
atualmente é pesquisadora do Centro de Política e Economia do Setor Público da
FGV.
Procurada pela Folha de S.Paulo, a SRI (Secretaria
de Relações Institucionais) da Presidência da República afirmou que, ao
analisar os números das MPs, é fundamental levar em conta que parte delas foi
convertida em projetos de lei que foram aprovados.
"O conteúdo dessas MPs foi validado, e o
governo conseguiu atingir seus objetivos, e, por isso, fecha o ano com saldo
positivo", diz em nota.
Ao analisar o índice de sucesso geral do governo no
Legislativo, levando em conta, portanto, as demais propostas apresentadas pelo
Executivo, o valor de Lula 3 (27%) fica próximo a de seus antecessores índice de Bolsonaro, por exemplo, foi de
25% no mesmo período. A taxa
fica distante apenas dos valores alcançados no primeiro (60%) e segundo (56%) mandatos de Lula.
Foram considerados projetos de lei (PL), medidas
provisórias, projetos de lei complementar (PLP), projetos sobre matéria
orçamentária (PLN) e propostas de emenda à Constituição (PEC).
Além dessa queda de braço, a própria relação entre
Executivo e Legislativo vem passando por mudanças, com um Congresso que tem
tido um engrandecimento. Entre os fatores que têm gerado um desequilíbrio estão
as alterações nas regras sobre emendas parlamentares, que vêm perdendo força
enquanto instrumento de negociação pelo governo.
No último dia 18, o líder do governo no Senado,
Jaques Wagner (PT-BA), chegou a dizer que o avanço do Congresso sobre o
Orçamento por meio de emendas é uma "anomalia do sistema" e disse que
a situação tende a "ficar impossível".
Joyce Luz destaca o baixo índice de aproveitamento
das MPs pelo governo e ressalta que, apesar de parte delas ter perdido a
eficácia, muitas acabam não sendo derrotas do governo, já que foram
transformadas em projeto de lei.
Ela questiona, por outro lado, o que vê como uma
neutralidade do Executivo nessa disputa sobre os trâmites entre Lira e Pacheco
e que acaba gerando custos políticos para o governo. "Aí fica a questão de
por que o governo continua emitindo MPs se ele também não interfere nesse
conflito para que ele seja solucionado?", indaga Joyce.
As MPs têm força de lei e entram em vigor logo após
sua edição, mas precisam ser aprovadas em até 120 dias pelo Congresso para
virarem lei de fato caso contrário elas deixam de ter validade.
A briga entre as duas Casas tem se dado porque Lira
queria manter uma alteração feita durante a pandemia, quando as MPs passaram a
ser apreciadas direto no plenário primeiro na Câmara e
depois no Senado, ao invés de uma
comissão mista
formada por deputados e senadores, como prevê a Constituição.
Em meio ao embate com Pacheco, o presidente da
Câmara passou a pressionar o governo para trocar MPs por projetos de lei com
urgência constitucional, o que ocorreu em algumas situações, como no caso do
voto de qualidade no Carf, do programa Desenrola e da tributação das offshores.
Em outubro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad,
chegou inclusive a dizer, em entrevista à Reuters, que o impasse sobre a
tramitação de MPs ainda não tinha se resolvido e que isso gerava
constrangimento ao governo.
No primeiro semestre, até mesmo a MP que definia a
estrutura do governo com seus ministérios, esteve sob risco de caducar, tendo
sido aprovada no limite. O mesmo ocorreu com a medida que recriou o programa
Minha Casa, Minha Vida.
Uma MP do início do governo que previa pagamento de
um extra de 50% no programa Auxílio Gás acabou incluída na MP do Bolsa Família
sob risco de caducar até a edição de um decreto chegou a ser aventada
para evitar que o benefício
deixasse de ser pago.
Em termos de projetos de lei, Lula apresentou 29
projetos no período analisado, dos quais 9 foram aprovados e sancionados. Entre
eles, estão a política de valorização do salário mínimo e de igualdade salarial
entre mulheres e homens na mesma função.
