quarta-feira, 19 de junho de 2024

Quem é o deputado Sóstenes Cavalcante, ‘PAI’ do PL do Estuprador

O deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) é o responsável por encabeçar o projeto do aborto, que tramita na Câmara dos Deputados em regime de urgência. O texto, assinado por 30 parlamentares, propõe punir quem interrompe uma gestação com mais de 22 semanas, mesmo nos casos permitidos em lei, e equipara a pena a quem realizar o procedimento à de quem cometer um homicídio.

Na manhã desta terça-feira, 18, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou o autor do projeto sem citar nominalmente Sóstenes. Lula sugeriu que o debate sobre o tema encare o aborto como "questão de saúde pública".

Em seu terceiro mandato na Casa, onde ocupa o cargo de 2° vice-presidente, Sóstenes já foi presidente da Frente Parlamentar Evangélica em 2022, conhecida como a Bancada da Bíblia. Hoje ele faz oposição ao governo de Lula. Durante os governos de Dilma Rousseff (PT), votou a favor do impeachment da presidente, e durante o governo de Michel Temer (MDB) foi a favor da reforma trabalhista e da PEC do teto dos gastos públicos.

Desde 2015, assinou sozinho ou com outros parlamentares, 83 projetos de lei na Câmara - 72 deles seguem em tramitação.

Pastor licenciado da Assembleia de Deus e natural de Maceió, Alagoas, o deputado é formado em teologia pela Faculdade de Ciências, Educação e Teologia do Norte do Brasil.

Em parceria com o pastor Silas Malafaia, foi responsável por organizar neste ano os atos em apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em São Paulo e no Rio de Janeiro, convidando parlamentares e políticos e tratando de questões operacionais dos atos.

Segundo o texto atual do projeto, uma pessoa que engravida após sofrer violência sexual e só consiga ter o direito ao aborto após 22 semanas, poderá ser condenada a pena máxima de 20 anos de prisão.

Atualmente, segundo a legislação em vigor, um estuprador pode ser condenado, no máximo, a metade do tempo, 10 anos. A pena pode ser ampliada para até 12 anos caso o crime envolva violência grave e a 30 anos caso a vítima morra.

Nesta segunda-feira, 17, Sóstenes admitiu que a votação da proposta na Câmara poderá ficar para depois das eleições municipais. O deputado afirmou que "não tem pressa" para votar o projeto, e que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), tem uma promessa com a bancada evangélica no apoio às pautas conservadoras - que poderá ser cumprida até o final de seu mandato na presidência da Câmara, no final deste ano.

•           'Se filha dele fosse estuprada, como ia se comportar?', diz Lula sobre autor de projeto do aborto

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou na manhã desta terça-feira, 18, o projeto de lei que equipara o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples. A proposta proíbe o aborto mesmo nos casos de gravidez decorrente de estupro e, nestes casos, a possível pena à gestante supera a pena prevista para o crime de estupro. O petista criticou o autor do texto e sugeriu que o debate sobre o tema encarasse o aborto como "questão de saúde pública".

A proposta que tem como um dos principais idealizadores o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), um dos líderes da bancada evangélica na Câmara.

"O cidadão diz que fez o projeto 'para testar o Lula'. Eu não preciso de teste, quem precisa de teste é ele. Eu quero saber se uma filha dele fosse estuprada, como ele ia se comportar", disse o presidente. "Eu, Luiz Inácio Lula da Silva, sou contra o aborto, para ficar bem claro. Agora, enquanto chefe de Estado, o aborto tem que ser tratado como questão de saúde publica, porque você não pode continuar permitindo que a 'madame' vá fazer um aborto em Paris e que a coitada morra em casa tentando furar o útero com uma agulha de tricô. Este é o drama que estamos vivendo", afirmou.

Para Lula, o tema não deveria estar em tramitação na Câmara, sobretudo em regime de urgência. Segundo o presidente, as pautas de costumes "não têm nada a ver com a realidade que vivemos". "Quem está abortando são meninas de 12, 13, 14 anos, é crime. É crime hediondo. O cidadão estuprar menina e depois querer que ela tenha um filho. Um filho de monstro", disse Lula. "A menina é obrigada a ter um filho de um cara que estuprou ela? Que monstro vai sair do ventre desta menina?".,

No sábado, o presidente já havia declarado, nas redes sociais, que é uma "insanidade querer punir uma mulher vítima de estupro com uma pena maior que um criminoso que comete o estupro".

•           Autor é desmentido por médicos e ameaça mulheres

O deputado federal bolsonarista Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), autor do PL do Estupro, foi desmentido nesta segunda-feira (17) pelos médicos que citou mais cedo na Câmara dos Deputados em sessão que debatia o projeto. Ele resgatou um caso de 2020 em que uma menina capixaba engravidou após ser vítima de abuso sexual, e citou os médicos ao apresentar a história de forma fantasiosa.

A menina tinha 10 anos e teve a cirurgia de aborto negada no Espírito Santo. Transferida para Recife (PE), conseguiu receber o atendimento devido. Sóstenes afirmou que os médicos do Centro Integrado de Saúde Amauri Medeiros (Cisam) teriam se recusado a fazer o procedimento uma vez que a gravidez da vítima já avançava 23 semanas.

“Para a surpresa dos que haviam organizado a transferência, os médicos dos diversos plantões do serviço de aborto do Cisam também se recusaram a realizar o procedimento. O doutor Olímpio de Moraes, diretor da unidade, então dirigiu-se pessoalmente ao Cisam e, tomando a si a menina para exame, aplicou injeção de cloreto de potássio no coração do nascituro, causando-lhe morte instantânea por assistolia. Em seguida, disse aos colegas: ‘O concepto está morto, não há mais o que discutir, podem realizar o aborto’”, declarou.

Horas depois, questionado pela Folha, Olímpio Moraes desmentiu o parlamentar e apontou que sua versão do episódio é fantasiosa. Ele disse que, ao contrário da narrativa do bolsonarista, não foi ele quem realizou o procedimento, mas a equipe do Cisam.

“Não houve resistência da equipe. Eu era diretor da maternidade, não plantonista, e não faço procedimentos”, afirmou o médico.

Nésio Fernandes, o então secretário de Saúde do ES, também foi citado por Cavalcante e o desmentiu. Ao contrário de um jato particular, como dito pelo deputado, a criança foi transferida por um avião de carreira.

•           A ameaça caso o projeto não seja aprovado

Também à Folha, Sóstenes Cavalcante afirmou que quer o projeto aprovado antes das eleições municipais de outubro. Ele declarou que espera que os deputados “que são pró-vida” o apoiem. O ex-líder da bancada evangélica considera que terá o apoio do chamado ‘centrão’, a quem reconhece afinidade com o que chama de “pró-vida”.

No entanto, dada a pressão popular, o apoio ao projeto tem caído na Câmara. Em enquete no site da Câmara, por exemplo, 88% disseram discordar totalmente do texto. Questionado sobre isso, disparou uma verdadeira ameaça aos direitos das mulheres.

“É um projeto light, não é nada radical. O Estatuto do Nascituro é muito mais pró-vida que esse, que é um meio termo. Mas se não quiserem votar esse, a gente vota o Estatuto do Nascituro”, disparou.

O projeto em questão foi apresentado em 2007 pelos então deputados Luiz Bassuma (PV-BA) e Miguel Martini (PHS-MG). Prevê a inclusão dos “direitos do feto” na legislação brasileira, que valeriam desde a concepção. Além disso, também busca enquadrar o aborto como crime hediondo.

•           Extrema direita é detonada nas redes por apoio a PL do Estupro

Na quarta-feira (12), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), colocou para votação, de maneira repentina e sem avisar as lideranças da casa, a urgência de tramitação do PL 1409/24, que equipara o aborto após a 22ª semana ao crime de homicídio.

Com a urgência aprovada, o "PL dos estupradores", como a matéria está sendo chamada nas redes e pelos opositores ao texto, não precisa passar pelas Comissões da Câmara e pode ir, a qualquer momento, à votação no plenário da casa.

Diante de tamanho retrocesso que o PL visa impor, entre eles, o fato de que se penaliza mais a mulher estuprada do que o estuprador, a reação da sociedade foi imensa e, na noite desta quinta-feira (13), milhares de mulheres ocuparam as ruas de várias cidades do Brasil contra o projeto de lei. Outras manifestações estão marcadas para os próximos dias. Veja mais abaixo.

Um dos grupos responsáveis pelo "PL dos estupradores" é a chamada "bancada evangélica", que reúne parlamentares religiosos do Congresso Nacional e que, desde sempre, se colocam contra qualquer política de avanço aos direitos das mulheres e LGBT.

Dessa maneira, internautas indignados com o avanço do "PL dos estupradores" subiram a hashtag "BANCADA EVANGÉLICA ACABOU", onde expõem os parlamentares da extrema direita que apoiam o projeto de lei que visa penalizar mulheres estupradas que abortarem.

•           Lula enquadra autor do PL do Estupro: "quem precisa de teste é ele"

Em forte entrevista na manhã desta terça-feira (18) à CBN, em que disparou contra a Globo e comparou Campos Neto a Sergio Moro, o presidente Luis Inácio Lula da Silva enquadrou o deputado bolsonarista Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), presidente da bancada evangélica e autor do Projeto de Lei 1904/2024, o PL do Estupro, que equipara o aborto feito a partir da 22ª de gestação ao crime de homicídio, inclusive impondo penas maiores às vítimas de estupro que aos estupradores.

Poste de Silas Malafaia, Cavalcante comanda um grupo de 31 deputados aliados de Jair Bolsonaro (PL) que apresentaram a proposta, colocada em regime de urgência por Arthur Lira (PP-AL) na Câmara Federal.

Ao comentar as dificuldades na relação com o Congresso e uma inédita "extrema direita ativista pouco pragmática na política e muito pragmática nas mentiras", o presidente citou a tramitação à toque de caixa do PL.

"Eu nem gosto de discutir isso, porque quem está abortando, na verdade, são meninas de 12, 13, 14 anos. É crime! É crime hediondo um cidadão estuprar uma menina e depois querer que ela tenha um filho, o filho de um monstro", disse Lula, em tom indignado. "As crianças estão sendo violentadas dentro de casa. Muitas vezes por padrastos", emendou.

Lula então criticou a imaturidade que está sendo colocado o debate pelos fundamentalistas no Congresso e detonou Cavalcante, que havia dito que colocou o projeto em pauta simplesmente para "testar" a posição do presidente.

"Essa discussão tem que ser mais madura, não da forma banal como se faz hoje. O cidadão diz que fez o projeto para 'testar o Lula'. Eu não preciso de teste, quem precisa de teste é ele. Eu quero saber se uma filha dele fosse estuprada, como ele iria se comportar", afirmou.

Lula ainda reiterou sua posição pessoal sobre o aborto, mas ressaltou a necessidade de se debater o tema como questão de saúde pública.

"Eu, como pai de 5 filhos, avô de 8 netos e bisavô de uma bisneta... Eu, Luis Inácio Lula da Silva, sou contra o aborto. Para ficar bem claro. Agora, como chefe de Estado, o aborto tem que ser tratado como questão de saúde pública. Porque você não pode continuar permitindo que a madame faça um aborto em Paris e que a coitada morra em casa tentando furar o útero com uma agulha de tricô. Esse é o drama que estamos vivendo", disse.

Em seguida, Lula propôs uma outra discussão, que também é alvo de uma narrativa distorcida pela extrema direita.

"A gente vai ter que debater se tem ou não educação sexual na escola. A gente vai ter que ensinar meninos e meninas como se comportar. Porque nós estamos no século XXI e retrocedendo nessa discussão. E o que é triste é que um deputado apresente um projeto de lei em que um estuprador pode pegar uma pena menor do que a estuprada. O que é isso? Eu sinceramente acho que essa coisa nem deveria ter entrado em pauta porque o tema do Brasil não é esse", concluiu.

•           Penalizar meninas de 14 anos estupradas é "aberração", diz advogado após fala do autor do PL do Estupro

O advogado Ariel de Castro Alves, especialista em direitos da infância e juventude, afirmou em entrevista à Fórum que a declaração de Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), deputado fundamentalista que encabeça o Projeto de Lei 1904/2024, conhecido como PL do Estupro, admitindo que, com a proposta, quer punir meninas menores de idade que interromperem gravidez decorrente de estupro com procedimentos abortivos, é uma "afronta aos direitos das crianças e dos adolescentes" e uma "aberração jurídica".

Em entrevista, ao responder sobre a forte repercussão negativa relacionada ao projeto, que na prática equipara o aborto feito a partir da 22ª de gestação ao crime de homicídio, inclusive impondo penas maiores às vítimas de estupro que aos estupradores, Sóstenes Cavalcante disse que, quando a situação envolver uma menor de idade, ela será submetida a "medidas socioeducativas", que também são um tipo de punição.

“Não é pena alternativa, são medidas socioeducativas. Ela pode tranquilamente fazer um atendimento de socioeducação para que isso não volte a se repetir...”, disparou o bolsonarista.

Para Ariel de Castro Alves, que é ex-Secretário Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, a declaração de Sóstenes Cavalvante "mostra que, de fato, a principal finalidade da proposta é punir as vítimas de estupros, sejam mulheres adultas ou adolescentes".

De acordo com o especialista, tanto a punição às crianças e adolescentes que interromperem a gravidez decorrente de estupro quanto o projeto como um todo são inconstitucionais.

"O Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe a revitimização. A vítima precisa receber acompanhamento psicológico e social visando superar as violações sofridas e os traumas, e não ser duplamente punida pelo estupro e pela medida socioeducativa. Essa proposta se opõe totalmente ao princípio constitucional da proteção integral e da prioridade absoluta aos direitos das crianças e dos adolescentes. Por isso é inconstitucional e não pode prosperar".

"Entendo que a proposta significa um grande retrocesso. Mulheres vítimas de estupro poderão ser punidas com penas de homicídio, de 6 a 20 anos, maiores do que as aplicáveis aos estupradores. Estupro: 6 a 10 anos de reclusão; estupro de vulnerável: 8 a 15 anos de reclusão. Uma verdadeira aberração jurídica", diz ainda o advogado.

<><> Acesso ao aborto legal

O aborto é permitido no Brasil em casos de estupro e, atualmente, não há limite de tempo de gravidez para que o procedimento seja realizado. O PL 1904, entretanto, propõe que a interrupção da gestação a partir de 22 semanas passe a ser crime equiparável ao de homicídio.

"Um dos princípios do Direito Penal Brasileiro é o da Proporcionalidade. E essa hipótese das vítimas de estupro receberem penas maiores do que de seus algozes é inaceitável", diz Ariel de Castro Alves.

O especialista explica que, em muitos casos, vítimas de estupro demoram mais de 20 semanas após o início da gravidez para realizarem o aborto legal pois, além de estarem traumatizadas, o acesso ao procedimento é restrito e burocrático.

"As meninas e mulheres vítimas de estupro, em alguns casos, demoram pra realizar o aborto por estarem submetidas, ameaçadas e constrangidas por seus agressores, e em razão da burocracia dos serviços de saúde, policiais e judiciais, e também pelas oposições morais e religiosas de alguns profissionais públicos e privados e das próprias famílias. Elas não demoram pra realização do procedimento por mero 'capricho'", pontua.

"A legislação brasileira deveria prever punições para os agentes públicos ou privados que dificultam a realização do aborto legal e não punir a vítima de estupro que já foi totalmente violada nos seus direitos fundamentais", defende Castro Alves.

De acordo com o advogado, que atualmente é membro da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB-SP e do Instituto Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, o Congresso Nacional deveria, neste momento, se debruçar em "aprimorar o atendimento de saúde, social, psicológico, policial e judicial das mulheres e meninas gestantes em decorrência de estupros, e também gestantes que estejam em risco de vida ou grávidas de fetos anencéfalos para que o procedimento de aborto legal ocorra o quanto antes".

"A violência sexual, incluindo os estupros de vulneráveis, são as piores e mais recorrentes violações contra os direitos das crianças, adolescentes e mulheres adultas no Brasil. Esse tipo de proposta pode colaborar para agravar essa situação. O parlamento brasileiro deveria discutir e estabelecer propostas objetivando de fato o enfrentamento das violações de direitos humanos, ouvindo as entidades e os especialistas e não visando o proselitismo religioso e eleitoral, com proposições demagógicas e oportunistas como essa", finaliza.

 

Fonte: Fórum/Agencia Estado

 

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