Salomão
envia ao STF e PGR relatório sobre supostos crimes de Moro, Dallagnol e Hardt
O
Conselho Nacional de Justiça enviou ao Supremo Tribunal Federal e à Procuradoria-Geral
da República cópia do relatório da Polícia Federal, incorporado aos autos da
correição extraordinária realizada na 13ª Vara Federal de Curitiba e na 8ª
Turma do TRF-4, que cita a participação de agentes da Lava Jato em suposto
crime de peculato na modalidade desvio de recursos públicos.
A
ação do ministro corregedor Luís Felipe Salomão data de terça-feira (11/6),
poucos dias após o CNJ decidir, por 9 votos a 5, instaurar processo administrativo
disciplinar contra a juíza federal Gabriela Hardt e outros três magistrados que
atuaram no TRF-4, que teria afrontado decisões do STF.
No
caso de Hardt, a Corregedoria entendeu que a juíza, ao homologar o acordo da
famigerada Fundação Lava Jato, deixou suas digitais no esquema que movimentou
bilhões de reais oriundos de acordos de leniência e delação premiada da Lava
Jato. O esquema teria sido instituído na época em que Sergio Moro
comandava a 13ª Vara Federal.
Salomão,
que chamou o esquema de “cash back”, além de votar pela
abertura de processos administrativos, remeteu os autos da correição ao STF e
PGR, para que os fatos sejam apurados também na esfera penal.
No
CNJ, a representação disciplinar contra Sergio Moro foi desmembrada
do caso Hardt e ainda será apreciada pelo plenário. Quanto a Deltan Dallagnol, o CNJ não pôde aprofundar as
investigações contra o ex-procurador da República, mas o relatório do delegado
da Polícia Federal Élzio Vicente da Silva cita necessidade de apurar nas
esferas competentes sua participação no conluio para supostamente desviar, para
interesses próprios, os recursos dos acordos da Lava Jato.
No
relatório, consta que o contexto em que a chamada fundação Lava Jato surgiu
pode configurar possível crime comum. O relatório da PF sugere que a fundação
privada – considerada inconstitucional e anulada pelo STF – aparentemente
contemplaria as aspirações políticas de Deltan Dallagnol e Sergio Moro.
Conforme
o GGN mostrou com exclusividade, em interrogatório realizado no âmbito da correição, Dallagnol
afirmou que não se recorda de ter
pressionado a juíza Gabriela Hardt para rapidamente homologar o acordo da
fundação Lava Jato. Porém, a correição conta com depoimento da própria magistrada detalhando como foi
abordada informalmente pelos procuradores de Curitiba.
Além
disso, há elementos de provas indicando que Dallagnol esteve envolvido até o
pescoço com o processo que a Petrobras enfrentou nos EUA por causa da Lava
Jato. Além de ajudar os americanos a fabricar as denúncias que culminaram no
acordo com pagamento de multa bilionária nos EUA pela Petrobras, Dallagnol
teria negociado com os americanos o retorno de parte da multa ao Brasil. A
fundação Lava Jato seria o instrumento idealizado por Dallagnol para
internalizar os mais de R$ 2,5 bilhões da multa que seriam devolvidos às
“autoridades brasileiras”.
Em
paralelo aos passos dos americanos contra a Petrobras, Moro abriu um
procedimento secreto que foi usado para administrar as contas judiciais que
receberem, ao longo de vários anos, o dinheiro de multas pagas na Lava Jato.
Sem transparência ou aparente critério, o próprio Moro, com ajuda de
procuradores, decidiu como distribuir os recursos. Grande parte teria retornado
aos cofres da Petrobras, a título de “reparação”, mesmo sem trânsito em julgado
das ações. Com o caixa abastecido, a Petrobras conseguiu fazer frente à multa
bilionária arbitrada nos EUA, e a Lava Jato em Curitiba planejou se beneficiar
adiante com o retorno da multa para os cofres da fundação privada. Salomão
chamou o esquema de “cash back”.
