Em meio a desgaste, governo Lula tem série
de prioridades no Congresso
O governo do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem pela frente uma série de
prioridades no Congresso Nacional. As pautas vão desde a regulamentação da
reforma tributária até o projeto que dá novas diretrizes para o ensino médio. A
gestão petista colecionou derrotas na terça-feira (28/5), na sessão conjunta de
análise de vetos do Congresso, em uma demonstração de fragilidade na construção
de uma base aliada no Legislativo.
Nos destaques
negativos para Lula, deputados e senadores derrubaram trecho do projeto de lei
(PL) nº 2.253/2022, conhecido como “Lei das Saidinhas”, que autorizava detentos
a deixar temporariamente os presídios para convívio familiar. Também mantiveram
um veto do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) à Lei de Segurança Nacional sobre
o trecho que tratava da criminalização da comunicação enganosa em massa, ou
seja, a divulgação de notícias falsas.
A avaliação feita por
governistas, no entanto, é de que as pautas econômicas, consideradas
prioritárias, seguem blindadas de derrotas. O Congresso majoritariamente
conservador e a proximidade com as eleições municipais faz as pautas mais
polarizadas não terem apoio, avaliam parlamentares.
A principal pauta de
interesse do governo no momento é a regulamentação da reforma tributária. O
presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), criou dois grupos de
trabalho com sete deputados cada para debater os projetos de lei complementares
(PLPs) da reforma e não indicou um relator, com o objetivo de acelerar a
análise. Lira quer aprovar os textos até 18 de julho, quando começa o recesso
parlamentar.
O governo trabalha com
o calendário de aprovar as propostas no primeiro semestre na Câmara, e no
segundo semestre, no Senado Federal. No momento, os grupos de trabalho estão
iniciando os trabalhos e a expectativa é de que o segundo projeto, que trata
sobre a questão federativa, chegue na próxima semana ao Congresso.
Outra preocupação do
Executivo é com a articulação política em torno do Orçamento de 2025. Embora o
projeto de lei orçamentária do ano que vem ainda não ter sido enviado, já está
no Congresso o projeto de lei das diretrizes orçamentárias (LDO) de 2025. No
ano passado, por exemplo, congressistas incluíram um calendário de emendas na
LDO, que só neste ano, em um acordo, foi derrubado e o Planalto criou um
cronograma para repasses de emendas parlamentares.
• Outras prioridades fogem da parte
econômica
Em outra frente
essencial para o governo estão os projetos de cotas raciais em concursos
públicos e de nova diretriz para o ensino médio.
O que trata da
prorrogação por 10 anos das cotas para negros, indígenas e quilombolas em
concursos públicos federais e aumenta a reserva de vagas de 20% para 30% já foi
aprovado pelo Senado, mas ainda aguarda deliberação da Câmara. O governo tem
pressa, já que a política de cotas precisa ser prorrogada.
Ela venceria em 10 de
junho, dez anos após o início da atual legislação, mas por decisão do Supremo
Tribunal Federal (STF) o texto segue válido até a aprovação do novo no
Congresso.
O outro projeto de lei
prioritário é o que institui alterações no chamado Novo Ensino Médio. Ele já
foi aprovado na Câmara e agora está transitando pelo Senado.
A matéria estabelece
2.400 horas para cursos de ensino médio regulares, com 600 horas para
itinerários formativos, as chamadas disciplinas optativas. O plano do governo é
aprovar a proposta antes do recesso parlamentar, em julho.
• PT cobra ministros de Lula, que dizem
não ter sido chamados a conter derrota no Congresso
A presidente do PT,
Gleisi Hoffmann, cobrou responsabilidade dos ministros de outros partidos após
as derrotas em série do governo Lula nesta semana do Congresso com votos contrários ao Executivo até mesmo de dois parlamentares petistas.
Segundo Gleisi, esses
aliados têm que ser chamados a atuar junto a suas bancadas em situações como
essa. "Os partidos que compõem a base têm que ter mais responsabilidade
com pautas que são importantes para o governo, como fake news, saidinha e armas."
Procurados pela
reportagem, ministros desses partidos afirmam, porém, que não foram acionados
pelo Palácio do Planalto para ajudar a convencer as bancadas a evitar a derrota
do governo.
A reportagem conversou
com cinco ministros de partidos da centro-direita e todos afirmaram não ter recebido nenhum pedido da articulação política.
Compõem a base
governista e têm ministérios a União Brasil, o PSD, o MDB, o PP e o
Republicanos, que, juntos, estão no comando de 11 pastas de Lula.
