sábado, 8 de março de 2025

7 destaques do discurso de Trump no Congresso

presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, fez um discurso na noite de terça-feira (04/03) em uma sessão conjunta do Congresso pela primeira vez desde que voltou ao poder, no qual delineou sua visão para seu segundo mandato. "O sonho americano é imparável", disse Trump no mais longo discurso presidencial já registrado no Congresso, com uma hora e 40 minutos. Ele foi vaiado pelos democratas e aplaudido pelos republicanos presentes. Em seis semanas de governo, o presidente republicano agiu para cortar empregos entre os servidores públicosreprimir a imigraçãoimpor tarifas aos maiores parceiros comerciais dos EUA e colocar a aliança transatlântica em xeque por causa da guerra na Ucrânia.

<><> Confira abaixo alguns dos principais pontos do discurso de Trump no Congresso.

1. Guerra comercial e ameaça ao Brasil

Trump falou sobre a guerra comercial que ele iniciou esta semana, incluindo tarifas de 25% sobre o México e o Canadá. Na quarta-feira (5/3), porém, o governo americano recuou parcialmente e ofereceu isenção, por um mês, para empresas automotivas que importem ou exportem do Canadá e do México. O presidente também impôs tarifas de 10% sobre as importações chinesas. Após dias de turbulência nos mercados, que receberam mal as medidas, Trump minimizou as potenciais consequências econômicas da guerra comercial. No momento em que ele tocou no assunto, Trump foi menos aplaudido no Congresso. Muitos republicanos permaneceram sentados — um sinal de que as tarifas de Trump dividiram o partido. "As tarifas são sobre tornar a América rica novamente e tornar a América grande novamente", disse Trump. "E está acontecendo. E vai acontecer bem rápido. Haverá uma pequena perturbação, mas estamos bem com isso. Não será muito." Trump fez uma menção ao Brasil: "Em média, a União Europeia, China, Brasil, Índia, México, Canadá e inúmeras outras nações nos cobram tarifas muito mais altas do que cobramos deles, o que é extremamente injusto". Trump disse que tarifas recíprocas aos parceiros comerciais dos EUA entrarão em vigor em 2 de abril. "No dia 2 de abril, entram em vigor tarifas recíprocas, e qualquer tarifa que nos impuserem, nós também imporemos a eles... qualquer imposto que nos cobrarem, nós os taxaremos. Se usarem barreiras não monetárias para nos manter fora de seus mercados, então usaremos barreiras não monetárias para mantê-los fora do nosso mercado".

2. "Vamos tomar a Groenlândia de um jeito ou outro"

Trump disse no discurso: "Esta noite também tenho uma mensagem para o povo incrível da Groenlândia. Apoiamos fortemente o seu direito de determinar seu futuro. E se escolherem fazer isso, nós os receberemos nos Estados Unidos", disse Trump, em um aceno aos 56 mil habitantes do país, a maioria do povo Inuit. A ilha, a maior do mundo, é um território autônomo da Dinamarca. Em outras ocasiões, Trump havia dito que a Dinamarca deve desistir de interferir no território para, em suas palavras, "proteger o mundo livre". Ele voltou a falar sobre o assunto no discurso no Congresso. "Precisamos da Groenlândia para a segurança nacional e até mesmo para a segurança internacional. Estamos trabalhando com todos os envolvidos para tentar obtê-la. Realmente precisamos dela para a segurança global e acho que vamos obtê-la. Vamos obtê-la de um jeito ou de outro", disse ele no Capitólio.m"Nós os manteremos seguros. E os faremos ricos." A Groenlândia é de importância estratégica para os EUA, pois fica na rota mais curta para a Europa. Além disso, contém reservas significativas de minerais e petróleo.

3. Uma "carta importante" de Zelensky

Trump disse que recebeu uma "carta importante" do líder da Ucrânia no início do dia, que parecia corresponder ao que Volodymyr Zelensky postou publicamente nas redes sociais. O presidente da Ucrânia disse que estava pronto para trabalhar sob a "forte liderança" de Trump para acabar com a guerra e "ir à mesa de negociações o mais rápido possível para trazer uma paz duradoura mais perto". "Agradeço que ele tenha enviado esta carta", disse Trump aos parlamentares americanos. Zelensky aceitou os termos americanos um dia depois de Trump suspender toda a ajuda militar ao sitiado aliado dos EUA. Isso ocorreu após uma reunião acalorada na Casa Branca na semana passada, quando os dois líderes discutiram diante das câmeras de TV, antes de cancelar os planos de assinar um acordo de minérios que permitiria aos EUA lucrar com uma parceria econômica envolvendo os recursos naturais da Ucrânia. Analistas diziam que Trump esperava anunciar durante seu discurso ao Congresso que o acordo havia sido finalmente fechado. Mas isso não aconteceu.