¨ Deltan disse que Moro poderia dar dinheiro à Transparência
Internacional Brasil, revela interrogatório
A
Corregedoria Nacional de Justiça encontrou no depoimento de Bruno Brandão, um
dos diretores-executivos da Transparência Internacional Brasil no auge da Lava Jato, uma prova ilustrativa de como Sergio
Moro e Deltan Dallagnol – entre outros membros do Ministério Público Federal -,
supostamente distribuíram indevidamente os recursos angariados a partir do
trabalho da própria força-tarefa. O interrogatório de Brandão admite que “havia
espaço para arbitrariedades na eleição dos possíveis beneficiários de valores
nesses acordos” firmados na Lava Jato, apontou a Polícia Federal.
No
relatório da correição extraordinária feita na Lava Jato do Paraná – que serviu de base para o corregedor nacional de Justiça abrir
uma representação disciplinar contra Sergio Moro -, consta o depoimento de Bruno Brandão afirmando que foi
procurado por Deltan Dallagnol, logo no “início” da operação, para falar sobre
a possibilidade de repasses pela 13ª Vara Federal de Curitiba à TIB.
No
interrogatório, Brandão ressalva que não se recorda se o dinheiro oferecido
seria fruto dos acordos de leniência e delação premiada fechados na Lava Jato.
A Corregedoria identificou uma “gestão caótica” dos recursos, com distribuições
sem critérios técnicos aparentes e sem transparência e prestação de contas, ou
seja, ao sabor dos interesses lavajatistas.
“Indagado
se a TI [Transparência Internacional brasil] foi, em algum momento, sondada
sobre a possibilidade de recursos oriundos de acordos de colaboração ou de
leniência sob controle da 13ª Vara Federal de Curitiba fossem dirigidos para projetos
da TI Brasil, [Bruno Brandão] respondeu QUE não sabe dizer se especificamente
sobre acordos de colaboração ou de leniência, mas o depoente se recorda que foi
sondado pelo então procurador da república DELTAN DALLAGNOL, salvo engano no
início da operação, informando que haveria possibilidade de a 13ª Vara Federal
de Curitiba destinar recursos para a TI”, aponta o depoimento de Bruno
Brandão.
Ex-juiz
e hoje senador, Moro entrou na mira do Conselho Nacional de Justiça por, entre
outros fatores, ter criado um procedimento ultra secreto justamente para
movimentar recursos bilionários levantados
pela Lava Jato ao longo de vários anos. Somente a Petrobras e o MPF estavam
envolvidos no procedimento secreto, que foi tornado público por Gabriela Hardt
em 2019, depois que o escândalo da Fundação Lava Jato veio à tona.
O
depoimento de Brandão sinaliza que a própria TIB admitiu haver problemas
no modus operandi da Lava Jato em gerir os recursos. Moro
movimentava o dinheiro das contas judiciais sem participação ou conhecimento da
União, sem controle dos órgãos competentes, sem ciência dos réus que pagavam as
multas estabelecidas nos acordos, sem aguardar o trânsito em julgado das ações.
Na prática, a Lava Jato teve o poder de decidir sozinha onde aplicar ou a quem
beneficiar com milhões de reais.
“QUE
a partir desse contato, a TI realizou estudos buscando entender como
funcionaria essa prática, e pode afirmar que nunca pleitearam tais recursos;
QUE o motivo dessa postura é o fato de que identificaram problemas e
fragilidades no modelo que isso se desenvolve no Brasil, com poucos controles,
muita discricionariedade e pouca transparência nas decisões entre ministério
público e poder judiciário, bem como na governança do Fundo de Direitos Difusos
(FDD)”, resumiu a Polícia Federal a respeito do
depoimento de Brandão.
Apesar
do relacionamento próximo com Dallagnol, a Transparência Internacional Brasil
não recebeu recursos da Lava Jato. Porém, realizou estudos e esteve à
disposição dos procuradores para ajudar, inclusive, a definir o destino dos
recursos que seriam “desviados” para a famigerada Fundação Lava Jato, abortada
pelo Supremo Tribunal Federal. Na semana passada, o CNJ transformou a juíza Gabriela Hardt em alvo de processo
administrativo disciplinar justamente por ter homologado o acordo da fundação
privada.
