Melatonina pode ser caminho para conter
perda de memória, aponta pesquisa
A melatonina, hormônio
liberado pelo corpo quando chega a hora de dormir, tem sido cada vez mais
apontada pela ciência como intensificador da fixação das memórias de longo
prazo. Um estudo conduzido no Japão, contudo, não apenas confirmou essa
qualidade, como também revelou parte de como acontece esse processo, abrindo
caminhos para futuras terapias.
A descoberta é um
avanço na possibilidade de novos tratamentos, sobretudo relativos a
esquecimentos provocados pelo aumento da idade. Os resultados foram publicados
em junho na revista NeuroReport por pesquisadores da Universidade Sophia, em
Tóquio, e está na fase de testes com animais.
O artigo descreve um
processo fisiológico molecular chamado fosforilação, que envolve modificação de
certas proteínas nas células nervosas cerebrais e leva à consolidação do
reconhecimento de algo já visto. Após uso de melatonina, os ratos observados
tiveram alterações nos níveis de fosforilação de cinco proteínas-chave da
formação da memória de longo prazo, permitindo aos autores detectar mecanismos
de aumento da memória induzidos pela substância.
Em nota da
universidade, o autor principal do estudo, o professor Atsuhiko Chiba, do
Departamento de Materiais e Ciências da Vida da Faculdade de Ciências e
Tecnologia, contou que o objetivo da pesquisa foi explorar vias de sinalização
dos receptores da melatonina.
A equipe, composta
também pelos doutores Masahiro Sano, da Universidade de Tohoku, e Hikaru
Iwashita, da Universidade Médica de Kansai, investigou os efeitos de três
compostos ligados à substância na formação da memória.
Além do hormônio do
sono em si, eles analisaram também o N1-acetil-5-metoxiquinuramina (AMK),
composto biológico resultante da metabolização da melatonina, e o ramelteon,
droga que se liga e ativa o receptor de melatonina.
O estudo foi feito
apenas com camundongos machos para evitar "qualquer provável variabilidade
de dados resultante dos ciclos reprodutivos que ocorrem em fêmeas de
mamíferos".
Testando a memória
A formação de memória
de longo prazo nos animais foi avaliada por meio de uma série de experimentos
de reconhecimento de objeções pelos ratos, que por três dias seguidos foram
colocados em uma arena por 5 minutos diários.
No quarto dia, dois
objetos idênticos foram colocados no espaço do experimento e os ratos puderam
os explorar por 5 minutos, no que foi chamado de "fase de
treinamento". No dia seguinte, um dos dois objetos foi substituído por um
novo e os ratos passaram mais tempo explorando o desconhecido que o já
familiar, comprovando a fixação da memória daqueles primeiros itens.
Na etapa seguinte,
foram analisados os efeitos das substâncias no hipocampo cerebral, área que é o
centro de aprendizagem e memória do cérebro dos mamíferos. "Experimentos
iniciais mostraram claramente que a administração de melatonina, ramelteon ou
AMK na dose de 1 mg/kg facilitou a formação de memória de longo prazo",
afirmaram os pesquisadores.
·
Riscos da automedicação
O farmacêutico
bioquímico Rafael Appel Flores, pesquisador e diretor científico na empresa Dr.
Fisiologia, é pós doutorado em neuroendocrinologia pela Universidade de São
Paulo (USP) e vê com otimismo a recente descoberta japonesa, mas lembra que é
uma fase preliminar.
"Isso abre portas
para desvendar o papel da melatonina, inclusive no tratamento de quem têm perda
de memória e dos mais idosos, mas, por mais que o modelo se aproxime muito do
que acontece em humanos, não dá para a gente transpor isso de forma completa, é
preciso estudos em pessoas para chegar às mesmas conclusões", diz.
O especialista destaca
ainda que a melatonina não é o único agente da memória, pois há outros fatores
envolvidos, como dormir ou fazer pausas nos estudos.
"Diversas
pesquisas, inclusive em humanos, demonstram, por exemplo, que uma noite de sono
bem dormida, com mais de sete ou oito horas, depois de estudar ou aprender
novos conhecimentos, é fundamental para consolidar novas memórias",
afirma.
A principal função da
melatonina está relacionada à regulação dos ritmos circadianos que são os
padrões biológicos de atividade e repouso que se repetem aproximadamente a cada
24 horas. A produção dessa substância é feita pela glândula pineal, que é sensível
à luz e sincroniza o nosso relógio biológico interno.
"Nós, seres
humanos, somos diurnos, utilizamos o período de luz para exercer nossas
principais atividades e o noturno para ajustar certos processos biológicos,
como o da melatonina, que aumenta no corpo quando está escuro e diminui quando
há exposição da luz, desempenhando um papel crucial no controle de sono e
vigília", afirma o bioquímico.
Como esse hormônio
regulador é naturalmente produzido pelo corpo, a melatonina não deve ser
consumida por conta própria. Quando recomendada para melhorar o sono costuma
funcionar apenas para os que têm alguma deficiência em sua produção, o que
torna uma avaliação médica imprescindível.
Fonte: FolhaPress
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