sábado, 15 de junho de 2024

"CPI das Igrejas já": PL dos Estupradores mobiliza sociedade, que pede investigação

Após a Câmara dos Deputados aprovar a urgência do projeto de lei (PL 1904/2024) que equipara o aborto após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio na quarta-feira (12) e a sociedade se mobilizar contra a proposta, a hashtag "CPI das Igrejas Já" ganhou força nas redes sociais.

Nesta sexta-feira (14), internautas utilizaram o X, antigo Twitter, para pedir a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra as igrejas evangélicas pela suspeita da acelerada aprovação de urgência da PL pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e forte apoio da bancada evangélica do Congresso à proposta.

Mas para além disso, também há uma onda silenciosa de crimes sexuais contra menores praticados por pastores evangélicos no país. Casos como o da Igreja Bola de Neve, o do pastor da Igreja Evangélica Assembleia do Reino de Deus em Goiás e do líder evangélico Sinval Ferreira são apenas alguns dos crimes tornados públicos no último mês e pouco falados.

•           PL dos Estupradores

O projeto de lei encabeçado pelo deputado Sóstenes Cavalcante e assinado por outros parlamentares fundamentalistas equipara o aborto realizado após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio, até em casos de estupro. Atualmente, a legislação sobre o aborto permite a realização do procedimento em três situações: estupro, risco de vida para a mãe e anencefalia do feto - e não estabelece prazo máximo para o aborto legal.

A proposta do projeto é equiparar o aborto realizado em caso de estupro após 22 semanas ao crime de homicídio, alterando o Código Penal para que a pena imposta seja de 20 anos. A lei estabelece, hoje, pena de um a três anos quando provocado pela gestante ou com seu consentimento, e de três a dez anos, quando feito sem o consentimento da gestante.

•           Saiba quem são os deputados que propuseram o PL da Gravidez Infantil 

O projeto foi proposto pelo deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e assinado por outros 31 deputados. A maioria deles são do Partido Liberal, o mesmo do ex-presidente Jair Bolsonaro. 

<><> Quem são eles?

# PL: Carla Zambelli (SP), Delegado Paulo Bilynskyj (SP), Mario Frias (SP), Eduardo Bolsonaro (SP), Abilio Brunini (MT), Coronel Fernanda (MT), Delegado Ramagem (RJ), Bia Kicis (DF), Pastor Eurico (PE), Capitão Alden (BA), Julia Zanatta (SC), Nikolas Ferreira (MG), Junio Amaral (MG), Eli Borges (TO), Gilvan da Federal (ES), Filipe Martins (TO) e Bibo Nunes (RS).

# MDB: Delegado Palumbo (SP), Simone Marquetto (SP), Renilce Nicodemos (PA) e Pezenti (SC). 

# União Brasil: Cristiane Lopes (RO) e Dayany Bittencourt (CE).

# Republicanos: Ely Santos (SP) e Franciane Bayer (RS).

# Partido Progressistas: Evair Vieira de Melo (ES) e Luiz Ovando (MS).

# E de outros partidos: Dr. Frederico (PRD/MG), Greyce Elias (Avante/MG), Lêda Borges (PSDB/GO) e Cezinha de Madureira (PSD/SP).

<><><> Votação relâmpago

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pautou a votação do requerimento de urgência, apresentado pelo deputado Eli Borges (PL-TO), sem aviso e sem anunciar o número do projeto. 

Lira pediu orientação de bancada ao deputado carioca Pastor Henrique Vieira [vice-líder do Psol], que não respondeu, e considerou a urgência aprovada em votação simbólica – sem registro do voto de cada deputado no painel eletrônico – que durou apenas 23 segundos. Em geral, a votação simbólica ocorre quando já existe acordo entre os parlamentares sobre o tema em pauta. 

Nas redes sociais, a deputada Natália Bonavides (PT-RN) escreveu que Lira deu “um golpe contra o direito das mulheres” ao aprovar “um requerimento de urgência sem sequer anunciar a votação. O requerimento permite que seja votado o projeto que obriga meninas e mulheres que sofrerem violência sexual a terem filho de estuprador".

A proposta acrescenta artigos ao Código Penal para equiparar as penas previstas para homicídio simples àquelas para abortos realizados após 22 semanas de gestação, mesmo nos casos em que a prática é prevista legalmente. O projeto também proíbe o aborto mesmo em casos de gravidez decorrentes de estupro, se houver viabilidade fetal.  