A
correição extraordinária citou o nome de Deltan Dallagnol mais de 80 vezes, mas
nenhum procurador de Curitiba é investigado no CNJ. Os fatos, no entanto, ainda
serão encaminhados à Procuradoria-Geral da República, que decidirá se adotará
providências na esfera penal. Na visão da Corregedoria, personagens da Lava
Jato podem ter incorrido nos crimes de peculato e corrupção com a história da
fundação privada.
·
Modelo irregular de fechar acordos
Para
além disso, a correição refletiu sobre como o próprio modelo de colaboração
premiada ou acordo de leniência instituído na Lava Jato para dar azo ao
pagamentos de multas vultosas pelos réus, era um modelo “em desacordo” com a
legislação vigente à época.
“Tratava-se,
aparentemente, da importação de um modelo de resolução de questões criminais
por meio do pagamento de dinheiro, inclusive negociando penas, cujas decisões
homologatórias, no entender de DELTAN DALLAGNOL, ‘não havendo questionamentos,
transitavam em julgado'”.
A
correição trata o modus operandi da Lava Jato como “sui
generis” e ressalta que o próprio ex-procurador Deltan
Dallagnol “confirmou que o tipo de colaboração utilizado na atuação da
força-tarefa Lava Jato não era o previsto na legislação, mas um padrão
adquirido em apurações anteriores à Lei nº 12.850/2013, realizadas em Curitiba,
Paraná”.
Pelo
que se interpreta do interrogatório de Deltan Dallagnol, a Lava Jato
possivelmente ignorou a lei da delação premiada, instituída em 2013, e seguiu
bebendo dos vícios que os procuradores desenvolveram desde a época do
Banestado.
“Esses
acordos surgiram antes da lei de 2013. A lei veio regulamentar uma prática que
foi estabelecida na força-tarefa do Banestado, com a participação minha, doutor
Januário [Paludo], doutor Carlos Fernando [dos Santos Lima], doutor Orlando
[Martello], que eram as pessoas que… eram as pessoas que, em grande medida,
vieram a compor a força-tarefa do caso Lava Jato. Ou seja, eram as pessoas que
conheciam toda a tradição desses acordos e que, pela primeira vez na história,
fizeram esses acordos antes de qualquer regulamentação. Depois veio a
regulamentação“, disse Deltan Dallagnol.
A
correição, no entanto, esclarece que o argumento de Deltan apresenta uma “ideia
equivocada” sobre as delações premiadas no País. “(…) há de partida duas
falhas no argumento: a) a operação Lava Jato se iniciou em 2014, após a
publicação da lei que regulamentou o instituto da colaboração premiada,
portanto deveria ter seus atos regidos pela Lei nº 12.850/2013; e b) as
práticas da força-tarefa do Banestado, anteriores à legislação de 2013 – que
prosseguiram sendo empregadas em Curitiba –, não foram encampadas ou absorvidas
pelo texto legal vigente ao tempo da operação.”
Um
levantamento parcialmente incorporado à correição também mostrou que, quando o
assunto é acordo de delação premiada ou de leniência, a Lava Jato lançou mão
de “disposições contra a lei ou fora da lei em relação: a) à pena; b)
às provas; c) ao direito de acesso à justiça; d) à competência; e) aos bens; f)
à propositura de outras ações; g) às medidas cautelares pessoais; h) à multa
compensatória. Em resumo, os acordos tratavam de local, forma e regras de
progressão de pena; apresentavam o objeto do ajuste de forma difusa; previam
obrigações em relação a terceiros não signatários (filho e cônjuge maiores de
18 anos, p.ex.); previam não impugnação de sentenças condenatórias; elegiam o
juiz que homologaria o acordo; previam destinação de valores aos órgãos de
persecução penal com base legal diversa da estabelecida na lei; entre outras
questões também correlacionadas às anomalias identificadas nos processos
estudados na correição.”
¨
Interrogado, Deltan
disse que “não se recorda” de pressionar Hardt para homologar a Fundação Lava
Jato
O
ex-procurador Deltan
Dallagnol disse em interrogatório que embasa a correição
extraordinária na Lava Jato, promovida pela Corregedoria Nacional de Justiça,
que “não se recorda” de ter pressionado a juíza federal Gabriela
Hardt para acelerar a homologação do acordo entre Ministério Público Federal e
Petrobras que desviaria mais de R$ 2 bilhões para a famigerada fundação privada
que, na mídia, ficou conhecida como Fundação Lava Jato.
