terça-feira, 28 de maio de 2024

Ruchir Sharma: ‘O que deu errado com o capitalismo’

Em seu discurso de despedida, Ronald Reagan descreveu a América como a “cidade brilhante sobre uma colina”, aberta a “qualquer um com vontade e coração para chegar aqui”. Eu fui um dos inspirados a tentar, e hoje a mistura dinâmica de acadêmicos e empreendedores que energizam o líder mundial em tecnologia ainda me parece um maravilha. Das 100 maiores empresas dos EUA, 10 agora têm diretores executivos que nasceram em meu país natal, a Índia, um avanço que só poderia ter acontecido em uma meritocracia capitalista.

No entanto, estou preocupado com o rumo que os EUA estão liderando o mundo agora. A fé no capitalismo americano, que foi construída sobre um governo limitado que deixa espaço para a liberdade e a iniciativa individual, despencou. A maioria dos americanos não espera estar “melhor daqui a cinco anos” — um recorde negativo desde que o Edelman Trust Barometer fez essa pergunta pela primeira vez, há mais de duas décadas. Quatro em cada cinco duvidam que a vida será melhor para a geração de seus filhos do que foi para a deles, também um novo mínimo. De acordo com as últimas pesquisas do Pew, o apoio ao capitalismo caiu entre todos os americanos, particularmente entre os democratas e os jovens. Na verdade, entre os democratas com menos de 30 anos, 58% agora têm uma “impressão positiva” do socialismo; apenas 29% dizem o mesmo do capitalismo.

Isso não é surpreendente, dado o que todos nós temos ouvido. Quando Joe Biden venceu em 2020, artigos de opinião em jornais ao redor do mundo saudaram sua presidência como um toque de finados para a “era do governo pequeno”, que eles dataram da rebelião “neoliberal” contra o estado de bem-estar social lançada por Reagan e Margaret Thatcher. Histórias recentes do capitalismo traçam o mesmo arco, argumentando que esses dois líderes encerraram três décadas “gloriosas” de pós-guerra para a social-democracia, quando governos ambiciosos trabalhavam com líderes corporativos e sindicais para gerar crescimento mais rápido e distribuir os resultados de maneira mais justa. Em suma, esses pensadores veem os planos de Biden para novos gastos e regulamentações como uma bem-vinda ruptura com o governo pequeno e avarento e uma solução plausível para a frustração popular com o capitalismo.

Só há um problema: a era do governo pequeno nunca aconteceu. O governo tem se expandido por quase um século em praticamente todos os aspectos mensuráveis, como gastador, tomador de empréstimos e regulador; o único recuo breve, sob Bill Clinton, prova a tendência. Nos EUA, os gastos do governo aumentaram oito vezes desde 1930, de menos de 4% para 24% do PIB — e 36% incluindo os gastos estaduais e locais. O que mudou sob Reagan foi que, à medida que os gastos aumentavam, as arrecadações de impostos permaneciam estáveis, então o governo começou a pagar por sua própria expansão tomando empréstimos. Os déficits passaram de raros a rotineiros e, como resultado, a dívida pública quadruplicou nos EUA para mais de 120% do PIB hoje.

Em vez de reverter o curso do governo, Reagan mudou a conversa, que frequentemente se concentrava em uma agenda neoliberal de cortes em impostos, déficits ou regulamentações. Mas mesmo quando os governos tentaram desregular, o resultado foi mais regras complexas e caras, que os ricos e poderosos estavam mais bem equipados para navegar. Na década de 1980, temendo que as dívidas crescentes pudessem resultar em outra depressão como a dos anos 1930, os bancos centrais começaram a trabalhar junto com os governos para sustentar grandes corporações, bancos e até países estrangeiros, sempre que os mercados financeiros vacilavam.

Com razão, os progressistas ridicularizam essa nova versão do capitalismo como “socialismo para os muito ricos”, mas os governos também estavam distribuindo alívio para os pobres e a classe média. Mais do que socialismo para os ricos, isso é “risco socializado”, uma campanha para inocular toda uma sociedade contra recessões econômicas. Embora ainda amplamente criticada como a terra do capitalismo “cru” reaganiano, a América está substituindo a Europa como a sociedade menos tolerante à angústia financeira para qualquer pessoa, incluindo os super-ricos.

