segunda-feira, 10 de março de 2025

Remédio chinês contra câncer de pulmão supera o mais vendido do mundo

O DeepSeek chocou o mundo ao entregar uma inovação inesperada a um preço inacreditável. Mas essa tendência disruptiva não se limita às big techs: ela vem acontecendo silenciosamente no setor farmacêutico.

Em setembro, a Akeso, uma empresa de biotecnologia chinesa pouco conhecida, fundada há quase uma década, abalou o setor de biotecnologia com seu novo medicamento para câncer de pulmão.

ivonescimab, o novo medicamento, foi considerado em um teste conduzido na China como tendo superado o Keytruda, o medicamento de sucesso desenvolvido pela Merck que arrecadou mais de US$ 130 bilhões (cerca de R$ 769 milhões) em vendas para o gigante americano que dominou o tratamento do câncer.

Os pacientes tratados com o novo medicamento da Akeso passaram 11,1 meses antes que seus tumores começassem a crescer novamente, em comparação com 5,8 meses para o Keytruda, de acordo com dados clínicos divulgados na Conferência Mundial sobre Câncer de Pulmão, um importante fórum médico.

Ao longo de vários dias no início de setembro, as ações da Summit Therapeutics, sediada na Califórnia, parceira da Akeso nos EUA, mais que dobraram para um recorde, de acordo com dados da Refinitiv. A empresa havia licenciado o direito de comercializar o novo medicamento na América do Norte e na Europa.

Na época, embora especialistas tenham dito que foi um momento decisivo para as empresas farmacêuticas chinesas, foi pouco notado fora da indústria. Tudo isso mudou após as façanhas da DeepSeek no início deste ano, que colocaram a atenção internacional em focos de inovação na China – com crescentes implicações globais.

“Eu acredito que a indústria de biotecnologia chinesa desempenhará um papel importante globalmente. E nós [iremos] participar cada vez mais”, disse Michelle Xia, CEO da Akeso, em uma entrevista no mês passado com a BiotechTV.

Em uma declaração enviada à CNN, a Akeso disse que foi um “momento incrivelmente emocionante” ver seu medicamento superar o Keytruda, o medicamento mais vendido do mundo.

“A inovação da Akeso é impulsionada por uma profunda compreensão da biologia da doença e engenharia de proteínas, ao mesmo tempo em que se beneficia do rápido tempo de desenvolvimento e da abundância de talentos de primeira linha na China”, disse.

·        A ascensão da biotecnologia chinesa

Até a década de 1980, quando a China abriu sua economia, a maioria de suas empresas farmacêuticas eram estatais. Durante a maior parte dos últimos 40 anos, as empresas de biotecnologia chinesas estavam principalmente replicando medicamentos existentes, conhecidos como medicamentos “me-too”.

Mas nos últimos 10 anos, elas começaram a inovar com medicamentos mais avançados que podem competir diretamente com as ofertas ocidentais. E elas assinaram bilhões de dólares em acordos de licenciamento com parceiros ocidentais para levar seus produtos para o resto do mundo.

A AstraZeneca assinou um acordo de US$ 1,92 bilhão (cerca de R$ 11 bilhões) com o CSPC Pharmaceutical Group da China no ano passado para desenvolver medicamentos cardiovasculares, e a Merck tem um acordo de US$ 2 bilhões (cerca de R$ 12 bilhões) com a Hansoh Pharmaceutical da China sobre uma pílula experimental para perda de peso.

“As pessoas sabiam que a indústria de biotecnologia estava crescendo muito rápido na China, mas muito poucas a viam como uma ameaça real aos principais inovadores dos EUA”, disse Rebecca Liang, analista farmacêutica da AB Bernstein.

“Agora a ameaça está se tornando real, porque você começa a ver esses medicamentos de última geração que são uma espécie de salto.”

De acordo com uma nota de pesquisa publicada pela HSBC Qianhai Securities no início deste mês, a China está se tornando um centro de inovação para toda a indústria, com o número de acordos de licenciamento saltando de apenas 46 em 2017 para mais de 200 no ano passado.

O valor total do acordo foi de apenas US$ 4 bilhões (cerca de R$ 23 bilhões) em 2017 e subiu para US$ 57 bilhões (cerca de R$ 337 bilhões) no ano passado, disse.

E números da empresa de inteligência de mercado Mergermarket indicaram que grandes transações farmacêuticas no valor de US$ 50 milhões (cerca de R$ 295 milhões) ou mais envolvendo empresas chinesas cresceram quase 30% em 2024 em comparação com o ano anterior.

Cui Cui, diretor administrativo de pesquisa em saúde da Jefferies, disse que as capacidades de pesquisa e a eficiência de desenvolvimento das empresas de biotecnologia chinesas estão se recuperando, graças a fatores como forte apoio governamental, investimento estrangeiro e uma riqueza de talentos nacionais.

“No passado, [a biotecnologia chinesa] era vista apenas como imitadora, mas no futuro, pode ser capaz de competir com as melhores empresas farmacêuticas globais”, disse Cui à CNN.

·        Dúvidas em casa

Mas enquanto a conquista da Akeso está causando ondas no exterior, o debate está acirrado na China sobre a qualidade dos medicamentos genéricos produzidos internamente, que têm os mesmos ingredientes ativos dos medicamentos patenteados, mas são muito mais baratos.

A desconfiança sobre o histórico de medicamentos produzidos internamente é profunda na China. Essas preocupações se transformaram em alvoroço público no mês passado sobre a suposta qualidade questionável dos medicamentos genéricos chineses, o que levou a uma investigação oficial.