A
correição extraordinária na 13ª Vara Federal de Curitiba, promovida pelo time
do ministro Luís Felipe Salomão, descobriu, a partir de depoimento da própria juíza Gabriela Hardt, que houve pressão sobre a magistrada e tratativas informais
junto aos procuradores de Curitiba para homologar o acordo, que foi feito às
“pressas” e faltando documentos básicos, na visão da Corregedoria. Os
procuradores teriam, inclusive, antecipado, via WhatsApp, a minuta do termo de
poucas páginas que Hardt veio a homologar em 2019. Questionado sobre os fatos,
Deltan disse não se recordar de nada.
“QUE
indagado se integrantes da força-tarefa trataram previamente dos termos do
acordo de assunção de compromissos com a juíza GABRIELA HARDT, [Deltan
Dallagnol] respondeu que não se recorda; QUE deseja esclarecer que, até
assinava em conjunto algumas petições, mas não estava ‘na parte operacional’;
QUE não sabe dizer o prazo entre a protocolização do acordo e a decisão de
homologação; QUE, em geral, as decisões de homologação ocorriam rapidamente;
QUE indagado especificamente se tem conhecimento de algum integrante da
força-tarefa ter discutido os termos do acordo, inclusive com apresentação de
minuta, com a juíza GABRIELA HARDT, respondeu que não se recorda.”
[Trecho do depoimento de Deltan Dallagnol na correição extraordinária]
Na
semana passada, por 9 votos a 5, o CNJ decidiu abrir procedimento administrativo disciplinar
(PAD) contra Gabriela Hardt justamente por
causa da Fundação Lava Jato, entre outros pontos. Além disso, Salomão sugeriu o
encaminhamento de cópia dos autos à Procuradoria-Geral da República, para que
se verifique a possibilidade de apuração também na esfera criminal.
O
PAD vai se restringir a investigar a conduta de Hardt na homologação do acordo
que só não se tornou realidade por decisão do Supremo Tribunal Federal. O
ministro Alexandre de Moraes entendeu que a fundação privada com dinheiro
público era uma empreitada inconstitucional e homologada por juízo
incompetente, e anulou os efeitos do acordo.
O
termo previa a criação da Fundação Lava Jato com dinheiro de multa paga pela
Petrobras nos Estados Unidos, com parte considerável do montante (80%)
retornando ao Brasil sob a influência de Dallagnol. Com a fundação privada, a
força-tarefa pretendia investir em “projetos sociais” e formação de lideranças
políticas.
No
relatório da correição, consta que o contexto em que a fundação surgiu pode
configurar possível crime de desvio na modalidade peculato. O relatório da
correição – que não pôde se aprofundar sobre o papel dos procuradores na trama
– afirma ainda que é preciso investigar a quem interessava a criação da
fundação privada, e indica que, no âmbito pessoal, aparentemente contemplava as
aspirações de Deltan Dallagnol e Sergio Moro pela carreira política.
Embora
Dallagnol afirme que não se recorda de nada, a correição revelou que o
ex-procurador esteve envolvido até o pescoço com o processo que a Petrobras
enfrentou nos EUA por causa da Lava Jato. Além de ajudar os americanos a
fabricar as denúncias que culminaram em acordo com multa bilionária, Dallagnol
teria negociado o retorno de parte da multa ao Brasil.
Em
paralelo, Moro abriu o procedimento secreto que foi usado para administrar as
contas judiciais de ondem partiram bilhões de reais, sem transparência ou
critério, aos cofres da Petrobras. A verba era fruto de acordos de delação e
leniência fechados pela Lava Jato em Curitiba, e destinados à Petrobras antes
mesmo do trânsito em julgado. Com isso, a Petrobras conseguiu fazer frente à
multa nos EUA, e a Lava Jato planejou se beneficiar adiante com o retorno da
multa para a fundação privada. Salomão chamou o esquema de “cash back”.
Fonte:
Jornal GGN
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