Atualmente, a legislação permite que o aborto seja realizado em três ocasiões: estupro, risco de morte à mulher e anencefalia do feto. 

 

•           PL do Estupro revitimiza essas mulheres e crianças, afirma Cida Gonçalves

A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, se manifestou nesta quinta-feira (13) sobre o PL 1904/2024, chamado de "PL da Gravidez Infantil" e "PL do Estupro", e afirmou que o projeto revitimiza mulheres e crianças vítimas de um dos crimes mais crueis contra as mulheres, que é o estupro.

A declaração da ministra veio após a Câmara dos Deputados aprovar o pedido de urgência para o PL, que não precisava mais passar pelas Comissões da Casa e pode ser votado diretamente no plenário.

De acordo com a ministra, "não é por acaso que os movimentos feministas e de mulheres vêm intitulando o Projeto de Lei 1.904/2024 de ‘PL da Gravidez Infantil'". Dados do Sistema Único de Saúde (SUS) revelam que, em média, 38 meninas de até 14 anos se tornam mães a cada dia no Brasil, o que mostra o desafio que é para uma menina acessar o direito ao aborto legal. Em 2022, foram mais de 14 mil gravidezes entre meninas com idade até 14 anos no país.

Seja por desinformação sobre direitos e como acessá-los; exigências desnecessárias como boletim de ocorrência ou autorização judicial; ou pela escassez de serviços de referência e profissionais capacitados, o Brasil delega a maternidade forçada a essas meninas vítimas de estupro, prejudicando não apenas o futuro social e econômico delas, como também a saúde física e psicológica. Ou seja, perpetua ciclos de pobreza e vulnerabilidade, como o abandono escolar.

Esse cenário irá se agravar ainda mais caso o PL 1904/2024 seja aprovado, segundo a ministra, uma vez que o país vive uma "epidemia de abuso sexual infantil". Somente em 2022, foram registrados 75 mil casos de estupro – o maior número da série histórica, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Do total, seis em cada dez vítimas eram crianças de até 13 anos.

Além disso, a ministra ainda ressaltou outras realidades crueis desse crime: 68% dos estupros ocorreram na residência das vítimas e, em 64% dos casos, os autores eram familiares das vítimas. "Ou seja, as principais vítimas de estupro no Brasil são meninas menores de 14 anos, abusadas por seus familiares, como pais, avôs e tios. São essas meninas que mais precisam do serviço do aborto legal, e as que menos têm acesso a esse direito garantido desde 1940 pela legislação brasileira", acrescentou a ministra.

Outro ponto que a ministra considera "estarrecedor" do PL é a alteração do tempo de pena para mulheres que realizarem o aborto após 22 semanas de gestação, passando a ser de 6 a 20 anos de prisão - enquanto a do estuprador é de 6 a 10 anos. "Portanto, a mulher que optar pelo aborto legal em caso de estupro poderá passar na prisão até o dobro do tempo de seu estuprador", pontua.

Por fim, a ministra ressalta que "criança não é para ser mãe, é para ter infância, é para ser criança e estar na escola".

Janja se pronuncia sobre PL dos Estupradores e parte para cima de autores bolsonaristas

A socióloga Rosângela Silva, a Janja, se pronunciou na manhã desta sexta-feira (14) sobre o PL 1.904/2024, que prevê a equiparação do aborto ao homicídio caso a gestação já esteja com mais de 22 semanas, e partiu para cima dos autores do projeto: 32 deputados bolsonaristas capitaneados por Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), "poste" de Silas Malafaia na Câmara Federal.

"Os propositores do PL parecem desconhecer as batalhas que mulheres, meninas e suas famílias enfrentam para exercer seu direito ao aborto legal e seguro no Brasil", afirma Janja.

Segundo ela, a mudança no Código Penal para equiparar o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, quando a gestação for fruto de estupro ou representar risco de vida para a mãe "ataca a dignidade das mulheres e meninas, garantida pela Constituição Cidadã. É um absurdo e retrocede em nossos direitos".

"A cada 8 minutos uma mulher é estuprada no Brasil. O congresso poderia e deveria trabalhar para garantir as condições e a agilidade no acesso ao aborto legal e seguro pelo SUS. Não podemos revitimizar e criminalizar essas mulheres e meninas, amparadas pela lei. Precisamos protegê-las e acolhê-las", escreveu a socióloga, esposa de Lula.

