O que está por trás da alta de casos de
coqueluche na Europa
No inverno europeu de
2023, especialistas em saúde de todo o continente começaram a notar um fenômeno
incomum: os casos de coqueluche estavam
aumentando.
No Reino Unido, por
exemplo, o número de casos atingiu o ponto mais alto em duas décadas. Mas
isso não estava ocorrendo apenas na Europa. As autoridades de saúde dos EUA
também começaram a relatar um aumento.
Somente entre janeiro
e março de 2024, foram registrados 32 mil casos de coqueluche na Europa – para
comparação, a média anual fica em torno de 38 mil, segundo o Centro Europeu de
Prevenção e Controle de Doenças (ECDC), que divulga esse dado desde 2011.
Se a tendência continuar, os casos de coqueluche poderão aumentar cerca de dez
vezes em 2024 em comparação com um ano habitual.
De acordo com os
números apresentados no último relatório do ECDC, a maioria dos casos europeus
ocorreu em crianças, faixa etária para a qual a doença é mais mortal.
Apesar disso, esses
números precisam ser interpretados com cautela, pondera Paul Hunter, professor
de medicina da Universidade de East Anglia, no Reino Unido. Isso porque o
número de casos pode ser, na verdade, ainda maior.
Como os bebês correm
risco mais alto quando se trata da doença, eles normalmente têm muito mais
probabilidade de receber um diagnóstico do que indivíduos de outras faixas
etárias. Muitas pessoas mais velhas, porém, também podem ter contraído
coqueluche e não terem sido diagnosticadas.
Por outro lado, Hunter
explica que também é possível que haja uma espécie de "efeito de
contágio". Como os médicos estão cada vez mais conscientes da coqueluche,
é mais provável que deem um diagnóstico sobre a doença do que no passado –
fator que também pode distorcer os números.
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Por que os casos estão aumentando
Especialistas ainda
não sabem dizer com certeza por que os casos estão aumentando. Tal como
acontece com a maioria dos surtos de doenças infecciosas, isso
pode ter relação com uma série de fatores diferentes atuando ao mesmo
tempo.
Juntamente com um
declínio da vacinação em bebês, está também a queda constante na imunização
durante a gravidez em toda a Europa – o que também ajuda a explicar o grande
número de casos em bebês.
Mães não vacinadas
durante a gestação não transmitem anticorpos aos bebês
recém-nascidos. "Você só começa a vacinar crianças contra a
coqueluche por volta das oito semanas", explica Hunter. "E a
maior parte das doenças mais graves ocorre frequentemente antes disso."
As taxas de vacinação
contra a doença durante a gravidez variam amplamente em todo o continente
europeu, de acordo com o relatório de maio do ECDC. Na Espanha, cerca de 88%
das grávidas foram vacinadas em 2023. Na República Tcheca, onde foi registrado
um aumento acentuado nos casos, esse índice foi de apenas 1,6%.
No Reino Unido, a
adesão entre as grávidas diminuiu ao longo da última década, de cerca de 70% em
2016 para aproximadamente 60% em 2023.
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O papel da covid-19
Além disso, o aumento
pode estar relacionado, pelo menos em parte, ao que as autoridades de saúde
chamam de queda na imunidade da população desde a pandemia de covid-19.
Com os protocolos
rigorosos adotados durante a pandemia para evitar o SARS-CoV-2 – como uso de
máscaras, higiene das mãos, menos aglomeração –, os casos de gripe e
estreptococos atingiram mínimos históricos.
Desde o fim da
pandemia, os casos voltaram a aumentar. Mas Hunter diz que isso não explica
totalmente o aumento drástico da coqueluche.
Isso porque a doença
não estava presente na população em níveis elevados antes da pandemia –
existia, mas era rara, não como a gripe. E os casos de gripe talvez tenham
duplicado nos anos desde a pandemia, segundo Hunter – e não aumentado dez
vezes, como estamos prestes a ver com a coqueluche.