4. Obrigado a Elon Musk

Trump fez uma menção especial ao bilionário Elon Musk, que estava assistindo da galeria, no início de seu discurso. Musk lidera a força-tarefa do recém-criado Departamento de Eficiência Governamental (Doge, na sigla em inglês) que demitiu dezenas de milhares de servidores públicos e cortou bilhões de dólares em ajuda externa e em programas em todo o governo federal. O empresário da SpaceX e da Tesla, vestindo um terno escuro com uma gravata azul, levantou-se para receber aplausos da plateia de parlamentares. "Obrigado, Elon", disse o presidente. "Ele está trabalhando muito duro. Ele não precisava disso." Trump continuou listando alguns exemplos de gastos desnecessários que ele disse terem sido eliminados pela iniciativa de corte de custos de Musk, provocando risos dos republicanos. "Oito milhões de dólares para promover LGBTQI+ na nação africana de Lesoto, da qual ninguém nunca ouviu falar", disse Trump. Os parlamentares democratas seguraram cartazes dizendo "Musk rouba" e "mentira". O Doge afirma já ter economizado US$ 105 bilhões, mas esse número não pode ser verificado de forma independente. Dados foram publicados mostrando economias de US$ 18,6 bilhões, mas erros contábeis foram relatados por veículos de imprensa dos EUA que analisaram os números.

5. Democratas vaiam Trump

Nos primeiros cinco minutos do discurso, o deputado democrata Al Green, do Texas, foi escoltado para fora da Câmara após se recusar a cumprir as exigências do presidente da Câmara de parar de importunar o presidente, tomando seu assento. Enquanto Trump falava, outros democratas seguravam cartazes dizendo "Isso é mentira". Com os republicanos no controle da Casa Branca, Câmara dos Representantes e Senado, os democratas ainda não têm uma liderança clara no partido para tentar conter a onda de medidas do governo Trump. Muitas mulheres democratas chegaram à Câmara vestindo terninhos rosa em protesto. Dezenas de seu partido — algumas delas usando as palavras "Resista" impressas nas costas de suas camisas — deixaram a Câmara durante o discurso do presidente. "Não há absolutamente nada que eu possa dizer para fazê-los felizes", disse Trump, aparentemente feliz com o rancor dos democratas. A liderança democrata escolheu Elissa Slotkin — senadora de primeiro mandato do Michigan, Estado em que a vitória eleitoral de Trump foi relativamente apertada — para entregar a resposta oficial do partido às políticas do governo. Ela acusou Trump de uma "doação sem precedentes para seus amigos bilionários" e alertou que "ele poderia nos levar direto para uma recessão".

6. Combate à imigração e homenagem

Durante o discurso, Trump anunciou que renomeou um refúgio de vida selvagem do Texas em homenagem a uma garota de Houston que foi supostamente morta por imigrantes indocumentados. Jocelyn Nungaray, de 12 anos, foi encontrada morta em junho de 2024 após ser dada como desaparecida. Alexis Nungaray, sua mãe, foi convidada pela primeira-dama Melania Trump a assistir ao discurso do presidente. Na sua posse, em janeiro, Trump prometeu que seu governo começaria a deportar "milhões e milhões" de imigrantes com antecedentes criminais. O número de migrantes cruzando ilegalmente a fronteira sul caiu no mês passado para o menor nível em pelo menos 25 anos. Mas o presidente republicano teria ficado frustrado com o ritmo das remoções, que até agora não conseguiram superar os números de deportados durante o último ano de seu antecessor, Joe Biden.

7. Trump culpa Biden pelos preços dos ovos

O aumento do custo dos ovos tem sido manchete nas últimas semanas nos EUA. E Trump — que prometeu aos eleitores que acabaria com a inflação — deixou claro quem ele considerava responsável. "Como vocês sabem, herdamos, da última administração, uma catástrofe econômica e um pesadelo de inflação", disse Trump. "Joe Biden, especialmente, deixou o preço dos ovos sair do controle — e estamos trabalhando duro para baixá-lo novamente." Os preços dos ovos dispararam sob Biden, pois seu governo ordenou que milhões de aves fossem abatidas no ano passado em meio a um surto de gripe aviária. Os preços continuaram subindo no começo da presidência de Trump. A inflação anual subiu ligeiramente para 3% no mês passado, mas bem abaixo do pico de 9,1% em 2022. Apenas um em cada três americanos aprova a forma como Trump lida com o custo de vida, de acordo com uma pesquisa da Reuters/Ipsos divulgada na terça-feira.

