Emir
Sader: O Brasil que ia mal
Para o
guru do bolsonarismo, Paulo Guedes, se o PT ganhasse as eleições, em três meses
viraríamos uma Argentina e em seis meses uma Venezuela. Era e é a visão de que
o Brasil estaria à beira do abismo. Uma visão costumeira nos meios de
comunicação, que prognosticam, em geral, que o futuro do país seria negativo,
que as instabilidades justificariam os juros estratosféricos, que a situação
internacional tenderia a atentar contra a estabilidade econômica que
aparentemente o governo consegue impor.
Graças
ao desastre de que o Paulo Guedes era o guru econômico, o Lula e o PT voltaram
ao governo. Mas não deu nada daquilo. Nem Argentina, nem Venezuela.
Os
dados sociais da Argentina são catastróficos, a concentração de renda é brutal,
mais de metade da população pode ser considerada pobre. O desemprego bate
recordes.
Pelas
decisões do governo de Javier Milei de liberalização geral da economia, os
proprietários podem cobrar o aluguel que bem entendam, inclusive em dólares.
Como resultado, grandes setores da própria classe média deixaram de poder pagar
seus aluguéis e foram para a rua.
Uma das
cenas mais tristes foi a de ver famílias de classe média fuçando no lixo da
Avenida Corrientes, passando a dormir na principal avenida de Buenos Aires. As
lojas estão vazias, a população de rua cresce vertiginosamente.
Enquanto
no Brasil, a distribuição de renda é efetiva e permite que o país tenha pleno
emprego, que, ao contrário do que prognosticava Guedes, a economia cresce, os
investimentos são crescentes, o país vai bem.
Enquanto
a relação da Venezuela com o Trump é péssima, Lula conseguiu uma convivência
positiva com o presidente norte-americano.
Para
desespero dos seus detratores, o Brasil vai bem. Tornou-se uma referência,
porque combate o neoliberalismo com eficiência, fortalecendo a democracia,
convivendo perfeitamente com a oposição.
O que
significa isso? Que se pode e se deve combater o neoliberalismo, o modelo mais
negativo da atualidade, que trata de mercantilizar tudo, fazer com que tudo
tenha preço, tudo se venda, tudo se compre.
E que a
forma de combatê-lo é priorizando as políticas sociais, ao invés dos ajustes
fiscais. De fortalecer e de democratizar o Estado, ao invés do Estado mínimo.
Javier
Milei, por sua parte, como expressão máxima do Estado mínimo, chegou a afirmar
que "Entre o Estado e a máfia, prefere a máfia" (sic).
O
Brasil não se tornou nem uma Argentina, nem uma Venezuela. O país tem um
caminho próprio, inovador. O Brasil vai bem, muito obrigado.
• Freada na economia do Brasil pode ser
positiva?
A
economia brasileira deu novos sinais de desaceleração, com aumento de 0,1% do
PIB (Produto Interno Bruto) no terceiro trimestre deste ano, frente ao segundo
trimestre, segundo novos dados divulgados pelo IBGE nesta quinta-feira (4/12).
Em
relação ao mesmo trimestre de 2024, o PIB avançou 1,8%, com crescimento puxado
pela agropecuária (alta de 10,1%), indústria (1,7%) e serviços (1,3%). No
acumulado de 2025, o PIB cresceu 2,4% em relação ao mesmo período de 2024.
O dado
do último trimestre — crescimento de 0,1% — indica que a maior parte do
crescimento da economia brasileira neste ano aconteceu no primeiro semestre. No
momento atual, a economia está em ritmo mais lento.
Essa
desaceleração do Brasil fica mais acentuada se comparada com outros países em
desenvolvimento.
A China
cresceu a um ritmo anualizado de 4,8% neste ano; a Índia está crescendo a 8,2%.
O
crescimento do PIB — que significa que um país está produzindo mais bens e
serviços — geralmente está associado a uma economia mais saudável e produtiva,
com elevação do bem-estar geral da população.
Quando
o PIB cresce, normalmente há mais empregos e melhores salários para todos.