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Vacina contra coqueluche
O terceiro provável
fator complicador para a alta poderia ser as próprias vacinas contra a
coqueluche, dizem os especialistas.
O primeiro imunizante
contra a doença foi introduzido em meados do século 20 em países
desenvolvidos como EUA, Canadá e partes da Europa. Embora tenha sido muito
eficaz, foi associado a efeitos colaterais negativos. A queda acentuada na
imunidade contra a doença levou a surtos nas décadas de 70 e 80.
Durante o final da
década de 90 e início da década de 2000, os países começaram a introduzir uma
vacina de segunda geração – desta vez uma injeção acelular
(desenvolvidas a partir de fragmentos de uma bactéria), em vez de uma
vacina celular.
Embora não tenha
provocado os efeitos secundários associados à primeira vacina, essa versão foi
ligeiramente menos eficaz, conferindo imunidade por um período de tempo mais
curto.
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O que pode ser feito
O aumento de casos
apresenta um desafio para os médicos, destaca Andrew Preston, professor e
especialista em coqueluche da Universidade de Bath, no Reino Unido.
Os reforços de
vacinação podem ser uma opção para reduzir o contágio, mas "não está
totalmente claro com que frequência é possível se imunizar sem perder a
eficácia".
Ou será
necessário se acostumar com a ideia de que "desde que consigamos
evitar que os bebês fiquem gravemente doentes e morram, todos os outros tenham
que lidar com uma tosse crônica de vez em quando?", destaca Preston.
Existem novas vacinas
contra coqueluche, explica, algumas das quais poderiam transferir imunidade
"muito superior" em comparação com as duas disponíveis
atualmente.
Mas, segundo
ele, seria difícil introduzir essas doses no calendário atual de
vacinas. Isso porque o imunizante contra a coqueluche é combinado com
outras cinco vacinas numa única dose no Reino Unido e na maior parte da Europa,
motivo pelo qual a introdução de uma nova injeção exigiria uma
reestruturação.
"Teríamos que
reformular todas as outras vacinas, e isso é uma tarefa monstruosa",
destaca Preston.
·
A situação no Brasil
No Brasil, a vacina
para coqueluche faz parte do calendário de imunização do Sistema Único de Saúde
(SUS) e devem ser imunizadas crianças de até 6 anos, 11 meses e 29 dias.
Há também uma vacina específica para gestantes e profissionais de saúde que atuam
em maternidades e em unidades de internação neonatal, atendendo recém-nascidos
e crianças menores de um ano de idade.
Grávidas devem
fazer uma dose da vacina do tipo adulto (dTpa) a partir da 20ª semana a cada
gestação. A imunidade não é permanente, após cinco a dez anos, em
média, da última dose da vacina, a proteção pode ser pouca ou inexistente.
Em 2021, 2022 e 2023
foram confirmados 159, 244 e 214 casos de coqueluche no Brasil,
respectivamente. Este ano, foram 31 casos até 22 de abril, de acordo com o
Ministério da Saúde.
A coqueluche é uma
infecção respiratória e causada pela bactéria Bordetella Pertussis.
Os sintomas podem se
manifestar em três níveis. No primeiro, o mais leve, são parecidos com os
de um resfriado, incluindo mal-estar geral, corrimento nasal, tosse seca e
febre baixa. No estágio intermediário, a tosse seca piora e, no estágio mais avançado,
pode ser tão intensa que pode comprometer a respiração, provocar vômitos
ou cansaço extremo. Geralmente, os sintomas da coqueluche duram entre seis a 10
semanas.
A transmissão ocorre,
principalmente, pelo contato direto do doente com uma pessoa não vacinada por
meio de gotículas eliminadas por tosse, espirro ou até mesmo ao falar. Em
alguns casos, a transmissão pode ocorrer por objetos recentemente contaminados
com secreções de pessoas doentes. O tratamento da coqueluche é feito
basicamente com antibióticos, sob orientação médica.
Fonte: Deutsche Welle
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