¨      Checagem: as mentiras de Trump em discurso ao Congresso

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, fez na noite de terça-feira (04/03) seu primeiro pronunciamento ao Congresso americano desde que assumiu o segundo mandato, congratulando-se com realizações do seu governo nos últimos 43 dias. "Estamos só começando", anunciou.

Mas várias afirmações incluíam exageros ou dados completamente falsos em temas como ajuda financeira à Ucrânia, clima, imigração e até a história do Canal do Panamá. A DW e a agência AP verificaram algumas das afirmações.

<><> EUA forneceram mais ajuda à Ucrânia do que os europeus?

>>>> Afirmação:

"Gastamos talvez 350 bilhões de dólares. [...] E eles [os europeus] gastaram US$ 100 bilhões [...] Biden aprovou mais dinheiro para essa luta do que a Europa gastou", disse o republicano Trump, fazendo referência ao seu antecessor imediato na presidência, o democrata Joe Biden.

>>>> Verificação de fatos da DW: Falso.

Donald Trump tem feito essa afirmação repetidamente desde fevereiro, mas nunca forneceu nenhuma prova. As fontes disponíveis publicamente relatam números bem diferentes: De acordo com o Instituto Kiel para a Economia Mundial (IfW), um think tank alemão que monitora os gastos ocidentais com a Ucrânia, a ajuda financeira dos EUA aos ucranianos de fevereiro de 2022 até 31 de dezembro de 2024 somou 114 bilhões de dólares.

Em contrapartida, a Europa (incluindo a Turquia) direcionou nesse mesmo período 132 bilhões de dólares. Portanto a proporção de ajuda à Ucrânia entre os EUA e a Europa é completamente diferente do que Trump está retratando. Os números estão disponíveis no Ukraine Support Tracker, que o IfW disponibiliza na internet para divulgar a ajuda militar, financeira e humanitária para a Ucrânia.

O IfW leva em conta apenas o apoio fornecido diretamente, portanto seus números diferem de outras pesquisas, em que outros gastos são registrados, como o reabastecimento dos estoques de armas dos EUA após entregas à Ucrânia.

Mas dados do próprio governo dos EUA sobre a ajuda à Ucrânia tampouco coincidem com os números de Trump. De acordo com o Ukraine Oversight Working Group de Washington, a contribuição americana para a ajuda à Ucrânia totalizou 203 bilhões de dólares.

"Desde a invasão em ampla escala da Rússia na Ucrânia, em fevereiro de 2022, o Congresso aprovou ou disponibilizou quase 183 bilhões para a Operação Atlantic Resolve e a resposta mais ampla da Ucrânia. Além disso, os Estados Unidos forneceram 20 bilhões de dólares em empréstimos sob a iniciativa de aceleração de receita extraordinária das nações do G7”. O Departamento de Defesa dos EUA também informa o mesmo valor, de cerca de US$ 183 bilhões.

A questão de quanto cada país gastou com a Ucrânia depende também de quais serviços estão incluídos. Com base no cálculo padronizado do Ukraine Support Tracker, as nações da Europa, incluindo as instituições da União Europeia, forneceram muito mais ajuda à Ucrânia do que os EUA.

<><> Acordo Climático de Paris custou trilhões de dólares para os EUA?

>>>> Afirmação:

 "Eu retirei [os EUA] do injusto Acordo Climático de Paris, que nos custou trilhões de dólares, que outros países não pagaram", disse Trump no pronunciamento.

>>>> Verificação de fato da DW: Falso.

O Acordo Climático de Paris entrou em vigor em novembro de 2016. Seu principal objetivo é garantir que a temperatura média global não aumente mais de 2°C, ou, de preferência, apenas 1,5°C, em comparação com os níveis pré-industriais. De cinco em cinco anos, cada país decide o que quer fazer para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Se essas metas não são atingidas, não há punição: os compromissos são voluntários.

É verdade que a luta contra as mudanças climáticas custa muito dinheiro. Não apenas para as tecnologias que reduzem as emissões de gases de efeito estufa: também são necessários fundos financeiros para o mundo se adaptar às consequências das mudanças climáticas e para lidar com ondas de calor mais extremas, secas mais frequentes ou furacões mais devastadores. De acordo com o pacto, os países mais ricos são particularmente solicitados a apoiar financeiramente outros mais afetados pelas mudanças climáticas, mas que têm menos recursos à disposição.