Mas
esse não é exatamente o cenário vivido no Brasil atualmente. Apesar de haver
mais empregos e melhores salários, muitos economistas estão preocupados que o
crescimento econômico acelerado possa causar mais problemas do que benefícios
ao país no longo prazo.
Economistas
ouvidos pela BBC News Brasil vêem a recente desaceleração como uma boa notícia,
que pode ajudar a ajustar outros problemas econômicos atuais, como a
expectativa de inflação alta e os juros altos.
"Daqui
para frente é muito melhor a gente crescer consistentemente a 2% ou 2,5% ao ano
de uma forma sustentável, mas com juro baixo", afirma Mansueto Almeida,
economista-chefe do banco BTG Pactual.
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Pleno emprego
A
economia brasileira vem crescendo em ritmo acelerado desde o fim da pandemia de
covid. Em 2021, o crescimento foi de 4,8% — em um momento em que o país se
recuperava da forte contração registrada logo no começo da pandemia.
Mas nos
anos seguintes, o crescimento seguiu robusto — a um ritmo de 3% ou superior
desde 2022.
Por que
o crescimento econômico era bom naquela época, mas é considerado perigoso agora
por alguns economistas?
A
resposta está no desemprego, explica Almeida.
"Quando
estávamos na pandemia, a taxa de desemprego era de 14%. Então tinha muita gente
desempregada que precisava ser trazida para o mercado de trabalho. Agora não.
Agora o desemprego está em 5,4%", diz.
Esse
índice de desemprego é o que alguns economistas chamam de "pleno
emprego" — uma situação em que praticamente todo mundo que quer trabalhar
consegue.
Para
Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, a taxa baixa de desemprego no
Brasil é uma "excelente notícia".
Mas é
justamente em momentos de pleno emprego que o crescimento econômico acelerado
pode ser prejudicial.
O
aquecimento da economia faz com que as empresas precisem contratar mais
empregados para suprir o aumento do consumo. Mas a oferta de mão-de-obra já
atingiu o seu limite — não há mais de onde tirar trabalhadores. Com maior
concorrência por trabalhadores, os salários sobem, e isso provoca um aumento
geral de custos e preços. E a oferta de bens e serviços na economia não
consegue acompanhar o aumento do consumo.
Esse
aumento generalizado de preços na economia é a inflação — que pode desfazer
todos os ganhos vividos pela população no momento de crescimento, explica
Vitória.
"As
famílias têm um bem-estar no curto prazo, mas no médio e longo prazo, a
inflação tira de volta essa melhora no poder de compra que as famílias
ganharam", afirma.
Para
tentar controlar todas essas variáveis, há dois grandes agentes econômicos que
trabalham de forma independente entre si — o Banco Central e o governo federal.
O Banco
Central pode acelerar ou desacelerar o ritmo da economia através da taxa de
juros (a política monetária) — quanto maior o índice, mais lento o crescimento.
Já o governo federal pode influenciar na economia com o orçamento e gastos
públicos (a política fiscal).
Desde
2024, o Banco Central vem tentando desacelerar o crescimento econômico
brasileiro com "doses cavalares" de juro alto, afirma Silvia Matos,
coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação
Getulio Vargas (Ibre-FGV).
"A
economia não desacelerou em 2024. Ela demorou muito mais para desacelerar. O
Banco Central disse no final do ano que iria subir os juros mais três vezes.
Isso é altíssimo em termos de série histórica e mais alto do que qualquer outro
lugar no mundo", afirma.
A
desaceleração atual do PIB é um sinal de que essa política de juro alto está
tendo o efeito desejado pelo Banco Central, que precisa manter a inflação
abaixo de 4,5%, o teto da meta. As expectativas de inflação estão finalmente
caindo e existe a esperança de que em 2026 os juros também comecem a cair no
Brasil.
Rafaela
Vitória, do Banco Inter, afirma que a economia brasileira demorou para se
desacelerar porque as políticas monetária e fiscal estão indo em sentidos
contrários.
Enquanto
o governo federal dava um impulso fiscal na economia, a política monetária do
Banco Central tentava conter a aceleração com juros altos.