Algo está mudando na cultura. Assim como a “revolução no manejo da dor” americana, que insistia em tratar até mesmo lesões moderadas com opiáceos poderosos, estava viciando a nação em OxyContin, sua abordagem ao manejo da dor econômica estava viciando o sistema em um gotejamento contínuo de apoio governamental. Nas últimas duas décadas, os EUA caíram do quarto para o 25º lugar nos rankings da Heritage Foundation de liberdade econômica, à medida que tanto a regulamentação quanto a dívida aumentaram.

Se a era do governo pequeno era um mito, então a maioria que quer que o governo “faça mais” faria bem em pensar duas vezes. Um governo ainda maior é mais provável de amplificar do que aliviar sua frustração com as disfunções do capitalismo moderno.

 

¨      Presidente do Banco Central proclama o caos para aumentar os juros. Por Jeferson Miola

O presidente do Banco Central Roberto Campos Neto fabrica cenários desfavoráveis e superestima impactos e dificuldades para justificar a manutenção dos juros altos. Ou, ainda, para aumentar a taxa de juros, que continua a mais alta do mundo, com ganhos reais de quase 7% acima da inflação.

Em seminário na Fundação Getúlio Vargas/FGV [24/5], Campos Neto alardeou o risco inflacionário decorrente do evento climático no Rio Grande do Sul.

Ele disse que “por causa das coisas que estão acontecendo, o preço dos alimentos vai ser um pouco mais alto, aí de fato você tem um número [de inflação] que pode ser um pouco maior”.

Além da inflação, Campos Neto menciona preocupação com o impacto fiscal do esforço de reconstrução do Rio Grande do Sul.

O banqueiro é da mesma escola do governador tucano Eduardo Leite, que mesmo alertado sobre o evento climático, negligenciou e optou por deixar a população desprotegida porque “a agenda que se impunha ao estado era aquela especialmente vinculada ao restabelecimento da capacidade fiscal do estado […]”.

Quem ouve as forçadas profecias do presidente bolsonarista do Banco Central tem a impressão de que a inflação e as contas públicas estão descontroladas, o que está longe da realidade. A previsão de inflação de 2024, por exemplo, é de 3,2% a 3,8%.

Este alarmismo de Campos Neto é interessado. Ele proclama o caos para aumentar os juros.

Cada 1% a mais que os tecnocratas “independentes” das finanças adicionam na taxa de juros significa pelo menos 80 bilhões de reais sequestrados por ano do Tesouro Nacional para serem embolsados por financistas, especuladores e parasitas da dívida pública.

Tal cifra desviada dos cofres públicos para o setor financeiro é equivalente ao orçamento do Estado do RS para 2024, e próximo do valor que o governo Lula deverá aportar para a reconstrução do estado.

No mesmo dia em que Campos Neto recitava na FGV suas notas de terrorismo financeiro para ambientar a estratégia de aumento dos juros na próxima reunião do COPOM, o economista e fundador do ICL Eduardo Moreira denunciava a manipulação da pesquisa Focus, do Banco Central, por instituições financeiras, financistas e operadores do mercado, com o objetivo de fraudar a expectativa de inflação e, com isso, corroborar a tese altista do presidente do BC.

Segundo o economista, “alguns bancos pegaram e meteram 8% de inflação só para puxar a média para cima e fazer confusão no mercado. E isso, só para vocês terem a noção, é um escândalo, pois analista de banco nunca muda mais do que 3% para 3,1%, ou 3% para 3,2%, e de 4% para 3,8%”.

Eduardo Moreira diz que “o Banco Central parece técnico, mas não é”. Ele denunciou que o esquema: “tem toda a pinta de já combinado com os veículos de imprensa para gerar as notícias que eles querem para já chegarem batendo. Como é anônimo, [o analista] mete 8% lá para forçar o BC a tomar uma decisão em cima de uma mentira”.

É um disparate o Banco Central não ter um sistema próprio de análise, integrado por instituições ilibadas, como o IPEA e o IBGE, e, ao invés disso, basear suas decisões sobre as taxas de juros a partir de pesquisa sobre a expectativa de ganho que o próprio mercado tem, não que a realidade econômica indica. O absurdo [ou crime] é ainda maior quando o mercado manipula projeções para justificar ganhos maiores com juros.