Por exemplo, há o Fundo Verde para o Clima (GCF), formulado antes do Acordo Climático de Paris. Em 2014, o então presidente dos EUA, Barack Obama, anunciou que queria direcionar 3 bilhões de dólares ao GCF. Em 2023, a então vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, prometeu ao GCF mais 3 bilhões de dólares. Naquela época, 2 bilhões de dólares do valor prometido por Obama haviam sido efetivamente pagos. 

Entretanto, as cartas de intenção e promessas não se traduzem necessariamente em pagamentos. Os fundos devem ser aprovados pelo Congresso dos EUA. Até o fim de 2024, de acordo com o GCF, a segunda carta de intenção dos EUA não havia sido convertida em pagamentos.

No início de sua presidência, em 2021, Joe Biden anunciou que investiria 11,4 bilhões de dólares anualmente em projetos climáticos em todo o mundo até 2024, não incluindo apenas o GCF. De acordo com o Departamento de Estado dos EUA, o país gastou 1,5 bilhão de dólares nesses projetos em 2021. Esse valor subiu para 5,8 bilhões de dólares em 2022 e 9,5 bilhões de dólares em 2023. Para 2024 Biden havia prometido 11 bilhões.

Dessa forma, nesses anos todos, o valor total gasto pelos EUA em programas internacionais de proteção climática somou efetivamente 27,5 bilhões de dólares. Mesmo se fossem incluindo números de outros anos, os EUA nunca chegariam perto dos "trilhões" que afirma Trump.

<><> 38 mil americanos morreram durante a construção do Canal do Panamá?

>>>> Afirmação:

"O Canal do Panamá foi construído pelos americanos para os americanos, não para os outros. Mas outros poderiam usá-lo. Mas foi construído a um custo enorme em sangue e riqueza americanos; 38 mil trabalhadores morreram na construção do Canal do Panamá [...] Nós o demos ao Panamá e vamos pegá-lo de volta", disse Trump. O Canal passou para o controle dos panamenhos em 1999.

>>>> Verificação de fatos da DW: Falso.

Em primeiro lugar, a transferência do controle Canal do Panamá não foi um presente dos EUA para o Panamá, como Trump tem afirmado repetidamente, mas o resultado de longas negociações. A transferência foi baseada em dois acordos: o Tratado do Canal do Panamá, estipulando que o controle dos EUA terminaria em 31 de dezembro de 1999, e o Tratado de Neutralidade, segundo qual "após o término do Tratado do Canal do Panamá, somente a República do Panamá poderá operar o canal".

Com relação à declaração de Trump de que o canal foi construído por americanos, 38 mil dos quais teriam morrido no processo: os números reais são bem menores, especialmente para a fase de construção que envolveu diretamente os EUA, entre 1904 e 1914.

As condições de trabalho durante a construção do Canal do Panamá, que foi iniciada pelos franceses entre 1881 e 1889, eram extremamente difíceis para os padrões atuais. A carga de trabalho, mas também doenças, provocaram muitas mortes nos canteiros de obras.

O site da Autoridade do Canal do Panamá informa, porém, que os mortos somaram mais de 25 mil nas duas fases da construção: a primeira dirigida pelos franceses, e a segunda, pelos americanos. Mais de 20 mil desse total de mortos foi registrado na fase francesa, que terminou em 1889.

Os americanos assumiram a construção em 1904. De acordo com registros hospitalares, 5.609 operários morreram de doenças e acidentes durante o período americano, quando havia mais de 55 mil empregados. A maioria esmagadora dessas mortes, segundo historiadores, foi de cidadãos de países do Caribe, e não americanos. "O número de americanos brancos que morreram foi cerca de 350", apontou o historiador David McCullough, num livro sobre a construção do canal.

<><> Números sobre imigração

>>>> Afirmação:

"Nos últimos quatro anos, 21 milhões de pessoas entraram nos Estados Unidos. Muitas delas eram assassinos, traficantes de pessoas, membros de gangues", disse Trump, que fez do combate à imigração irregular uma das suas principais bandeiras de campanha.

>>>> Verificação de fatos da agência de notícias AP: Falso

O número, que Trump cita regularmente, é altamente inflado. A Alfândega e a Proteção de Fronteiras dos EUA registraram mais de 10,8 milhões de prisões por travessias ilegais a partir do México de janeiro de 2021 até dezembro de 2024.

Mas isso são prisões, não pessoas. Sob restrições de asilo durante a pandemia de pandemia de covid-19, muitos atravessaram mais de uma vez até conseguir, pois não havia consequências legais para quem fosse mandado de volta ao México. Portanto, o número de indivíduos é menor do que o de detenções.

Também não há indicações de que outros países estejam enviando seus criminosos ou portadores de doenças mentais através da fronteira, apesar das alegações de Trump.

 

Fonte: BBC News/DW Brasil 

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