O regulador de saúde da China posteriormente defendeu a segurança dos medicamentos, dizendo que a investigação concluiu que as preocupações com a qualidade eram infundadas.

Vários moradores de Pequim disseram à CNN na semana passada que não estavam familiarizados com a Akeso ou seu novo medicamento e ainda preferiam medicamentos importados.

“Para ser honesto, costumo escolher o medicamento mais caro. Afinal, você recebe o que paga”, disse Gu Zhihao, morador de Pequim, à CNN.

Investidores e reguladores dos EUA questionaram anteriormente a qualidade dos dados de ensaios clínicos coletados na China. Liang disse que a Food and Drug Administration (FDA) dos EUA rejeitou medicamentos desenvolvidos no país no passado porque a configuração do ensaio “não era rigorosa o suficiente”.

O novo medicamento da Akeso, que não é genérico, foi aprovado pelo regulador farmacêutico da China para alguns pacientes com câncer de pulmão. Mas ainda está a anos de distância de ser vendido nos EUA.

Um ensaio global está em andamento para o final deste ano, o que pode provar ainda mais sua eficácia, de acordo com Cui. Se o resultado for sólido, seria mais uma evidência dos avanços que a China fez no desenvolvimento de medicamentos de ponta.

¨      Luz ultravioleta torna tratamento do câncer mais tolerável

A luta contra o câncer pode ser uma tortura, não há dúvida. Não é raro o corpo inteiro ser afetado durante o tratamento por quimioterapia, que, na pior das hipóteses, pode até ter que ser interrompido.

Mas atualmente um diagnóstico de câncer não é mais necessariamente uma sentença de morte. Graças à medicina moderna, diferentes formas podem ser tratadas com sucesso, embora, é claro, quanto mais cedo o tumor for descoberto, maiores serão as chances de cura.

Um estudo publicado na revista Cancer Cell em fevereiro reforça a esperança: pesquisadores do Hospital Universitário de Freiburg descobriram que a irradiação de células imunitárias com luz ultravioleta (UV) permite aos pacientes tolerarem melhor a oncoterapia: os efeitos colaterais são reduzidos significativamente, sem que o combate ao tumor seja prejudicado.

<><> Qual é o efeito da irradiação com UV?

O estudo envolveu 14 pacientes dos hospitais universitários das cidades alemãs de Freiburg, Essen e Regensburg, que sofriam de vários tipos da doença, como melanoma, câncer de pulmão e da tireoide. Devido ao tratamento, eles desenvolveram colite (doença inflamatória intestinal), hepatite (inflamação do fígado), dermatite (reações inflamatórias da pele) ou uma combinação das três.

Após a exposição à luz ultravioleta, os que sofriam de colite ficaram completamente curados, e 92% de todos os participantes relataram que seus sintomas inflamatórios tinham se reduzido significativamente.

O número de pacientes foi pequeno, mas "a alta taxa de reação e o fato de que quase não houve efeitos colaterais" são notáveis, avalia Robert Zeiser, chefe do Departamento de Imunologia de Tumores e Regulação Imunológica do Centro Médico da Universidade de Freiburg.

<><> Por que a oncoterapia fica mais tolerável

O tratamento com luz é chamado de "fotoferese extracorporal" (ECP, na sigla em inglês). Na imunoterapia, o câncer é combatido com anticorpos, que se ligam a antígenos nas células cancerosas, mas também se acoplam a antígenos em células saudáveis em outras partes do corpo, o que pode provocar inflamações graves.

Na ECP, o sangue de pacientes com câncer é coletado e as células imunológicas que contém são irradiadas com luz UV. O sangue tratado é então reinjetado, num ciclo semelhante ao da hemodiálise.

As células irradiadas são absorvidas pelas do sistema imunológico, onde desencadeiam uma reação "que leva a um 'apaziguamento' do sistema imunológico", explica Zeiser: "A absorção ocorre no tecido inflamado, não no tumor, daí a especificidade da terapia."

Desta forma, as reações inflamatórias são inibidas, enquanto os anticorpos podem continuar sua luta contra o câncer. Esse efeito é controlado pela adiponectina, uma molécula antes conhecida principalmente por seu papel na metabolização de gordura.

<><> Uma luta menos árdua

A pesquisa sobre ECP no Centro Médico da Universidade de Freiburg foi chamada de fase 1b/2, "ou seja, um estágio muito inicial no qual, além da eficácia, o foco principal é a segurança da terapia", explica Zeiser.

Mais pesquisas são necessárias para que mais pacientes de câncer possam se beneficiar do procedimento. E os próximos passos já estão sendo planejados: um estudo complementar, com um número bem maior de participantes, escolhidos de maneira aleatória, será realizado em Freiburg.

A equipe de pesquisa responsável pelo trabalho recém-publicado tem grandes esperanças para a ECP: "É provável que a descoberta torne a imunoterapia mais segura, porque os efeitos colaterais podem ser mais bem controlados. No entanto, o próximo estudo é importante para investigar isso em detalhes", argumenta Robert Zeiser.

Em outra área, a ECP já está sendo usada com sucesso: a radiação ultravioleta ajuda pacientes transplantados ao diminuir as reações de rejeição aguda ou crônica contra o novo órgão. No Reino Unido, por exemplo, o procedimento foi autorizado para essa finalidade.

 

Fonte: CNN Brasil/DW Brasil

 

Nenhum comentário: