Como as baratas-alemãs ou 'baratinhas' se
espalharam pelo mundo
Se você superou o nojo
e o medo, e ousou matar uma barata com uma pisada, o mais provável é que aquele cadáver – que
agora tem que sair do seu sapato – seja o de uma barata-alemã.
Não importa se você
está no Brasil, na Argentina, no México, nos Estados Unidos ou em qualquer
outro país, das 4.500 espécies que existem, a
alemã (Blattella germanica) é a que conseguiu conquistar o mundo.
Na pia da cozinha, em
cantos úmidos e escuros, deslizando por ralos e canos... Exceto no meio da
natureza, esses insetos parecem estar por toda parte.
No Brasil, elas são
conhecidas popularmente como "baratinhas". Mas por aqui também podem
ser chamadas de barata-loira, barata-francesa e francesinha.
Originária da Ásia
(especificamente do leste da Índia e de Bangladesh), a barata-alemã se espalhou
pelo planeta por duas rotas em direções opostas, de acordo com um novo estudo
publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences que
analisou amostras de DNA de 281 espécimes de 17 países.
A primeira onda migrou
para oeste a partir da Baía de Bengala, no Oceano Índico, há cerca de 1.200
anos.
A onda seguinte, há
cerca de 390 anos, rumou para o leste.
Parou primeiro na
Indonésia, de lá provavelmente viajou para a Europa, chegando finalmente ao
continente americano há cerca de 120 anos.
As guerras e o
comércio facilitaram essas migrações. Mas como elas conseguiram sobreviver em
ambientes com climas tão diversos?
·
As vantagens da
globalização (para baratas)
Em parte, a resposta
está na globalização.
"Como são insetos
restritos a ambientes internos e raramente estão ao ar livre, as condições
ambientais externas não fazem grande diferença", explica Qian Tang,
pesquisador da Universidade Harvard, nos EUA, e coautor do estudo.
"E, com a
globalização, as casas estão se tornando cada vez mais semelhantes e
compartilhando as mesmas características", acrescenta em entrevista à BBC
News Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
Melhorias nas
condições de moradia — como o uso de aquecimento no inverno — tornaram o
habitat mais confortável para essas baratas, que não toleram bem o frio.
E os padrões de
higiene modernos, ao contrário do que poderíamos supor, deram à Blattella
germanica uma vantagem sobre o resto da espécie.
Uma casa mais limpa
"torna mais difícil para outras espécies de baratas encontrar
comida", explica Tang.
"No entanto, as
baratas alemãs — que são pequenas (medindo entre 1 cm e 1,5 cm) e vivem em
grupos — se comportam de forma cooperativa na busca por alimento."
"Portanto, se
alguém encontra comida, deixa algum rastro para que outros membros da colônia
possam acessá-la. Ou seja, é uma espécie mais eficiente para encontrar alimento
em uma casa relativamente limpa", acrescenta.
Por outro lado,
apresentam uma rápida evolução na resistência aos inseticidas, ao contrário de
outras espécies, o que as torna menos vulneráveis às tentativas de eliminá-las.
·
Alemãs?
Uma vez descoberta a
sua origem, que não tem relação com a Alemanha, a questão é por que acabaram
com esse nome.
Segundo Tang, a
primeira vez que foram vistos na Europa foi nos armazéns de alimentos do
exército durante a Guerra dos Sete Anos (1756-1763).
Cada lado no conflito
chamava eses insetos pelo nome do seu oponente: para os soldados russos eram
"baratas prussianas" (em homenagem ao antigo Estado alemão), enquanto
os inimigos da Rússia chamavam de "baratas russas".
Alguns anos depois, o
biólogo sueco Carl Linneus as classificou e primeiro deu o nome de Blatta
germanica (Blatta significa evitar a luz em latim) e germânica porque
as espécies que analisou foram coletadas na Alemanha.
É importante lembrar
também que a Suécia lutou na Guerra dos Sete Anos contra a Prússia.
O gênero foi
posteriormente renomeado como Blattella, para agrupar as variedades
menores de baratas.
·
Como acabar com elas
Voltando à barata que
ainda está presa — ou não — no seu sapato... Como podemos combatê-las, visto
que podem causar alergias e doenças?
Por se tratar de um
inseto de interiores, os produtos naturais não funcionam, diz Tang.
O que ajuda, explica,
é lidar da melhor forma com o desperdício de alimentos para reduzir o número de
indivíduos e usar inseticidas, embora as baratas desenvolvam rapidamente
resistência aos produtos.
Além disso, "com
base no nosso conhecimento, sabemos que têm medo do frio", diz Tang.