Na terça-feira (28), o
governo sofreu derrotas na sessão do Congresso destinada a analisar vetos
presidenciais e na sessão da Câmara o que contou com a participação maciça desses partidos.
O veto de Lula que
mantinha o direito às saidinhas a parte dos presos foi derrubado na Câmara por
314 votos a 126 e no Senado por 52 votos a 11.
A derrota do governo
contou com o apoio de dois parlamentares do PT, a deputada federal Maria do
Rosário (RS) e o senador Fabiano Contarato (ES) mas o presidente da República contou o apoio inusual do deputado Aécio Neves (PSDB-MG).
O senador Contarato já
havia anunciado publicamente que iria votar contra o veto de Lula por
considerá-lo errado. Entre outros argumentos, ele chamava a atenção para o fato
de o projeto ter sido aprovado por ampla maioria no Senado.
Maria do Rosário, que
é pré-candidata do PT à Prefeitura de Porto Alegre, foi procurada, mas não se
manifestou sobre seu voto.
Próximo de Lula e
filiado ao PT, o advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do grupo
Prerrogativas, afirmou à coluna Mônica Bergamo, da Folha, ser
"constrangedor ter que reconhecer e aplaudir o voto corajoso do deputado
federal Aécio Neves e ter que explicar e justificar os votos equivocados da
deputada Maria do Rosário e do senador Contarato".
Já o veto que Jair
Bolsonaro (PL) havia feito contra a criminalização de fake news foi mantido
pelos deputados com placar parecido, de 317 a 139 com isso, não foi necessária votação no
Senado.
Horas após essas
votações, a Câmara dos Deputados aprovou de forma simbólica, sem a contagem de
votos, um projeto de decreto legislativo que reverte parte das mudanças feitas
no ano passado pelo Ministério da Justiça para o controle de armas.
Após as sessões da
terça, parlamentares de esquerda avaliavam que os ministros indicados por Lula
para melhorar a interlocução com o Congresso não conseguem controlar as
bancadas partidárias.
Reservadamente,
deputados e senadores petistas dizem ainda que o centrão tem tentado se colar
ao bolsonarismo nas chamadas pautas de costumes para conseguir algum ganho
político nas eleições municipais, em outubro.
Segundo esse
raciocínio, o governo sabe que não tem como sair vitorioso em votações como
essa, já que o Congresso é formado majoritariamente por parlamentares
conservadores, com protagonismo de bancadas como a da bala, do agronegócio e
religiosa.
Eles afirmam, por
outro lado, considerar que essa aliança entre bolsonarismo e centrão não é
"incondicional" e que o governo tem conseguido os votos necessários
em matérias que são consideradas prioritárias, como as da pauta econômica.
Nesses casos, porém, o
Planalto tem sido obrigado a ceder em vários pontos de suas propostas
originais.
A esquerda tem tamanho
minoritário na Câmara e no Senado. Por isso, buscou formar sua base de apoio
distribuindo ministérios a partidos de centro e de direita, em um primeiro
momento para União Brasil, PSD e MDB cada uma das legendas têm três representantes na
Esplanada.
No ano passado, o
petista fez uma reforma ministerial, abrindo espaço no primeiro escalão para o
PP e o Republicanos, numa tentativa de consolidar sua base na Câmara.
Isso lhe deu um
confortável base no papel, mas, na prática, como foi visto na última terça, o
Palácio do Planalto tem sofrido seguidas derrotas tanto na Câmara como no
Senado.
Lula reuniu na quarta
seus articuladores e decidiu comandar reuniões semanais, toda segunda-feira,
mas descartou por ora mudanças na equipe.
Essa atitude se
assemelha a outros momentos de crise em que, quase sempre, auxiliares
palacianos afirmam que haverá uma participação mais direta de Lula na relação
com o Congresso.
Compõem a articulação
política de Lula praticamente só integrantes do PT.
O chefe é o ministro
Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais), que não tem
interlocução com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), por decisão do
segundo.
O líder no Congresso é
o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP, mas que deve se filiar ao PT),
apontado como um dos responsáveis pelo fiasco da terça-feira.
O líder da Câmara é,
José Guimarães (PT-CE), que nesta semana cobrou publicamente renovação na
Esplanada dos Ministérios. O líder no Senado é Jaques Wagner (PT-BA).
• Governo Lula chega aos 500 dias com
crise no RS e embates no Congresso
Com a chegada do mês
de junho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ultrapassa um terço do
novo governo. Nesses mais de 500 dias, o chefe do Executivo se propôs a
melhorar áreas de meio ambiente, relações internacionais e economia, enquanto
travou batalhas com o Congresso e enfrentou crises sanitárias e climáticas no
país.