Roberto Campos Neto não tem compromisso com o desenvolvimento do Brasil e com a soberania monetária do país. Nos meses que ainda tem de mandato na presidência do Banco Central, ele está empenhado em intensificar o ataque ao butim.

¨      Campos Neto prepara sua continuidade. Por Pedro Augusto Pinho

O Estado de S. Paulo, no sábado, 18 de maio de 2024. Uma das manchetes de capa da edição era ”Campos Neto diz que não tem que avisar o governo ao mudar orientação para juro”.

A chamada completa ocupava um quarto da primeira página (imagem ao lado).

Roberto de Oliveira Campos Neto (1969) é formado em economia na Universidade da Califórnia (EUA). Trabalhou no mercado financeiro entre 1996 e 2019, quando, nomeado pelo Presidente Jair Bolsonaro, assumiu a presidência do Banco Central do Brasil.

Sua única credencial é ser neto de Roberto de Oliveira Campos (1917-2001), ministro de Castelo Branco,  que jamais se destacou pelo brilho intelectual.

Roberto de Oliveira Campos jamais se destacou pelo brilho intelectual. 

Em 1999, sua candidatura à Academia Brasileira de Letras sofreu forte oposição dos acadêmicos e só se impôs pelo patrocínio do dono da mídia, milionário e influente político, Roberto Marinho.

Campos denominou seu livro de memórias “A lanterna na popa”, realmente jamais soube ver à frente e, muito menos, a favor do Brasil, daí seu apelido “Bobby Fields”.

Mas ele e muitos outros, incapazes de perceber os fatos em sua complexidade, apelam para as polaridades. No caso político de esquerda ou direita.

Esta não é a postura de pessoas que prezam a compreensão das situações e buscam a melhor solução pelo mais competente executor.

Veja-se o caso de Hélio Marcos Pena Beltrão (1916-1997).

Um ano separa os nascimentos de Roberto Campos e Hélio Beltrão. 

Enquanto Campos cursava seminário católico, Beltrão buscava o serviço público e a formação jurídica.

Em 1953, Campos trabalhava junto aos estadunidenses, embora representando o Brasil, e Beltrão, com visão prospectiva redigia o Plano Básico de Organização da Petrobrás.

Campos serviu como ministro do Planejamento de Castelo Branco e Beltrão ocupou a mesma pasta com Costa e Silva.

Beltrão, embora conservador, nunca enfrentou uma polêmica como direitista ou contra os interesses nacionais. Já Campos, por falta de argumentos, se refugiava na direita e no exemplo estadunidense.

Acompanhando a vida de Beltrão na Petrobrás, jamais ouviu-se de alguém a mais leve insinuação de entreguista, que sempre acompanhou Roberto Campos.

Seu filho, pai do atual presidente do Banco Central, tinha no currículo o apelido de“americano”, dado por seus colegas do tradicional e conservador Colégio Santo Inácio, no Rio de Janeiro, onde estudou. 

Se o avô não era dos mais iluminados e se mantinha em destaque na mídia pelo fervor entreguista com que defendia os interesses estadunidenses, o neto, menos preparado, nada mais representa do que as finanças apátridas, as mesmas que deram o golpe na sucessão de Geisel, que hoje, como desde 1990, dominam o governo brasileiro.

As finanças apátridas têm levado o Brasil a tragédias — como as Brumadinho, Mariana, Petrópolis e do Rio Grande do Sul — principalmente devido à falta do Estado, às privatizações.

As finanças apátridas também eliminaram a tranquilidade do futuro, na forma de empregos e da previdência social, cuidados por Geisel, fornecendo um número nunca visto no País de casos de ansiedade às portas de psicólogos e psiquiatras.

Para não apontar o que está à vista de todos, nas grandes cidades: moradores de rua, desemprego ou uberização, epidemias, assaltos, insegurança, e, em consequência, medo e ódio.

Tudo isso se cristaliza na campanha de Campos Neto para se manter, tratando da moeda nacional, fora dos controles do Estado e dos eleitos pelo povo para os representar.

Lula, como na escolha da presidência da Petrobrás, trocará seis por meia dúzia ou reverterá a dominação estrangeira no Banco Central do Brasil?

 

Fonte: O Cafezinho/Viomundo

 

 

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