¨ Por que há cada vez mais moscas e baratas e menos borboletas e
abelhas
Uma nova análise
científica sobre o número de insetos no mundo sugere que 40% das espécies estão
experimentando uma "dramática taxa de declínio" e podem desaparecer.
Entre elas, abelhas, formigas e besouros, que estão desaparecendo oito vezes mais
rápido que espécies de mamíferos, pássaros e répteis. Já outras espécies, como
moscas domésticas e baratas, devem crescer em número.
Vários outros estudos
realizados nos últimos anos já demonstraram que populações de algumas espécies
de insetos, como abelhas, sofreram um grande declínio, principalmente nas
economias desenvolvidas. A diferença dessa nova pesquisa é ter uma abordagem mais
ampla sobre os insetos em geral. Publicado no periódico científico Biological
Conservation, o artigo faz uma revisão de 73 estudos publicados nos últimos 13
anos em todo o mundo.
Os pesquisadores
descobriram que o declínio nas populações de insetos vistos em quase todas as
regiões do planeta pode levar à extinção de 40% dos insetos nas próximas
décadas. Um terço das espécies está classificada como ameaçada de extinção.
"O principal
fator é a perda de habitat, devido às práticas agrícolas, urbanização e
desmatamento", afirma o principal autor do estudo, Francisco Sánchez-Bayo,
da Universidade de Sydney.
"Em segundo
lugar, está o aumento no uso de fertilizantes e pesticidas na agricultura ao
redor do mundo, com poluentes químicos de todos os tipos. Em terceiro lugar,
temos fatores biológicos, como espécies invasoras e patógenos. Quarto, mudanças
climáticas, particularmente em áreas tropicais, onde se sabe que os impactos
são maiores."
Os insetos representam
a maioria dos seres vivos que habitam a terra e oferecem benefícios para muitas
outras espécies, incluindo humanos. Fornecem alimentos para pássaros, morcegos
e pequenos mamíferos; polinizam em torno de 75% das plantações no mundo;
reabastecem os solos e mantêm o número de pragas sob controle.
·
Os riscos da redução
do número de insetos
Entre destaques
apontados pelo estudo estão o recente e rápido declínio de insetos voadores na
Alemanha e a dizimação da população de insetos em florestas tropicais de Porto
Rico, ligados ao aumento da temperatura global.
Outros especialistas
dizem que as descobertas são preocupantes. "Não se trata apenas de
abelhas, ou de polinização ou alimentação humana. O declínio (no número de
insetos) também impacta besouros que reciclam resíduos e libélulas que dão
início à vida em rios e lagoas", diz Matt Shardlow, do grupo ativista
britânico Buglife.
"Está ficando
cada vez mais claro que a ecologia do nosso planeta está em risco e que é
preciso um esforço global e intenso para deter e reverter essas tendências
terríveis. Permitir a erradicação lenta da vida dos insetos não é uma opção
racional".
Os autores do estudo
ainda estão preocupados com o impacto do declínio dos insetos ao longo da
cadeia de produção de comida. Já que muitas espécies de pássaros, répteis e
peixes têm nos insetos sua principal fonte alimentar, é possível que essas
espécies também acabem sendo eliminadas.
·
Baratas e moscas podem
proliferar
Embora muitas espécies
de insetos estejam experimentando uma redução, o estudo também descobriu que um
menor número de espécies podem se adaptar às mudanças e proliferar.
"Espécies de
insetos que são pragas e se reproduzem rápido provavelmente irão prosperar,
seja devido ao clima mais quente, seja devido à redução de seus inimigos
naturais, que se reproduzem mais lentamente", afirma Dave Goulson, da
Universidade de Sussex.
Segundo Goulson,
espécies como moscas domésticas e baratas podem ser capazes de viver
confortavelmente em ambientes humanos, além de terem desenvolvido resistência a
pesticidas.
"É plausível que
nós vejamos uma proliferação de insetos que são pragas, mas que percamos todos
os insetos maravilhosos de que gostamos, como abelhas, moscas de flores,
borboletas e besouros".
·
O que podemos fazer a
respeito?
Apesar dos resultados
do estudo serem alarmantes, Goulson explica que todos podem tomar ações para
ajudar a reverter esse quadro. Por exemplo, comprar comida orgânica e tornar os
jardins mais amigáveis aos insetos, sem o uso de pesticidas.
Além disso, é preciso
fazer mais pesquisas, já que 99% da evidência do declínio de insetos vêm da
Europa e da América do Norte, com poucas pesquisas na África e América do Sul.
Se um grande número de
insetos desaparecer, diz Goulson, eles provavelmente serão substituídos por
outras espécies. Mas esse é um processo de milhões de anos. "O que não é
um consolo para a próxima geração, infelizmente".
Fonte: BBC News Mundo
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