"Seguimos juntas, lutando por nossos direitos", concluiu Janja, compartilhando a hashtag #MeninaNãoÉMãe.

<><> Nas ruas e nas redes

Milhares de mulheres ocuparam as ruas em várias cidades do Brasil na noite desta quinta-feira (13) para se manifestar contra o Projeto de Lei 1904/24. Foram registradas passeatas em São Paulo, Florianópolis, Brasília e no Rio de Janeiro. Cabe destacar que outros atos contra o "PL do Estupro" estão marcados para acontecer nos próximos dias.

Após a sociedade se mobilizar contra a proposta, a hashtag "CPI das Igrejas Já" ganhou força nas redes sociais.

Nesta sexta-feira (14), internautas utilizaram o X, antigo Twitter, para pedir a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra as igrejas evangélicas pela suspeita da acelerada aprovação de urgência da PL pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e forte apoio da bancada evangélica do Congresso à proposta.

Mas para além disso, também há uma onda silenciosa de crimes sexuais contra menores praticados por pastores evangélicos no país. Casos como o da Igreja Bola de Neve, o do pastor da Igreja Evangélica Assembleia do Reino de Deus em Goiás e do líder evangélico Sinval Ferreira são apenas alguns dos crimes tornados públicos no último mês e pouco falados

 

•           Bolsonaristas querem prender mulheres estupradas e soltar criminosos e golpistas

Três Projetos de Lei em discussão na Câmara dos Deputados servem para traçar bem o perfil dos bolsonaristas: o PL dos Estupradores, o PL de Anistia aos Golpistas de 8 de janeiro e o PL do Fim das Delações Premiadas de criminosos. Todos apoiados entusiasticamente pelos seguidores de Bolsonaro e pelo próprio ex-presidente.

Resumidamente, o primeiro criminaliza e põe na prisão, condenadas a até 20 anos de cadeia, mulheres e meninas estupradas. Especialmente estas, a grande maioria das vítimas de estupro no país.

Os outros dois visam libertar criminosos:

•           O primeiro, os golpistas de 8 de janeiro. É relatado pelo deputado bolsonarista Rodrigo Valadares.

•           O segundo, impossibilitar delações premiadas e tentar anular as feitas, como as do ajudante de ordens Mauro Cid, por exemplo. Mas também a de Ronnie Lessa, que indicou os mandantes dos assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes.

Ambos com o objetivo de livrar golpistas e criminosos de prestar contas à Justiça.

<><> O PL dos Estupradores

O Projeto de Lei 1904/24 prevê que o aborto realizado acima de 22 semanas de gestação, em qualquer situação, passará a ser considerado homicídio, inclusive no caso de gravidez resultante de estupro.

Além de criminalizar as mulheres vítimas de estupro, a lei as enquadra em penas que podem chegar a 20 anos de prisão. A pena máxima para o estuprador é de dez anos.

 <><> O PL da Anistia aos Golpistas de 8 de janeiro

O PL 2858/2022, de autoria do ex-deputado Major Vitor Hugo, “concede anistia a todos os que tenham participado de manifestações em qualquer lugar do território nacional do dia 30 de outubro de 2022”.

O projeto de lei do Major Vitor Hugo, datado de 2022, portanto anterior aos atos de 8 de janeiro, possui outros seis projetos apensados por versarem sobre o mesmo tema: anistia a manifestantes. Um dos textos, apresentado pelo deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB), é direto em relação a conceder a anistia aos participantes e réus pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro.

“Concede anistia aos acusados e condenados pelos crimes definidos nos arts. 359-L e 359-M do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, em razão das manifestações ocorridas em Brasília, na Praça dos Três Poderes, no dia 08 de janeiro de 2023.”, diz a ementa do projeto. 

<><> O PL do Fim das Delações Criminosas

 A urgência do PL 4.372 de 2016, que proíbe que pessoas presas façam delação premiada, foi aprovada nessa quarta-feira (13) na Câmara dos Deputados, assim como o PL dos Estupradores, em votação simbólica, quando os parlamentares não precisam registrar o voto no painel eletrônico.

O objetivo evidente dos bolsonaristas é anular as delações de Mauro Cid e Ronnie Lessa para livrar Jair Bolsonaro e milicianos.

Os três projetos traçam um retrato sem retoques do bolsonarismo: criminalização das mulheres estupradas e liberdade para criminosos e golpistas.

 

Fonte: Fórum/Brasil de Fato

 

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