Mansueto
Almeida faz uma analogia: é como se, ao dirigir um carro, o governo estivesse
apertando o acelerador, enquanto o Banco Central aperta o freio ao mesmo tempo.
"Vimos
um aumento de gasto generalizado. O governo aprovou a PEC da Transição, com
cerca de R$ 200 bilhões de gastos adicionais no ano de 2023, principalmente com
o Bolsa Família, que tem um orçamento por volta de R$ 70 bilhões", afirma
Vitória.
"Houve
a volta da política de crescimento real do salário mínimo, que hoje não é
compatível com a nossa capacidade de oferta infelizmente. Esse crescimento real
do salário mínimo impacta os benefícios da previdência, principalmente pensões
e aposentadoria."
"Estamos
vendo um gasto médio crescendo 5% acima da inflação, bem acima daquele teto
teórico do Arcabouço Fiscal, que era de 2,5%. E isso tem turbinado a economia
até mais do que a nossa capacidade. Por isso o efeito inflacionário
preocupa", diz Vitória.
Ela
afirma que o impulso fiscal do governo ajudou muito no consumo das famílias e
permitiu um crescimento robusto do mercado de trabalho, com queda forte no
desemprego.
Houve
também melhora em alguns indicadores sociais e econômicos.
Dados
divulgados pelo IBGE esta semana mostram que a população em situação de pobreza
no Brasil é a menor dos últimos 12 anos. Em um ano, entre 2023 e 2024, cerca de
8,6 milhões de brasileiros abandonaram as linhas de pobreza.
O que
acontece então a partir de agora?
Os
economistas ouvidos pela BBC News Brasil acreditam que o Brasil está chegando a
um momento de "pouso suave" da economia — em que a desaceleração é
gradual e permite a queda dos juros.
Essa
queda de juros é fundamental tanto para melhorar o ambiente de investimentos no
Brasil (empresas têm capacidade de tomar empréstimos mais baratos e investir no
aumento da produtividade) como no da dívida pública (o governo federal paga
menos juro na sua dívida, melhorando as contas públicas).
Os
dados de PIB — como os que foram divulgados nesta quinta-feira — são
fundamentais para determinar se esse pouso vai continuar sendo suave ou não.
Se em
futuras divulgações o PIB surpreender com crescimento acelerado, isso seria um
sinal de que a "dose cavalar" de juro alto, citada por Matos, não
está funcionando. Espera-se então que o Banco Central adie o movimento de corte
de juros hoje aguardado por todos.
Em
2026, os economistas esperam que haverá ainda um impulso fiscal adicional para
a economia brasileira, com as novas faixas de isenção de Imposto de Renda que
entrarão em vigor, e com aumentos de gastos típicos de anos de eleição.
Mas
para o ano seguinte, em 2027, os três economistas ouvidos pela BBC News Brasil
acreditam que haverá discussões sobre novos ajustes fiscais a serem feitos pelo
governo do candidato que ganhar a eleição de 2026.
"Eu
tenho um otimismo com cautela. Eu acho que com a economia crescendo e a atual
situação no mercado de trabalho são pontos muito positivos para se comemorar. É
possível a gente corrigir o rumo sem gerar uma crise econômica, como aquela que
vimos em 2015 e 2016, com desemprego e recessão muito grandes", disse
Rafaela Vitória, do Banco Inter.
"É
um copo meio cheio. Eu estou otimista com a atual situação. Mas se não
corrigirmos o rumo fiscal, podemos ter uma crise em breve."
Mansueto
Almeida, do BTG Pactual, também vê com bons olhos o patamar atual de
crescimento, mas alerta para os desafios.
"Se
o Brasil ficar com o crescimento do PIB de 2,5% ao ano de forma consistente,
com inflação na meta e juro baixo, isso é um cenário muito bom, porque 2,5% de
crescimento do PIB significa um PIB per capita que cresce a 2% ao ano. Mas o
grande desafio é desacelerar o crescimento do gasto, trazer a inflação para
baixo e ter um cenário de crescimento com juro baixo."
Fonte:
BBC News Brasil

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