Entre os não aprovados, estão as propostas do
chamado "pacote da democracia", que estão parados na Câmara desde
julho.
Lula também aprovou um projeto de lei complementar,
formato em que tramitou o arcabouço fiscal, regra aprovada para substituir o
teto de gastos. Comparado a seus antecessores o índice é superior, já que
nenhum teve o projeto do tipo aprovado no recorte.
Quanto aos projetos de matéria orçamentária, o
índice também próximo aos primeiros 11 meses dos demais governos.
Uma vitória da articulação do governo foi a
aprovação da PEC da Reforma Tributária, ela não entra na conta do governo,
entretanto, já que foi de autoria do Legislativo e de texto anterior ao atual
governo Lula.
A aprovação da PEC da Reforma da Previdência no 1º
ano do governo Bolsonaro, por sua vez, apesar de entrar na conta do governo,
foi aprovada com forte engajamento do então presidente da Câmara, Rodrigo Maia.
Na mesma semana em que teve a histórica reforma
aprovada, porém, Lula viu vários de seus vetos serem derrubados pelo Congresso,
entre eles à desoneração da folha de pagamentos e ao marco temporal de terras
indígenas.
Fabiano Santos, que é coordenador do OLB, grupo que
é ligado ao Iesp-Uerj (Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro), diz que um dos fatores importantes a se levar em
conta é a força da direita no Congresso, o que acaba por si só impondo uma
maior dificuldade de composição para o atual governo.
"O jogo político entre Executivo e
Legislativo, onde este é bem aparelhado e divergente do campo político do
primeiro é muito concentrado na dinâmica da emissão e derrubada dos
vetos", diz.
Ele, porém, não vê o empoderamento do Congresso
como algo que estaria diminuindo o poder do Executivo, mas sim, como um endosso
do caráter presidencialista do sistema, dado que ele é baseado na separação dos
poderes.
Joyce, por sua vez, destaca a taxa de apoio de
parcela dos partidos que fazem parte da base de governo em votações na Câmara.
A União Brasil, por exemplo, que tem ministério na Esplanada, entregou 62% de
seus votos, no período analisado.
GOVERNO ARGUMENTA QUE MPS VIRARAM PLS
Procurada pela Folha de S.Paulo, a SRI ressalta que
parte das MPs viraram projetos de lei aprovados.
A SRI afirmou, em 21 de dezembro, que, de 46 MPs
publicadas pelo governo, 15 "tiveram seus conteúdos remetidos para outros
projetos de lei".
Disse ainda que, portanto, 23 MPs foram
"convertidas em lei", 8 "já tinham produzido todo o efeito
esperado quando caducaram", pois tratavam de crédito extraordinário ou
prorrogação de prazo de lei; 2 caducaram tendo apenas "efeito
administrativo", e que outras 13 seguem em tramitação.
A Folha de S.Paulo questionou o recorte temporal
dos dados e também pediu o detalhamento sobre os critérios do balanço de MPs
que teriam sido convertidas em lei, mas não houve resposta.
Ø Haddad
indica apoio à antecipação de troca de presidente do BC para fim do 1º ano de
governo
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, indicou, em
entrevista do jornal O Globo, que apoia a ideia de integrantes de
governo de antecipar o fim do mandato dos presidentes do Banco Central para
encerramento do primeiro ano da gestão do presidente da República.
Pela lei de autonomia do BC, a possibilidade de
troca no comando do BC se dá no fim do segundo ano de mandato do presidente da
República. Na prática, atualmente, a indicação do substituto de Roberto Campos
Neto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ocorrerá no fim deste ano. Se
valesse a ideia do governo, já teria acontecido no encerramento de 2023.
“Diria que um ano do mandato presidencial seguinte
pode funcionar melhor do que dois anos, porque as decisões de política
monetária têm efeito até 18 meses à frente. E há risco de um presidente
indicado pelo governo anterior interferir na gestão do seguinte. Também entendo
que a quarentena (para voltar ao mercado) de seis meses no Brasil é curta.
Poderia ser dois anos”, afirmou Haddad.
Fonte: FolhaPress
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