O marco de tempo do
mandato foi citado por Lula em um discurso no dia 8 de maio, ao falar com
otimismo sobre o rumo do Brasil: “Escrevam isto, porque nós estamos apenas com
15 meses de governo, menos de um terço do mandato. Portanto, vamos fazer três
vezes mais do que fizemos até agora para atingir o ápice das coisas boas neste
país”.
Na virada de junho,
Lula completa 17 meses, ou seja, 517 dias à frente da Presidência. Nesse
período, o mandatário conseguiu avançar em agendas da economia, como a
aprovação da reforma tributária, do meio ambiente e da retomada das relações
exteriores.
No entanto, o governo
ainda enfrenta dificuldades na relação com o Congresso Nacional. Além disso,
passou por uma crise na saúde, com a alta de casos de dengue, e o desastre
climático no Rio Grande do Sul (RS). Todo esse cenário trouxe impactos à imagem
do titular do Planalto, que sofre com a falta de popularidade em comparação a
mandatos anteriores.
• Articulação com Congresso
Pedro Feliu Ribeiro,
professor de relações internacionais da Universidade de São Paulo, aponta que a
política externa é um campo mais possível de o presidente avançar comparado a
questões progressistas e uma reforma administrativa dentro do Brasil. Isso por
causa da relação turbulenta entre Executivo e Legislativo.
“A política externa
surge como uma opção, um porto seguro, para esse avanço”, disse. Além da
retomada das relações internacionais mais clássica brasileira, o professor
apontou o retorno do “tradicional presidencialismo de coalização”.
“A grande questão é
que o Congresso é mais conservador, a polarização aumentou muito, e o centro
desse espectro político está menos povoado. Boa parte do Centrão migrou para o
bolsonarismo e pautas conservadoras, além disso, o Lula pega o Congresso que conseguiu
muito manejo orçamentário com Bolsonaro, pelo orçamento secreto. Reverter essa
situação é muito complicada”, explicou.
“O custo é altíssimo
nesse governo, talvez como nunca foi visto antes porque a polarização aumentou.
Vai ter muita limitação, o que o presidente vai conseguir fazer é escolher
poucas prioridades e avançar a agenda legislativa”, completou.
• Relações exteriores e meio ambiente
Professora de relações
internacionais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo
(FESPSP) e pesquisadora do Observatório de Regionalismo (ODR), Flavia Loss
avaliou que o Brasil teve a percepção internacional manchada pela “repercussão
do que aconteceu com a Covid-19 e a questão ambiental”, durante o governo de
Jair Bolsonaro (PL).
“Na Europa e nos
Estados Unidos, ficamos com uma imagem muito ruim, tivemos impactos no
comércio, tivemos estremecimento com as relações com a China e o nosso
agronegócio que fez pressão. Qualquer outro governo teria que lidar com as
consequências do que aconteceu, praticamente reconstruir, e essa palavra tem
sido muito usada no Ministério de Relações Exteriores e pelo Lula“, disse.
Outro ponto
prejudicado e trabalhado pelo petista, segundo Loss, é a atuação em
organizações internacionais, “principalmente com a pauta ambiental. O Brasil
sempre foi atuante, sobretudo dos anos 1990 para frente, sempre participamos
das negociações importantes e sofremos na época Bolsonaro. O Brasil volta como
protagonista nessa agenda”.
Dessa forma, o país
utiliza a liderança do G20, o Grupo dos Vinte, para reparar a imagem e se
preparar para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas
(COP) de 2025, que será sediada em Belém (PA). Após o evento, Loss avaliou que
o Brasil precisa voltar o foco para a África, porque deslocou embaixadores para
cuidar do G20 e da COP30.
• Economia
Outra vitória do
governo Lula 3 foi a aprovação de matérias importantes na área de economia. Já
no primeiro ano de mandato, a gestão conseguiu passar a reforma tributária e o
marco fiscal, duas pautas prioritárias para o ministro da Fazenda, Fernando
Haddad.
A gestão também colheu
bons resultados no crescimento econômico do país. De 2022 a 2023, o PIB cresceu
2,9%, alavancado pelo agronegócio e pelo consumo das famílias.
No entanto, neste ano,
Lula teve dificuldades no Congresso, ao tentar emplacar a reoneração da folha
de pagamentos de 17 setores da economia. A proposta teve forte reação de
parlamentares. Ao fim, o governo precisou ceder em manter a desoneração para o
ano de 2024, ao contrário do que defendia a equipe econômica.
Fonte:
Metrópoles/FolhaPress
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